Emilia Ferreiro Argentina 1936- Pedagoga e Psicóloga Trechos do livro Com todas as letras “(...) analfabetismo e pobreza caminham juntos, não são fenômenos independentes; analfabetismo e marginalização social caminham juntos, não são fenômenos independentes. O analfabetismo dos pais está relacionado com o fracasso escolar de seus filhos.” (p. 56) “(...) o conjunto de conhecimentos que um indivíduo adquire no curso de seu desenvolvimento depende das exigências do meio cultural em que cresce. (...)” (p. 57) Ferreiro fala que as culturas do campo e cidade são diferentes e exigem conhecimentos distintos. Existe um movimento em direção à urbanização, contrário à ruralização. “(...) O funcionamento da sociedade global requer indivíduos alfabetizados; portanto, os indivíduos podem exigir o direito à alfabetização, o que não pode ser entendido como uma opção individual, mas como uma necessidade social.” (p. 58) “(...) A escola, através de seu longo processo de desenvolvimento enquanto instituição social, operou uma transmutação da escrita. A escrita é um objeto social, mas a escola transformou-a em um objeto exclusivamente escolar (...)” (p. 70) “Reduzir a língua escrita a um código de transcrição de sons em formas visuais reduz sua aprendizagem à aprendizagem de um código. (...)” (p. 72) Para a autora, introduzir a língua escrita significa: permitir explorações de jornais, revistas, cartas, etc., poder escrever com diferentes propósitos, perguntar e ser entendido, saber antecipar o conteúdo de um texto a partir dos dados contextuais. “(...) os filhos de pais alfabetizados (melhor dizendo: que usam no cotidiano e com frequência língua escrita) chegam à escola com uma série de conhecimentos que adquiriram em contextos sociais de uso desse objeto social e, além disso, com uma série de conhecimentos, produto de suas explorações ativas sobre a língua escrita (...)” (p. 71) “(...) As crianças de pais nãoalfabetizados ou semi-alfabetizados tampouco chegam ignorantes à escola; chegam, porém, com muito menos informação: quase tudo o que sabem é produto de suas próprias explorações ativas sobre a língua escrita em contextos pouco apropriados (a escrita em uma camiseta, em um pedaço de jornal que serve para acender o fogo (...)) (p. 71) Trechos do livro Reflexões sobre alfabetização “Se considerarmos a escrita “como um código de transcrição gráfica das unidades sonoras” (p. 14) para um código visual, então “tanto os elementos como as relações já estão predeterminados; o novo código não faz senão encontrar uma representação diferente para os mesmos elementos e as mesmas relações”. (p. 16) Nesse caso “coloca-se em primeiro plano a discriminação perceptiva nas modalidades envolvidas (visual e auditiva)”. (p. 18) Nesse sentido privilegia-se o exercício de discriminação, e não há questionamento sobre “a natureza das unidades utilizadas”. (p. 18) Nesse caso, a aprendizagem da língua escrita é “concebida como a aquisição de uma técnica”. (p. 19) Quando “se concebe a aprendizagem da língua escrita como a compreensão do modo de construção de um sistema de representação”, admitimos que, “embora se saiba falar adequadamente, e se façam todas as discriminações necessárias, isso não resolve o problema central: compreender a natureza desse sistema de representação”. (p. 19) “A aprendizagem se converte na apropriação de um novo objeto de conhecimento, ou seja, em uma aprendizagem conceitual”. (p. 19) Na página 22, a autora descreve como podemos reconhecer na criança diferentes momentos relacionados ao processo de alfabetização: * distinção entre o modo de representação icônico e não icônico; * a construção de formas de diferenciação (controle progressivo das variações sobre os eixos qualitativo e quantitativo); * a fonetização da escrita (que se inicia com um período silábico e culmina no período alfabético). A escrita é um “objeto cultural” e ela “cumpre diversas funções sociais”. “O escrito aparece, para a criança, como objeto com propriedades específicas e como suporte de ações e intercâmbios sociais”. (p. 44) A criança cria critérios próprios para dar sentido ao sistema de escrita. Ela primeiro distingue o figura e o que é escrita, depois estabelece que deva haver uma quantidade mínima de caracteres para escrever uma palavra, depois a criança se dá conta que deve haver uma variedade de caracteres de uma mesma palavra. “Ambas as hipóteses, a da quantidade e a da variedade, são construções próprias da criança, no sentido de elaborações internas que não dependem do ensino do adulto nem da presença de amostra de escritas onde podem aparecer anotações de uma ou duas letras, com reduzida variedade interna”. Não se trata de confusões perceptivas por parte da criança, mas de questões de conceito. As crianças criam as suas sistematizações “ao operarem com base no próprio raciocínio”. (p. 47) A criança que convive desde pequena num ambiente “letrado”, em que as pessoas a sua volta utilizam a escrita e a leitura em diferentes situações, interage com esse sistema de representação e cria sentidos para ele, mesmo que não aprenda formalmente a ler e escrever. A escola tem “um papel insubstituível” no processo de aprendizagem da escrita que é o de “criar condições para que a criança [...] por si mesma” (p. 59) como fazer uso do sistema alfabético. O adulto, “para ser eficaz, terá que adaptar seu ponto de vista ao da criança. Tarefa nada fácil, já que poderia parecer impossível reconstruir introspectivamente o estado de analfabetismo pelo qual todos já passamos”. (p. 60) “Desde que nascem (as crianças) são construtoras de conhecimento. No esforço de compreender o mundo que as rodeia, levantam problemas muito difíceis e abstratos e tratam, por si próprias, de descobrir respostas para eles. Estão construindo objetos complexos de conhecimento e o sistema de escrita é um deles”. (p. 64) “No processo de assimilação (isto é, no processo de elaboração da informação), o sujeito transforma a informação dada; às vezes a resistência do objeto obriga o sujeito a modificar-se também (isto é, a mudar seus próprios esquemas) para compreender o objeto (isto é, para incorporá-lo, para apropriar-se dele)”. (p. 69) “A pré-escola deveria cumprir a função primordial de permitir às crianças que não tiveram convivência com adultos alfabetizados – ou que, pertencem a meios rurais isolados – obter essa informação básica sobre a qual o ensino cobra um sentido social (e não meramente escolar): a informação que resulta da participação em atos sociais onde o ato de ler e o de escrever têm propósitos explícitos”. (p. 98) Bibliografia FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. 25. ed. São Paulo: Cortez, 2010. (Coleção questões da nossa época; v.6) FERREIRO, E. Com todas as letras. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2000