XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM SERVIÇO E A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: ENTRE A EMERGÊNCIA E A URGÊNCIA DE FORMAR PROFESSORES Maria Elizabete Souza Couto Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC Resumo Este trabalho tem como objetivo analisar e discutir o contexto da formação de professores, considerando a modalidade de ensino que está em expansão – Educação a Distância – e o lugar dos formadores de professores. Adotamos uma pesquisa de caráter qualitativo e trabalhamos com professores e tutores que estão na condição de formadores do curso de Pedagogia na UESC. Para coleta de dados utilizamos os diários de campos das reuniões e encontros durante um semestre. As reuniões aconteciam com o grupo, mas também em individual para o planejamento da disciplina. Nesta modalidade, há estruturantes (recursos tecnológicos/AVA tendo a tela como a sala de aula, materiais didáticos e outra configuração pedagógica como tempos e prazos delimitados). Por fim, está na condição de formador(a) na EAD é compreender a dinâmica e a complexidade da sociedade atual. Tudo é muito rápido, é um construir e reconstruir constante, um quebra-cabeça que é arrumado diariamente. As zonas de sombras e as zonas de possibilidades configuram e reconfiguram a todo instante. E a zona de conhecimento alarga-se na sua complexidade indicando que os novos referenciais para a formação de professores buscam conceitos fundantes de várias áreas do conhecimento (humanas, biológicas, saúde, exatas). Assim, começamos a compreender que o lugar dos formadores – professores e tutores - encontra-se em um campo interdisciplinar, marcado pela nova cartografia da vida humana e da formação profissional, articulando os saberes e fazeres numa rede de relações e conexões para pensar um modelo de educação a distância e o lugar dos formadores, quer seja professor, quer seja tutor, numa condição de rede, de estar junto e aprender com o outro. Palavras chave: educação a distância; formação em serviço; formação e formadores. Introdução Este trabalho tem como objetivo analisar e discutir o contexto da formação de professores, considerando a modalidade de ensino que está em expansão – Educação a Distância – e o lugar dos formadores de professores. Para tal análise faz-se necessário fazer uma retrospectiva histórica sobre o que professores e pesquisadores consideraram, ao longo do tempo, como campo de conhecimento e atuação na profissão e como, em determinado momento, perceberam que seria necessário avançar e buscar novos referenciais para explicar a formação e as políticas de formação de professores, o trabalho docente e as práticas pedagógicas, que, de repente, apresentam-se com um caráter emergencial, Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003522 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 indicando aspectos importantes, mas que se situam em lugares diferentes no percurso da formação: é preciso formar os professores que já estão na docência, atendendo assim aos aspectos legais e, também, vislumbrando uma melhoria na qualidade de ensino, visto que teremos professores com mais argumentos conceituais (teóricos e metodológicos), por outro lado, é preciso formar professores, mas não qualquer formação (MARCELO GARCIA, 2007). Dois aspectos que ainda não se interligaram; talvez aí esteja o ‘nó’ da construção e reconstrução dos processos formativos no contexto global e local. Sendo assim, a nossa indagação para reflexões do objeto de estudo é: qual o lugar os formadores de professores na educação a distância? A emergência e a urgência para/na formação de professores A busca de novos referenciais na formação de professores concretizou-se na elaboração de novas diretrizes, estudos e pesquisas indicando a urgência de romper com o paradigma que estava vigente. Marcados por essa desintegração de conceitos teóricos e metodológicos vivemos o momento de muita transição. Tal condição requer a busca e solução de vários “tipos de complexos quebra-cabeças instrumentais, conceituais e matemáticos” (KUHN, 2001, p.59) e metodológicos. Assim, “as revoluções científicas são os complementos desintegradores da tradição à qual a atividade da ciência normal está ligada” (id, p.25). Para compreendê-los parece que o caminho é por meio da pesquisa, do olhar investigador e observador para captar as nuances do objeto de estudo segundo as implicações e significações da(s) nova(s) teoria(s) que começaram a repercutir e a constituir-se em corpus de conhecimento que não fora construído por apenas uma pessoa e, em apenas, um insight. Foi necessário amadurecimento de conceitos para que fossem sistematizados e socializados com a comunidade acadêmica e os professores de uma maneira geral. Assim, o pesquisador “deve preocupar-se em compreender o mundo e ampliar a precisão e o alcance da ordem que lhe foi imposta” (KUHN, 2001, p.65). A condição do professor-pesquisador indica uma nova cartografia de saberes e fazeres, políticas e práticas. A partir desse momento, pesquisadores e estudiosos brasileiros vêm desenvolvendo pesquisas nas várias regiões do país e, ainda, indicam que há muitas “zonas de sombras que precisam ser desvendadas, se considerarmos os desafios de uma escola de massa e o lugar que nela desempenha o trabalho do professor, especialmente em Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003523 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 sociedades como a nossa que não equacionaram o problema da desigualdade social e escolar” (LELIS, 2001, p. 43), bem como as ‘zonas de conhecimentos’ traduzidas como o repertório de conhecimentos que o professor já construiu na sua trajetória profissional, individualmente, com seus alunos e colegas, e as ‘zonas de possibilidades’(MOOL; GREENBERG, 1996), as quais podem ser entendidas como espaços e tempos indicadores de aprendizagens que, certamente, contribuem para a formação, com conexões de estratégias, caminhos diversos entre a escola, universidade e a comunidade, bem como a socialização e discussão de práticas e a busca de novos referenciais para ajudar na sistematização da formação e aprendizagem. Nas zonas de possibilidades consideramos as singularidades e particularidades dos sujeitos – aluno, professor, pais, comunidade etc. - para ir além da sala de aula e da escola, do conteúdo escolar estabelecendo redes sociais de conhecimentos. Como ficam as zonas de possibilidades formativas nos currículos dos cursos de formação de professores que priorizam a duração (carga horária e anos do curso), com disciplinas obrigatórias e poucas que tratam da diversidade e da cultura, muitas vezes, apenas para cumprir decretos e resoluções, sem definir um eixo norteador para a formação e sem preservar o princípio da pesquisa e a necessidade e estabelecer a articulação entre a universidade e a escola? Parece que as zonas de possibilidades ajudam-nos a pensar e refletir sobre as temáticas emergentes, as mudanças na sociedade, as conexões significativas entre a escola e a sociedade e as novas perspectivas para a formação de professores. Poderíamos considerálas como o ‘passaporte’ para a construção de novos processos formativos. Tais zonas de possibilidades fazem parte do nosso quebra-cabeça, está com muitas peças embaralhadas, por isso, em construção constante. É um continuum. Na formação de professores a própria condição da sociedade local e global vem indicando a urgência de buscar novos paradigmas, novas zonas de possibilidades na (re)construção do quebra-cabeça, para pensar políticas e processos formativos tendo como foco não apenas aquela sala de aula e aqueles alunos – sujeitos da aprendizagem -, mas pensar “no contexto planetário. [...] o desafio da ordem global/da globalidade é um desafio da complexidade” (MORIN, 2003, p.14). Segundo Marcelo Garcia (2007) temos professores com uma visão e formação homogênea, trabalhando com alunos diversos. Este é o momento e o contexto que vivemos, Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003524 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 com as dúvidas, insegurança e incertezas, entre a emergência e a urgência de formar professores para melhorar o índice da educação básica e, consequentemente, a vida de todos. Será que um dia compreenderemos essa condição e chegaremos a pensar em uma formação de professores em um contexto planetário? Segundo Morin (1998, p.176), a complexidade neste contexto pode ser entendida como “[...] aquilo que tenta conceber a articulação, a identidade e a diferença de todos esses aspectos”: a docência, educação, formação, aprendizagem, sociedade, escola etc., bem como “é preciso ver a complexidade onde ela parece em geral ausente como, por exemplo, na vida quotidiana” (MORIN, 1998, p.83), o dia a dia a concretização da escola, da formação e da profissão. Tratamos aqui da formação como peça do quebra cabeça, considerando as políticas, modalidade de ensino, condições e, também, suas tensões e contradições presentes no contexto de sua efetivação – a universidade e a escola. Neste caso, a complexidade aparece, justamente, como uma espécie de dificuldade, incerteza, incapacidade de estar seguro de tudo, de formular uma lei/teoria e até compreendê-las na maneira como orientam e determinam a trajetória profissional do professor (ingresso na carreira, organização do trabalho pedagógico, concepção de aprendizagem e de ensino, rotina da escola e da sala de aula, salário, aposentadoria, organização de carga horária, financiamentos, reformas educacionais etc.). Parte do cotidiano dos processos formativos e da educação no sentido macro para que o profissional possa construir a base de conhecimento necessária para o desempenho do trabalho docente. Segundo Oliveira (2004, p. 1128), são “necessários esforços que vão além da interpretação do texto das reformas, abarcando o contexto em que se desenvolvem” para compreender as mudanças que são de natureza endógenas e exógenas e que estão relacionadas com a educação e a sociedade para além do espaço da escola e da sala de aula. Assim, pensar a formação de professores no contexto planetário é compreender a complexidade no movimento da sociedade, começando pela sua identificação: sociedade da informação, sociedade do conhecimento, sociedade globalizada etc. Seguindo esse raciocínio, acreditando nessa nova postura e ordem social (CASTELLS, 2002), estamos construindo saberes e fazeres de um novo paradigma, que exige uma nova base de conhecimento para a formação de professores que poderá contribuir, mediar e facilitar essa transição. Inicialmente, podemos pensar que o desenvolvimento humano é base para tal Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003525 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 construção, tendo como eixo norteador uma formação integral do indivíduo, preparando-o para viver em uma sociedade plural, em permanente processo de transformação e mudanças, considerando os aspectos cognitivos, afetivos, sociais, culturais, éticos, físicos, espirituais, ambientais etc., para que os sujeitos da formação tenham condições de construir conhecimentos, resolver problemas, formular hipóteses, tomar decisões, trabalhar em grupo etc. Entretanto, o Brasil, na sua condição de país emergente, ainda segue os ditames do Banco Mundial para amenizar as mazelas que historicamente foram acumulando-se, deixando-nos um registro de muitos analfabetos, concorrendo ainda mais para o aumento da grande desigualdade social. Eis a marca da urgência para pensar políticas e processos formativos que contribuam para formar professores que possam trabalhar em contextos emergentes, os quais trazem em sua natureza as novas temáticas, condições sociais e espaços diversificados, indicando a construção de novos conhecimentos que traduzam essa responsabilidade social, local e planetária. Nesse contexto, emerge a educação a distância com o potencial que as tecnologias da informação e comunicação oferecem para sua viabilização. Todavia, não podemos considerá-la como a “redentora dos graves problemas educacionais” (MORAES, 2005, p. 182). Para tal construção faz-se necessário um repensar sobre os programas, políticas e cursos de formação de professores, as modalidades – presencial e a distância - que são oferecidos, na tentativa de construir novos caminhos. Além de programas de formação de professores, fomos invadidos com leis, planos, diretrizes, resoluções etc (LDB, Parâmetros Curriculares Nacionais, Diretrizes Curriculares dos cursos, Plano Nacional de Educação etc.), que norteiam novas perspectivas para organizar o processo formativo de professores. Tal processo inicia-se em 1996, com a aprovação da LDB 9394/96, que mudanças e reorganizações passaram a ser necessárias para ajustar a Lei ao contexto vigente marcando assim um momento de muitas discussões, estudos e polêmicas nas escolas, nas universidades, no MEC e Secretarias Estaduais e Municipais da Educação e também na sociedade civil. Passando mais de uma década, muito já foi feito, mas muito ainda temos a fazer. Precisamos formar professores não somente para o agora, mas também para o amanhã (o emergente e o urgente). É necessário pensar nos professores que já estão na profissão e não têm a formação exigida pela LDB 9394/96, no artigo 62, mas também, Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003526 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 formar novos professores para ingressar na carreira docente. Pensar na condição das grandes, médias e pequenas cidades, no papel das instituições de ensino superior (universidades, faculdades e centros universitários) etc. Nova Cartografia na formação de professores: do emergente à urgência A nova cartografia na formação de professores tem como propósito atender as atuais exigências caracterizando numa perspectiva de construção de conhecimento para viver, aprender e ensinar no sentido macro. Algumas vezes, confundimos essa nova cartografia com uma avalanche de técnicas, dicas e receitas que são boas, ajudam a ensinar e, aprender, mas, em algumas situações, pode não oferecer as bases necessárias para a sistematização e construção de conceitos. Nesse sentido, duas posições podem ser analisadas: a primeira apresentada por McDiarmid (1995, p. 18), quando nos diz que “sem o tempo para aprender, experimentar novas idéias e refletir, a abordagem do ‘livro de receitas' é o melhor que os professores podem fazer”. A segunda, indica que esse tempo para ‘aprender sobre como ensinar’ e ‘aprender sobre como ser professor (KNOWLES et al, 1994) é uma das condições para a construção dessa nova cartografia na formação. Um tempo que não é tarefeiro, não é recheado de receitas, truques e dicas, mas que deve ser construído na dinâmica da ação, investigação, e reflexão durante a trajetória formativa. Muitas vezes, as receitas, dicas e truques podem ser úteis, mas também podem começar e terminar em si mesmo, não indicando caminhos para avançar na construção de conceitos. Outras vezes, não se constituem em uma atividade homogênea para todos os professores, depende também das características pessoais, cognitivas, contextuais, relacionais, ideológicas etc., de cada professor ou do grupo de professores para desenvolver suas próprias capacidades e potencialidades e recorrer a tais receitas, truques e dicas (MARCELO GARCIA, 1999). Por isso, é urgente e necessário formar professores, independente da modalidade de ensino, para ir além dos truques, dicas e receitas, para refletir e contextualizar, ajudá-los na tomada de decisão, resolução de problemas e na possibilidade de escolher o momento e o conteúdo para utilizá-los. A formação inicial de professores ainda não dá conta de atender a todas as demandas, não obstante a qualidade do que fizermos nos programas e cursos de formação de professores, na melhor das hipóteses só poderemos preparar professores para Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003527 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 iniciar a carreira docente (ZEICHNER, 1993; LOUGHRAN, 2009). E ainda, a formação inicial deve ser “destacada como um momento formal em que processos de aprender a ensinar e aprender a ser professor começam a ser construídos de forma mais sistemática, fundamentada e contextualizada” (MIZUKAMI, 2006, p.216). Segundo Marcelo Garcia (2007), precisamos de políticas e programas de formação (inicial e continuada) que considerem o professor como um sujeito da cognição, aprendizagem, afetividade, cultura e socialização, capaz de articular os conhecimentos a partir de múltiplas conexões, com flexibilidade operatória, adaptada ao contexto social, local e regional dos aprendizes e da comunidade. Cursos e programas que possibilitem condições para ‘aprender sobre como ensinar’, mas também, como construir conhecimentos sobre o ensino, combinando a competência com a capacidade de inovação e reflexão. Assim, a preocupação não deve estar apenas na formatação do curso, duração, local e modalidade da formação, mas com o cerne dessa formação, ou seja, o que professores iniciantes e experientes precisam aprender e como devem ser motivados e mobilizados para aprender novos conhecimentos necessários à docência (MIZUKAMI, 2006). Uma formação com o sentido e o significado que significa educar e formar sujeitos para viver em uma “sociedade democrática, tendo em vista aprendizagens que lhes possibilitem participar na vida política, civil e econômica” (id, 2006, p.221). Talvez seja este o ponto de partida no processo formativo que se desenvolve ao longo da trajetória docente e não deve ser considerada como um fim em si mesmo. É um ‘terreno de ensaios’ (LOUGHRAN, 2009, p.33), um espaço para construção e desenvolvimento de conceitos, práticas, truques, dicas, histórias e receitas para compreensão do complexo mundo do ensino, da aprendizagem e da formação. Assim, os professores começam a construir a sua base de conhecimentos para o ensino quando ainda estão nos cursos de formação inicial. Um conhecimento construído a partir da observação, o que já foi “denominado de aprendizagem pela observação” (MARCELO GARCIA, 2007, p.73), quando ainda estamos estudando e começamos a compreender o professor que queremos ou não queremos ser. Aprendizagem que não está definida no corpus sistematizado dos conhecimentos para a Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003528 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 formação, mas que vai sendo formalizado, modificado, mobilizado e ampliado na construção pessoal (teorias pessoais) do aluno/futuro professor. Entre o emergente e o urgente, é preciso pensar numa formação de professores que seja capaz de contemplar e “desocultar as complexidades do ensinar” (LOUGHRAN, 2009, p. 35) e aprender para ensinar, aumentando as zonas de possibilidades no desenvolvimento da base de conhecimento para o ensino na/da formação de professores. Nessa condição, precisamos também ampliar esse universo de saberes e fazeres para os formadores. Parece ser uma via de mão dupla que em determinado ponto se encontram e outras relações e construções são estabelecidas, dando ‘vez’ e ‘voz’ a todos os sujeitos envolvidos no ensinar e aprender e formar. Essas novas relações indicam uma nova cartografia para a formação de professores, superando o modelo da racionalidade técnica para atender as diversas demandas e condições que estão presentes nas escolas e nos contextos formativo e social, tais como: trabalhar com as tecnologias; a formação por meio da educação a distância que vem desenhado uma nova configuração e, certamente, nova cartografia na formação de professores e de seus formadores; educação inclusiva, educação do campo e indígena a diversidade etc. É evidente que precisamos atender a toda essa demanda, mas não devemos descuidar dos saberes fundantes para a formação. Como bem disse Marcelo Garcia (2007), é preciso saber que formação estamos oferecendo, considerando que este futuro profissional poderá trabalhar em contextos e realidades múltiplas (escola do campo, cidade, educação de jovens e adultos, espaços não escolares, comunidades diversas etc.). Tal condição é ainda mais necessária quando se trata de uma questão antiga de uma forma relativamente nova (a base de conhecimento para o ensino). Essa clássica questão deve ser abordada em relação ao saber (base de conhecimento), o local da formação e da docência. Não temos uma teoria definida e única, porque a base de conhecimento não é fixa, para construção dos saberes fundantes na formação de professores, entretanto, já temos pesquisas apresentadas, por meio da literatura internacional e nacional, que indicam pistas para organização da formação de professores, acrescentando as temáticas que emergem das demandas sociais, considerando o contexto político, cultural e educacional. Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003529 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 Para melhor analisar as condições da formação de professores, principalmente, no contexto da pesquisa e do ensino, no contexto dessa nova cartografia da docência (professores formados em cursos regulares nas universidades; programas de caráter emergencial (UAB, PARFOR, PROAÇÃO, PROFORMAÇÃO etc.) é preciso pensar quem será este sujeito da formação e da docência. O professor é um sujeito que aprende para ensinar e ensina aprendendo estando imerso em conhecimentos do seu mundo com o olhar para além do seu entorno. Assim, parafraseando Charlot (2000), podemos inferir que o professor é um sujeito que deve estar aberto a um mundo que não se reduz aqui e agora, portador de desejos e movido por esses desejos; um ser social, que nasce e cresce em uma família, ocupa uma posição em um espaço social (filho/filha, pai/mãe, marido/mulher, tio/tia, primo/prima, sobrinho/sobrinha, irmão/irmã) e na escola pode ser professo/professora, gestor/gestora etc; um ser singular, com uma história, capaz de interpretar o mundo, dá sentido a esse mundo, a posição que ocupa, bem como as suas relações e a maneira como constrói novas relações. Um sujeito da ação, que age no e sobre o mundo; encontra a questão do saber como necessidade de aprender e como presença no mundo de objetos, pessoas, ideias, lugares de saberes e fazeres; um sujeito que se produz e é produzido por meio da educação – formação e docência. O percurso para a realização do trabalho Para o desenvolvimento do trabalho elegemos uma pesquisa de caráter qualitativo com a finalidade de estudar e analisar conceitos referentes ao objeto de estudo (formação de professores) que, segundo André (1995), espera mostrar a complexidade da rede de interações que constitui a experiência habitual, mostrando como se estrutura a produção do conhecimento na rede de relações que se estabelecesse para a construção do conhecimento, compreendendo que a formação acontece em espaços e tempos diversificados. Trabalhamos com professores que lecionam disciplinas em curso de graduação, na modalidade a distância, e os tutores que assumem o papel de formadores por estar na mediação entre alunos e professores, lidando, mais diretamente, com os processos formativos, na rede de certezas, incertezas, dúvidas e aprendizagens. O curso de graduação é ofertado pela Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC em parceria com o Sistema da Universidade Aberta do Brasil/UAB. Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003530 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 Para coleta de dados utilizamos os diários de campo que foram escritos nos encontros e reuniões com os professores e tutores durante um semestre letivo. As reuniões acontecem com o grupo de professores, mas também, individualmente, para planejamento da disciplina. Os professores e tutores têm uma trajetória profissional com base nos cursos presenciais. Esse foi o nosso celeiro para pensar a formação dos formadores – professores e tutores, visto que todos estão na condição de aprendiz, para pensar os tempos, espaços, condições de trabalho, material didático e tecnológico e o aluno como um sujeito que é abstrato, está em um espaço que não sabemos qual é e onde é. Consideramos como categoria de análise a formação de formadores – professores e tutores. O lugar dos formadores: os professores e os tutores Nos encontros e reuniões com os professores e tutores fomos aprendendo como se organiza um curso na modalidade a distância, sua lógica pedagógica, organizacional e os recursos humanos e tecnológicos. Parece ser uma tarefa que depende de poucas pessoas. Aí reside a complexidade dessa modalidade de ensino (MORIN, 2003). Além da estrutura tecnológica é preciso de pessoal qualificado, tecnicamente e com conceitos teóricos consistentes para a efetivação de um curso de graduação dessa natureza. Os professores, com vínculo empregatício na universidade, disseram-nos que: - quanto mais ‘nó’ tem ruído (Prof. R.); - o encontro presencial é o ‘termômetro do tempo’. Este precisa ser replanejado constantemente (Profa. A.); - a formação de uma ‘teia’ de conhecimento (Profa. S.); - [é preciso ter ] cuidado na maneira de falar com o aluno, contexto da relação virtual para construir as relações (Profa. K.); - somos professores presenciais trabalhando com alunos que é presencial e tutores que também são formados para o presencial . [...] o professor é indicado e vê a EAD como uma complementação salarial (Prof.L); - quando começamos a compreender a dinâmica da EAD estamos terminando a disciplina (Profa. RO); - não quero aprender a lidar com a Plataforma Moodle (Profa. RA). Os tutores, que também são formadores pela função que assume junto aos alunos, disseram-nos que: - A formação com o professor da disciplina não dá conta, depende o esforço do tutor, o seu crescimento profissional (T. C.); Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003531 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 - a tutoria é o momento de melhorar a formação para formar o outro (T.A.); - momento de aprofundamento dos conhecimentos teóricos e também o compreender a tecnologia como possibilidade de aprendizagem (T.J); No conjunto, o lugar de formação fica caracterizado pelos termos: ‘nó’, ‘teia’ e ‘termômetro do tempo’ indicando a rede de relações que marca a complexidade (MORIN, 2003), em que os formadores têm uma formação presencial, com uma história profissional presencial, mas no momento ver-se na condição de formadores(as) em cursos na modalidade a distância em uma instituição que também está construindo a sua concepção de educação a distância, para melhor estruturar seus processos formativos. No geral, temos professores com uma visão e formação homogênea (MARCELO GARCIA, 2007), para trabalhar em uma modalidade de ensino que ainda está construindo o seu corpus de conhecimento. Fazer a transposição dos processos didáticos de um curso presencial para a modalidade a distância não é possível. Nesta modalidade, há outros estruturantes – recursos tecnológicos/AVA tendo a tela do computador como a sala de aula, materiais didáticos e outra configuração pedagógica como tempos e prazos delimitados - que nos cursos presenciais estão presentes, mas não têm um papel tão agregador como na educação a distância. Por isso que a professora diz: quando entendemos o processo a disciplina terminou. A maneira como o professor é indicado para lecionar a disciplina e como os cursos na modalidade a distância chegaram à instituição parecem delinear o lugar da formação. Cursos que chegam por meio de programas emergenciais, para atender a urgência da educação no país, parecem não criar raízes/sustentabilidade para sua continuidade quando o financiamento acabar. Esta é uma incerteza, meio a tantas certezas dos cursos presenciais e por ser uma incerteza ainda não temos investimentos mais consistentes para garantir a continuidade dos cursos na modalidade a distância na instituição. Um marco da complexidade (MORIN, 2003) Estabelecer relações com o outro que está no virtual requer cuidados na maneira de falar/escrever, apresentar as atividades, indicar as leituras, preparar a disciplina no seu Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003532 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 conjunto (leituras, vídeo aula, atividades etc.), tanto na comunicação sincrônica como a assincrônica. O tutor, que não possui vínculo empregatício com a instituição, tem uma trajetória efêmera estando no lugar de formador buscando sempre melhorar o seu crescimento profissional, vislumbrando outros espaços a partir dessa experiência. Este precisa ter autonomia intelectual para indicar leituras, tomar decisões, resolver problemas e contribuir na construção de conceitos fundantes para a formação docente. Esta característica ainda fica a desejar entre os tutores pesquisados. Esperam sempre do professor toda e qualquer tomada de decisão, sendo este um dos pontos da incerteza para garantir o aprofundamento dos estudos com os alunos. Tecendo considerações... Está no lugar de formador em um curso na modalidade a distância, no contexto da sociedade tecnológica, indica que as mediações, conversas acontecem no espaço virtual. Não podemos desconhecer tal condição! Este é um marco da complexidade nessa modalidade de ensino, visto que estamos acostumados com presencialidade, configurandose em uma das zonas de sombras, visto que é preciso dispor de tempo e reconstruir o processo pedagógico. Queremos olhar nos ‘olhos’ os nossos alunos, falar, sentir, ouvir..., mas na virtualidade são ações expressas pela palavra escrita no ambiente virtual. Entretanto, os professores, tutores e alunos são aprendizes dessa nova forma de ler, escrever, discutir, interpretar, formar conceitos, estabelecer relações etc. indicando os caminhos para essa nova cartografia na formação e construindo novas zonas de conhecimentos. Entre a urgência e a emergência a educação a distância não é considerada como a “redentora dos graves problemas educacionais” (MORAES, 2005). Está na condição de formador(a) em cursos a distância é compreender a dinâmica e a complexidade dessa nova cartografia. Tudo é muito rápido, da tomada de decisão a certeza de que pode estar acertando ou errando. É um construir e reconstruir constante, um quebracabeça (KUHN, 2001) que é arrumado diariamente. As zonas de sombras (LELIS, 2001) e as zonas de possibilidades (MOOL; GREENBERG, 1996) configuram e reconfiguram a todo instante. Nessa reconfiguração, vamos desocultando cotidianamente a complexidade (LOUGHRAN, 2009) e aprendendo que a zona de conhecimento alarga-se na sua Junqueira&Marin Editores Livro 2 - p.003533 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 complexidade, indicando que os novos referenciais para pensar a formação de professores buscam conceitos fundantes de todas as áreas do conhecimento (humanas, biológicas, saúde, exatas). Começamos a compreender que o lugar dos formadores de professores encontra-se em um campo interdisciplinar, marcado pela nova cartografia da vida humana e da formação profissional, articulando os saberes e fazeres numa rede de relações e conexões para pensar um modelo de educação a distância e o lugar dos seus formadores – professor e tutor - numa condição de rede, de estar junto e aprender com o outro. Referências ANDRÉ, M. E. D. Avanços no conhecimento etnográfico da escola. In: FAZENDA, I. (Org.). Pesquisa em Educação e as transformações do conhecimento. São Paulo: Papirus, 1995. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9394/96. 1996. CASTELLS, M. A Sociedade em rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Vol. 1, São Paulo: Paz e Terra, 2002. KNOWLES, J. G., COLE, A. L.; PRESSWOOD, C. S. Through Preservice Teachers’ Eyes: experiences through narrative and inquiry. New York, McMillan College Puyblishing Co, 1994. KUHN, T. S. 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