Patrimônio Cultural: Memória, História e Identidade. Prof. Tiago da Silva Coelho “Dizemos: afinal, somos aquilo que pensamos, amamos, realizamos. E eu acrescentaria: somos aquilo que lembramos.” (BOBBIO, 1996) Gosto de ti Porque conservas nas pedras O roçar do tempo e da memória Porque és História E nas fachadas a lembrança De que és Arte (Maria José Balancho, Lisboa, 1993) O que é Patrimônio Cultural de uma cidade, estado ou país? São bens móveis, imóveis, saberes, fazeres, celebrações, expressões. Possuem valor simbólico, histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e afetivo para uma coletividade. Integram a memória e a identidade desta coletividade. Patrimônio Patrimônio (do latim patrimoniu) significa: herança paterna, bens de família, bens necessários para ordenar um eclesiástico, dote dos ordinandos, propriedade. Um indivíduo ao longo de sua vida acumula bens que, no futuro, vai legar à família. Ampliando o conceito, entende-se atualmente que são patrimônios: a vida, o corpo, a linguagem, as coisas (artes, arquitetura, artesanato, música, literatura...), os sonhos, as histórias... A Constituição de 1988 prevê: Art. 216 – Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artísticoculturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. O Patrimônio Cultural se relaciona com três conceitos fundamentais: Memória, História e Identidade; Memória Conhecimento ou consciência sobre situações, eventos, ações, sensações passadas. Lembranças, reminiscências, vestígios. Aquilo que serve de lembrança. A memória permite a construção da identidade individual e coletiva. Estabelece a relação entre o passado e o presente e permite vislumbrar o futuro. Por ser um elemento vivo, a memória está sujeita a modificações e alterações.Toda memória coletiva e individual se desenvolve em um espaço, em um lugar.Contempla esquecimentos, deformações, seleções, ressentimentos, supervalorizações. A memória se alimenta de lembranças vagas... “Possibilidade de reconstrução da atmosfera de um outro tempo.” Lucília de Almeida Neves Delgado “Guardar, reter, para em seguida mobilizar e devolver. A memória é seletiva, pois guardamos o que nos interessa – aquilo que aparentemente nos é necessário –, assim como tentamos descartar o que supomos não precisarmos.” Aloísio Magalhães “O esquecimento ainda é memória.” Carlos Drummond de Andrade “Cada pessoa é responsável pelo que aviva sua própria memória.Todos são responsáveis pelo que aviva a memória da comunidade.” CARTILHA DO PATRIMÔNIO - IEPHA/MG (1989). A memória é sempre presente e seus significados não estão prontos à espera de alguém que os resgate; A memória não contém uma verdade sobre o passado e sim se presta a construir uma de suas possibilidades de interpretação, que é matéria prima da História; História “A necessidade de mudança presente principalmente a partir dos tempos modernos distancia as noções de memória e história. Nesse sentido, a memória é carregada por grupos vivos, está sempre em processo de evolução aberta a dialética da lembrança e do esquecimento; já a história é a reconstrução incompleta daquilo que não existe mais. A história pertence a todos e a ninguém, o que lhe dá uma vocação para o universal.” Pierre Nora Identidade é mais um processo que uma definição; “A identidade vai sendo construída em sua própria temporalidade pelo entendimento também daquilo que foi transformado e que, de alguma forma, pode ser narrado.” (RICOEUR, Paul.1997) Baseando-se numa lenda clássica que falava sobre os “palácios da memória”, Santo Agostinho relaciona memória e Identidade – “é lá que me encontro a mim mesmo” – e mostra que a identidade é construída a partir da percepção das mudanças e continuidades temporais. (SANTO AGOSTINHO, 1999, p. 266-168) O patrimônio histórico-cultural, tomado como um dos suportes da memória coletiva, produz identidades sociais que são determinantes nos modos como os homens se apropriam da realidade que os cerca, apresentam e lutam por suas ideias. Preservar bens histórico-culturais é garantir a todos o direito de se apropriar dos significados a eles atribuídos, bem como a condição de uma leitura mais crítica, própria e autônoma. Patrimônio Cultural Bens Móveis ou Tangíveis: Objetos que podem mover-se, como por exemplo, a medalha de um ex-combatente de guerra ou o sino de uma igreja. Patrimônio Cultural Bens Imóveis ou Tangíveis: Conjunto de bens construídos ou não pelos humanos, como um edifício, um monumento ou um recurso natural (rios, montanhas, florestas, vales) Patrimônio Cultural Bens Intangíveis: Conjunto de elaborações técnicas, artísticas ou linguagens construídas ao longo do tempo como: expressões populares (carnaval), expressões musicais (bandas de música), grupos de teatros, fazeres, culinária, etc... Sobre o patrimônio imaterial A Unesco define como Patrimônio Cultural Imaterial “as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural.” Para não esquecer O Patrimônio Imaterial é transmitido de geração em geração e constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana. Constitui em Patrimônio Cultural um conjunto de bens que, de alguma forma, permitem o reconhecimento do passado coletivo de uma sociedade, de uma cultura e dos elos que nos ligam a ela. “dos mecanismos que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas”, do “passado público” . (Eric Hobsbawm. 1955, p. 13.) Três questões fundamentais: - O que preservar? - Por que preservar? - Como preservar? Sempre que se pensa no que é preservado é preciso pensar também sobre o que é destruído, esquecido ou silenciado. Quem define o que é historicamente significativo? Para quem? Em que momento do presente – e por quais razões – determinados bens são avaliados como sendo historicamente relevantes? Que circunstâncias promovem o esquecimento? A ideia de que algo do passado deve ser preservado apenas porque continua existindo é, no mínimo, ingênua. Quando se luta pela permanência de um bem são as relações humanas que lá se estabelecem que devem vir à tona e a nossa compreensão sobre essas coisas. O patrimônio não é apenas o objeto – material ou imaterial – preservado, mas as práticas, atitudes significados e valores dos quais o objeto é suporte de informação. A análise das práticas de preservação do patrimônio históricocultural, não pode prescindir do estudo da ‘memória’ que ela busca registrar. Para além dos seus componentes mais objetivos, existem também na memória elementos de subjetividade que só podem ser compreendidos em um outro campo, aquele que mescla o individual e o social. O que é necessário saber sobre Tombamento? Palavra antiga que se referia ao ato de guarda e consevação de documentos importantes nos arquivos da Torre do Tombo, em Portugal. Atualmente significa um ato administrativo realizado pelo Poder Público com o objetivo de preservar, por intermédio da aplicação legislativa específica, bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e afetivo para uma população. Modos de preservação de um Patrimônio Histórico Cultural Um bem pode ser preservado por meio do tombamento, de inventários, dos planos diretores, do registro e de leis. Podemos, assim, pensar em quatro escalas, quatro níveis de preservação: • Patrimônio municipal (muitas vezes chamado de “interesse local”); • Patrimônio estadual; • Patrimônio nacional; • Patrimônio da humanidade (que não tomba, apenas indica). Inventário: É a primeira forma para o reconhecimento da importância dos bens culturais e ambientais, por meio do registro de suas características principais. Planos diretores: Estabelecem formas de preservação do patrimônio, em nível municipal, por intermédio do planejamento urbano. Leis: Os municípios podem criar leis específicas que estabeleçam incentivos à preservação. Tombamento: Lei que garante a preservação de bens que interessam à memória coletiva. Registro: A salvaguarda do patrimônio imaterial se faz através do registro e da organização de um dossiê com as informações necessárias. Livro dos Saberes; Livro das Celebrações; Livro das Formas de Expressão; Livro dos Lugares. O Tombamento como qualquer Lei federal, estadual ou municipal estabelece limites aos direitos individuais com o objetivo de resguardar e garantir direitos e interesses de conjuntos da sociedade. Não é autoritário porque sua aplicação é executada por representantes da sociedade civil e de órgãos públicos, com poderes estabelecidos pela legislação. Propriedade e Tombamento Após o Tombamento o Bem imóvel não troca de propriedade. Os proprietários podem, inclusive, vendê-lo ou trocar seu uso; por exemplo, uma casa de moradia pode transformar-se em um estabelecimento comercial. O que muda? Um bem tombado não pode sofrer mudanças que danifiquem ou destruam suas características; atualmente qualquer cidadão pode impedir a destruição de bens tombados ou considerados de valor histórico cultural acionando a Promotoria pública local. (Exemplo, Casa do Agente Ferroviário). Patrimônio Cultural: Memória, História e Identidade. Prof. Tiago da Silva Coelho [email protected]