Pneumonia nosocomial: estratégia diagnóstica e terapêutica recomendada Ricardo de Amorim Corrêa Departamento de Clínica Médica - Disciplina de Pneumologia Faculdade de Medicina – UFMG Belo Horizonte DEFINIÇÕES • PNEUMONIA ADQUIRIDA NO HOSPITAL • Após ≥ 48 h da admissão • Não incubada à admissão • Tratada na enfermaria/apartamento ou na UTI se mais grave • PNEUMONIA VENTILADOR-ASSOCIADA • Após 48-72 h da intubação endotraqueal • PAH com intubação posteriormente = abordagem similar • PNEUMONIA RELACIONADA À ASSISTÊNCIA • Hospitalizado em qualquer unidade de atendimento agudo por ≥ 2 dias nos últimos 90 dias • Residente em casa de saúde ou asilo • Antibioticoterapia endovenosa, quimioterapia ou tratamento de escara nos últimos 30 dias • Usuário de Unidade de hemodiálise ATS, 2005 EPIDEMIOLOGIA PNM 27% US DATABASE. 1992-1997. VAP 86% ITU 31% Crit Care Med.1999;27(5) 887-892 VAP Prescrição de antimicrobianos P, coorte, 20 UTI-EUA, n = 398 (VAP) Kollef et al. Chest 2006;129:1210 PATOGÊNESE Colonização de orofaringe Bactérias patogênicas Aspiração via cuff / Biofilme Bactérias: Inóculo, tipo e virulência Defesas pulmonares: Cílios, anticorpos, celular COLONIZAÇÃO BACTERIANA VAP Craven et al. Clin Chest Med 2011;32:547 FATORES DE RISCO PARA BACTÉRIAS MULTIDROGA-RESISTENTES • Antibioticoterapia nos 90 dias anteriores • Tempo de internação atual > 5 dias • Prevalência alta de antibiótico-resistência na comunidade ou na unidade hospitalar NECESSITA • Fatores de risco para pneumonia relacionada à VALIDAÇÃO assistência: – – – – – – Hospitalização por ≥ 2 dias nos 90 dias anteriores Residência em casa de saúde ou similar Terapia endovenosa domiciliar Diálise crônica nos últimos 30 dias Tratamento domiciliar de escaras Membro familiar colonizado com BMDR • Doença ou terapia imunossupressora ATS. Am J Respir Crit Care Med 2005;171:388-416 Trouillet, Chastre et al. AJRCCM 1998;157:531-539 MORTALIDADE M. Atribuída IC 95% Risco Relativo Todos os casos 27,10 8.30,45.90 2,00 (1.41, 3.71) Pseudomonas sp 42,80 16.50, 44.57 2,50 (2.01, 4.50) Acinetobacter sp Fagon et al., Am J Med 1993;94:281-288 DIAGNÓSTICO CRITÉRIOS CLÍNICOS DE DIAGNÓSTICO CPIS ORIGINAL PONTO DE CORTE > 6 CRITÉRIOS CLÁSSICOS Infiltrado pulmonar novo ou progressivo + 2: • • • Febre Secreção traqueal ou escarro purulento Leucocitose ou leucopenia – Piora da oxigenação, taquicardia, taquipnéia Johanson WG, 1972 TEMPERATURA o C • 36.0 e ≤ 38.4 • ≥ 38.5 e ≤ 38.9 • ≥ 39.0 e ≤ 36.0 LEUCOMETRIA/mm3 • ≥ 4.000 e ≤ 11.000 • < 4.000 ou > 11.000 • < 4.000 ou > 11.000 + Bast. 500 ESCORE DE SECREÇÃO TRAQUEAL • < 14 • 14 • Escarro purulento Pa02/Fi02 • > 240 ou SDRA • ≤ 240 e sem SDRA RADIOGRAFIA DE TÓRAX • Sem infiltrados • Esparso ou difuso • Localizado PROGRESSÃO RADIOLÓGICA • Sem progressão • Progressão presente CULTURA ASPIRADO TRAQUEAL • Crescimento raro, discreto ou ausente • Crescimento moderado ou maior • Crescimento moderado ou maior consistente com o Gram 0 1 2 0 1 2 0 1 2 0 2 0 1 2 0 2 0 1 2 Pugin, 1991 CPIS x Critérios clássicos n = 25 PADRÃO ÁUREO: HISTOLOGIA + CULT. TECIDO 16 fragmentos pulmão + culturas: AT , PLBA, LBA, EP, TECIDO 80 70 75 77 69 60 50 42 40 30 20 10 0 C.clássicos Sensibilidade CPIS Especificidade Fàbregas et al. Thorax 1999;54:867-73 VALOR DO DIAGNÓSTICO CLÍNICO Fagon JY, Chastre J et al. Chest 1993;103 :547-53 Prospectivo, n=84, Fibro + Escovado Protegido + Diagnóstico clínico Pn. definida: Cultura Líquido pleural positiva, cavitação à TC, histopatologia Pn. provável: Cultura do Escovado Protegido 103 UFC/mL 70 62 60 50 % 40 33 32 30 20 16 10 0 Diagnóstico Probabilidade Pré-teste Tratamentos efetivos Tratamentos desnecessários DIAGNÓSTICO E IDENTIFICAÇÃO MICROBIOLÓGICA MÉTODOS MINIMAMENTE INVASIVOS • Aspirado traqueal MÉTODOS BRONCOSCÓPICOS •Lavado broncoalveolar • Mini-LBA (?) • Escovado protegido • Outros • Lavado broncoalveolar protegido ESTRATÉGIA “BACTERIOLÓGICA” DE DIAGNÓSTICO Infiltrado radiológico + Dois critérios clínicos CULTURA QUANTITATIVA Aspirado Traqueal / LBA / ESCOVADO Menor sensibilidade Maior especificidade Menos Falsopositivos Diagnóstico diferencial ATS. Am J Respir Crit Care Med 2005;171:388-416 10 r = 0.79 9 ( log 10 CFU/g tecido ) Cultura segmentos pulmonares Correlação entre culturas quantitativas e tecido pulmonar p < 0.0001 8 7 6 5 4 3 2 1 0 Nenhum Leve Moderado Grave Grau histológico de pneumonia Chastre et al. ARRD,1984 Chastre et al Am J Respir Crit Care Med 1995;152:231-40 Correlação entre culturas quantitativas Lavado Broncoalveolar (LBA) 10 r = 0.75 9 p < 0.0001 8 7 6 Cultura LBA ( log 10 CFU/mL ) 5 4 Grau histológico: 3 Moderado-Grave 2 Leve 1 Nenhum 0 -1 -1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Cultura segmentos pulmonares ( log 10 CFU/g tecido ) Chastre et al. ARRD,1984 Chastre et al Am J Respir Crit Care Med 1995;152:231-40 IDENTIFICAÇÃO MICROBIOLÓGICA VANTAGENS • • • • • Identificar os portadores (verdadeiros) de infecção Garantir a coleta apropriada de amostras para culturas Propiciar o início precoce de terapêutica eficaz Permitir a redução do espectro antimicrobiano Identificar pacientes que tem um foco infeccioso extrapulmonar DESVANTAGENS Resultado tardio: 48-72 horas Dificuldade do estabelecimento do melhor ponto de corte das culturas Forte influência (negativa) do uso prévio de antibióticos Dependência de operador treinado (no caso da broncoscopia) e equipamentos Falta um padrão-áureo CULTURAS QUANTITATIVAS LAVADO BRONCOALVEOLAR 104 UFC/mL ESCOVADO PROTEGIDO 103 UFC/mL ASPIRADO TRAQUEAL 105-6 UFC/Ml MINI-LBA 103 UFC/mL MÉTODOS DIAGNÓSTICOS MODIFICAM DESFECHOS? METANÁLISE ODDS PARA MORTALIDADE ESTUDO FAVORECE FAVORECE INVASIVO NÃO INVASIVO OR (IC 95%) % PESO N Shorr AF et al. Crit Care Med 2005;33(1) PROBABILIDADE DE USO INAPROPRIADO DE ANTIBIÓTICOS Shorr AF et al. Crit Care Med 2005;33(1) METANÁLISE - DESFECHOS (—) ESTUDO (+) Modificação Antibiótico Modificação OR % PESO (IC 95%) Antibiótico Shorr AF et al. Crit Care Med 2005;33(1) Quantitative versus qualitative cultures of respiratory secretions for clinical outcomes in patients with ventilator-associated pneumonia. Cochrane Database Syst Rev. 2008 Oct 8;(4):CD006482. • CONCLUSÕES: – Não existem evidências de que a cultura quantitativa resulta em redução da mortalidade ou alteração de antibióticos quando comparada com a cultura qualitativa em pacientes com PAVM. – O mesmo resultado foi observado quando a estratégia invasiva foi comparada com a não invasiva. – Não existem evidências de que a cultura quantitativa resulte em redução nos dias de internação na UTI, dias de ventilação mecânica e dias de uso de antibióticos. Cortesia Dr. Paulo Teixeira • Adequação: • • • • • 21 meses 299 pacientes em VM 1211 AT 75 LBA LBA diagnóstico em 41 / 75 pacientes = 55% • Incidência = 13.7% AT-pré: 38 / 40 = 95% IC 95% 88 – 100 Falso-negativo: Concordância entre 5% LBA e AT-pré Estratégia Trouillet: 34 / 41 = 83% IC 95% 72 – 94% p = 0.15 versus AT-pré Estratégia ATS: 28 / 41 = 68% IC 95% 54 – 82 p = 0.005 versus AT-pré V I G I L Â N C I A COLONIZAÇÃO CULTURAS DE VIGILÂNCIA – 48 h I.R.V.Mec TRATAMENTO PRECOCE DIAS VENT. DIAS UTI DIAS HOSP CUSTO TRATAMENTO ADEQUAÇÃO TERAPÊUTICA ANTIBIÓTICO ADEQUADO ANTIBIÓTICO INADEQUADO Rápida Redução do inóculo bacteriano Aumento da proliferação bacteriana Redução da resposta inflamatória Seleção de germes resistentes MORTALIDADE IMPACTO DA ADEQUAÇÃO DA ANTIBIOTICOTERAPIA ALVAREZ-LERMA, F. Int Care Med 1996;22:387-394 34,9 35,0 32,4 P, MULTICÊNTRICO, n = 530/ 565 PAVM p=0.0385 30,0 24,7 25,0 ANTIBIÓTICO 20,0 16,2 15,0 10,0 5,0 0,0 MORTALIDADE BRUTA MORTALIDADE ATRIBUÍDA ADEQUADO INADEQUADO ADEQUAÇÃO TERAPÊUTICA E MORTALIDADE P, coorte, 20 UTI-EUA, n = 398 (VAP) Kollef et al. Chest, 2006;129:1210 CRITÉRIOS CLÍNICOS PNEUMONIA ? Obter secreção do Trato Resp. Inferior Cultura (Quantitativa ou Semi-Quantitativa) & Microscopia Começar ANTIBIÓTICO EMPÍRICO (exceto se baixa probabilidade clínica & Microscopia negativa) INÍCIO TARDIO ou FATORES DE RISCO PARA BACTÉRIAS MULTI-DROGA RESISTENTES ? NÃO SIM LIMITAR ESPECTRO DO ANTIBIOTICOTERAPIA ANTIBIÓTICO PARA GERMES RESISTENTES ATS. Am J Respir Crit Care Med 2005;171:388-416 AJUSTE TERAPÊUTICO ATS. Am J Respir Crit Care Med 2005;171:388-416 2o. e 3o. Dias Verificar CULTURAS e avaliar RESPOSTA CLÍNICA TEMPERATURA, LEUCOCITOSE, RX, OXIGENAÇÃO, SECREÇÃO PURULENTA, ALTERAÇÕES HEMODINÂMICAS & FALÊNCIA ORGÂNICA MELHORA CLÍNICA APÓS 48-72 HORAS? NÃO CULTURAS (-) - Outro Germe? - Complicações? -Outro diagnóstico ou sítio de infecção? SIM CULTURAS (+) Ajustar tratamento - Outro Germe? - Complicações? - Outro diagnóstico ou sítio de infecção? CULTURAS (-) Considerar interromper tratamento CULTURAS (+) De-escalonar ATB Se possível: -Tratar 7 – 8 dias e reavaliar ANTIBIOTICOTERAPIA INICIAL - I SEM FATORES DE RISCO PARA BMDR, INÍCIO PRECOCE QUALQUER GRAVIDADE AGENTE POTENCIAL S. pneumoniae Haemophilus influenzae S. Aureus meticilino-sensível ANTIBIÓTICO RECOMENDADO CEFTRIAXONE ou LEVOFLOXACINA, MOXIFLOXACINA, ou CIPROFLOXACINA Bastonetes Gram-negativos sensíveis Eschericia coli Klebsiella pneumoniae Enterobacter species Proteus species Serratia marcescens ou AMPICILINA/SULBACTAN ou ERTAPENEM ATS. Am J Respir Crit Care Med 2005;171:388-416 ANTIBIOTICOTERAPIA INICIAL - II FATORES DE RISCO PARA BMDR, INÍCIO TARDIO QUALQUER GRAVIDADE - ATS, 2005 AGENTE POTENCIAL ANTIBIÓTICO RECOMENDADO PATÓGENOS DO GRUPO I MAIS BMDR Psedomonas aeruginosa Klebsiella pneumoniae (ESBL) Acinetobacter species ? CEFALOSPORINA ANTIPSEUDOMONAS (Cefepime, ceftazidime) ou CABAPENEM ANTI-PSEUDOMONAS (Imipenem, Meropenem) ou BETA-LACTÂMICO/INIB.BETALACTAMASE (Piperacilina/Tazobactan) MAIS FLUOROQUINOLONA ANTI-PSEUDOMONAS (Ciprofloxacina ou Levofloxacina) ou AMINOGLICOSÍDEO (amicacina, gentamicina ou tobramicina) MAIS S. aureus Meticilino-resistente* LINEZOLIDA OU VANCOMICINA Legionella pneumophila Incluir Macrolídeo (Azitromicina) ou Fluoroquinolona (Ciprofloxacina ou Levofloxacina) no lugar do aminoglicosídeo * Se fatores de risco ou incidência local aumentada para MRSA) OUTROS E IMPORTANTES ASPECTOS DETERMINANTES DE DESFECHOS • Implementação de protocolos sistemáticos • Tempo até início do tratamento • Doses e intervalos dos antimicrobianos • Adaptação local das diretrizes • Pneumonia da enfermaria x UTI • Diagnóstico precoce e padrões de resistência Conclusões • Sinais e sintomas têm baixa especificidade – Necessidade de rastreamento clínico sistemático • Diagnóstico microbiológico – Permite adoção de estratégias terapêuticas com dados locais – Racionalização do uso de antibióticos • Morbidade e mortalidade da VAP: – Busca pelo aprimoramento do arsenal diagnóstico • Usar o conjunto de dados clínicos, analíticos e microbiológicos para o diagnóstico da PAV. • Implementar PROTOCOLOS de “A a Z” no manejo da pneumonia nosocomial Diretrizes brasileiras de pneumonia adquirida no hospital 2007 www.sbpt.org.br Obrigado!