A palavra motivo é usada, na linguagem comum, com o sentido de causa. O estudo dos motivos, realizado pela Psicologia, tem por finalidade determinar as causas das nossas ações. Nossas ações são causadas por duas espécies de forças: 1. As fisiológicas (fome, fadiga, doença, etc.) e; 2. As sociais (desejo de agradar às pessoas com quem convivemos). Os psicólogos adotaram a palavra motivo para designar tanto as forças sociais como as fisiológicas que levam os seres humanos a agir. A palavra motivo é usada quando nos referimos ao comportamento humano. As forças que levam os animais a agirem são denominadas impulsos ou instintos. Os primeiros estudiosos do assunto fizeram uma longa enumeração das causas que nos levam a agir. William I. Thomas, sociólogo americano, apresentou uma pequena lista dos nossos motivos, que se tornou muito conhecida. Diz ele que o adulto normal apresenta quatro desejos fundamentais: Desejo de segurança - Este é o motivo que nos leva a atender as nossas necessidades físicas, tratar da saúde, trabalhar, adquirir propriedades, etc. Desejo de resposta (ou de correspondência) - Levado por este motivo, o ser humano procura contatos sociais e sexuais. Temos necessidade de estar relacionados com pessoas cujos sentimentos, ideais, modos de pensar, etc. tenham afinidade com os nossos. Desejo de aprovação social (prestígio ou reconhecimento) - Este motivo nos leva a praticar atos que tenham a aprovação do nosso grupo social e a evitar as ações reprovadas pelo mesmo. Desejo de novas experiências - Levados por este motivo, procuramos quebrar a rotina de nossas vidas, temos prazer na aventura, em variar as nossas experiências, em fugir à monotonia. Todas as pessoas normais na nossa cultura apresentam esses quatro motivos, embora raramente com a mesma intensidade. A força dos motivos depende em grande parte do sexo e da idade da pessoa. Assim, o desejo de correspondência parece ser mais intenso na mulher que no homem, e, na adolescência, parece predominar o desejo de aprovação social em ambos os sexos. O psicólogo Abraham Maslow apresentou, também, idéias muito sugestivas sobre nossos motivos, os quais ele diz estarem organizados em uma hierarquia. Sugeriu que o homem tem alguns motivos primários, instintivos, que vão desde os inferiores até os superiores. Primeiro temos os motivos fisiológicos, como a fome; depois, os motivos de segurança, como o medo; a seguir, os motivos de amor, os de estima e, finalmente, os de auto-realização. Quanto mais baixo for o motivo, tanto mais crucial ele é para a sobrevivência. A hierarquia refere-se também à ordem de, aparecimento dos motivos no desenvolvimento do indivíduo: os motivos fisiológicos aparecem primeiro, os de auto-estima mais tarde, e a auto-realização mais tarde ainda, se porventura surgir. O ponto mais importante da tese de Maslow é que o motivo superior não aparece enquanto os que lhe ficam por baixo não forem satisfeitos. Pessoas esfomeadas arriscam a vida para conseguir alimento. Só as pessoas bem alimentadas podem se dar ao luxo de estar seguras e a salvo. Apesar de os motivos de amor serem muito fortes, se uma pessoa estiver com medo, ela pode evitar relações com outras. Reduzido o medo, os motivos de amor surgem. Quando estes estão satisfeitos, aparece o motivo de auto-estima. Uma pessoa que necessita desesperadamente amar é capaz de perder o respeito por si própria, e voltar rastejando para um tormentoso objeto de amor. A idéia é bastante sugestiva, embora existam muitas exceções a essa hierarquia, como a mãe que se lança no interior de uma casa em chamas para salvar o filho. Maslow afirma que, quando todos os motivos inferiores estiverem satisfeitos, surge, finalmente, um motivo para a auto-realização. Trata-se de um conceito difícil de descrever. Para Maslow, significa o desejo de satisfação própria, de fazer aquilo para que cada um tem habilidade. Maslow fez estudos de pessoas que considerou serem auto-realizadoras: estudantes universitários em pleno rendimento e figuras históricas como Abraão Lincoln, Albert Einstein, Eleanor Roosevelt, etc. Por enquanto, o motivo de auto-realização é considerado como uma hipótese, esperando por pesquisas futuras. Chamamos de frustração a impossibilidade de satisfazer um motivo. As pessoas bem ajustadas satisfazem razoavelmente bem cada um de seus motivos fundamentais. Muitos autores estudaram as conseqüências da frustração, e notaram, entre elas, a agressividade. Quando frustrados, manifestamos agressividade através de nossas ações, palavras, entonação de voz ou, de modo geral, através do nosso comportamento. A agressão pode ser dirigida ao agente frustrador ou pode se transferir a um substituto deste. Por exemplo, uma criança frustrada no lar pelos pais mostra-se agressiva, na escola, para com o professor. Percival Symonds, da Universidade de Colúmbia, estudou crianças de jardim da infância, durante um ano. Notou ele que as crianças amadas no lar gostavam de cooperar e eram bem ajustadas na escola, ao passo que as crianças birrentas, antagônicas, eram geralmente rejeitadas no lar, manifestando sua agressividade na escola contra os colegas ou contra o professor. Tamara Dembo, discípula de Kurt Lewin, fez um estudo experimental sobre a frustração em crianças. Observou, no comportamento de crianças frustradas, o fenômeno chamado regressão, isto é, seu comportamento não correspondia à sua idade, mas apresentava características de idades inferiores, Por exemplo, crianças de escola maternal que brincavam alegremente com um telefone de brinquedo e agiam de modo semelhante ao de um adulto telefonando (discavam, punham o fone ao ouvido, falavam, "desligavam", etc,) foram frustradas pela observadora, que lhes tomou o brinquedo e o devolveu logo depois. Muitas delas mostraram regressão no seu comportamento com o "telefoninho": levaram-no à boca, sugando-o, arrastaram-no no chão puxando-o pelo fio, enfim, brincaram com ele como o fazem crianças bem mais novas. É comum observarmos regressão no comportamento de crianças na ocasião em que nasce mais um nenê na família: chupam o dedo, voltam a molhar a cama, exigem novamente a mamadeira, pedem colo, etc. Os psicólogos têm tentado descobrir quais os motivos mais fortes na determinação do comportamento humano. Como a força relativa dos motivos poderia ser medida? Não se poderia, obviamente, usar a caixa experimental com choque elétrico usada por Warden. Carl J. Warden, da Universidade de Colúmbia, imaginou uma caixa engenhosa para medir a força relativa dos impulsos no comportamento de ratos brancos. Um rato, impulsionado pela fome, sede ou algum outro fator, é colocado em um compartimento em uma das extremidades de uma caixa comprida. Na outra extremidade está o alimento, a água ou algum outro incentivo. Entre o animal e o incentivo há uma passagem estreita em cujo soalho há uma grade elétrica que, quando tocada, dá um choque. Quanto mais forte for o impulso de um animal, mais choques ele pode tomar. o experimento mais conhecido de Warden consistiu em comparar a força relativa dos cinco maiores impulsos no rato branco. Ele permitia a um rato faminto ou sedento atravessar a grade elétrica e mordiscar o alimento ou beber um golinho de água, mas, logo em seguida, ele o recolocava na outra extremidade da caixa. Então, cada vez que o rato atravessava a grade, era trazido de volta. A força do impulso foi medida pelo número de vezes que o rato atravessou a grade num período de vinte minutos. Ele observou que os impulsos maternal, de sede e de fome diferem pouco em força, mas são definidamente mais fortes que os impulsos sexual e exploratório. Impulso Incentivo Nº de Travessias Material Ninhada de filhotes 22,4 Sede Água 20,4 Fome Alimento 18,2 Sexo Rato do sexo oposto 13,8 Exploratório Lugar novo 6,0 No estudo da força relativa dos motivos no comportamento humano, alguns métodos têm sido tentados. Daniel Starch pediu a 74 pessoas de ambos os sexos que classificassem doze motivos quanto à importância na determinação de suas ações na vida diária. Foram classificados como mais fortes os seguintes: fome, amor pelos filhos, saúde, atração sexual, ambição, prazer, conforto físico, posse, aprovação por outras pessoas. Na avaliação dos próprios motivos, há muitas possibilidades de erro, por isso os psicólogos têm procurado dados mais objetivos. Edward Lee Thorndike descobriu quanto dinheiro os americanos gastam anualmente com roupas, alimentos, seguro de vida, moradia, etc. Diversos juízes imparciais avaliaram a que desejos as várias despesas pareciam satisfazer. Dos 24 desejos, os seguintes foram considerados os mais fortes: fome, segurança, proteção contra os elementos, aprovação pelos outros e bem-estar dos outros. Vários psicólogos têm estudado este assunto, porém as listas de motivos por eles apresentadas não concordam entre si porque os motivos são difíceis de identificar e de medir. Conceito Nossos motivos estão sempre dentro de nós, embora como que adormecidos. Há fatores temporários que têm o poder de fazer com que eles se manifestem. Chamamos incentivos aos fatores externos que têm o poder de despertar um motivo. O motivo, portanto, é uma força interna, faz parte de nossa personalidade, ao passo que o incentivo é um fator externo capaz de despertar um motivo. O elogio, a censura, a recompensa e a punição são exemplos de incentivos. Em Psicologia educacional, têm sido realizados estudos sobre o efeito do emprego de incentivos na Escola, empregando-se "grupos de controle" . Assim, Clarence Leuba, observando crianças resolvendo problemas de multiplicação, estudou o efeito de vários incentivos, a promessa de chocolate, o elogio, etc., e notou que esses incentivos trouxeram grande melhora na realização das crianças, comparativamente a um grupo de crianças que resolveu os mesmos problemas sem motivação semelhante. Elizabeth Hurlock demonstrou experimentalmente como o elogio e a censura afetam a aprendizagem. William F. Book e outros verificaram experimentalmente que os alunos apresentavam grande progresso quando iam sendo informados dos resultados de seus trabalhos. Outros estudiosos notaram a importância do emprego de incentivos tanto no comportamento de animais como no de crianças e de adultos. Os industriais perceberam rapidamente que as conclusões dos psicólogos sobre os incentivos tinham valor prático para eles e efetuaram experimentos nas próprias empresas. Harry D. Kitson observou que o uso de gratificação por aumento de produção elevou em 35%, em 20 semanas, o rendimento de linotipistas em uma tipografia. O psicólogo industrial inglês Stanley Wyatt comparou três planos de salário. Operários, durante 9 semanas, receberam um salário fixo. Depois, durante algum tempo, foi usado um sistema de gratificações por produção. Finalmente, foi adotado um aumento de salário por merecimento. Os resultados foram: as gratificações por produção aumentaram a produção em 50% comparativamente ao salário fixo. Uma elevação extra de 40% acompanhou o sistema de aumento de salário por merecimento. Os incentivos financeiros nem sempre são mais fortes que outros fatores. Stanley Wyatt observou que, quando os operários executam trabalhos desagradáveis, os sistemas tanto de gratificação por produção como o de aumento de salário não funcionam. No caso contrário, quando as tarefas executadas são interessantes, a melhora chega a atingir 200%. Diversos especialistas da Universidade Harvard (entre eles, Elton Mayo e T. N. Whitehead) fizeram um estudo de motivação industrial para uma companhia americana de eletricidade. Durante vários anos, seis moças realizando ligações telefônicas foram estudadas em diferentes tipos de períodos de trabalho, de pausas para repouso, de condições atmosféricas e de planos de salário. Tanto a melhoria por períodos longos como muitos dos "arrancos" ou dos recuos temporários (quanto à produção) resultaram não de fatores físicos, como horas ou salários, mas de fatores sociais, como a atitude das moças umas para com as outras. Aprovação, antagonismo ou indiferença afetaram diretamente a produção. Um sentido de importância por ter sido selecionada para o estudo, um senso de responsabilidade para com o projeto e a congenialidade crescente entre elas causaram a melhora geral. Em outras palavras, relacionamentos humanos motivam os operários mais fortemente que incentivos financeiros e boas condições de trabalho. DORIN, Lanoy. Introdução à Psicologia. São Paulo, Ed. do Brasil, 1980. GARRETT, H. E. Psicologia. Rio de Janeiro, Ed. Fundo de Cultura, 1965. KRECH, D. & CRUTCHFIELD, R. S. Elementos de Psicologia. São Paulo, Ed. Pioneira. 1968. MOULY, G. J. Psicologia educacional. São Paulo, Ed. Pioneira, 1973. MURRAY,E. Motivação e emoção. Rio de Janeiro. Ed. Zahar, 1983. SARGENT, S. S. & STAFFORD, K. R. Ensinamentos básicos dos grandes psicólogos. Porto Alegre, Ed. Globo, 1969. I. Com que sentido os psicólogos empregam a palavra motivo? 2. Quais os quatro desejos fundamentais apresentados pelos adultos, segundo Thomas? 3. Cite os nossos motivos, observando a ordem em que aparecem na teoria de Abraham Maslow. 4. Segundo Maslow, qual é a condição para que um motivo superior possa aparecer? 5. O que significa auto-realização e quando o aparecimento desse desejo se toma possível? 6. O que chamamos de frustração e quais suas conseqüências mais comuns? 7. Em que consiste a regressão? 8. Segundo os estudos realizados, quais dos nossos motivos parecem ser os mais fortes? 9. O que os psicólogos chamam de incentivo? 10. Cite incentivos empregados: a. na escola; b. nas empresas. (Sugestão de atividades: analise, do ponto de vista dos motivos, o seguinte livro: CARNEGIE, Dale. Como fazer amigos e influenciar pessoas. São Paulo, Cia. Ed. Nacional.) Os processos básicos da vida - a produção de energia, o crescimento do corpo e a reparação de tecidos danificados - dependem de um delicado conjunto de condições químicas nas células de qualquer organismo. No homem, a temperatura não deve variar mais que uns poucos graus, a partir de um nível ótimo de 37° C, por qualquer período de tempo; o nível de água no sangue e na linfa deve ser mais ou menos constante; os componentes químicos do sangue - oxigênio, açúcar, sais, etc. - não devem ultrapassar certos limites de segurança, e o sangue não deve tornar-se demasiado ácido ou alcalino. Desde essas condições deixem de ser mantidas, ocorre uma disfunção geral e, por fim, a morte. A maior parte dos órgãos especiais do corpo funciona para manter as condições necessárias nesse mar tropical existente em nosso corpo o meio interno, como é, denominado. O fígado fornece o açúcar, os pulmões fornecem o oxigênio, os rins filtram e eliminam os produtos excedentes, etc. Contudo, o organismo vive também num meio externo, cujas condições estão mudando constantemente - as provisões de alimento esgotam-se, a água inexiste ou não está ao alcance, a temperatura oscila. Apesar dessas alterações externas, o organismo deve manter a sua estabilidade interna. Walter B. Cannon chamou esse estado interno relativamente constante de homeostase. Se as condições internas variarem além de certos limites, diz-se que existe um estado de desequilíbrio homeostático, e são postos em ação diversos mecanismos homeostáticos a fim de remediarem a situação. Alguns motivos importantes para os seres humanos são usualmente classificados como homeostáticos. Fome e sede são os exemplos mais nítidos de motivos associados a um déficit interno de substâncias necessárias às funções corporais. Em geral, as condições que geram um desequilíbrio homeostático dão origem a uma diversidade de motivos psicológicos, cujos objetivos são a recuperação ou manutenção do equilíbrio interno. Este é da maior importância para a sobrevivência biológica. Tal modelo homeostático é extremamente lógico e reveste-se de um grande impacto sobre o pensamento psicológico. Alguns psicólogos afirmam que a homeostase é, direta ou indiretamente, a base de toda a motivação humana. (MURRAY, E. J. Motivação e emoção. Rio de Janeiro, Ed. Zahar, 1983.) Existirão alguns motivos mais intensos e outros menos intensos na determinação da conduta humana? Qual será a força relativa de tais motivos? Como poderá ser avaliada a intensidade de cada motivo em particular? Haverá diferenças individuais quanto à intensidade dos motivos? Essas e outras questões semelhantes, consubstanciando o problema da medida da motivação humana, têm desafiado os psicólogos, principalmente os que se preocupam com os aspectos relativos à dinâmica do comportamento. o problema em apreço não apresenta interesse teórico apenas; afigura-se antes de extrema importância prática nos mais variados campos da atividade humana e sobretudo na escola, como já acentuamos. Sendo o conhecimento da motivação a chave do controle do comportamento humano, é de suma importância a consideração da intensidade dos diferentes motivos, para um controle mais eficiente. Hilgard (1949) é quem afirma, ao iniciar o seu discurso presidencial da American Psychological Association, na reunião de setembro de 1949, na cidade de Denver: "Nenhum problema é mais fascinante do que o da motivação humana, e nenhum está em maior carência de uma sábia solução". Motivos haveria, capazes de, em determinadas circunstâncias, adquirir sobre os demais uma predominância tal que passassem a orientar o indivíduo para certos objetivos; outros, menos intensos, raramente atingiriam graus tão elevados de dominância na determinação do comportamento. Há a considerar também o problema das diferenças individuais: certos motivos são mais intensos em alguns indivíduos; outros, em outros, na dependência da personalidade de cada um e das experiências que cada qual tenha tido. Além disso, vários indivíduos podem realizar a mesma atividade, animados por motivos diferentes; é possível, igualmente, ocorrer o inverso, isto é, agirem os indivíduos diferentemente, embora a situação motivadora seja a mesma. Cumpre lembrar aqui, entretanto, que, na maior parte das vezes, o comportamento humano não é o resultado da ação de um único motivo, mas sim de um complexo motivado r presente a cada momento no indivíduo e suscetível de alterações, em função da predominância de uns ou de outros motivos. Diríamos, então, que, se de um lado a motivação depende da personalidade de cada indivíduo e das experiências passadas de cada um, de outro lado os incentivos presentes, num momento determinado, poderão influenciar o comportamento como fatores ambientais, capazes de satisfazer os motivos correspondentes. Do conhecimento de tais fatos depende, em grande parte, a eficiência da atuação de quem aplica a Psicologia à compreensão e orientação da conduta humana. Grande número de pesquisadores, interessados no problema da avaliação dos motivos humanos, tenta resolvê-lo, a despeito da extrema dificuldade da tarefa, que se nega a uma observação direta, pois a motivação é algo que precisa ser inferido de suas manifestações no comportamento. (ANGELINI, A. L. Motivação humana. São Paulo, Liv. José Olympio Ed.; 1973.).