Introdução à Nanotecnologia Introdução à Mecânica Quântica Dualidade onda-partícula “Não leve essa aula muito a sério… apenas relaxe e desfrute dela. Vou contar para vocês como a natureza se comporta. Se você admitir simplesmente que ela tem esse comportamento, você a considerará encantadora e cativante. Não fique dizendo para si próprio: “Mas como ela pode ser assim?” porque nesse caso você entrará em um beco sem saída do qual ninguém escapou ainda. Ninguém sabe como a natureza pode ser assim”. Richard Feynman (1918-1988) Prêmio Nobel de Física 1965 1.1 - A mecânica dos objetos microscópicos Mecânica clássica - Mecânica dos objetos macroscópicos: Leis de Newton. Partículas ou corpúsculos. Física corriqueira, intuitiva. Física das ondas: Ondas sonoras, eletromagnéticas. Difração e interferência. Mecânica quântica: Mecânica dos objetos microscópicos (átomos e elétrons, por exemplo). Se comportam em muitas situações como partículas e em outras como ondas. Mecânica quântica: teoria abstrata ou aplicada? Invenções que só foram possíveis por causa da mecânica quântica: computador, laser, energia nuclear, imagens de ressonância magnética, etc. Em 2000, a revista Scientific American estimou que 1/3 do produto interno bruto dos EUA estava ligado à mecânica quântica! 1.2 - A experiência de fenda dupla com projéteis http://www.physik.uni-muenchen.de/didaktik/Computer/Doppelspalt/dslit.html • Descrição • Simulação • Projéteis chegam em pacotes idênticos • Projéteis não apresentam interferência P12 P1 P2 P1 P12 P2 http://www.upscale.utoronto.ca/GeneralInterest/Harrison/DoubleSlit/DoubleSlit.html 1.3 - A experiência de fenda dupla com ondas Detetor móvel I1 I12 Fonte I2 Anteparo x x • Ondas podem ter qualquer intensidade: contínua, não discreta. • Ondas mostram interferência: I12 I1 I 2 d1 d 2 n I12 I1 I 2 2 I1I 2 cos Casos especiais: Interferência construtiva (=0): d1 d 2 n d1 d 2 2n 1 1 2 Interferência destrutiva (=): 2 x d1 d2 1.3 - A experiência de fenda dupla com elétrons Supondo que o impacto de um elétron no detetor produza um som de “clique”: (a) Todos os “cliques” são idênticos. (b) Os “cliques” acontecem de forma bastante errática. O instante de chegada dos elétrons parece ser imprevisível. (c) Nunca escutamos dois “cliques” simultaneamente, ou seja, os elétrons chegam um de cada vez. Elétrons chegam em pacotes idênticos: são como “bolinhas”! • Podemos medir a probabilidade ou taxa média de chegada do elétron em uma certa posição x. • Simulação Elétrons apresentam interferência!!! Detetor móvel P1 P12 Fonte de elétrons P2 Para elétrons: P12 P1 P2 Anteparo x x Decididamente, elétrons NÃO são como “bolinhas”… Resumo • Projéteis chegam em pacotes idênticos e não apresentam interferência: P12 P1 P2 • Ondas podem ter qualquer intensidade e apresentam interferência: I12 I1 I 2 • Elétrons chegam em pacotes idênticos e apresentam interferência! P12 P1 P2 Dualidade onda-partícula: Elétrons às vezes se comportam como ondas, outras vezes como partículas 1.4 - A luz como partícula: O Efeito Fotoelétrico Hertz (1886) Lenard Millikan (1914) Nobel 1923 Corrente vs. voltagem para luz de mesma frequência mas intensidades diferentes Elétrons são emitidos com energia cinética máxima: Tmax eV0 Potencial de retardo ou potencial de corte V0 em função da frequência da luz V0 Problemas com a teoria clássica: 1. Intensidade: Energia máxima dos elétrons emitidos deveria depender da intensidade da onda eletromagnética. Frequência 0 de corte Tmax = 0 , elétrons não são mais arrancados do eletrodo 2. Frequência: Efeito fotoelétrico deveria ocorrer para qualquer frequência. 3. Tempo de atraso: Para luz suficientemente fraca, o elétron só poderia ser emitido quando acumulasse energia suficiente da onda, que deveria ser absorvida de forma contínua. Nenhum tempo de atraso jamais foi detectado. A hipótese do fóton - Albert Einstein, 1905 (Nobel 1921) • Energia da luz é quantizada em “pacotes” (fótons) de valor E = h, onde h = 6,63×10-34 J.s é a constante de Planck • O fóton carrega também momento linear: E h h p c c W W • Energia é transferida de forma discreta, através de processos individuais de colisões entre 1 fóton e 1 elétron W : função trabalho (propriedade do material) • Fótons com energia h < W não vão conseguir arrancar elétrons do metal: h 0= W Tmax eV0 h W V0 h( 0 ) h( 0 ) V0 e 0 Inclinação da reta fornece a constante de Planck! Millikan obteve h = 6,57×10-34 J.s Aplicação: célula fotoelétrica 1.4 – Ondas de matéria Como obter P12? Use a matemática das ondas! Associar uma onda ao elétron: Louis de Broglie (Tese de Doutorado, 1924; Nobel 1929) Mesmas relações sugeridas por Einstein para fótons: E h p h p2 Exemplo: elétron com energia T 2m p 2m T ; cinética de 100 eV, qual o h h comprimento de onda? 0,12 nm p 2m T Verificação experimental: difração de elétrons por cristais (Davisson-Germer e Thomson, 1927; Nobel 1937) Microscopia eletrônica de transmissão de alta resolução Davisson Thomson “J. J. Thomson (pai) mostrou que o elétron é uma partícula, G. P. Thomson (filho) mostrou que o elétron é uma onda” Nanopartícula de CdSe Por que as propriedades ondulatórias da matéria não são notadas no dia-a-dia? Problema: qual o comprimento de onda de um objeto de 1 kg movendo-se a 10 m/s? h h 6,631034 J.s 6,631035 m p mv 10 kg.m/s Os Postulados da Mecânica Quântica 2.1 – A Função de Onda Uma partícula quântica é descrita por uma função de onda (r,t), que: • Contém toda a informação sobre a dinâmica da partícula • É uma função complexa • É unívoca, finita e contínua • Tem derivadas unívocas, finitas e contínuas (Na maior parte dos exemplos, vamos nos restringir a uma dimensão, por simplicidade) Exemplo: partícula livre (não sofre a ação de forças). • Momento linear é constante. • Função de onda deve reproduzir os postulados de de Broglie: h p ; E h ( x, t ) Aei ( kxt ) (onda plana) k 2 (vetorde onda) 2 (frequencia angular) h h p k k ; E 2 2 Interpretação probabilística da função de onda Max Born 1926 (Nobel 1954) Se, no instante t, é feita uma medida da localização da partícula associada à função de onda (x,t), então a probabilidade P (x,t)dx de que a partícula seja encontrada entre x e x+dx é igual a *(x,t) (x,t)dx. Densidade de probabilidade : P ( x, t ) * ( x, t ) ( x, t ) Normalizacao : * ( x, t ) ( x, t ) 1 - Note que P (x,t) é real e não-negativa, como toda probabilidade… “Deus não joga dados com o universo” “Einstein, pare de dizer a Deus o que fazer” (Albert Einstein) (Niels Bohr) 2.2 – A Equação de Schroedinger (Schroedinger 1926, Nobel 1933) ( x, t ) ( x, t ) V ( x , t ) ( x , t ) i 2 2m x t 2 2 V(x,t): energia potencial Em 3D : (r , t ) 2 (r , t ) V (r , t ) (r , t ) i ; 2m t 2 2 2 Laplaciano: 2 2 2 2 x y z 2 Exemplo: partícula livre (V=0) 2 2 ( x, t ) ( x, t ) i 2 2m x t Separacaode variaveis: ( x, t ) ( x) (t ) [ ( x) (t )] [ ( x) (t )] i 2 2m x t 1 2 d 2 1 d i E 2 2m dx dt 2 2 Relação de dispersão (k) ck (fotons) d d iE i E (t ) e iEt e it ( E ) dt dt 2 d 2 d 2 2m E E 2 2 2 2m dx dx d 2 2k 2 ikx 2 Solucao : ( x) e 2 k E dx 2m Solucao geral : ( x, t ) Aei ( kxt ) Bei ( kxt ) k 2 2m (elet rons) k 2.3 – Operadores Quânticos A cada grandeza física corresponde um operador matemático, que opera na função de onda. Operadormomentolinear pop : pop i x O que acontecequando operamospop na funcaode onda da particulalivre? i ( kxt ) pop ( x, t ) i e k ei ( kxt ) k ( x, t ) p ( x, t ) x Quando aplicamos um operador a e obtemos de volta a própria multiplicada por uma constante, diz-se que é uma autofunção do operador, com autovalor igual à constante obtida. Quando isso acontece, diz-se que a grandeza física associada tem valor bem definido, com incerteza nula. Assim, a da partícula livre é uma autofunção do operador momento, com autovalor ħk. Operadorenergia Eop : Eop i t O que acontecequando operamosEop na funcaode onda da particulalivre? i ( kxt ) Eop ( x, t ) i e ei ( kxt ) ( x, t ) E ( x, t ) t A da partícula livre também é uma autofunção do operador energia, com autovalor ħ. Operadorenergia cineticaTop : i i pop pop 2 2 x x Top 2m 2m 2m x 2 Operadorposicao xop x Noteque a da particulalivre nao e' uma autofuncaoda posicao: x xei ( kxt ) C Note que a equação de Schroedinger pode ser escrita em termos dos operadores: 2 2 ( x, t ) ( x, t ) V ( x , t ) ( x , t ) i 2 2m x t Top Vop Eop Top Vop H (operadorHamiltoniano) H Eop 2.4 – Valores Esperados • Em geral, o resultado de uma medida de uma certa grandeza física tem uma natureza aleatória: não pode ser previsto com total certeza. • Pergunta: qual o valor esperado ou valor mais provável (do ponto-de-vista estatístico) do resultado de uma medida? Seja uma certagrandeza fisica Q associada ao operadorQop . O valoresperado Q da medida no instantet e' dado por : Q * ( x, t )Qop ( x, t ) dx 2.5 – A Equação de Schroedinger independente do tempo Considerea equacao de Schroedinger quando o potencialnao depende do tempo: V ( x, t ) V ( x) 2 2 ( x, t ) ( x, t ) V ( x ) ( x , t ) i 2 2m x t Novamente,separacaode variaveis: ( x, t ) ( x) (t ) 2 2 [ ( x) (t )] [ ( x) (t )] V ( x) ( x) (t ) i 2 2m x t 1 2 d 2 1 d V ( x) i E 2 2m dx dt d d iE i E (t ) e iEt e it ( E ) dt dt 2 d 2 V ( x) E 2 2m dx Equacao de Schroedinger independent e do tempo Define- se o operadorHamiltoniano : 2 d 2 H Top Vop V ( x) 2 2m dx H E Equacao de autovalores Sua solucao permiteencontraros autovalores da energia Exemplos de aplicação da Equação da Schroedinger em 1D 3.1 – Partícula livre (revisão) E Potencial V ( x) 0 2 d 2 Eq. Schroedinger : E 2 2m dx Solucoes : ( x) Aeikx Beikx 2k 2 Energias: E 2m 2k 2 E 2m k Qualquer energia positiva é permitida (energia varia de forma contínua) 3.2 – Poço de potencial infinito V Potencial: Região proibida Região proibida 0, 0 x L V ( x) , x L ou x 0 0 L x Em x L ou x 0 (regiao proibida): ( x) 0 Em 0 x L, temos V ( x) 0 : 2 d 2 Eq. Schroedinger : E (comoa particulalivre) 2 2m dx 2 2 k Solucao : ( x) Aeikx Beikx ; E 2m Funcao de onda deve ser continuaem x 0 e x L CONDICAO DE CONT ORNO: ( 0) ( L ) 0 Em x 0 : (0) A B 0 A B ( x) Aeikx e ikx Asen kx (a menosde uma constante...) Em x L : ( L) Asen kL 0 kL n (n 1,2,3...) 2 k n2 2 2 n 2 n kn En (energiaquantizada) 2 L 2m 2m L Funcoesde onda : n ( x) Ansen k n x n : número quântico V (x) L 0 0 n=2 L n=3 L 0 L n=4 Região proibida n=1 E3 Região proibida 0 E2 E1 0 L x Comentários de validade geral: •Partículas que estão confinadas a uma região do espaço têm um espectro discreto de energias, ou seja, têm energias quantizadas • Matematicamente, isto decorre das condições de contorno impostas nas extremidades (como numa corda vibrante) • Quanto maior o número de zeros (nós) da função de onda, maior a energia do estado Exemplo em nanotecnologia: Poços quânticos semicondutores 3.3 – Potencial degrau, barreira de potencial e efeito túnel Efeito túnel: Atravessando barreiras P = 100 % P < 100 % Barreira 100% - P Potencial degrau V V0 E < V0 E 1 2 0 x Regiao 1 - eletronlivre: Regiao 2 - Eq. Schroedinger : 1 ( x) Aeikx Beikx (incidente refletida) 2 d 2 V0 E 2 2m dx d 2 2mV0 E , V0 E 0 2 2 dx Solucao : 2 ( x) Cex Dex , 2k 2 2m E E k 2m 2mV0 E onde Encontrar B, C e D em termos de A 1 ( x) Aeikx Beikx , x 0 Deve ter derivadascontinuasem x 0 : 2 ( x) Cex Dex , x 0 d 1 dx Funcao de onda nao pode divergir : x 0 d 2 dx x 0 ikA ikB D (2) C 0 Deveser continuaem x 0 : A B D (1) Combinando(1) e (2),obtemos: ik ik ( A B ) ( A B ) B A ik ik 2ik A A D D A ik ik Barreira de potencial e Efeito Túnel (x) V V0 e x x 0 incidente (x) refletido V transmitido 0 Existe uma probabilidade de encontrar o elétron na região classicamente proibida a x Simulações: http://www.neti.no/java/sgi_java/WaveSim.html Se a barreira for suficientemente pequena (largura a) o elétron poderá ser transmitido (tunelar) com uma certa probabilidade: EFEITO TÚNEL Ptrans 2 (a ) e 2a 2 “Efeito túnel” em ondas clássicas: Ondas evanescentes Reflexão interna total http://wwwhome.math.utwente.nl/~hammerm/Metric/Illust/parcoreM.html Acoplamento entre guias de onda Aplicação em nanotecnologia: STM (scanning tunneling microscope) Visualização e manipulação de átomos Heinrich Rohrer (à esquerda) e Gerd K. Binnig (direita), cientistas do IBM's Zurich Research Laboratory, na Suíça, receberam o Prêmio Nobel de Física de 1986 por seu trabalho no desenvolvimento do microscópio de varredura por tunelamento. STM Visualizando átomos Superfície de Níquel (IBM Research Labs, California) Superfície de Silício (Naval Research Lab, Wash DC, USA) Referências: • “Materiais e Dispositivos Eletrônicos”, Sergio M. Rezende, Editora Livraria da Física – Seções 2.3, 2.4, 3.1, 3.2, 3.3 e 3.4. • “Física Quântica”, Eisberg e Resnick, Editora Campus Seções 2.2, 2.3, 2.5, 2.4, Cap. 3, 5.1 a 5.5, 6.1, 6.2, 6.3, 6.5, 6.8 e 6.9 • “Lectures on Physics”, Feynman, Vol. 1, Cap. 37 (interferência com fenda dupla) Problemas: Rezende 2.8, 2.9, 2.12, 2.13, 3.2, 3.6, 3.7. 3.9, 3.10 Reproduza os cálculos realizados nesta aula. Apresentação de Rodrigo Capaz