INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO EMPRESARIAL – I (ADE) I – O Direito Empresarial e sua evolução: dos atos do comércio à teoria da empresa: 1. Formação, origem e evolução histórica do Direito Comercial: - Numa visão econômica, podemos dizer que constitui o comércio uma atividade humana que põe em circulação a riqueza produzida, aumentando-lhe a utilidade. O homem tende a viver em grupo para atender as suas necessidades, porque não as atende de forma isolada, e assim foi levado a aproximar-se de outras pessoas para poder trocar os produtos excedentes de seu trabalho, denominando-se esta fase, de permuta dos produtos, de economia de troca ou economia de escambo. Com a evolução da civilização, o mecanismo de troca em espécie foi se tornando cada vez mais difícil, surgindo a mercadoria padrão, como os animais e metais preciosos, servindo como denominador comum do valor para facilitar a troca, com a mesma característica da moeda. Desta forma evolui-se da economia de troca para a economia de mercado, onde o produtor não mais produz o seu produto para a troca, mas sim para vender, adquirindo moeda, para aplicá-la em um novo circulo de produção; - O Prof. belga Van Ryn afirma que o domínio próprio do Direito Comercial é o conjunto de regras jurídicas relativas à atividade do homem aplicada à produção, à apropriação, à circulação e ao consumo das riquezas; - O Direito Comercial surge na Idade Média com o desenvolvimento mercantil. Nas civilizações antigas existiam regras rudimentares deste Direito, mesmo na Roma antiga não houve um direito especializado para regular as atividades mercantis, uma vez que a sua organização social era estruturada principalmente sobre a propriedade e atividade rural. Surge com regras própria a partir do século XII, nas corporações de ofício. Podemos dividir a história do Direito Comercial em quatro períodos, assim estabelecidos: 1º período: neste o Direito Comercial é o direito aplicável aos integrantes de uma específica corporação de ofício, a dos comerciantes. Adota-se assim, um critério subjetivo para definir seu âmbito de incidência. Como exemplo de institutos existentes neste período temos a letra de cambio, os bancos e o seguro; 2º período: surge como processo de unificação nacional da Inglaterra e da França, onde houve a uniformização das normas jurídicas sobre as atividades econômicas. Neste período surgem as sociedades anônimas, que comparadas às sociedades de pessoas até então existentes, mostraram-se mais adequadas aos empreendimentos mercantis, para colaborar com a expansão colonial, as quais demandavam um grande aporte financeiro e limitação de risco; 3º período: inicia-se com a codificação napoleônica, com o Código Civil, em 1804, e o Código Mercantil napoleônico (Code de Commerce), em 1808, e, por conseqüência, a 1 objetivação do Direito Comercial, ou seja, transforma-se em disciplina jurídica aplicável a determinados atos de comércio, que em principio poderiam ser praticados por qualquer pessoa e não a determinadas pessoas. Desta forma fica estabelecido o principio da igualdade dos cidadãos e o fortalecimento do Estado ante os organismos corporativos, assim qualquer cidadão passa a poder exercer atividades mercantis e não tão somente os aceitos em determinadas associações profissionais, a corporação de oficio dos comerciantes. Neste período ocorreu a abolição do corporativismo, na forma até então concebido. Os citados Códigos exerceram grande influência em muitos países, principalmente os de língua latina, estabelecendo a teoria dos atos de comércio, não penetrando somente na Alemanha e nos países da Common Law. A teoria dos atos de comércio pode ser resumida como a relação de atividades econômicas; 4º período: este período inicia com a edição, em 1942 na Itália, do Códice Civile. Este Código reúne numa única lei as normas de direito privado, passando a disciplinar tanto a matéria de direito civil como a comercial. O núcleo conceitual do Direito Comercial deixa de ser ato de comércio, e passa a ser a empresa (teoria da empresa). Este Código apresenta uma teoria substitutiva à dos atos do comércio, estabelecendo a teoria da empresa. A diferença é que deixa de ser enfocada o gênero da atividade econômica, passando o enfoque a ser o da medida da importância da atividade econômica. O sistema italiano, acabou superando o francês, a partir do meado do século XX, onde as legislações de direito privado sobre matéria econômica não tem mais dividido os empreendimentos em duas categorias, ou seja, em civis e comerciais, e sim o de criar um regime geral para a disciplina privada da economia, excepcionando algumas atividades de menor expressão econômica; 2. Direito Comercial brasileiro: - À época do Brasil-colonia as relações jurídicas pautavam-se pela legislação de Portugal, com as Ordenações Filipinas, e com a influência do direito canônico e romano. A história do Direito Comercial brasileiro se inicia com a abertura dos portos às nações amigas, com a chamada Lei de Abertura dos Portos, de 1808. Em 1850, o então Imperador D. Pedro II aprovou o Código Comercial brasileiro, o qual teve inspiração do Code de Commerce, implantando o sistema francês de disciplina privada da atividade econômica, ou seja, incorporou a teoria dos atos de comércio. Embora tenha incorporado esta teoria, o Código brasileiro deixou de elencar os atos reputados comerciais, como o fez o francês. Somente vieram a ser discriminados no Regulamento nº 737, de 1850, um diploma adjetivo, em seu art. 19, onde considerava atos de comércio: a) a compra e venda ou troca de bem móvel ou semovente, para a revenda, por atacado ou a varejo, industrializado ou não, ou para alugar o seu uso; b) as operações de câmbio, banco e corretagem 2 b) as empresas de fábrica, de comissões, de depósito, de expedição, consignação e transporte de mercadorias, de espetáculos públicos; c) os seguros, fretamentos, riscos; d) quaisquer contratos relativos ao comércio marítimo e a armação e expedição de navios. - Mesmo sendo extinto os Tribunais do Comércio, em 1875, continuou o direito brasileiro a disciplinar as atividades econômicas pela teoria dos atos comerciais, contemplando dois diferentes regimes, o civil e comercial. Neste sentido, as atividades comerciais foram estabelecidas normas específicas, como a chamada de Lei de Luvas, em 1934, tutelando o fundo de comércio, possibilitando o direito à renovação compulsória do contrato de locação apenas aos exercentes de atividades comerciais e industriais; a eficácia probatória da escrituração mercantil, como privilegio de comerciantes; a execução judicial coletiva do patrimônio do devedor, não forma unificada no direito brasileiro, ou seja, permanece a falência aos comerciantes e a insolvência civil para os demais exercentes de atividade econômica; - Somente a partir de 1960, quando o direito brasileiro iniciou a sua aproximação ao sistema italiano de disciplina privada da atividade econômica, a lista das atividades estabelecidas pelo Regulamento nº 737, que servia de referência doutrinária de definição do campo de incidência do direito comercial brasileiro, teve diminuída a sua importância. A exemplo pode ser citado o Código de Defesa do Consumidor, de 1990, que trata todos os fornecedores independentemente do gênero da atividade em que operam submetendo a mesmo tratamento jurídico os empresários do ramo imobiliário, industriais, prestadores de serviço, banqueiros e comerciantes; a Lei 8.245/91, que dispõe sobre a locação predial urbana, introduzindo pequena alteração na disciplina da renovação compulsória do contrato de locação destinado a abrigar a exploração de atividade econômica, para estender o direito à ação renovatória às sociedades civis com fins lucrativos; - Com a promulgação do Código Civil brasileiro de 2002, foi concluída a transição entre o sistema francês e o italiano, o qual inspira-se no Código Civil italiano, e adota a teoria da empresa. O atual Código Civil brasileiro, em seu art. 966, assim define o empresário: Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços, sujeitando-se às disposições de lei referentes à matéria mercantil, nos termos do art. 2.037. Por sua vez o § Único, do art. 966, exclui do conceito de empresário o exercentes de atividade intelectual, de natureza científica literária ou artística , mesmo que conte com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se constituir o exercício da profissão elemento de empresa. Este dispositivo alcança, o profissional liberal, que apenas se submete ao regime geral da atividade econômica se inserir a sua atividade específica numa organização empresarial (elemento de empresa). Os empresários rurais, embora não estejam excluídos do conceito 3 de empresário, estão dispensados de inscrição no registro de empresas e dos deveres impostos aos inscritos (art. 971/C.Civ.); 3. Autonomia em relação aos outros ramos de direito/Fontes: leis e usos e costumes: - A autonomia do Direito Comercial no Brasil vem referida na Constituição Federal, que ao listar as matérias de competência legislativa, de competência privativa da União, menciona “Direito Civil” em separado do “Direito Comercial”, nos termos do inciso I, do seu art. 22. Na Portaria do Ministério da Educação, é considerada disciplina curricular autônoma; - Por fonte do Direito Comercial deve ser entendido o modo pelo qual surgem as normas jurídicas de natureza comercial. Assim temos as leis e os usos e costumes comerciais. 4