UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
ESCOLA DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
DEPARTAMENTO DE TEORIA E GESTÃO DA INFORMAÇÃO
CULTURA E INFORMAÇÃO 2012/1
Processo avaliativo individual
Leia o texto abaixo e assista ao documentário Muito Além do Cidadão Kane. Produza um
texto (uma lauda digitada em fonte Times New Roman 12, espaço entre linhas simples) que
discuta as frases ressaltadas em negrito/sublinhado tomando como referência para
exemplificação o documentário. Data de Entrega: 1º/junho.
MATOS, Olgária C. F. A Escola de Frankfurt: luzes e sombras do Iluminismo. São Paulo:
Moderna, 1993. Cap. 6, p. 69-72.
O conceito de indústria cultural, elaborado por Adorno e Horkheimer na obra
Dialética do iluminismo, diz respeito a uma teoria social do conhecimento. De acordo com
seus pressupostos, tudo se transforma em artigo de consumo. No mercado, todas as teorias se
equivalem, seja a de Marx, Hitler ou Lênin.
Também a “música” popular, em particular o jazz, sucumbe à uniformização e à
pesudo-individualidade. A essência da audição de massas é, para Adorno e Horkheimer, o
reconhecimento do que nos é familiar. Todas as vezes que uma certa fórmula se populariza,
isto é, tem êxito de consumo, a indústria a promove e repete sempre o mesmo padrão. Tais
circunstâncias intensificam a passividade social. E a uniformização técnica leva, por sua vez,
à “administração centralizada”. A arte na época de “sua reprodutibilidade técnica”, para
utilizar uma expressão de Benjamin, serve para reconciliar a audiência de massas com o status
quo.
Dissolvendo a tradicional oposição entre “alta cultura” e “cultura popular”, a indústria
cultural criou uma “barbárie estilizada”. Como escreve Adorno:
“A arte ligeira tem sido a sombra da arte autônoma. É a má consciência social da arte
séria [...]. A própria divisão é a verdade: pelo menos ela expressa a negatividade da cultura
que as diferentes esferas constituem. E menos ainda pode a antítese ser reconciliada
absorvendo-se a arte ligeira na séria ou vice-versa. Mas é isso que a indústria cultural
tenta[...]. A abolição do privilégio educacional através do mecanismo de vendas de
produtos culturais não abre para as massas as esferas das quais foram anteriormente
excluídas, mas dadas as condições sociais existentes, contribui diretamente para a
decadência da educação e o progresso da inexpressividade bárbara”.
A cultura de massa é “uma psicanálise ao revés”, é regressiva. Para Adorno e
Horkheimer, a “cultura de massa” não é nem cultura nem é produzida pelas massas: sua
lei é a novidade, mas de modo a não perturbar hábitos e expectativas, a ser imediatamente
legível e compreensível pelo maior número de espectadores ou leitores. Evita a complexidade,
oferecendo produtos à interpretação literal, ou melhor, minimal. Assim, a mídia realiza uma
“caça à polissemia”, pela demagogia da facilidade – fundamento da legitimidade desse
sistema de comunicação. Adorno critica a “indústria cultural” não por ser democrática, mas
por não o ser. A mídia transmite uma cultura agramatical e desortográfica, de tal forma
que a educação retorna à condição do segredo, conhecimento de uma elite: “A luta contra
a cultura de massa só pode ser levada adiante se mostrada a conexão entre a cultura
massificada e a persistência da injustiça social”.
Esse mecanismo que vive a ausência de pensamento autônomo é apontado pela Teoria
Crítica, em particular nos efeitos da televisão. Nos noticiários, por exemplo, a voz em off do
apresentador funciona como um superego sonoro que nos leva a concluir o que já está
decidido antes de nossa reflexão. Também nas entrevistas, o tempo da palavra cedida só é
permitido a fim de que o entrevistado diga o que é induzido a dizer. Adorno e Horkheimer
observam, ainda, que o mesmo procedimento de indiferenciação entre objetos e indivíduos na
troca no mercado está presente na televisão. A uma notícia de catástrofe natural ou social
segue o divertissement do nascimento de um ursinho Panda no zoológico de Moscou.
Foram essas concepções frankfurtianas que inspiraram uma crítica à política que toma
prioritariamente a questão da técnica como dominação. Não se trata, pois, de discutir a
democracia, mas de questionar a tecnologia. O modus operandi da televisão é, para os
frankfurtianos, uma das formas da destituição e do ataque aos direitos humanos, pois
oblitera a autonomia do pensamento e inflaciona a mente de preconceitos e
adestramento das consciências de maneira subliminar.
[...]
Os meios de comunicação de massa são o oposto da obra de pensamento que é a obra
cultural – ela leva a pensar, a ver, a refletir. As imagens publicitárias, televisivas e outras, em
seu acúmulo acrítico, nos impedem de imaginar. Elas tudo convertem em entretenimento:
guerras, genocídios, greves, cerimônias religiosas, catástrofes naturais e das cidades, obras de
arte, obras de pensamento. A cultura, ao contrário, é para os frankfurtianos a quintessência
dos direitos humanos. Em um mundo antiintelectual, antiteórico e inimigo do pensamento
autônomo, a razão ocupa lugar central. Cultura é pensamento e reflexão. Pensar é o
contrário de obedecer. A indústria cultural cria um simulacro de participação na cultura
quando, por exemplo, desfigura s Sinfonia n. 40 de Mozart em chorinho. Assim adulterada,
não é Mozart tampouco ritmo popular. Tanto a sinfonia quanto o samba vêem-se privados de
sua força própria de bens culturais, considerados em sua autonomia. O direito à cultura é o
direito de acesso aos bens culturais, e a compreensão desses bens é o ponto de partida para a
transformação das consciências.
Os bens culturais não nascem apenas do esforço dos grandes gênios que os criaram,
mas também da “anônima corvéia imposta aos contemporâneos desses gênios”. Sob esse
ponto de vista, todos os excluídos da “alta cultura” a ela têm direito. O processo de exclusão
dos indivíduos com relação às relações espirituais da sociedade não pára aí: a indústria
cultural destitui os indivíduos de sua “própria cultura” ao desfigurá-la em “arranjos de
massa”. Por essa razão, Adorno escreveu que “os deserdados da cultura são os verdadeiros
herdeiros da cultura”.
Download

Leia o texto abaixo e assista ao documentário Muito Além