Teoria Geral da Constituição
(Constituição, normas constitucionais: aplicação
e interpretação, poder constituinte e princípios
constitucionais)
Aulas 10 e 11
IGEPP – Senado Federal
Prof. Leo van Holthe


A Constituição é a lei fundamental e suprema de
um Estado.
Elementos
do
conceito
ideal
de
Constituição (século XIX):
a) sistema de garantias da liberdade;
b) princípio da separação dos poderes;
c) forma escrita.
Elementos de uma Constituição:
a) elementos orgânicos (estruturação do Estado);
b) elementos limitativos (direitos fundamentais);
c) elementos sócio-ideológicos (ordem econômica e
social);
d) elementos de estabilização constitucional (controle
de constitucionalidade, estados de sítio e de defesa,
intervenção federal, rigidez constitucional);
e) elementos formais de aplicabilidade (ADCT e art.
5.º, § 1.º).
Classificação de constituição:

1) Quanto ao conteúdo
a) Constituição material ou substancial: conjunto de
normas, inseridas ou não em um documento escrito, que
regulam a estrutura do Estado, a organização dos seus
órgãos e os direitos fundamentais.
b) Constituição formal: conjunto de normas inseridas no
texto
constitucional,
independente
do
seu
conteúdo.
Constituição
formal
é
necessariamente escrita e rígida.
2) Quanto à forma
a) Constituição escrita: conjunto de normas escritas.
Subdivide-se em: codificada (um único documento)
ou legal (mais de um documento legal).
b) Constituição não escrita, histórica, consuetudinária
ou costumeira: baseia-se em costumes, jurisprudência
e em textos esparsos.
3) Quanto à origem
a) Constituição democrática, promulgada, popular ou
votada: caracterizada pela participação popular
(Assembléia Nacional Constituinte).
b) Constituição outorgada: elaboradas sem participação
popular
c) Constituição pactuada, mista ou dualista: oriunda de um
pacto celebrado entre dois ou mais titulares do poder
constituinte (ex.:Magna Carta da Inglaterra de 1215)
d) Constituição cesarista, bonapartista, plebiscitária ou
referendária: constituições outorgadas que se submetem a
umaconsulta popular posterior ou anterior (ex.:
Constituições precedidas de plebiscitos no Chile de
Pinochet).
4) Quanto ao modo de elaboração
a) Constituição dogmática: necessariamente escrita que
respeita dogmas da teoria política e jurídica
dominantes.
b) Constituição histórica: necessariamente não
escrita, fruto da contínua síntese histórica, da tradição
e dos fatos políticos.
5) Quanto à estabilidade, alterabilidade ou
mutabilidade
a) Constituição imutável: não prevê nenhum processo de
alteração.
b) Constituição fixa: estabelece que somente pode ser
alterada por obra do próprio poder constituinte originário.
c) Constituição rígida: prevê, para a sua modificação, um
procedimento solene, mais difícil do que o previsto para a
alteração da legislação comum.
d) Constituição flexível: prevê, para a sua modificação, o
mesmo procedimento observado para as leis
infraconstitucionais.
e) Constituição semirrígida ou semiflexível: parte rígida,
parte flexível (ex.: CF brasileira de 1824).
6) Quanto à extensão
a) Constituição breve, concisa ou sintética: Constituição
de poucos artigos. Tende a ser mais duradoura (ex.:
Constituição dos EUA, de 1787).
b) Constituição longa, prolixa ou analítica: Constituição
extensa, que aborda e regula todos os assuntos que
considera relevantes à formação e funcionamento do
Estado.
7) Quanto à finalidade
a)
Constituição-garantia
(também
chamada
de negativa): seu objetivo principal reside na limitação do
poder do Estado por meio da previsão das liberdades
negativas ou liberdades-impedimento (ex.: Constituição
dos EUA).
b) Constituição-dirigente: pretende ser um plano normativo
global, que determina tarefas e programas de atuação
futura para o Estado. Caracteriza-se por conter normas
programáticas (ex.: CF/88).
c)
Constituição-balanço:
retrata
uma
situação
existente, voltada, portanto, para o mundo do “ser” (ex.:
Constituições soviéticas de 1924, 1936 e 1977).
8) Quanto à ideologia
a) Constituição ortodoxa ou simples: formada por
uma ideologia única (ex.: Constituições soviéticas).
b)
Constituição
eclética,
pluralista
ou
compromissória – abriga diversas ideologias, que
são conciliadas na Lei Maior (ex.: CF/88).
9) Quanto ao objeto
a) Constituição liberal: limita-se à organização do
Estado e é associada ao Estado Liberal de Direito
(séculos XVIII e XIX).
b) Constituição social: contém normas relativas à
ordem econômica e social e associa-se
ao welfare state (predomínio a partir do século
XX).
10) Quanto à concordância entre as normas
constitucionais e a realidade política (classificação
ontológica de Karl Loewenstein)



a) Constituição normativa: possui grande eficácia, uma
vez que a dinâmica do poder efetivamente se submete
às normas constitucionais (ex.: CF dos EUA).
b) Constituição semântica: as normas constitucionais
não dominam o processo político nem há essa vontade.
A Constituição não passa de uma “fachada” (exs: CF
brasileiras de 1937 e 1967).
c) Constituição nominal: as normas constitucionais
também não dominam o processo político, existindo,
porém, a pretensão de que no futuro haja concordância
entre as normas constitucionais e a realidade política
(ex.: CF/88).
Normas Constitucionais

As normas jurídicas possuem duas espécies de
eficácia: eficácia social ou efetividade,
relacionada com a real observância da norma no
meio social, e a eficácia jurídica, que diz
respeito à aplicabilidade da norma.

Todas as normas constitucionais possuem eficácia
jurídica. Em relação à eficácia social, José Afonso da
Silva classifica as normas constitucionais em:
a) Normas constitucionais de eficácia plena: desde a sua
entrada em vigor, produzem ou têm possibilidade de
produzir todos os efeitos essenciais, porquanto já
dotadas
de
normatividade
suficiente.
Possuem aplicabilidade imediata, direta e integral e
eficácia social plena. Exemplos: CF, arts. 1.º, 4º,
5.º,caput, IV, XXXV e XXXVI, 15, 17, §4.º, 21, 30, 44, 76,
145, 153 e 230, §2.º.
b)
Normas
constitucionais
de
eficácia
contida
(redutível ou restringível): são normas igualmente dotadas
de normatividade suficiente para produzir todos os seus
efeitos essenciais, mas o próprio texto da norma deixa
margem a que sua incidência seja restringida
posteriormente, nos termos da lei, de conceitos éticojurídicos ou de outras normas constitucionais.
Elas possuem aplicabilidade imediata ou direta, mas
possivelmente
não
integral
e
eficácia
social
contida ou redutível. Exemplos: CF, arts. 5.º, XIII, 37, I, 136,
34, I, 144, 5.º, XVI e 5.º, XXII.
c) Normas constitucionais de eficácia limitada: apresentam
aplicabilidade mediataou indireta (reduzida ou diferida),
dependente da elaboração de uma legislação ulterior.
Exemplo: CF, arts. 7.º, XX, e 218.
 As normas de eficácia limitada subdividem-se em normas
constitucionais de:


princípio institutivo ou oraginzativo (que traça esquema geral de
estruturação de órgãos ou institutos jur.), subdivididas em
impositivas ou peremptórias (arts. 20, §2.º, 33, 88, art. 109, VI, e
121) e facultativas ou permissivas (arts. 22, § único, 125, § 3.º,
125, § 6.º); e
normas constitucionais de princípio programático (ex.: CF, arts.
215 e 218). Estas obrigam e condicionam o PL, o PExecutivo e o PJ
às finalidades nelas contidas (STF, RE 271.286 AgR/RS).
Princípios de hermenêutica constitucional
a) Princípio da unidade da Constituição: as normas
constitucionais devem ser interpretadas em conjunto,
formando uma unidade de sentido. Diante desse princípio,
o Direito brasileiro não admite hierarquia jurídica entre as
normas constitucionais, tampouco a teoria alemã das
“normas constitucionais inconstitucionais”.
b)
Princípio do efeito integrador: a interpretação
constitucional deve favorecer a integração política e social,
fim último de uma Constituição.
c) Princípio da justeza, correção ou conformidade
funcional: a interpretação constitucional deve respeitar
o “esquema organizatório-funcional” (princípio da
separação de poderes) estabelecido na CF.
d) Princípio da concordância prática ou da harmonização:
os bens jurídicos protegidos pela Constituição devem
ser harmonizados no caso concreto, evitando o sacrifício
total de uns em relação aos outros.
e) Princípio da força normativa da Constituição e da
máxima efetividade ou da eficiência – estes princípios
exigem que a interpretação conceda à norma
constitucional o sentido que lhe dê maior eficácia.
f) Princípio da interpretação das leis em conformidade
com a Constituição: as leis devem ser interpretadas
em conformidade com a Constituição e não o
contrário, diante do princípio da supremacia
constitucional.
A interpretação conforme a Constituição:
 1) como princípio de hermenêutica constitucional – exige
que as leis sejam interpretadas em conformidade com a
Constituição, e não o contrário;
 2)
como técnica de decisão de controle de
constitucionalidade – utilizada nos casos de normas
“plurisiginicativas”, exige que seja(m) prestigiada(s)
aquela(s) interpretação(ões) que se harmonize(em) com os
preceitos da Carta Magna, diminuindo o âmbito de
incidência da norma (restringindo sua interpretação), mas
sem declarar a inconstitucionalidade do texto legal (não há
redução do texto da lei).
Métodos de hermenêutica constitucional
a) Método jurídico ou hermenêutico-clássico: sendo uma lei ,
a Constituição submete-se aos métodos clássicos de
hermenêutica usados para as leis em geral (gramatical,
lógico, sistemático, teleológico etc.).
b) Método tópico-problemático: por entender que a
Constituição é um sistema normativo aberto, deve o
intérprete partir do problema (e não da norma em
abstrato) e analisar os pontos de vista possíveis a fim de
escolher a melhor solução para o caso concreto.
c) Método científico-espiritual: deve o intérprete guiar-se
pelos valores que formam a essência, o “espírito da
Constituição”, a fim de realizar a integração política e
social.
d) Método hermenêutico-concretizador: parte da premissa
de que a leitura de qualquer texto normativo, inclusive o
texto
da
Constituição,
começa
pela
“précompreensão” do intérprete, o qual deve concretizar a
norma, levando em consideração o contexto
histórico em que se encontra inserido.
e) Método normativo-estruturante: considerando que existe
uma implicação necessária entre o texto normativo e a
realidade fática que ele pretende regular, a interpretação
da Constituição não se limita ao texto legal, devendo
igualmente levar em conta os fatos da realidade social
sobre os quais incide a Constituição.
f) Método da comparação constitucional: consiste na
confrontação de pontos comuns e divergentes entre
sistemas constitucionais de diferentes países (direito
comparado).
PODER CONSTITUINTE

Poder constituinte é o poder capaz de
estabelecer as normas constitucionais.

Teoria formal do PC: (Abade Sieyès – “O que é o
Terceiro Estado?”) diferença entre o poder
constituinte e os poderes constituídos.

Titularidade do PC: povo (soberania popular).

Exercício do PC: representantes do povo
(Assembleia Nacional Constituinte ou outorga).

Natureza do PC: três correntes: social, política e
jurídica.

Veículo do PC: a revolução.

Espécies de PC:

a) Material versus Formal.

b) Fundacional (ou histórico) versus pós-fundacional (ou
revolucionário).

c) Originário (PCO) versus Derivado (PCD).

Características do PCO:





inicial (o PCO é a base da ordem jurídica);
ilimitado juridicamente ou autônomo
metajurídicos);
incondicionado (forma);
permanente (titularidade);
extraordinário (exercício).
(limites

Conceito de PCD: é o poder de reformar ou de
complementar uma Constituição já existente.

Localização do PCD: inserido na CF/88, instituído
pelas normas originárias e passível de controle de
constitucionalidade.

Características do PCD:




derivado;
subordinado (limitado juridicamente);
condicionado.
Espécies de PCD: reformador e decorrente.

Subespécies do PCD reformador: emenda
constitucional (CF, art. 60) e revisão constitucional
(art. 3.º do ADCT).

Reforma constitucional não se confunde com
mutação constitucional (processo informal de
mudança da constituição; altera-se o sentido, e
não o texto, por obra da doutrina, da
jurisprudência e pelas forças sociais.

Limites ao PCD reformador:




limites materiais (cláusulas pétreas): expressos (CF,
art. 60, § 4.º) ou implícitos (titularidade do PC
originário e derivado e os limites expressos – arts. 60
da CF e 3.º do ADCT).
limites circunstanciais (estado de sítio, estado de
defesa e intervenção federal).
Limites procedimentais ou formais (arts. 3.º do ADCT
e 60, caput e §§ 2.º, 3.º e 5.º).
Existem limites temporais ao PCD reformador da
CF/88?

Conceito de PCD decorrente (PCD estadual):
poder que os estados e o DF têm de se autoorganizarem, por meio de constituições estaduais
e da LODF (art. 11 do ADCT e art. 25 da CF), a fim
de complementar a CF/88.

Limites ao PC decorrente:



Princípios sensíveis (CF, art. 34, VII).
Princípios estabelecidos ou organizatórios.
Princípios extensíveis.
Fenômenos de Direito Constitucional
intertemporal

Recepção:
leis
anteriores
compatíveis
materialmente com a nova CF ou emenda
constitucional permanecem em vigor. É um
processo automático e que, em regra, apenas se
preocupa com aspectos materiais das normas
infraconstitucionais. Para o STF, a não recepção
das leis pela nova CF ou pelas emendas
constitucionais equivale à sua revogação.

Repristinação: a lei não recepcionada por CF
posterior volta a vigorar por força de nova CF. Não é
automático e depende de previsão constitucional
expressa. A CF/88 não o adotou.

Desconstitucionalização: a nova CF recepciona
normas da CF passada como lei ordinária. Não é
automático e depende de previsão constitucional
expressa. A CF/88 não o adotou.
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS


Princípios
jurídicos:
funções
normogenética,
interpretativa, integradora e sistemática do
ordenamento jurídico.
Características dos princípios jurídicos:
alto grau de generalidade, abstração e indeterminação;
 força normativa;
 dimensão de peso (mandado de otimização, aplicado na
medida do possível);
 ponderação de interesses (princípio da
proporcionalidade).


Princípios Constitucionais:


positivados e não positivados (ex.: proporcionalidade ou razoabilidade – art. 5.º, LIV, da CF);
jurídico-constitucionais e político-constitucionais.
Princípios fundamentais (CF, arts. 1.º ao
4.º)

Fundamentos da RFB (art. 1.º): SO – DI – CI
– VA – PLU.

Objetivos do Brasil (art. 3.º): CO – RE – ER –
PRO – MO – GA.

Princípios do Brasil em suas relações internacionais
(art. 4.º):





a independência nacional; igualdade entre os Estados;
a defesa da paz, a solução pacífica dos conflitos, a
autodeterminação dos povos e a não intervenção;
a prevalência dos direitos humanos e o repúdio ao
terrorismo e ao racismo;
a cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade e a concessão de asilo político;
a integração econômica, política, social e cultural dos povos
da América Latina, visando à formação de uma comunidade
latino-americana de nações.




Formas de governo: república e monarquia.
Formas de Estado: simples ou unitário e composto ou
complexo (federação e confederação).
Sistemas
de
governo:
parlamentarista
e
presidencialista.
O Brasil adotou, na CF88, a forma de governo
republicana (princípio sensível), a forma de Estado
federativa (cláusula pétrea) e o sistema de governo
presidencialista.

Princípio do Estado Democrático de Direito:
evolução do Estado Liberal e do Estado Social
de Direito. Papel da lei no EDD.

Princípio da separação dos poderes:
separação não absoluta e sistema de freios e
contrapesos (concepção flexível).
Download

igepp_-_aulas_10_e_11_