METODOLOGIA DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO: ASPECTOS TEÓRICOS E EMPÍRICOS E UMA POSSÍVEL APROXIMAÇÃO ÀS FONTES Ana Palmira B. Casimiro (UESB)* Lívia Diana Rocha Magalhães (UESB)** Aspectos teóricos A despeito do avanço do conhecimento científico e da crescente convergência de métodos usados nas ciências exatas para se explicar fenômenos acontecidos nas ciências sociais1, observamos que o materialismo histórico e dialético continua sendo um método importante para se explicar os fenômenos sociais, mesmo quando, às vezes, ele aparece de maneira indireta. Quem bem o diz é Boaventura de Sousa Santos no texto Tudo que é Sólido Desmancha no Ar: O Marxismo Também? (p. 23-49), da coletânea de textos do autor, publicada sob o título: Pela Mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. Nas palavras do autor (SANTOS, 1999, p. 28), [...] Se para alguns autores, a obra de Marx, sujeita muitas vezes a exercícios de exegese escolástica, era o ponto de partida e o ponto de chegada da análise (Poulantzas e Wright, por exemplo), para outros, era apenas o ponto de partida (Bourdieu, Habermas, Gouldner, Giddens) e para outros ainda não era sequer o ponto de partida, embora a sua investigação só fosse inteligível contra um pano de fundo em que abundava o marxismo, como é o caso mais notável, de Foucault. * Professora do Programa de Mestrado e Doutorado Memória, Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB; Doutorado em Educação pela UFBA; Pós-doutorado em Educação pela UNICAMP; Coordenadora do Grupo de Pesquisa Fundamentos da Educação do Museu Pedagógico da UESB. E-mail: [email protected] ** Professora e vice-coordenadora do Programa Mestrado e Doutorado em Memória, Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB; Doutorado em Educação pela UNICAMP; Pós-doutorado em Educação pela UERJ; Coordenadora Geral do Museu Pedagógico da UESB. E-mail: lrmagalhã[email protected] 1 Como evidenciam Alan Sokal e Jean Bricmont (1997), cf. Referências. 1 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs O que há de mais peculiar no materialismo histórico e dialético é que tal método parte da ideia de seres humanos que vivem em sociedade e não separa a sociedade da natureza. Pelo contrário, os seres humanos são como parte do mundo natural, que é a base real de todas as suas atividades. “A produção e a reprodução da vida material, pelo trabalho e pela procriação, são, assim, uma relação ao mesmo tempo natural e social, diz-nos Marx nos Manuscritos econômicos e filosóficos de 1844” (BOTTOMORE, 1988, p. 342). São pressupostos da existência da sociedade, para Marx (1981): o homem (concreto); homens diante de um substrato (a natureza); homens em relação com a natureza; homens em relação com outros homens (produção social); e homens produzindo (consciência, representações, mentalidade, arte, religião). Para Marx (1981), são componentes essenciais da sociedade: Uma economia (produção/circulação/consumo); uma cultura (modo de vida, objetos culturais); e uma organização (família, tribo, horda, Estado). Com isso, ele sugere encontrar características comuns a todas as sociedades numa perspectiva antropológica. Além disso, para Marx, a sociedade historicamente existente situada e localizada, caracterizase por possuir um modo de produção/reprodução da existência e uma formação social específica. Em síntese: a) a ênfase na significação da natureza para o homem; b) a negação da autonomia das ideias na vida social; c) a concepção da centralidade da práxis humana na produção e a reprodução da vida social e, em consequência disso, d) a ênfase na significação do trabalho enquanto transformação da natureza e mediação das relações sociais, na história humana (BOTTOMORE, 1988, p. 255). Cabe lembrar que Marx (1981) usou a palavra sociedade, em três sentidos: Primeiramente, no sentido de sociedade humana, ou ‘humanidade socializada’ enquanto tal. Em segundo lugar, se referindo a tipos historicamente existentes de sociedade (por exemplo, a sociedade feudal ou a sociedade capitalista); E, finalmente, no sentido de qualquer sociedade particular (por exemplo, a Roma antiga ou a França moderna). Entretanto, é preciso ressaltar que a compreensão da realidade, a partir da concepção materialista, histórica e dialética não impede que vejamos os fatores superestruturais. Luckács (1979) observou a colocação de um problema, paradoxal e de grande importância, na compreensão da obra marxiana que se divide em: a) enunciados 2 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs diretos sobre certo tipo de ser, ou seja, afirmações ontológicas e, b) nenhum tratamento autônomo de problemas antológicos. Essas tendências encontram sua primeira expressão adequada nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, cuja originalidade inovadora reside, não em último lugar, no fato de que, pela primeira vez na história da filosofia, as categorias econômicas aparecem como categorias da produção e reprodução da vida humana tornando, assim, possível uma descrição ontológica do ser social sobre bases materialistas (LUCKÁCS, 1979, p. 15). Tudo isso ajuda a compreender as expressões: ‘condições de existência’ e ‘produção de consciência’, mormente a educação, no sentido dado por Marx. Por outro lado, a maneira como ele analisou o ‘trabalho’, abre múltiplas possibilidades para o entendimento de seu método, pois, aquele não exclui um fator teleológico o homem que projeta antes de fazer. É novamente Luckács quem evidencia o valor da categoria trabalho, tal como aparece na obra madura de Marx, contendo, porém, o cerne das suas ideias originais, ou seja, trabalho humano mediando natureza e sociedade. Conforme Luckács, através do trabalho, tem lugar uma dupla transformação. Por um lado, o próprio homem que trabalha é transformado pelo seu trabalho; ele atua sobre a natureza exterior e modifica, ao mesmo tempo, a sua própria natureza. Para este autor, o homem que trabalha utiliza as propriedades mecânicas, físicas e químicas das coisas, a fim de fazê-las atuar como meios para poder exercer seu poder sobre as coisas, “[...] de acordo com a sua finalidade [...] e tão-somente através de um conhecimento correto, através do trabalho, é que podem ser postos em movimento, podem ser convertidos em coisas úteis” (LUCKÁCS, 1979, p. 15). Essa conversão em coisas úteis, porém, é um processo teleológico: “[...] no fim do processo de trabalho, emerge um resultado que já estava presente desde o início da ideia” (LUCKÁCS, 1979, p. 16). Por outro lado, a educação prepara o homem para a vida, para o trabalho e o ser humano se educa e se humaniza pelo trabalho. Antes disso, Engels (MARX e ENGELS, In: Obras Escolhidas, s/d, p. 284), em carta a Bloch, explicou a tese marxista destacando o papel da superestrutura na concepção materialista da história: A situação econômica é a base, mas os diferentes fatores da superestrutura que se levanta sobre ela as formas políticas da luta de classes e seus resultados, as constituições que, uma vez vencida 3 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs uma batalha, a classe triunfante redige etc., as formas jurídicas, filosóficas, as ideias religiosas e o desenvolvimento ulterior que as leva a converter-se num sistema de dogmas também exercem sua influência sobre o curso das lutas históricas e, em muitos casos determinam sua forma, como fator predominante (MARX e ENGELS, In: Obras Escolhidas, s/d, p. 284). Para Engels, trata-se de um jogo de ações e reações entre todos os fatores infra e superestruturais, mas, acaba sempre por impor-se, como fator de maior importância, o movimento econômico. Isto quer dizer que as premissas e as condições econômicas são as que decidem, em última instância. No entanto, as condições políticas, ideológicas, mormente a educação, também desempenham seu papel, embora não decisivo (MARX e ENGELS, In: Obras Escolhidas, s/d, p. 285). Sem dúvida, nas sociedades atuais, principalmente a partir do aceleramento das relações capitalistas, é necessária uma atenção redobrada para se compreender como se movimentam as relações sociais, dados os inúmeros fatores que complicam tais relações, camuflando a realidade concreta. Aspectos empíricos: aproximação às fontes Estudar o fenômeno educativo numa perspectiva histórico-dialética nos parece cada vez mais eminente, se considerarmos que a nossa sociedade tem alcançado os mais altos níveis de contradições e acirramentos sociais e, ao mesmo tempo, a mais alta expressividade da atividade humana (práxis), que objetiva o sujeito e subjetiva o objeto, dentro de uma realidade concreta de objetivação da vida material e social. Hoje, particularmente, pensar a sociedade do ponto de vista da produção material é falar da alta capacidade de atuação humana sobre a natureza e sobre o outro, expressa nas altas conexões e diálogos entre distâncias. Mas, também, é falar de uma sociedade em um processo contínuo de degradação, na qual há a emergência de relações e práticas sociais construídas, que continuam atuando negativamente sobre grupos, coletividades e sobre as instituições (preconceitos de sexo, idade, gênero, etnia, classe etc.), apesar das exigências e reações do presente histórico. E, ao mesmo tempo, naturalizando o inaceitável, a miséria, a trapaça, a violência, o uso e o abuso do poder, os individualismos e a fusão de mecanismos educacionais que oferecem a escolarização 4 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs sem a formação básica, científica, que deveria tomar como base a correlação entre saberes, conhecimento etc. Portanto, é impossível pensar a educação fora da relação dialética parte, todo, e das relações concretas e contradições, dentro do estágio alcançado por essa sociedade. A educação deve ser pensada, sob a ótica da divisão social do trabalho, em permanente transformação, e de relações cada vez mais sutis de exploração da força do trabalho, da extração da mais-valia e dos reflexos negativos que operam sobre essa realidade. Destarte, devemos considerar o método histórico e dialético como o mais adequado para dar conta e explicar a multiplicidade dos fenômenos da educação. Na elaboração do trabalho científico, nos parece que é imprescindível a visão dialética da realidade, como capaz de abranger e incorporar as várias instâncias da realidade. Nesta visão, acreditamos ser possível empreender uma escolha teórica a partir de uma base metodológica dialética, compreendida em toda a sua abrangência. Devemos perceber, ademais, a importância da relação parte e todo que permeia o saber científico, o que permite uma leitura plural dos significados e das correlações entre as várias instâncias do conhecimento que formam as ciências humanas e sociais em sua vasta abrangência. Além de se deter nos aspectos materiais, sociais e ideológicos que cercam os fenômenos da educação, o método dialético pressupõe uma contínua circulação do teórico para o empírico e vice-versa. O objeto deve ser compreendido e esclarecido em sua estrutura significativa imanente, e explicado, a partir da inserção de sua estrutura em outra, imediatamente englobante (GOLDMANN, 1974, p. 107). Das Fontes: uma abordagem inicial Agora já podemos ressaltar que pensar em fontes para a pesquisa científica, sem dúvida, nos obriga a pensar em método científico e em escolha de teorias que devemos adotar para a sua leitura ─ sobre a noção de passado, de presente e de sociedade que adotaremos. Mas, antes de prosseguir, cabe observarmos que as contribuições de outras correntes historiográficas, muitas vezes sintetizadas em “nova história”, principalmente no que diz respeito às “fontes”, se tornam fundamentais para nós da educação, uma vez 5 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs que possibilitam o encontro de variadas fontes de informações, as quais revelam nosso objeto de estudo. De igual modo, as teorias da memória coletiva e social têm nos permitido ampliar e analisar como uma sociedade interpreta e se apropria da educação, da escola, em seu passado e no presente, dentro de realidades concretas e representacionais. No entanto, consideramos que ainda é a abordagem materialista, histórica e dialética aquela que nos oferece as condições para retrucar os pressupostos históricos positivistas de que existe uma razão universal, perdurável que leva a sociedade a se desenvolver e com a noção de que o passado de uma sociedade só pode ser lido por suas fontes oficiais. E perceber, também, que a parte social (em suas interações e ambiguidades), não é suficiente para explicar a realidade. Ou seja, que o mundo do pensamento pode produzir uma realidade aparente, à margem de suas contradições, camuflando os seus jogos de interesses econômicos e políticos, produzindo componentes cognitivos ideológicos, que tendem a oferecer-nos uma visão deformada da mesma (KOSIK, 1976). A fonte, como o próprio nome indica, é aquele lugar onde você deve beber água pura, de nascente. Na metáfora da pesquisa, é a mesma coisa: a fonte é onde você vai buscar a informação pura, no seu nascedouro. A aproximação correta às fontes primárias de informação é um dos indícios de que a pesquisa transita por um caminho seguro. As fontes secundárias são como afluentes, que também podem trazer informações fidedignas. Assim como a fonte (ou o rio) que são como acidentes geográficos e necessitam serem preservados, as fontes documentais também secam ou ficam poluídas (quando são contaminadas e ou destruídas). Portanto, devemos preservá-las. Segundo Richardson (1985, p. 207), “fonte primária é aquela que deve ter uma relação física direta com os fatos analisados, existindo um relato ou registro da experiência vivenciada”. Uma pessoa que observa um acontecimento é considerada uma fonte primária; uma fotografia ou gravação direta desse acontecimento também. Sem dúvida, o próprio documento, seja ele eivado de ideologia ou não, é uma fonte essencial. Os historiadores costumam classificar as fontes em primárias e secundárias e subclassificar as fontes primárias em manuscritas e impressas. Dentro desta classificação básica, podemos dividi-las, ainda, em fontes orais, fílmicas, plásticas e 6 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs imagéticas. Para as fontes orais, utilizamos, geralmente, os recursos da entrevista e do questionário, ou a gravação em algum sistema de áudio/visual (gravador, rádio, filme, etc.). Fontes plásticas são os próprios monumentos, ou objetos significativos (igreja, ferramenta, instrumento, escola, régua, palmatória, jardim, uniformes etc.) e fontes imagéticas são imagens por qualquer via de reprodução (retrato, pintura, desenho, escultura, gravura, mapa). A organização das fontes imagéticas para a pesquisa em educação: algumas indicações Na organização empírica do objeto, em primeiro lugar, devemos realizar a coleta das imagens, por exemplo, que digam respeito à Educação, à História da Educação (Geral e no Brasil), ou a outras áreas humanas, para complementarmos o texto escrito; Em segundo lugar, devemos confeccionar uma ficha técnica, informativa para cada imagem coletada e, finalmente, devemos agrupar/selecionar/colecionar as imagens obtidas – visando facilitar a utilização das mesmas (imagem). O que chamaríamos de imagens? Reproduções em fotografias digitais, digitalizadas e/ou escaneadas, para complementar (funcionando como documento ou fonte histórica) e suplementar (funcionando como exemplo visual) o texto escrito. No nosso entendimento, seriam imagens adequadas, na pesquisa histórica e educacional, por exemplo: documentos manuscritos, fotos, pinturas, desenhos, gravuras etc. E mais: esculturas, construções ou artefatos públicos pertinentes ao tema, como: prédios escolares, plantas, mapas, fachadas, mobiliários, uniformes escolares, comemorações e desfiles cívicos/religiosos, cenas de educação, fotos de personagens significativas da educação. E, ainda, fotos indicando contrastes de classe, como, por exemplo: escolas urbanas e escolas rurais, públicas ou privadas, prédios escolares da região sul do país versus escolas nordestinas, escola com maioria de crianças brancas, destaque e lugar especial para crianças brancas nos desfiles, lugar etc. No caso da análise de imagens fílmicas, deveríamos observar as mesmas categorias empíricas das imagens fixas. Por fim, como agrupar/selecionar/colecionar as imagens coletadas, visando facilitar a apreensão pela equipe técnica de pesquisa? Poderíamos organizar as fichas, arquivos ou bancos de dados, com as imagens agrupadas em ordem cronológica, 7 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs compatível com a ordem cronológica e espacial do texto escrito. Dentro de cada época e períodos, agruparíamos, ainda, por área temática ou categorias, tipo: educação religiosa e leiga; escola pública e privada; categoria infantil, jovem e adulto; escola normal, educação superior, ensino técnico-profissionalizante, norte-nordeste, sul-sudeste, Brasil ou exterior (somente como exemplos). Quando, como e porque pesquisar e buscar fontes documentais em arquivos Pesquisa e busca de fontes em arquivos devem ser feitas quando a pesquisa demandar este tipo de recurso. Se optarmos por fazer um estudo teórico sobre um determinado autor que vai subsidiar uma pesquisa anterior, talvez precisemos somente de fontes secundárias. Se você pretende fazer uma monografia sobre ‘o trabalho na Grécia Antiga’, com certeza, você vai utilizar somente textos clássicos, vai utilizar fontes secundárias (outros autores da época, ou posteriores), mas não vai ter condição, é claro, de fazer pesquisa arqueológica. Em alguns casos, a fonte é o próprio ícone analisado. Assim, um prédio escolar, uma igreja, uma creche, funcionam tanto como informação indicativa, como simbólica e ou icônica. Na maior parte das vezes, as fontes estão nos arquivos e bibliotecas onde podemos trabalhar com fontes primárias e secundárias, impressas e manuscritas (leitura paleográfica). Ou, ainda, estão nos museus sob a forma de fontes fílmicas, imagéticas, fotográficas, audiovisuais, etc. Definido um projeto, é necessário contextualizar um objeto. Daí surge a pergunta: quais devem ser as minhas fontes? Ou: como delimitar minhas fontes? Primeiro, devemos delimitar de acordo com o objeto (recorte) e, a depender do recorte, devemos contextualizá-lo em um determinado período histórico. Uma boa medida para localizar as fontes existentes sobre um determinado assunto é recorrer a livros que evidenciem a forma como se organiza a sociedade em estudo, por meio de livros de história econômica e administrativa.2 Estes livros vão orientar: 2 A exemplo dos livros de Vianna (1951), Lobo (1968) e Avellar (1970), dentre outros publicados mais recentemente. Cf. Referências. 8 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs quanto à organização econômica daquele contexto (impostos, salários, preços, relações de trabalho, heranças, partilhas de bens, escravos, documentos de terras etc.); quanto à organização social (classes, grupos sociais, associações de classe, modos de vida, etc.); quanto à produção de ideias (educação, meios de comunicação, formas de lazer, formas de cultura, produção intelectual, etc.); quanto à organização política (forma de governo, organização dos poderes políticos, do estado, leis, jurisprudência, representações políticas, cargos etc.); quanto à organização geográfica (divisão territorial e administrativa do território, estados, cidades, vilas, distritos, sistema viário, distribuição de terras etc.). Mas, seja qual for o tema, precisa-se de uma delimitação histórica e geográfica (que chamamos de marco). Isto porque: 1) qualquer fenômeno (problema) surge no tempo histórico e aparece como fenômeno, quando passa a ser problema coletivo e não o acontecimento isolado, referente a uma ou a poucas pessoas; 2) a partir do entendimento de que existe um problema social, começa uma demanda social pela sua resolução (movimentos sociais, reivindicações, lutas); 3) até que aconteçam conquistas sociais que levam este problema a ser considerado matéria de lei; 4) depois, acontecem novas lutas para que a lei seja cumprida; finalmente, o problema passa a ser a questão: de que forma a lei está sendo cumprida? Foi assim que aconteceu nos principais movimentos sociais como, a título de exemplo, na luta das mulheres, dos negros, dos portadores de necessidades especiais etc. Devemos lembrar que, em qualquer tipo de pesquisa, alguns aspectos precisam ser considerados, como primordiais: comprovação da veracidade (autenticidade) do documento; possibilidade de desaparecimento, ocultação e ou destruição do documento; acessibilidade ao local e ao documento; estado de conservação, possibilidade de leitura paleográfica etc. Onde pesquisar e buscar fontes documentais Afirmamos que a busca de informações para o estudo da Educação por meio das fontes escritas, orais e imagéticas é de fundamental importância, particularmente 9 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs para o entendimento de determinadas políticas, no presente. Fontes que, inclusive, podem estar guardadas, ocultadas ou proibidas, silenciando determinadas informações e dificultando a expressão de realidades vividas por alunos, professores, pais e demais profissionais da educação, como também de outras instâncias educativas, isto é, da educação em sua ampla abrangência objetual. Supomos que as fontes educacionais brasileiras estejam guardadas no Ministério da Educação, registradas nos dados do IBGE, empilhadas nas secretarias estaduais e municipais de educação. Entretanto, lembramos que podem estar, também, nas próprias escolas, nas fotos representativas de desfiles cívicos, de eventos festivos de cada escola e dos calendários litúrgicos, dentre outras possibilidades. Se não estiverem localizadas nestes lugares apropriados, surge a pergunta sobre onde poderão estar ou porque não foram guardadas. Além disso, também podem estar guardadas em outros tipos de arquivos, tais como: Públicos (federais, estaduais, municipais de empresas públicas, IBGE, IGHBs, IPHAN); Privados e Associativos (fundações, entidades filantrópicas, escolas particulares, museus, conservatórios, academias musicais e literárias, etc.); Religiosos (cúria metropolitana, arquidioceses, dioceses, bispados, paróquias, províncias, custódias, guardianatos, conventos, seminários, mosteiros, casas religiosas, colégios, irmandades, ordens terceiras e confrarias). Os arquivos se dividem, basicamente, em duas categorias: Correntes (em uso); Não correntes (arquivo morto). Não podemos deixar de referenciar a importância dos registros de memória, que podem se constituir como um importante acervo para abordar o tempo presente (ou mais recente). Mas, de igual modo, como todas as fontes, precisam passar pelo crivo teóricometodológico e serem cotejadas com outras fontes documentais. Enfim, a educação escolar e a não escolar, em suas especificidades e interconexões dialéticas, devem recorrer às mais diversas fontes de informação, visando superar as grandes lacunas sobre os seus muitos temas e problemas. Considerações finais Pesquisar a educação brasileira é enfrentar objetos cada vez mais controversos, que encarnam uma tensão continua entre aspectos proeminentes de um passado que se 10 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 3, número 9, março de 2013. www.faceq.edu.br/regs recusa em passar e de um presente que, muitas vezes, aparenta uma realidade transformada, em favor da nossa sociedade. Por exemplo, é o que acontece quando o Ministério da Educação e as políticas educacionais e sociais dos governos indicam experiências exitosas por meio de dados ou de situações que demonstram nosso alcance educacional e científico. Ou quando autoridades oficiais apresentam os desvios como problemas circunstanciais, que são transferidos para os sujeitos, para as instituições escolares, e para as estruturas educacionais de certas regiões e localidades do país. Nessa perspectiva, acreditamos ser fundamental reaver a história estrutural em sua abordagem materialista, histórica e dialética, utilizando todas as suas categorias teóricas (aparência-essência, parte-totalidade, passado-presente-futuro, singular- universal)3 e todos os seus recursos empíricos, como um método imprescindível que nos possibilitará decodificar o objeto, ampliar a escala de análise da realidade e expor os resultados à luz de teorias adjacentes. Referências bibliográficas MARX, Karl. E ENGELS, Friedrich. Obras Escolhidas. V.3. São Paulo: Alfa-Omega, LTDA. [s.d.]. AVELLAR, Hélio de Alcântara. História Administrativa e Econômica do Brasil. Rio de Janeiro: MEC/FENAME, 1970. BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. 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