Apatia corporativa
Fabíola Lago
O que é preciso para combater a frustração na área de vendas e manter a equipe sempre
motivada
A área comercial é o coração de muitas empresas. Ela funciona como um termômetro do
sucesso (ou não) de produtos e serviços oferecidos e, sobretudo, das estratégias criadas pela
organização. Para isso, exige-se uma equipe sempre motivada e treinada. No entanto, nem
sempre negócios são fechados, ouvem-se muitos "nãos" no mercado e, em algumas vezes, as
metas estipuladas apresentam-se como inacessíveis a qualquer mortal. Nesse cenário, o
resultado, além da baixa performance financeira, pode ser traduzido e estampado no rosto de
cada um dos profissionais da equipe: frustração, sentimento daninho para quem quer se manter
num mercado cada vez mais competitivo.
Para o psiquiatra Leonard Verea, do Instituto Verea, muitas vezes o problema não está no
desempenho dos vendedores, mas na própria gerência ou na estratégia traçada pela empresa.
"Muitos gestores causam estresse, desgaste, frustração e baixa auto-estima ao colocar metas
inalcançáveis", diz. Perda de sensibilidade, de boa argumentação e criatividade pode ser alguns
dos problemas causados por essa postura, uma vez que tira o foco do profissional da venda para
a corrida para alcançar determinados valores.
"O que mais importa, hoje, numa venda é o desejo do comprador. As pessoas compram por
prazer e o vendedor é o veículo desse processo. Por isso, ele também tem de vender com
prazer", enfatiza Verea. "As empresas sabem exatamente quais são suas possibilidade
comerciais, mas traçam objetivos inalcançáveis, acreditando que haverá maior esforço por parte
dos vendedores, o que é um equívoco", analisa. Em sua opinião, as organizações deveriam se
concentrar mais no processo de pós-venda, na fidelização do cliente.
Para Carlos Hilsdorf, pós-graduado em marketing pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e
consultor conhecido por performances em convenções que conjugam mágica e palestras
temáticas, as metas devem ser um processo progressivo e acumulativo. "Esse é um caminho
vitorioso porque, por meio da auto-superação, o profissional de vendas prova a ele mesmo que é
um campeão. Ele sabe como está o mercado e, quando são colocadas metas impossíveis, ele se
sente agredido como profissional; percebe que a empresa não é transparente com seus
objetivos", complementa.
O resultado, segundo o consultor, é que com o passar dos anos o discurso da direção da
organização perde credibilidade junto à área. "E o que é pior: quando há uma estratégia
desenvolvida em bases reais, ninguém vai acreditar", avalia Hilsdorf.
Comunicação Ele também afirma que outro erro freqüente das empresas é a organização de
convenções de vendas. "É importante ter um profissional de comunicação nesse momento. Na
hora certa, o criador, o executivo responsável, aparece para ser reconhecido pelo trabalho
desenvolvido. Muitas vezes, a estratégia é boa, mas mal apresentada e não empolga a equipe",
comenta Hilsdorf. No entanto, ele alerta para a diferenciação de eventos de puro
entretenimento, palestras que são injeção de ânimo apenas por algumas horas e o trabalho de
profissionais que realmente motivam as pessoas para o dia-a-dia. "Isso é fundamental nos
encontros de equipes de vendas", diz.
Na Atento Brasil, empresa da área de contact center, a seleção de profissionais para o setor de
vendas obedece a critérios exigentes. Todos possuem nível superior, falam mais de uma língua e
70% do seu tempo é dedicado ao planejamento da negociação antes de chegar ao cliente a
maioria diretores. "Aquela imagem do vendedor como uma pessoa carismática, em que apenas a
boa lábia bastava, acabou. Precisamos de pessoas que reúnam as duas características: que
tenha bom relacionamento pessoal, que seja agradável, mas que possua também conhecimento
técnico, domine a microinformática, seja capaz de planejar, propor, negociar, realinhar sua
estratégia de acordo com as demandas do cliente", conta Nelson Armbrust, vice-presidente
comercial e de marketing da Atento.
Em relação às metas, Armbrust afirma que, atualmente, o importante é a qualidade e não a
quantidade. "É ter foco no negócio", acrescenta. Assim, na empresa, o profissional não é mais
avaliado tão somente pelo faturamento, mas também pela rentabilidade, pela qualidade do serviço prestado, além da própria
avaliação do cliente, revelada por meio de pesquisas de satisfação. "Em nosso segmento, muitas
empresas começaram com contratos pequenos e hoje consomem muito mais nossos produtos",
exemplifica o vice-presidente. Quando a performance não é a esperada, a política da Atento é
dar total apoio
ao vendedor, acompanhar de perto os problemas que está enfrentando e até agendar visitas de
prospecção nas quais o diretor comercial o acompanha. "É importante que a área comercial sinta
que a empresa está ao lado dela. Alguns profissionais conseguem pedir ajuda, outros não, por
considerarem um sinal de fraqueza. É preciso ajudar a todos no momento certo", diz Armbrust.
Trimestralmente, são realizadas reuniões com alguma área da Atento que tenha alguma
novidade relacionada a área comercial. Pode ser de TI ou algum produto novo, tudo para manter
a equipe bem atualizada sobre o que acontece na organização.
"Cada vez mais as empresas estão se preocupando com o desenvolvimento e entrosamento de
seus profissionais, seja por meio de treinamentos, reuniões e workshops", avalia Marinho de
Jesus, gerente de Treinamento da Fundação Brasileira de Marketing (FBM), entidade que produz
conteúdo e informações para a capacitação profissional na área de marketing e de outras de
gestão empresarial ligadas à Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB).
Marinho também acredita que há empresas onde o baixo rendimento dos vendedores está
relacionado à falta de harmonia com outras áreas da companhia, pouco monitoramento e
políticas incoerentes ou até mesmo a ausência delas. "Visão exclusiva de curto prazo, cobrança
de resultados sem fornecer recursos, não acreditar e não praticar os pontos fortes dos
colaboradores também são outros fatores detectados por nós como origem dessa baixa
produtividade", explica. No entanto, ele destaca que há um consistente movimento de empresas
dos mais variados portes e segmentos para corrigir esses problemas e praticar um modelo de
gestão mais moderno e eficaz para produção de resultados econômicos, sociais e de perenização
da gestão.
Para Marinho, os procedimentos mais inteligentes, atualmente, para obter bons resultados dos
vendedores são a supervisão direta e o apoio para os menos experientes, empowerment e
liberdade de ação para os mais experientes, além de práticas criativas de envolvimento,
comprometimento e visão compartilhada para todos. "Disponibilizar ferramentas adequadas,
como mapeamento do mercado, histórico de cada cliente, informações sobre os concorrentes e
sobre o próprio público-alvo e potencial de crescimento, por exemplo."
Orientação Diante do "não" freqüente nas atividades de vendas, Marinho diz que o
importante é entender a negativa. "Vendedores convivem permanentemente com situações
geradoras de frustrações. Além de automotivação, uma orientação clara para o cliente e suas
necessidades e a postura de aprender com os erros são práticas que ajudam a conviver e
superar essa dificuldade natural", conclui.
Pelo caráter do seu produto, a indústria farmacêutica Merck Sharp & Dohme também necessita
de profissionais de vendas com alto nível de conhecimento. Por lidar diariamente com médicos,
diretores de hospitais e farmacêuticos, a equipe, composta por 80% de propagandistas e 20%
de propagandistas-vendedores, passa por treinamentos intensos antes de ir a campo. "É um
grande desafio, porque esse pessoal passa todo o seu tempo visitando médicos, numa média de
220 por mês", destaca José Paulo Alves, gerente nacional de vendas.
A competitividade entre os medicamentos exige que o vendedor tenha qualificação para
responder a todos os questionamentos possíveis e uma resposta insegura pode fazer com que
o médico dê preferência ao concorrente. Por isso mesmo, a maioria dos vendedores é composta
por dentistas, veterinários, engenheiros com idade entre 25 e 35 anos, muitos dos quais já
foram estagiários da Merck. Todos trabalham com palm top e enviam relatórios on-line
diariamente. Segundo Alves, boa verbalização, capacidade de discutir anatomia, fisiologia, além
de confiabilidade, são alguns dos requisitos importantes para a atividade. Para manter a equipe
com bom desempenho, a política é de muitas premiações. "Ninguém fica três meses sem ser
bonificado de alguma forma", explica o executivo. O acompanhamento de perto pelos gerentes
distritais é outra prática para manter a boa produtividade.
Biotecnologia A Syngenta, empresa voltada para proteção de cultivos e sementes, com cerca
de 19 mil funcionários em mais de 90 países, também tem um corpo de vendas bastante
especializado, os chamados RTVs (representante técnico de vendas), que atuam em todo o
território nacional. Por trabalharem com vendas indiretas, eles são treinados para capacitar
balconistas de cooperativas agrícolas e pontos-de-venda em geral sobre seus produtos.
Segundo o diretor de RH da companhia, Guilherme Rhinow, são "verdadeiros homens de
negócios". "Eles devem conhecer informática, ser bem informados sobre seus clientes e finanças
para negociar prazos e preços", conta. Como o mercado de biotecnologia é bastante
competitivo, em que inovações na área de pesquisa significam muitas vantagens na hora da
venda, estar atualizado sobre a concorrência é primordial. Segundo o diretor, o pós-venda
também é muito importante, uma vez que o RTV acompanha todo o desenvolvimento da
plantação até o final da safra.
Para manter a motivação da equipe, a Syngenta tem um plano sucessório para capacitar futuros
gerentes e gestores. Anualmente, é realizada uma convenção e as metas estão vinculadas a
programas de incentivos e remuneração variável. "Nossos indicadores são arrojados, porém
consistentes", comenta Rhinow sobre o cálculo das metas na empresa.
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