Universidade Federal de São Carlos
Departamento de Química
A inserção da dimensão ambiental na formação
de profissionais da área de Química
Profa. Dra. Vânia Gomes Zuin
Congresso Internacional Multidisciplinar
Humboldt Kolleg - Limits and Interfaces in Science
São Paulo - SP
Novembro - 2009
Apresentação

INTRODUÇÃO

QUESTÃO DE PESQUISA

CAMINHOS METODOLÓGICOS


RESULTADOS E DISCUSSÃO
Análise documental e das entrevistas
Razão instrumental
O slogan e a sociedade do espetáculo
Relações CTSA: dimensão ética e razão emancipatória
Questões curriculares
Formação docente
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A dimensão ambiental na formação de profissionais
- Química

As demandas relativas à inserção da dimensão ambiental – aqui
considerada em um sentido mais amplo como ambientalização curricular
– no campo da educação têm constituído um desafio incontornável para
as IES do País
 o desafio de sua introdução não se esgota nos espaços
curriculares tradicionais, mas demanda a totalidade das práticas e
políticas acadêmicas de ensino, pesquisa, extensão e gestão, ou seja, os
pilares sobre os quais se estrutura a idéia contemporânea de
universidade (ZUIN et al., 2009)
A dimensão ambiental na formação de profissionais
- Química

Dada a especificidade da formação docente em Química que - tanto
imposta pelas novas diretrizes curriculares nacionais para esse curso
(BRASIL, 2001) quanto pela realidade escolar - procura se distinguir e
criar uma identidade própria diversa daquela do curso de bacharelado, a
questão ambiental parece ainda se mostrar reduzida, fragmentada e
nebulosa, ou seja, algo muito próximo ao que Bauman (2001) acredita
fluída
 a palavra “fluidez” se apresenta como uma metáfora adequada para captar a
natureza da modernidade na atualidade, e também apropriada para a discussão do
termo “dimensão ou questão ambiental” no campo da Química, dado ser esta uma
expressão que muitas vezes parece escorregadia, evasiva e fugitiva, de uma
fragilidade que acaba por desmantelar o projeto de individualização e liberdade
A dimensão ambiental na formação de profissionais
- Química

Há poucos estudos voltados à formação de profissionais da área de
Química que se ocupem da discussão de sua dimensão ambiental, ou mais
frequentemente, do paradoxo presente no slogan da Química Verde*,
quando a noção de prevenção de poluição significa, muitas vezes, apenas
a promoção de alternativas menos perigosas de se realizar as mesmas
coisas, principalmente aquelas de caráter tecnocientífico industriais
* A Química Verde pode ser definida como “a criação, o desenvolvimento e a
aplicação de produtos e processos químicos para reduzir ou eliminar o uso e a
geração de substâncias nocivas à saúde humana e ao ambiente” (ANASTAS e
WARNER, 1998)
Risco = f(perigo, exposição)
A dimensão ambiental na formação de profissionais
- Química

Eriksen (2002) discute o conceito de Bildung** na educação superior em
Química, que implica na inclusão da dimensão ética, que vá além da
compreensão corrente das “boas práticas de laboratório” ou “gestão
visando a qualidade total”, para o questionamento: “o que seria mais
adequado a fazer e por quê?”
** Bildung: termo alemão que significa a formação do indivíduo, com ênfase na
autonomia da interioridade do sujeito, no pleno desenvolvimento das forças de
cada ser humano (GUR-ZE’EV, 2006)
Questão de pesquisa
 Quais são as compreensões acerca da dimensão ambiental presentes
no currículo e no discurso dos envolvidos – coordenadoras(es),
professoras(es),formandas(os) e demais agentes institucionais – com o
curso de licenciatura em Química de uma universidade pública brasileira
e em que medida tais concepções influenciam o processo de formação
docente?
Caminhos metodológicos

Abordagem qualitativa (ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2001;
BOGDAN; BIKLEN, 1994; CHIAZZOTTI, 2001; LUDKE; ANDRÉ, 1986)
- Sistematização crítica da literatura sobre o campo curricular de
formação docente e dimensão ambiental que considere a perspectiva
CTSA, com ênfase na sua relação com a área de Química;
- análise documental (Diretrizes Curriculares Nacionais; Plano de
Desenvolvimento Institucional, Plano Pedagógico e Estrutura Curricular
do Curso de Licenciatura em Química da universidade de interesse);
- realização de entrevistas semi-estruturadas com licenciandas(os),
docentes, e demais sujeitos vinculados ao curso, com o propósito de
investigar as representações destes sobre a inter-relação da dimensão
ambiental e as temáticas científica, tecnológica, econômica e social
- observação das práticas das(os) licenciandas(os) em aulas teóricas e
experimentais, em reuniões de grupos de pesquisas, dentre outros
contextos pertinentes
Resultados e discussão

Categorias e subcategorias estabelecidas
Razão instrumental
O slogan e a sociedade do espetáculo
Relações CTSA: dimensão ética e razão emancipatória
Questões curriculares
Formação docente
Resultados e discussão

O slogan e a sociedade do espetáculo
- Como destacado por Debord (1997), toda sociedade nas quais imperam as
atuais condições de produção, a vida (ou o que deveria ser projeto
verdadeiro desta) ocorre como uma imensa e intensa acumulação de
espetáculos, ou seja, um conjunto cada vez maior de representações, pois
“o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre
pessoas, mediada por imagens” (p.14)
- Então, para se constituir em algo merecedor de atenção, há que ser
percebido, quase que exclusivamente por meio de mídias que promovam
grande e intensa repercussão. Este recado já é percebido, em seus
variados formatos, pelas(os) estudantes do primeiro ao último ano do
curso, não exceptuando as(os) suas(seus) professoras(es) e coordenadora
Resultados e discussão

O slogan e a sociedade do espetáculo
Adesão
Crítica
Eu acho que tentar realmente ... vocês que estão trabalhando
mais com isso, tentar conscientizar o pessoal, através de
campanhas, através de palestras, como vocês têm feito. (...)
Acho que, no final, quando você faz essas coisas, você está ali,
você está no palco, nossa!!! O pessoal já
se empolga.
(Coordenadora da licenciatura)
Tipo, cada pessoa tem seu topo. Ou uma fama. (..) E não tem
topo, se um acha que ter três pós-doc pra mim é o meu topo,
então, beleza, você vai fazer o que você acha, sei-lá.
(licencianda L, 1ºano)
Mais artigo dá o prazer, dá prestígio!! É, onde seu nome
aparece, né? É quanto mais seu nome aparece... (licenciando E,
3ºano)
Quanto mais tiver no seu Lattes... Melhor você é. Assim, uma
das atividades que dá mais dinheiro... é a parte ambiental,
né? (licencianda T, 3ºano)
Resultados e discussão

Questões curriculares
- A resistência ao entorpecimento, e mesmo a sua aceitação, são dolorosos. Se
o sono restaurar o estado de semiconsciência e permitir ao sujeito a sua
recolocação na trajetória curricular padrão, então, há uma grande
possibilidade de que vença o ritual de formação característico da área da
Química. O ideal da educação pela dureza prevalece, na qual se
supervaloriza a capacidade de suportar o desconforto, a dor. Adorno
(1994) nos adverte para o fato de que “aquele que é duro contra si mesmo
adquire o direto de sê-lo contra os demais e se vinga da dor que não teve a
liberdade de demonstrar, que precisou reprimir”(p.39). Repreensão parece
ser a palavra de ordem, quando, pautado em uma razão dita nobre ou
legitima um sujeito lança mão de quaisquer meios para alcançar os
objetivos, inclusive autoritários
Também, nem é falta de vontade, porque não tem
tempo.
Seu tempo é tão restrito que você prefere
dormir... (licencianda T, 3º ano)
Resultados e discussão

Formação docente
- Historicamente, o professor sempre possuiu uma imagem pejorativa, pois era
rotulado como alguém que se afastava da esfera prática ou material, ou
seja, vivia no plano das idéias. Aqui, se verifica o inverso, a pesquisa é o
elemento formador, Bildung, o mais valorizado, que é a idéia que será
aplicada, patentiada, publicizada, “Lattescizada”
- A este respeito, Adorno (1995) destaca a transformação estrutural do
docente universitário atual, que se converte em um vendedor de
conhecimentos. A docência e seu processo formativo são então
menosprezados, pois, nem no plano das idéias, hoje, esta área parece
habitar, há um vazio. As(Os) licenciadas(os) só são valorizados quando
enfrentam processos seletivos que discriminam, atestam o seu
conhecimento em química
Resultados e discussão

Formação docente
Eu acho o diferencial do nosso curso, a carga mesmo, depois
eu vou mostrar o caderninho pra vocês, inclusive dar algumas
explicações. Se você olhar outros cursos, tem até a
dissertação da A. C., que mostra a, a situação
dos
cursos de química, nas estaduais e federais. Nosso curso é
voltado para a formação de professor, nossa preocupação
realmente é formar um bom professor. Então, nós temos
enfim, felizmente ou infelizmente, não sei te dizer, mas, por
exemplo, no último exame da pós-graduação a maioria dos
alunos aprovados e com notas muito boas foram os alunos
licenciatura. Eles dizem que os bacharéis dizem, e eles ficam
preocupados, que os bacharéis ficam dizendo que eles não têm
formação em química, que a formação deles em química é
ruim, mas eles têm, tiveram notas melhores e desempenhos
excelentes em outras unidades na USP, em Araraquara.
(Coordenadora da licenciatura)
Resultados e discussão

Formação docente
- Neste contexto, este professor de química em formação carece de uma
identidade que o qualifique como profissional. Como também destacado por
Adorno (1996), explodem os sintomas da crise de uma formação que,
atualmente, levam, quase que exclusivamente, à semiformação
(Halbbildung)
Os sintomas de colapso da formação cultural que se fazem
observar por toda parte, mesmo no estrato das pessoas
cultas, não se esgotam com as insuficiências do sistema e dos
métodos da educação, sob a crítica de sucessivas gerações.
Reformas pedagógicas isoladas, indispensáveis, não trazem
contribuições substanciais. Poderiam até, em certas ocasiões,
reforçar a crise, porque abrandam as necessárias exigências a
serem feitas aos que devem ser educados e porque revelam
uma inocente despreocupação frente ao poder que a realidade
extrapedagógica exerce sobre eles (...)
Considerações finais


A dimensão ambiental parece não caber às(aos) licenciandas(os), pois
estas(es) não possuem o reconhecimento e valorização de sua profissão. No
interior deste curso, a pesquisa parece ser o elemento formador por
excelência, especificamente nas áreas consideradas duras. A maximização
da produção assume um papel de destaque, pois o conhecimento convertese em patentes ou artigos, de preferência de grande impacto, que põem em
evidência aqueles que têm mais produtos, como também colocam na
berlinda os pesquisadores que não os possuem em um número tido como
satisfatório
Este mecanismo de mercantilização do trabalho docente e discente,
inebriante, vicioso e altamente competitivo, é imediatamente entendido já
nos primeiros meses do curso de licenciatura em Química. Ressalta-se que,
muito facilmente, os competidores se tornam em inimigos a serem
combatidos. Claro está que tal modelo produtivo e formativo não toca
apenas àqueles que pertencem ao grupo investigado, mas, para estes
sujeitos, os modi operandi têm um grande peso e uma forte tradição
Considerações finais


Há lampejos que indicam um processo formativo capaz de gerar a crítica e
a emancipação, em um movimento de resistência àquilo que se coloca na
semiformação. As(os) licenciandas(os), em alguns momentos, têm a
capacidade de perceber que falta algo, mas que nem sempre o curso, por si
só, pode e deve dar conta. Entretanto, nesta busca pela melhoria, tanto
as(os) licenciandas(os) quanto a coordenadora reclamam uma modificação
do currículo, pois acreditam que o curso necessita de reformulação. Para
isso, solicitam a inclusão de mais disciplinas do grupo técnico-conceitual
químico
As reflexões acerca da incorporação da dimensão ambiental à formação
docente emancipatória – para além dos princípios da emergente Química
Verde – apontam para a importância de se repensar coletivamente, analisar
criticamente a literatura e documentos curriculares, por meio da discussão
das complexas problemáticas socioambientais atuais e da apropriação de
uma visão epistemológica contemporânea com relação à produção do
conhecimento e empreendimento tecnocientífico
Considerações finais

Porém, qual é o real potencial de transformação de uma nova filosofia
voltada a práticas ambientalmente corretas (Química Verde) para o curso
de licenciatura em Química? Em que medida a dimensão ambiental
extrapola o slogan formativo? Como evitar a semiformação de
professoras(es) de Química, saindo da denúncia fácil e simplificadora de
que ela é um produto da racionalidade técnica e cientificista? Quais
caminhos construir? A mim, parece mais produtivo um processo de
ambientalização curricular ou construção de uma racionalidade alternativa
que nasça no interior do curso, que pode e deve ocorrer lenta e
inexoravelmente
Obrigada
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