Marcella dos Santos Amorim Pediatria – HRAS Orientador : Dr. Filipe Lacerda www.paulomargotto.com.br Definições Uniformização das definições Conferência realizada pelo American College of Chest Physicians and Society of Critical Care Medicine ( Agosto 1991) Objetivos : - uniformização de protocolos de tratamento e de pesquisa - detecção e intervenção precoce Definições Infecção : definida como o fenômeno de resposta inflamatória à presença de um microorganismo e seus produtos ou a invasão de um tecido previamente estéril por microorganismos. Bacteremia : presença de bactérias no sangue. Definições SRIS Presença de pelo menos dois dos seguintes critérios : - temperatura acima de 38 ºC retal ( 37,8ºC oral ou 37,2ºC axilar) ou menor que 36ºC retal ( 35,8ºC oral ou 35,2ºC axilar) - frequência cardíaca > P90 para idade - taquipnéia c/ frequência respiratória > P90 para idade ou hiperventilação c/ PCO2 < 32 mmHg - contagem leucocitária > 12.000 células/mm³ (ou < 4.000 células/mm³) ou ainda mais de 10% de formas imaturas (bastonetes) Definições Sepse : resposta sistêmica à infecção (SRIS causada por uma infecção). Sepse grave : associada com disfunção orgânica, anormalidades de perfusão e/ou hipotensão. É caracterizada pela ocorrência de sepse mais um dos seguintes critérios : - diminuição do estado de consciência ( Glasgow < 15 sem doença do SNC) - lactato arterial > 1.6 mEq/L ou lactato venoso > 2.2 mEq/L - débito urinário < 1 mL/Kg/hora por duas horas consecutivas medidas c/ sonda urinária. Definições Choque séptico : sepse grave com hipotensão, apesar da adequada ressuscitação volêmica (manifestações de acidose láctica, oligúria e/ou alteração aguda do sensório) Critério diagnóstico : - presença de hipotensão c/ duas medidas distintas de PA abaixo do P3 para a idade depois da administração de mais de 20 mL/Kg de cristalóide ou colóide + - necessidade de suporte inotrópico ou vasopressor, excluindo a dopamina em dose baixa (< 5 mcg/Kg/min) ou qualquer um dos critérios diagnósticos de sepse grave. Epidemiologia Sepse é a principal causa de morte em UTI no mundo e muitos estudos tem demonstrado um aumento na incidência e uma leve redução na sua mortalidade. Estudo brasileiro mostrou : - mortalidade global 46,6% sepse 16,7% sepse grave 34,4% choque séptico 65,3% Elevado impacto econômico e social Epidemiologia Martin et al mostraram : - sepse principal causa de morte nas UTIs e nos EUA - 2 a 11% das internações hospitalares e nas UTIs são devido á sepse - aumento na incidência (8,7% ao ano) 1979 (82,7/100.000) 2000 (240,4/100.000) - redução na mortalidade de 27,8% no início do estudo para 17,9% nos últimos 5 anos de tal estudo. Epidemiologia Outro estudo brasileiro em UTIs pediátricas : - índice geral de mortalidade 7,4% sendo que sepse foi a principal causa de óbito ( 18,6%) - mortalidade foi maior entre os desnutridos (13,7%) e em menores de 1 ano(13,22%) - faixa etária e o grau de desnutrição foram fatores de risco e de pior prognóstico nos quadros de sepse. Fisiopatologia Produção excessiva de mediadores inflamatórios e excessiva ativação de células inflamatórias Descontrole no balanço pró e antiinflamatório. Sepse : tendência a formação de trombos e redução da fibrinólise. 1ª linha de defesa: células fagocitárias ( monócitos e macrófagos) e a via alternativa do complemento. Principais deflagradores da resposta inflamatória : (componentes da parede bacteriana) - endotoxinas (lipídio A) gram negativos - ácido teicóico gram positivos FNT alfa mediador chave na sepse! Fisiopatologia ativação direta dos macrófagos e monócitos componentes parede celular ativação indireta c/ a produção de citocinas ( FNT alfa, IL 1, IL 6, IL 8, leucotrienos e PAF) Mediadores primários atuam em outras células perpetuando a inflamação ( resposta inflamatória tardia) Mediadores secundários Fisiopatologia Papel do endotélio vascular - regulação do tônus vascular - homeostasia - fibrinólise - permeabilidade produção de substâncias endotélio vascular ação procoagulante e protrombótica citocinas endotoxinas produção mediadores inflamatórios Polimorfonucleares : lesam o endotélio pela aderência c/ consequente aumento da permeabilidade vascular ( edema, diminuição do DC e da PA) Redução da deformidade das hemáceas - microcirculação Modulação da apoptose celular Etiologia Agentes de infecções adquiridas na comunidade - Neisseria meningitidis - Haemophilus sp. - Escherichia coli - Streptococcus pneumoniae - Streptococcus pyogenes - Staphylococcus aureus (MRSA comunidade)* - Enterococcus faecalis - Rickettsia e fungos RN Streptococcus agalactiae E. coli Haemophilus influenzae tipo B S. pneumoniae N. meningitidis Pneumonia lembrar dos atípicos Etiologia Agentes de infecções hospitalares - Staphylococcus aureus meticilino-resistente - Staphylococcus epidermidis - Pseudomonas aeruginosa Bacteremias estafilococos coagulase–negativo, bacilos gram negativos e fungos Fungos ( 20%) e polimicrobianas (13%) Trato respiratório : S. aureus, H. influenzae, P. aeruginosa, K. pneumoniae * M. tuberculosis, B. pertussis e Legionnella pneumoniae * Imunossuprimidos : fungos, P. jiroveci e N. acorticosteroides Trato urinário : E. coli, K. pneumoniae, Pseudomonas sp., Candida sp. Ferida cirúrgica : geralmente polimicrobiana Quando suspeitar? Como reconhecer? Faixa etária pediátrica (sintomatologia muito variável) Empenho em encarar tal quadro clínico como sepse Reconhecimento precoce e adoção de medidas de suporte/terapêuticas que alterem o prognóstico desses doentes Classificar o paciente como séptico ( qual estágio???) - Frausto at al. analisaram 2527 pacientes com SRIS e a sua evolução : - sepse 26% - choque séptico 4% - sepse grave 18% * tempo médio de evolução da sepse para sepse grave foi de 1 dia!! Quando suspeitar? Como reconhecer? Campanha Mundial de Sobrevivência na Sepse (Survival Sepsis Campaign) As sociedades médicas no mundo empenhadas em adoção de abordagens rápidas, precoces e ações terapêuticas protocoladas nos quadros de sepse. Planejam uma redução na mortalidade da sepse de 25% até 2010. Quando suspeitar? Como reconhecer? Quadro clínico súbito/grave X quadro insidioso (apresentação imprevisível) Sinais e sintomas variam de acordo c/ a faixa etária jovem inespecífico Alto índice de suspeita história clínica bom exame físico exames laboratoriais rigoroso acompanhamento Importante diferenciar de outra condição inflamatória sistêmica não infecciosa. Quando suspeitar? Como reconhecer? Recém-nascido - letargia/irritabilidade - pele pálida - vômitos/problemas na alimentação - bradicardia - má perfusão periférica - apnéia, gemido, cianose - convulsões - distensão abdominal - icterícia/hepatoesplenomegalia - rash cutâneo Quando suspeitar? Como reconhecer? Lactentes jovens - sintomatologia semelhante à do RN * alteração no nível de consciência ou apnéia sinais precoces! Lactentes maiores e crianças - febre/calafrio - prostração - irritabilidade - palidez - distensão abdominal e/ou íleo paralítico OBS : não raramente as manifestações da sepse já indicam a presença de complicações e/ou disfunções orgânicas como choque, insuficiência respiratória, sangramentos, etc. Quando suspeitar? Como reconhecer? Sepse de origem hospitalar *sintomatologia menos característica (confundida ou mimetizada por situações de gravidade ou por tratamentos em uso) - distensão abdominal - hipotonia gástrica/resíduo gástrico - íleo - náuseas/vômitos - taquicardia/taquipnéia - instabilidade vasomotora e térmica - palidez Quando suspeitar? Como reconhecer? 2001: Conferência Internacional para Definições de Sepse 2001 ( International Sepsis Definitions Conference). Objetivo : revisar os conceitos de sepse. Modificações : - utilização de critérios bioquímicos e/ou imunológicos para o diagnóstico de sepse. - critérios definidos para serem aplicados em pacientes adultos, pediátricos e neonatais (Tabela 1.1) Tabela 1.1 – Critérios diagnósticos para sepse. Infecção, documentada ou suspeitada, e algum dos seguintes: Variáveis gerais - febre (temperatura corporal > 38,3°C) - hipotermia (temperatura corporal < 36°C) - frequência cardíaca > 90 batimentos por minuto ou > 2 desvios-padrão acima do valor normal para a idade - taquipnéia - alteração do estado mental - edema significativo ou balanço hídrico positivo (> 20 ml/kg em 24 h) - hiperglicemia (glicemia > 120 mg/dl) na ausência de diabete Variáveis inflamatórias - leucocitose (contagem de leucócitos > 12.000) - leucopenia (contagem de leucócitos < 4.000) - contagem de leucócitos normal com mais de 10% de formas imaturas - proteína C reativa plasmática > 2 desvios-padrão acima do valor normal - procalcitonina plasmática > 2 desvios-padrão acima do valor normal Variáveis hemodinâmicas - hipotensão arterial (PAS < 90 mmHg, PAM < 70 mmHg ou uma redução na PAS > 40 mmHg em adultos ou < 2 desvios-padrão abaixo do normal para a idade) - SvO2 > 70%c - índice cardíaco > 3,5 l/min-1 Variáveis de disfunção orgânica - hipoxemia arterial (PaO2/FiO2 < 300) - oligúria aguda (débito urinário < 0,5 ml/kg/h por pelo menos 2 h) - aumento na creatinina > 0,5 mg/dl - distúrbios de coagulação (RNI > 1,5 ou TTP > 60 s) - íleo (ausência de ruídos intestinais) - trombocitopenia (contagem de plaquetas < 100.000/Pl) - hiperbilirrubinemia (bilirrubina total plasmática > 4 mg/dl) Variáveis de perfusão tecidual - hiperlactatemia - diminuição do fluxo capilar Quando suspeitar? Como reconhecer? Choque não é diagnosticado pela hipotensão! Mecanismos compensatórios ( FC RVS ) taquicardia (sinal precoce) * choque “quente” (fase precoce) : pele quente, pulsos cheios e preenchimento capilar rápido estado hiperdinâmico. * choque “frio” (fase tardia) : extremidades frias, pulsos finos, preenchimento capilar lentificado, hipotensão, diminuição do DC. Quando suspeitar? Como reconhecer? Disfunções orgânicas - cardiovascular : disfunção miocárdica (edema miocárdico, alterações na fibra miocárdica, fatores depressores -> citocinas?) - pulmonar : lesão endotélio pulmonar -> edema intersticial, desequilíbrio V/Q, hipoxemia, complacência pulmonar (SARA -> “pulmão de sepse”) - renal : disfunção tubular renal (hipoperfusão renal + lesão endotelial) NTA oligúria, queda na TFG e creatinina - neurológica : alteração nível de consciência (encefalopatia séptica), fraqueza muscular e respiratória ( polineuropatia do doente crítico) Quando suspeitar? Como reconhecer? - gastrointestinal : retardo no esvaziamento, úlceras de estresse, translocação bacteriana, isquemia da mucosa - hepática : colestase ( elevação BD), TGO/TGP tocadas e icterícia sinal de pior prognóstico - hematológica : leucopenia ( pior prognóstico), anemia progressiva, plaquetopenia por consumo( infecção, drogas, CIVD) - metabólica : hiperglicemia, glicogenólise, catabolismo proteico e lipídico, aumento na secreção de insulina e na sua resistência periférica. *disfunção pulmonar e renal são mais precoces! Diagnóstico laboratorial Diagnóstico microbiológico : culturas (sangue, urina, liquor, secreções) Positividade de 30 a 50% - se longa permanência em UTI pesquisar fungos! Hemograma : alterações morfológicas dos neutrófilos, leucopenia e plaquetopenia (mau prognóstico) própria sepse, CIVD, uso de drogas, PTT Gasometria e lactato hipoperfusão, metabolismo anaeróbico, prognóstico pH, manuseio respiratório acidose metabólica deprime a função miocárdica e indica perfusão! Diagnóstico laboratorial Exames auxiliares : provas de coagulação, função renal, hepática, exames de imagem (localizar o foco da infecção) Indicadores de resposta inflamatória sistêmica – proteínas de fase aguda - Proteína C reativa (PCR) • • • • • • • Produzida pelos hepatócitos Ativa o sistema do complemento Sua secreção inicia em 4 a06h, c/ pico entre 36 e 50h (48h) Não se correlaciona c/ a gravidade da infecção Permanece elevada vários dias após a eliminação da infecção Condições não infecciosa Análise evolutiva, guiando a antibioticoterapia Diagnóstico laboratorial - Procalcitonina • Precursora da calcitonina, secretada pela tireóide • Liberação induzida por toxinas bacterianas • Elevação precoce, 2h após a endotoxemia, pico com 14h • Marcador de infecção grave e sepse • Maior sensibilidade no diagnóstico precoce de sepse* • Discrimina melhor causas infecciosas de não infecciosas • Útil na diferenciação de infecção bacteriana X viral • Melhor valor prognóstico comparado ao PCR* • Níveis > 2 ng/mL -> alto risco de sepse grave e choque séptico • Alto custo • Não é bom p/infecções neonatais * Sugerem alguns estudos, ainda não está comprovado! Diagnóstico laboratorial Ferritina • Forma de armazenamento dos íons ferro • As reservas de ferro regulam a sua produção • Síntese aumentada em processos inflamatórios • Elevação em 24 a 48h, pico em 72h e mantém-se elevada por semanas • Metabolismo do ferro alterado na sepse • Marcador prognóstico em sepse grave e choque séptico? Nova geração de biomarcadores ( marcadores de superfície celular, receptores solúveis, etc) Tratamento Abordagem inicial : medidas de suporte de vida - via aérea adequada ( suplementação c/ O2) - manutenção de respiração efetiva - ressuscitação volêmica e cardiovascular Acesso vascular adequado ( tempo estimado p/ sua obtenção em crianças é de 5 minutos) Rastreamento do foco infeccioso Terapia antimicrobiana Tratamento Terapêutica antimicrobiana BASE DA Ressuscitação volêmica TERAPÊUTICA Drogas vasoativas Terapia imunomoduladora Terapia adjuvante OBS : limites entre sepse – sepse grave – choque séptico – DMO não são claramente detectados na prática clínica! OBS : evolução crítica, na maioria dos casos, ocorre ainda fora da UTI! Tratamento Terapia antimicrobiana empírica Tratamento Ressuscitação volêmica - solução cristalóide X colóide - Carcilo et al. demonstraram melhora significativa na sobrevida de crianças portadoras de choque séptico que receberam 40mL/Kg de SF ou mais na 1ª hora de tratamento. - objetivos : restaurar a volemia com melhora do DC e da oferta de O2 tecidual. Tratamento Drogas vasoativas Tratamento Dopamina * depuração plasmática na criança é maior que no adulto e em RN menor! * induz a secreção de noradrenalina * aumento na resistência vascular pulmonar Dobutamina * não nescessita da secreção de noradrenalina p/ sua ação hemodinâmica * ausência de efeito alfa agonista * em pacientes pediátricos pode predominar o efeito beta 2 Tratamento Adrenalina * efeito adverso temido : vasoconstrição renal * RN e crianças menores são mais sensíveis ao efeito afla agonista * útil na fase inicial do choque séptico( queda na RVS e hipotensão) Noradrenalina - dose baixa : inotrópica e cronotrópica positiva + alfa agonista - dose alta : importante ação alfa vasoconstritora * comparada à adrenalina : mais propriedade alfa e causa menos arritmias. Tratamento dopamina doses crescentes não melhora dobutamina doses crescentes c/ dopamina dose baixa não melhora associa adrenalina/noradrenalina em doses crescentes Tratamento Terapia imunomoduladora - anticorpos monoclonais - anticorpos anti-FNT - antagonista de receptores de citocinas - imunoglobulinas Terapia adjuvante - corticoesteróides : doses fisiológicas por 7 dias / doses baixas de uso contínuo - NPT - bloqueadores dos receptores H2 OBRIGADA!!! Nota do Editor do site www.paulomargotto.com.br, Dr. Paulo R. Margotto Consulte: Conferência Consenso Internacional sobre Sepse Pediátrica: Definições de Sepse e Disfunção de Múltiplos Órgãos em Pediatria Autor(es): Brahm Goldstein, et al. Apresentação: Francyne Britto Funayama Isabela Medeiros Novais, Taina Oriente. Wiliam Cesar Gomes de Oliveira Dias e Paulo R. Margotto Choque séptico Autor(es): Eduardo J. Troster. Realizado por Paulo R. Margotto