Novas modalidades familiares. Concepções de redes sociais de apoio e seu impacto no direito de crianças e adolescentes. Maria Amalia Faller Vitale Família é uma realidade complexa e em transformação. A família se apresenta como campo de tensão. Nela coexistem mecanismos de conflito e de solidariedade. Todos nós temos internalizado um modelo de família, uma idéia do que “deve ser” uma família. A dificuldade em analisarmos e avaliarmos a família está, comumente, vinculada à proximidade que temos com esta realidade. Alguns pontos de partida Pensar a família é pensá-la no tempo, no decorrer de seu percurso de vida. Ela não está cristalizada em uma etapa ou momento da vida. Não se trata de idealizar a família. Ela pode ou não ser um lugar seguro para as crianças e adolescentes crescerem A partir da segunda metade do século XX, a família progressivamente conheceu profundas transformações. As mudanças sociais penetram o âmago das relações familiares. Essas implicam em ganhos e custos sociais e afetivos para a família. A família contemporânea tende a ser relacional. A afetividade integra as regras formais entre sexos e gerações.(Singly, 1996) Aumento da expectativa de vida Aumento da participação da mulher no mercado de trabalho Famílias menores Famílias mais instáveis socialmente Mobilidade das famílias é maior Menos tempo de convivência Mudanças familiares Crescimentos de separações/divórcios Casamentos e recasamentos Famílias monoparentais Mulheres chefes de família Famílias reconfiguradas (pluriparental) Famílias homo afetivas Famílias unipessoais Famílias não parentais Destaque: Elos parentais e os vínculos de filiação. Redesenhar das fronteiras familiares. • As rupturas e uniões sucessivas demandam deslocamentos de residência e territórios. E quando estas alternativas se afunilam, as condições econômicas são determinantes para parte das famílias direcionarem-se aos abrigos. “A família não se restringe ao grupo doméstico, pois envolve um leque de relações de consangüinidade e afinidade, e ainda, de laços de parentesco “fictícios”, no sentido de que não derivam de vínculos legais e/ou biológicos” (Fonseca, 2001,p.220-1). As redes de trocas familiares se estruturam de acordo com o modo de inserção das famílias em seu espaço social e, portanto, de modo socialmente desigual. Redes Familiares Rede social pessoal constitui um mapa relacional mínimo que incluí todas as pessoas que o indivíduo interage. As inter-relações são de grau variado. Relações podem ser: próximas,intimas,intermediárias, ocasionais. Rede social pessoal Redes primárias são constituídas por laços da família, parentesco, amizade, vizinhança e trabalho. Em seu conjunto formam uma trama de relações que confere a cada sujeito identidade e sentimento de pertencer (Sanicola,2008,p.51). Redes Primárias As informais são (...)” constituídas por laços que se estabelecem entre pessoas visando a resposta de uma necessidade imediata” (Sanicola, 2008, p.51). Redes informais Distingue-se o modo de solidariedade das redes primárias: Nos segmentos pauperizados estariam associadas à subsistência Nos segmentos médios e altos, as redes teriam como objetivo a promoção social (Vasconcelos, 2003). Redes e Desigualdade Redes são sexuadas Redes intergeracionais Rede gênero e geração Nas famílias estudadas, a rede é preponderantemente feminina e de parentesco e constitui a principal referência de ajuda para a mulher. Todavia quando falha a rede de apoios múltiplos e a presença paterna é frágil ou ausente, as crianças tendem a ser afetadas (Fávero, Vitale, Baptista, 2009). No decorrer do percurso de vida há momentos em que as famílias se tornam mais dependentes das solidariedades privadas, em especial, quando os programas das políticas públicas respondem de forma lenta às necessidades das famílias. Nas condições apontadas poderá ocorrer um reordenamento do lugar das crianças e dos adolescentes na rede familiar. Uma história familiar Pesquisa: Família de crianças e adolescentes abrigados na cidade de São Paulo: quem são, como vivem, o que desejam Fragmentos de depoimento de mãe com filhos abrigados (Fávero, Baptista, Vitale,2009) “Meu avô abandonou minha avó. Ela falava assim que ele abandonou. Ele teve cinco filhas com a [outra] mulher.” “Meus avós paternos eram de Pernambuco”. “Casei de novo, mas não deu. Ele era violento, a família dele se metia. Fui morar com a sogra e a irmã dele. Foi um inferno. Ele foi preso. Na deu certo com a família dele (ainda mais quando ele foi preso) e fiquei sem casa. Foi assim que acabei trazendo meus filhos para o abrigo”. “Se minha mãe estivesse viva, eu não teria meus filhos abrigados. Ela não deixaria os netos. Ela me ajudaria”. “Tinha uma mulher que me ajudava pra ‘caramba’, que cuidava dos meus filhos para eu trabalhar(...) ela cuidava dos bebês e eu trabalhava fora.” “As pessoas de fora pensam que você está curtindo. Mas, para a gente a sensação de impotência é muito grande. Você fica refém do próprio sistema, Você tem que ter aluguel, tem que ter uma cama ( para as crianças)(...) Eu tenho que ter os requisitos (...) falei pro juiz: excelência, tem tantos jovens desempregados, é difícil para quem tem 45 anos.” Qual o lugar da criança e do adolescente em nossa sociedade? O que ocorre com crianças e adolescentes, no decorrer das mudanças do percurso de vida, quando : as condições socio-ecônomicas são vulneráveis ? a rede familiar falha ou é frágil? na ausência paterna ou materna? na falta de políticas públicas consistentes? Para mudar o lugar de crianças e adolescentes é preciso também, mudar nosso olhar sobre suas famílias. Como nos diz Sarti (2007,p:35): (...) nas políticas sociais trata-se de transformar o lugar do outro na sociedade. No entanto, como condição prévia a essa transformação,trata-se de mudar o lugar em que nos colocamos perante os demais. Fávero, E. T. Vitale, M. A. F. ,Baptista, M. V. Famílias de crianças abrigadas na cidade de São Paulo: quem são, como vivem, o que desejam, FONSECA, C. Mãe é uma só?Reflexões em torno de alguns casos brasileiros. Psicologia Usp, S. Paulo, v.13,n.12,p.49-68,2002. GUEIROS, D. Adoção por consentimento da família de origem. São Paulo:Cortez editora, 2007. SANICOLA, L. As dinâmicas de rede e o trabalho social. São Paulo: Veras, 2008. SLUZKi,C. E. A rede Social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997. SINGY, F. Trois thèses sur la famille contemporaine.In: Le Gall,D. et MARTIN, C. 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