ESAPL IPVC Licenciatura em Engenharia do Ambiente e dos Recursos Rurais Economia Ambiental Tema 6 IMPOSTOS E CONTAMINAÇÃO ÓPTIMA Para quê a Regulamentação ? No tema anterior vimos que as soluções de mercado (tipo Coaseanas) para as externalidades eram possíveis apenas em alguns casos concretos, e que normalmente é necessário algum tipo de regulamentação. Note-se que a regulamentação da contaminação não é mais do que uma forma de se tentar atingir Q*, o nível de contaminação socialmente óptimo. Muitos economistas defendem um tipo de intervenção muito específico: um imposto sobre o contaminador, baseado na estimativa dos danos por este provocados. Falamos aqui, muito concretamente, do Princípio do Poluidor Pagador. Tal imposto é conhecido por Imposto de Pigou, devido ao economista Arthur C. Pigou que, em 1920, no seu livro “Economics of Welfare” propôs um imposto como meio idóneo para se chegar ao equilíbrio entre o custo social e o custo privado. O que é o Imposto de Pigou ? Voltemos ao nosso gráfico de sempre. A internalização fiscal, de tipo Pigouviano, consiste em fazer pagar pelo agente emissor da deseconomia uma taxa igual ao montante dessa deseconomia. Se no nosso caso estabelecêssemos um imposto sobre cada unidade do nível de actividade que incrementasse a contaminação e igualássemos esse imposto a t*, podemos ver que tal imposto faria com que Πm se deslocasse para a esquerda até (Πm - t*). € Πm CEm Πm – t* t* 0 Q* Qπ Q O que é o Imposto de Pigou ? t* tem de ser pago para cada nível de actividade, de tal forma que o Lucro marginal Πm se reduza em t*. O contaminador desejará agora maximizar os seus benefícios, sujeitos ao imposto, e isto tem lugar em Q*, como desejável. Portanto, o imposto t* é um imposto óptimo, uma vez que consegue fazer com que se atinja o óptimo social em Q*. € Πm E como se determina t* ? Como se vê, ele é igual ao CEm no óptimo. CEm Πm – t* t* 0 Q* Qπ Isto define um Imposto Pigouviano Óptimo: é igual ao custo externo marginal (isto é, ao dano causado por uma unidade marginal de contaminação) no nível óptimo de contaminação. Q As suas implicações € Se o contaminador continuar a produzir em Qπ deverá pagar um imposto total de: 0abQ* + Q*bcQπ. Mas a área Q*bcQπ (a cor de rosa) não será paga porque o imposto excede os benefícios privados líquidos correspondentes ao nível de actividade Q*Qπ. Em vez disso, o contaminador recuará para Q*, evitando pagar impostos – de acordo com a teoria. Mas em Q* o contaminador continua a pagar 0abQ*, apesar de agora estar a emitir apenas a quantidade óptima de contaminação. O contaminador parece ser Πm penalizado por duas vezes: uma para recuar até Q*, e de novo quando está operando no nível de contaminação óptimo. CEm a b c Q* Qπ t* 0 Q As suas implicações Será que o que acabámos de ver é socialmente justificado ? A resposta depende da visão que tenhamos sobre os Direitos de Propriedade. Se a empresa não tem o direito de usar o meio ambiente para emitir resíduos, então o imposto 0abQ* é um imposto sobre o uso de uma propriedade pertencente a outros (por exemplo o Estado). Se a empresa tem todo o direito de usar o ambiente como achar mais conveniente, não só é errado o imposto sobre a contaminação óptima, como o próprio princípio impositivo aplicado entre Q* e Qπ. Todo o esquema de imposto seria errado. Podíamos ainda considerar que a empresa não tem qualquer direito de emitir acima de Q*, mas sim todo o direito de emitir até ao nível óptimo de contaminação. O desenho do imposto Pigouviano está então associado à visão que se tenha do direito que os contaminadores têm de usar o ambiente como vazadouro de resíduos. O que de facto se perde ou se paga com o Imposto de Pigou 1 – A perda de benefícios líquidos pelo facto de não se produzir em Qπ, mas sim em Q* - triângulo Q*bQπ. 2 – O dano residual, ou seja, o nível óptimo de externalidade - triângulo 0bQ*. € Πm 3 – Um imposto residual - triângulo 0ab – interpretável como uma renda paga pela utilização do meio ambiente como poço para a poluição residual. A soma 1+2 representa a internalização total da externalidade. CEm a b A soma 2+3 representa o imposto pago. c 3 t* 1 2 0 Q* Qπ Q Mais implicações Imaginemos agora que introduzimos uma capacidade de assimilação do meio ambiente (como anteriormente referimos) 0e – quer dizer, os prejuízos só sobrevêm a partir de um certo nível de actividade económica 0A. € Πm E introduzimos também um imposto Pigouviano uniforme t* conforme o modelo anterior. CEm a e Emissões O contaminador continua a pagar 0abQ* como antes. 1 2 0 c 3 4 t* b B A Q* Qπ Q O imposto continua a ultrapassar a externalidade e inclui agora a parcela 0aBA (zona 4) que corresponde a uma renda paga pelo uso da função de assimilação do meio ambiente. Mais implicações O que acabámos de ver parece reforçar a injustiça de um imposto geral sobre todo o tipo de emissões: as que não produzem qualquer prejuízo (associado com 0A); as que apenas produzem o prejuízo óptimo (associado com AQ*); ou as que produzem um prejuízo não óptimo (associado com Q*Qπ). Tudo isto depende do que consideremos que o contaminador deve pagar: se deve pagar por todo o prejuízo causado, se deve pagar só pelo prejuízo não óptimo, ou se deve também pagar pelo uso do meio ambiente. No último caso o contaminador está a pagar pelas funções de assimilação do meio ambiente. Mas o imposto que paga e que temos vindo a analisar está baseado no prejuízo ou dano, pelo que parece pouco lógico utilizar um imposto baseado num critério – o dano causado – para reflectir outro critério, que é o do uso de um recurso escasso. Outras Críticas aos Impostos Comecemos por ver algumas das virtudes dos impostos Pigouvianos: 1. Usam os mecanismos de mercado para colocar um preço sobre serviços muito valiosos até então não taxados – os proporcionados pelo meio ambiente. 2. De certo modo imitam o mercado, já que o imposto pode ser alterado por forma a reflectir a escassez do serviço. 3. Têm propriedades de optimização se se conhecerem tanto os custos do prejuízo como os de limitação da contaminação. 4. São normalmente uma solução com custos inferiores a outros tipos de regulamentação (como adiante veremos). No entanto, no mundo real os impostos sobre a contaminação são a excepção e não a regra. Os impostos de tipo Pigouviano não só estão limitados na sua extensão, como também muito raramente são determinados de acordo com a teoria anteriormente exposta. Vejamos de seguida porquê. Outras Críticas aos Impostos 1. Incerteza sobre a justiça do imposto Pigouviano De um modo geral, a sociedade é sempre contra a introdução de novos impostos. Mas aqui, a alternativa é sempre a introdução de algum tipo de regulação. Por isso, o problema é o que já foi abordado, ou seja, o receio de que o imposto vá mais além do que taxar a contaminação relevante dum ponto de vista Paretiano (não óptima), chegando a taxar a contaminação óptima e mesmo a contaminação física num contexto em que os resíduos vertidos são inferiores à capacidade de assimilação do ambiente. Se a indústria está pronta a aceitar a primeira situação – o princípio do Poluidor Pagador – já não é bem assim no caso da última. 2. Falta de conhecimento sobre a função prejuízo Um imposto Pigouviano requer que se conheça, pelo menos em parte, a curva dos Custos Externos Marginais (CEm), que mais não é que a interpretação marginal da função geral do custo externo total, ou função de prejuízo. É opinião generalizada de economistas e de agentes de controlo da poluição, que as funções de prejuízo são muito difíceis de calcular na prática. Além disso, é sempre possível encontrar especialistas diferentes para chegarem a funções de prejuízo diferentes para as mesmas situações. Outras Críticas aos Impostos 3. Falta de conhecimento sobre a função benefício Para além do conhecimento da função de prejuízo, é também necessário conhecer a função de benefício ou de lucro privado. Ora no caso dos contaminadores serem empresas e do agente regulador ser um governo, o conhecimento da função benefício pode ser impossível, pelo facto de se tratar de informação que se reveste de confidencialidade comercial. Um governo, como autoridade impositiva que é, não se encontra numa boa posição para obter esta informação. As situações retratadas neste ponto e no ponto anterior são normalmente conhecidas como o problema da assimetria de informação entre contaminador e regulador. 4. O Status quo A regulação sobre a contaminação teve início no séc. XIX aquando da publicação das primeiras leis sobre saúde pública. Na altura todo o esquema se baseava no estabelecimento de normas, e apoiava-se nas inspecções e nas multas às transgressões. Os impostos surgem pois como um sistema novo de regulação… e a novidade nem sempre é bem vinda. Impostos versus Normas Falámos atrás que os impostos são normalmente uma solução de custo menor, quando comparados com outros métodos de regulação da contaminação. Ainda que não tenhamos estudado as Normas, vamos seguidamente ver como de facto, o estabelecimento de um imposto de tipo Pigouviano conduz a custos inferiores aos causados por uma Norma Ambiental – para o mesmo objectivo de redução da contaminação. O exemplo é um exemplo gráfico, que toma os custos de redução da contaminação de três empresas, com tecnologias distintas. Esses custos são comparados na situação em que a redução da contaminação é conseguida através da aplicação de um imposto, ou através da aplicação de uma norma ambiental. O exemplo deve-se aos economistas Baumol e Oates (1971). Impostos versus Normas Sejam CMR1, CMR2 e CMR3 os custos marginais de redução da contaminação, de três empresas distintas que produzem o mesmo tipo de produto. Note-se que as curvas são distintas de empresa para empresa, porque as suas tecnologias também o serão. Podemos ver que, para qualquer nível de limitação das emissões de poluentes, a empresa 1 tem os maiores custos de limitação, a empresa 2 os seguintes, e a empresa 3 os mais baixos. Custos Impostos CMR1 CMR2 CMR3 0 S2 Redução da Contaminação Suponhamos agora que se estabelece uma regulamentação que limita as emissões de poluentes por empresa ao montante S2. Impostos versus Normas Uma vez que foi dito a cada empresa para limitar a contaminação a uma quantidade 0S2, a empresa 1 irá ao ponto A, a empresa 2 irá ao ponto B, e a empresa 3 irá ao ponto C. Obtém-se uma contaminação global de 3S2. Uma alternativa é estabelecer um imposto Pigouviano t*. O imposto estabelece-se de tal forma que a empresa 1 vá ao ponto X, a empresa 2 ao ponto B, e a empresa 3 ao ponto Y. Observe-se que por facilidade de cálculos, considerámos neste exemplo que S2-S1 = S3-S2 e ainda que S1+S2+S3 = 3S2. Custos Impostos CMR1 CMR2 A CMR3 t* X B Y C 0 S1 S2 S3 Redução da Contaminação Veja-se por exemplo para a empresa 1 que, até S1 lhe sai mais barato limitar a contaminação que pagar o imposto. Mas sem dúvida que, para além de S1, lhe sai mais barato pagar que limitar. O mesmo raciocínio se pode seguir para as outras duas empresas. Impostos versus Normas Note-se que com o imposto se consegue o mesmo nível de contaminação global de 3S2, uma vez que considerámos S1+S2+S3 = 3S2. Mas a empresa 1, com custos mais altos de limitação, reduz a contaminação menos que S2, enquanto que a empresa 3, com custos menores, reduz mais que S2. Parece portanto não haver diferença significativa entre a Norma e o Imposto, no que diz respeito ao nível de contaminação atingido. Mas há uma diferença de custos. Para vermos isso temos de somar as áreas debaixo das curvas CMR. Vejamos: Situação com Normas: CTRN = 0AS2 + 0BS2 + 0CS2 Custos Impostos CMR1 CMR2 A CMR3 t* X B Y C 0 S1 S2 S3 Redução da Contaminação Impostos versus Normas Note-se que com o imposto se consegue o mesmo nível de contaminação global de 3S2, uma vez que considerámos S1+S2+S3 = 3S2. Mas a empresa 1, com custos mais altos de limitação, reduz a contaminação menos que S2, enquanto que a empresa 3, com custos menores, reduz mais que S2. Parece portanto não haver diferença significativa entre a Norma e o Imposto, no que diz respeito ao nível de contaminação atingido. Mas há uma diferença de custos. Para vermos isso temos de somar as áreas debaixo das curvas CMR. Vejamos: Situação com Normas: CTRN = 0AS2 + 0BS2 + 0CS2 Custos Impostos Situação com Imposto: CMR1 CTRI = 0XS1 + 0BS2 + 0YS3 CMR2 A CMR3 t* X B Y C 0 S1 S2 S3 Redução da Contaminação Impostos versus Normas Note-se que com o imposto se consegue o mesmo nível de contaminação global de 3S2, uma vez que considerámos S1+S2+S3 = 3S2. Mas a empresa 1, com custos mais altos de limitação, reduz a contaminação menos que S2, enquanto que a empresa 3, com custos menores, reduz mais que S2. Parece portanto não haver diferença significativa entre a Norma e o Imposto, no que diz respeito ao nível de contaminação atingido. Mas há uma diferença de custos. Para vermos isso temos de somar as áreas debaixo das curvas CMR. Vejamos: Situação com Normas: CTRN = 0AS2 + 0BS2 + 0CS2 Custos Impostos Situação com Imposto: CMR1 CTRI = 0XS1 + 0BS2 + 0YS3 CMR2 A CMR3 t* X B CTRN - CTRI = S1XAS2 - S2CYS3 Y C 0 S1 S2 S3 Claramente os Custos não são iguais. Deduzamos o valor de CTRI do valor de CTRN : Redução da Contaminação Impostos versus Normas Nitidamente S1XAS2 é maior que S2CYS3 de tal forma que: CTRN > CTRI Demonstra-se assim que para chegar ao mesmo nível de contaminação, o estabelecimento de normas provoca custos totais de limitação maiores que o estabelecimento de um imposto. Situação com Normas: CTRN = 0AS2 + 0BS2 + 0CS2 Custos Impostos Situação com Imposto: CMR1 CTRI = 0XS1 + 0BS2 + 0YS3 CMR2 A CMR3 t* X B CTRN - CTRI = S1XAS2 - S2CYS3 Y C 0 S1 S2 S3 Claramente os Custos não são iguais. Deduzamos o valor de CTRI do valor de CTRN : Redução da Contaminação Umas Palavras Finais Apesar de todas as dificuldades apontadas aos Impostos Pigouvianos, não quer dizer que eles não tenham utilidade. Repare-se que podemos estar mais interessados em conhecer a direcção adequada da variação dos níveis de contaminação do que propriamente em atingir um nível óptimo teórico. Se for assim, os Impostos sobre a contaminação podem ser um instrumento adequado de acção reguladora, já que a sua utilização pode, de forma paulatina, contribuir para que a sociedade se vá aproximando daquilo que ela considere como o nível adequado, ou aceitável, de contaminação. Exemplos como os impostos sobre o tabaco ou sobre o álcool, são bons exemplos de impostos que de alguma forma têm efeitos semelhantes aos acabados de citar.