ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO – AASP. DIREITO IMOBILIÁRIO. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. TEORIA E PRÁTICA. Flávio Tartuce Doutor em Direito Civil e Graduado pela Faculdade de Direito da USP. Especialista e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP. Coordenador dos cursos de Direito Civil, Direito Contratual e Direito de Família e das Sucessões da Escola Paulista de Direito. Professor dos cursos de mestrado e doutorado da FADISP-ALFA. Professor da Rede LFG. Professor da ESA/OAB/SP e em Escolas da Magistratura. Advogado, parecerista e árbitro. CONDOMÍNIO CONCEITO: Verifica-se condomínio quando mais de uma pessoa tem o exercício da propriedade sobre determinado bem. São vários os sujeitos ativos em relação ao direito de propriedade, que é único. A propriedade é total e única, o que justifica as denominações co-propriedade e compropriedade. CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ORIGEM: a) Condomínio voluntário ou convencional - se decorrer do acordo de vontade dos condôminos, ou seja, se nascer de um negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Ex. Três amigos que compram um terreno para investimentos em comum. No silêncio do instrumento de instituição (contrato), presume-se que a propriedade estará dividida em partes iguais. O CONDOMÍNIO EDILÍCIO TEM ESTUDO SEPARADO. b) Condomínio incidente ou eventual - quando surgir por motivos estranhos à vontade dos condôminos. Ex. Duas pessoas recebem determinado bem em razão de falecimento do proprietário. c) Condomínio necessário ou forçado - quando vier de determinação de lei, ou seja, quando for conseqüência inevitável do estado de indivisão da coisa. nasce dos direitos de vizinhança tal como na hipótese de paredes, muros, cercas e valas (art. 1.327 do CC). 2 CONDOMÍNIO EDILÍCIO PROPRIEDADE COMUM + PROPRIEDADE EXCLUSIVA. “Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos. § 1o As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio. (Redação dada pela Lei nº 12.607, de 2012) § 2o O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos”. NATUREZA JURÍDICA? PESSOA JURÍDICA? DOUTRINA CLÁSSICA X DOUTRINA CONTEMPORÂNEA. VER ENUNCIADO 90 CJF/STJ. ARGUMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS. 3 INSTITUIÇÃO E CONVENÇÃO. INSTITUIÇÃO. NASCIMENTO DO CONDOMÍNIO. “Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial: I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; III - o fim a que as unidades se destinam”. CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO. ESTATUTO GERAL. CONTRATO COLETIVO. “Art. 1.333. A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção. Parágrafo único. Para ser oponível contra terceiros, a convenção do condomínio deverá ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis”. 4 CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. REQUISITOS. “Art. 1.334. Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará: I - a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio; II - sua forma de administração; III - a competência das assembléias, forma de sua convocação e quorum exigido para as deliberações; IV - as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores; V - o regimento interno. § 1o A convenção poderá ser feita por escritura pública ou por instrumento particular. § 2o São equiparados aos proprietários, para os fins deste artigo, salvo disposição em contrário, os promitentes compradores e os cessionários de direitos relativos às unidades autônomas”. 5 DIREITOS DOS CONDÔMINOS. Art. 1.335. São direitos do condômino: I - usar, fruir e livremente dispor das suas unidades; II - usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores; O regimento interno prevê as normas de uso das áreas comuns. III - votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite. Cabe previsão em contrário na convenção? 6 DEVERES DOS CONDÔMINOS. Art. 1.336 CC. I) Dever de contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção (com a redação dada pela Lei 10.931/2004). NÃO SE PODE ESQUECER QUE A OBRIGAÇÃO DE PAGAR AS DESPESAS CONDOMINIAIS CONSTITUI UMA OBRIGAÇÃO PROPTER REM (ART. 1.345). II) Dever de não realizar obras que comprometam a segurança da edificação Ilustrando, é permitida a obra de unificação de unidades em que um mesmo condômino adquire os apartamentos 51 e 52, fundindo-os em um só. A obra não poderá implicar, por exemplo, na derrubada de uma coluna que os separa, que dá sustentação ao prédio. “Civil – Condomínio – Obras – Ausência de prejuízo – Motivo de segurança – Escorreito remanesce o aresto recorrido quando, embasando-se nas provas dos autos, reconhece que as obras efetivadas em bloco de residências em condomínio não causaram prejuízo às unidades residenciais e tiveram por escopo robustecer a segurança do prédio” (STJ – REsp 204.077/SC – Rel. Ministro Waldemar Zveiter – Terceira Turma – j. 7 27.03.2000 – DJ 05.06.2000, p. 155). DEVERES DOS CONDÔMINOS. Art. 1.336 CC. III) Dever de não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas POLÊMICA. FECHAMENTO DA SACADA. “O fechamento da sacada da unidade condominial, por interferir na harmonia do conjunto arquitetônico, caracteriza alteração da fachada do edifício, de sorte que somente pode ser realizada mediante aprovação unânime dos condôminos” (Tribunal de Justiça de São Paulo – Ap. s/ Rev. 553.153 – 9.ª Câm. – Rel. Juiz Marcial Hollanda – j. 18.11.1998 – JTA (LEX) 177/499). “O fechamento de varanda com vidro translúcido não altera a estética da fachada externa do condomínio. São válidas as deliberações da Assembléia Geral Extraordinária que autoriza a realização de obra útil, quando a decisão atende o quorum exigido pela vontade dos condôminos manifestada na Convenção Condominial e no vigente Código Civil” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais – 15.ª Câmara Cível – Processo 1.0024.04.391299-7/001(1) – Relator Viçoso Rodrigues – Data da publicação 08.08.2006). COLOCAÇÃO DE TELA DE SEGURANÇA É PERMITIDO... 8 DEVERES DOS CONDÔMINOS. Art. 1.336 CC. IV) Dever de dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. Vários problemas. - Excesso de barulho. A questão da “lei do silêncio”. Poluição sonora e multa. “Multa condominial por barulho excessivo. Prova robusta de perturbação sonora causada pelo filho do apelante, pelo aparelho de som em altura indevida, mantida, pois a penalidade pelo uso nocivo da propriedade. Condomínio que exige limitações na liberdade de conduta individual, a fim de se preservar a tranqüilidade e a harmonia gerais. Direito à propriedade que não pode dar lugar ao abuso (artigo 1.228, § 2.º, Código Civil)” (Tribunal de Justiça de São Paulo – Ap. s/ Rev. 867.22400/9 – 10.ª Câm. – Rel. Juiz Soares Levada – j. 10.11.2004). - Reuniões de trabalho. Trabalhar no imóvel é possível quando o condomínio é residencial? - Desenvolver atividades que contrariam os “bons costumes”. Ex. Prostituição. 9 SANÇÕES AOS CONDÔMINOS. ART. 1.336. “§ 1o O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito”. A NOVA MULTA TEM APLICAÇÃO IMEDIATA, MESMO AOS CONDOMÍNIOS ANTERIORES? “A multa por atraso prevista na convenção de condomínio, que tinha por limite legal máximo o percentual de 20% previsto no art. 12, parágrafo 3.º, da Lei 4.591/1964, vale para as prestações vencidas na vigência do diploma que lhe dava respaldo, sofrendo automática modificação, no entanto, a partir da revogação daquele teto pelo art. 1.336, parágrafo 1.º, em relação às cotas vencidas sob a égide do Código Civil atual. Precedentes” (STJ, REsp 746.589/RS – Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior – Quarta Turma – j. 15.08.2006 – DJ 18.09.2006, p. 327). Ver, ainda: STJ – REsp 689.150/SP – Rel. Ministro Jorge Scartezzini – Quarta Turma – j. 16.02.2006 – DJ 13.03.2006, p. 328). 10 SANÇÕES AOS CONDÔMINOS. • Abono de pontualidade “disfarçando” a multa. Enunciado da V Jornada de Direito Civil do STJ (2011): Enunciado n. 505. “É nula a estipulação que, dissimulando ou embutindo multa acima de 2%, confere suposto desconto de pontualidade no pagamento da taxa condominial, pois configura fraude à lei (Código Civil, art. 1336, § 1º), e não redução por merecimento”. 11 SANÇÕES AOS CONDÔMINOS. ART. 1.336. (...). “§ 2o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembléia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa”. CUIDADO: A APLICAÇÃO É BEM RESTRITA... NÃO CONFUNDIR COM A PREVISÃO A SEGUIR... 12 SANÇÕES AOS CONDÔMINOS. “Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem. Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia”. 13 POLÊMICAS. O ART. 1.337 DO CC TEM APLICAÇÃO AO CONDÔMINO INADIMPLENTE? JOSÉ FERNANDO SIMÃO ENTENDE QUE NÃO. ENTENDO QUE SIM. Nesse sentido: “Despesas condominiais. Cumulação das multas previstas nos arts. 1.336, § 1.º, e 1.337, caput, do CC de 2002. Possibilidade. Não configuração de bis in idem. Inadimplemento reiterado conforme critério definido pelos próprios condôminos e que não esvazia a previsão do art. 1.336, § 1.º. Apelo não provido” (Tribunal de Justiça de São Paulo – Ap. c/ Rev. el. ação sem revisão 916995008 – 30.ª Câm. – Rel. Juiz Luiz Felipe Nogueira – j. 29.11.2007). Enunciado n. 92 do STJ: “As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo”. 14 POLÊMICAS. CABE A EXPULSÃO DO CONDÔMINIO ANTISSOCIAL? CARLOS ALBERTO DABUS MALUF – NÃO. CRISTIANO CHAVES E NELSON ROSENVALD – SIM. Enunciado da V Jornada de Direito Civil do STJ (2011): Enunciado n. 508. “Verificando-se que a sanção pecuniária mostrouse ineficaz, a garantia fundamental da função social da propriedade (arts. 5º, XXIII, da CRFB e 1.228, § 1º, do CC) e a vedação ao abuso do direito (arts. 187 e 1.228, § 2º, do CC) justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior assembleia prevista na parte final do parágrafo único do art. 1.337 do Código Civil delibere a propositura de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal”. 15 ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO. Três situações: - Convenção proíbe. - Convenção permite. - Convenção nada prevê. Julgados – análise caso a caso. “Ação cominatória – Condomínio – Criação de animal em apartamento – Ausência de prova da perturbação ao sossego, saúde e segurança dos demais condôminos – Proibição contida em norma interna – Inaplicabilidade. O condomínio pode estabelecer regras limitativas do direito de vizinhança, conforme autoriza a Lei 4.591/1964. A regra interna do Condomínio que proíbe a criação de animais deve ser interpretada teleologicamente, apenas se aplicando quando restar demonstrado que está ocorrendo perturbação ao sossego, saúde e segurança dos demais moradores. – Inexistindo provas de que tais danos estão ocorrendo, permite-se a criação dos animais, não se justificando a aplicação de qualquer penalidade por esse motivo” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais – Processo TJ/MG 2.0000.00.488929-4/000(1) – Rel. Des. Heloísa Combat – j. 09.03.2006). 16 ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO. “APELAÇÃO. Declaratória de nulidade de cláusula Convenção de condomínio Proibição de animais em unidade autônoma Cláusula restritiva que deve ser relativizada em relação aos animais de pequeno porte que não tragam risco à segurança, saúde e sossego Precedentes Sentença reformada Recurso provido em parte”. (TJSP; APL 9145528-68.2007.8.26.0000; Ac. 5807460; Caraguatatuba; Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Egidio Giacóia; Julg. 03/04/2012; DJESP 20/04/2012). 17 ANIMAIS EM CONDOMÍNIO EDILÍCIO. “RELAÇÃO CÍVEL. Ação indenizatória por danos morais c/c obrigação de fazer com fulcro no art. 5º inciso X da CF/88. Direito de vizinhança. Criação de cachorro de pequeno porte em apartamento. Latidos constantes. Perturbação dos vizinhos. Regimento interno que prevê a criação de animais no condomínio nos termos do seu art. 9º. Discussão entre os vizinhos. Responsabilidade civil subjetiva. Meros aborrecimentos. Danos morais não configurados. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos”. (TJBA; Rec. 0084496-66.2008.805.0001-1; Primeira Turma Recursal; Relª Juíza Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo; DJBA 29/11/2010). 18 DIREITO DE PREFERÊNCIA. “Art. 1.338. Resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, preferir-se-á, em condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e, entre todos, os possuidores”. • Enunciado n. 91 do STJ: “A convenção de condomínio, ou a assembléia geral, podem vedar a locação de área de garagem ou abrigo para veículos a estranhos ao condomínio”. • Enunciado n. 320 do STJ: “O direito de preferência de que trata o art. 1.338 deve ser assegurado não apenas nos casos de locação, mas também na hipótese de venda da garagem”. • Qual a consequência se a preferência for preterida? Luiz Edson Fachin entende pela aplicação do art. 504 do CC, o que parece ser o melhor caminho, inclusive nas hipóteses de locação. 19