O que adolescentes dependentes químicos
acham de sua comunicação?
Christian César Cândido de Oliveira*, Claudia Inês Scheuer**, Sandra Scivoletto***
Curso de Fonoaudiologia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo & Grupo
Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP
* Mestrando em Ciências pelo Depto de Fisiopatologia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Fonoaudiólogo da equipe do Ambulatório de Adolescentes e Drogas, do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP .
**Profa. Dra Docente do Curso de Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da USP .
***Doutora em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Coordenadora do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo. Responsável pelo Ambulatório de Adolescentes e Drogas, do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
I- Introdução
Em usuários de drogas podem ser encontradas alterações na fluência verbal
(Oliveira, et al, 2003), déficits de memória (Bhattachary & Powell, 2001), déficits de
atenção (Rogers & Robbins, 2001), dificuldades na aprendizagem (Sollowij et al,
2002) e na concentração (Ameri, 1999), alterações na seqüência do pensamento,
no padrão vocal e na articulação da palavra (Grünspun, 1987; Ardila et al, 1991).
Porém, são escassos os estudos que observem o quanto esta população percebe
estas ou outras alterações em sua comunicação oral. O Centro Brasileiro de
Informação sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) constatou, na década de 90, em
um levantamento de uso de drogas entre crianças e adolescentes de rua, que
apenas 11,1% dos usuários de drogas acreditavam haver relação entre drogas,
cérebro e funcionamento cerebral (Noto, et al, 1997).
II- Propósito do Estudo
O objetivo desse estudo foi descrever a impressão que adolescentes usuários de
drogas têm de seu discurso espontâneo após ouvi-lo.
III- Metodologia
A amostra de adolescentes usuários de drogas foi obtida no Ambulatório de Álcool
e Drogas para Adolescentes do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência
do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Fizeram parte deste grupo, 10 adolescentes usuários
de drogas psicotrópicas de ambos os sexos, com diagnóstico de dependência de
substâncias psicoativas segundo CID-10 (OMS, 1993). Quanto aos tipos de
substâncias consumidas, 4 adolescentes faziam uso exclusivo de álcool e 6 de
múltiplas drogas, três do sexo feminino e sete do sexo masculino e idade média de
15,5 anos.
Procedimentos
Após conversa informal com fonoaudiólogo e obtenção de uma amostra de fala
espontânea, gravada em mini disc, os adolescentes ouviram a gravação e falaram
livremente sobre o impacto do próprio discurso. Foi escolhida esta forma de coleta
de fala porque de acordo com Perkins, Kent e Curlee (1991), a fala auto-expressiva
é aquela que não requer nenhuma atenção para qualquer aspecto de sua
produção, além dos envolvidos na geração da mensagem lingüística. Expressa os
sentimentos e intenções do falante, formulados num código lingüístico – fonológico,
morfossintático, semântico e pragmático – com intenção comunicativa.
IV- Resultados
De acordo com os resultados obtidos, a maioria dos sujeitos (70%) não gostou de
ouvir o próprio discurso. Para estes jovens, o que mais desagradou foi a
observação de que “gaguejavam” para falar (n=2), hesitavam excessivamente
(n=3), utilizavam pausas entre palavras (n=2), a voz era irritante ou “inferior à de
outras pessoas” (n=2), tinham vergonha para falar em público (n=2), e por este
motivo, sentiram-se intimidados com a gravação (justificando assim uma
performance pior) além do conteúdo da mensagem parecer “sem nexo”, desprovido
de sentido (n=2). Os três sujeitos que gostaram da forma como se comunicaram
(30%) disseram que suas vozes eram boas e a qualidade da gravação excelente.
Quatro dos sete sujeitos que tiveram impacto negativo após ouvirem seus respectivos
discursos, atribuíram tal performance comunicativa ao uso de drogas. Dois deles
disseram ainda que poderiam falar melhor se lessem mais do que o habitual.
A impressão que adolescentes dependentes químicos tiveram após
ouvirem o próprio discurso
7
10
3
5
0
Impressão ruim
Impressão boa
V- Conclusão
Com base nos resultados obtidos, observa-se que a avaliação do discurso pode ser
uma aliada para melhor conscientização de adolescentes em tratamento especifico
para a dependência química, uma vez que estes adolescentes muitas vezes iniciam o
tratamento com dificuldades para perceberem a nocividade das drogas. A ausência de
estudos fonoaudiológicos que avaliem a comunicação neste grupo de sujeitos pode
estar levando a um sub-diagnóstico de distúrbios da comunicação nesta população.
Por outro lado, ela pode, inclusive, estar reforçando a minimização que os usuários de
substâncias psicoativas costumam fazer a respeito dos prejuízos das drogas. É
consenso na literatura que pacientes dependentes costumam negar ou minimizar não
só o próprio uso, mas os problemas decorrentes deste em sua vida (Brasiliano e
Knapp, 2001). Ao observarmos que a maioria dos sujeitos relatou prejuízo na
comunicação, pode-se sugerir que, aumentando o tamanho da amostra e obtendo-se
resultados semelhantes ao deste estudo inicial, a inclusão de orientações e/ou
tratamento fonoaudiológico nesta população pode ser importante para implementar a
abordagem ampla necessária na recuperação do desenvolvimento normal de jovens
dependentes químicos, questões fundamentais para um melhor prognóstico no
tratamento da drogadição e promoção da abstinência.
VI- Referências Bibliográficas
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de fluencia de habla en consumidores de drogas psicotrópicas. Revista de Psiquiatria y Salud Mental; XX nº4: 202-207, 2003.
Correspondência: Christian César Cândido de Oliveira. Email: [email protected]
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