UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA CAPITAL SOCIAL E PADRÕES DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICO-SOCIAL EM IJUÍ - RS DEJALMA CREMONESE Prof. Dr. Marcello J. Baquero Orientador Porto Alegre, 2006 1. OBJETIVOS 1.1. Geral: Analisar os níveis de participação políticosocial em âmbito local ao tratar, especificamente, do município de Ijuí – Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. 1.2.Específicos a) b) c) d) e) f) Tratar da análise da participação como pressuposto básico da democracia, fundamentada na teoria democrática, bem como avaliar os déficits da participação no contexto da democracia latinoamericana e brasileira; Estudar a variável participação na transição da cultura política para o capital social; Avaliar os limites da participação na cultura política brasileira; Revisar os estudos que tratam da participação político-social ao nível local, tendo como objeto de estudo o município de Ijuí, considerando seu passado histórico e sua cultura política, bem como efetuar a abordagem conceitual das principais matrizes da cultura política (coronelismo, movimento integralista e trabalhismo); Apresentar a Cotrijuí, o Movimento Comunitário de Base (MCB) e a FAFI/Fidene/Unijuí como exemplos de capital social, instituições nascidas do espírito associativo e da participação da população ijuiense, bem como apresentar dados que comprovam a evolução do comportamento político e do capital social da sociedade ijuiense a partir do resultado comparativo dos surveys de 1968 e 2005. Analisar os dados e comparar a evolução do comportamento político e do capital social da sociedade ijuiense 2. A TESE DO TRABALHO Comprovar o declínio das manifestações de participação político-social e do capital social (associativismo, participação cívica comunitária, confiança interpessoal e institucional) no município de Ijuí-RS nas últimas décadas. 3. COLETA DE MATERIAL (METODOLOGIA) 3.1. Pesquisa bibliográfica (fundamentação teórica) Concepções gerais sobre a democracia e participação Teoria democrática (participativista: Macpherson (1978) e Pateman (1972) versus institucionalistas: Dahl (1997; 1989), Schumpeter (1961) e Sartori (1994) Cultura política: Almond e Verba (1965) Capital social: Tocqueville (1962) Putnam (2002) Cultura política brasileira: Oliveira Vianna (1955; 1956) - insolidarismo Sérgio Buarque de Holanda (2000) O homem cordial Victor Nunes Leal (1975) coronelismo Cultura política do RS: O coronelismo e a Revolução Federalista: Joseph Love (1975) e Loiva Otero Félix (1987) Sociedade, política e cultura de Ijuí A evolução social e econômica: A cultura política (O coronelismo, o Integralismo, o trabalhismo): Exemplos de capital social em Ijuí Cotrijuí FAFI/Fidene Movimento Comunitário de Base (MCB) 3.2. Pesquisa de Campo: Aplicação e análise dos resultados do survey aplicado na população urbana de Ijuí acima de 16 anos entre os dias 02 de maio a 31 de agosto de 2005 (400 entrevistas) – coordenação do professor Marcello Baquero. Comparação longitudinal entre os dados do survey 2005 com um survey aplicado no mesmo município em 1968 pelo Núcleo de Pesquisas e Documentação da Política RioGrandense – NUPERGS, tendo como coordenador o professor Hélgio Trindade. Indicadores econômicos, sociais e políticos: IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística FEE - Fundação de Economia e Estatística TRE/RS - Tribunal Regional Eleitoral, TRE – RS). Foram efetuadas pesquisas ainda no Museu Antropológico Diretor Pestana – MADP, e, nos jornais locais, principalmente o Correio Serrano Entrevistas pessoais (escritas e orais) com lideranças comunitárias, políticas e educacionais de Ijuí, CAPÍTULO 1 - PARTICIPAÇÃO COMO PRESSUPOSTO ESSENCIAL DA DEMOCRACIA 1.1 Origem e evolução da democracia 1.2 Participação: concepções gerais 1.3 Debate da participação na teoria democrática (participativistas X institucionalistas) 1.4 Democracia formal e participação restrita na América Latina 1.5 Autoritarismo democrático no Brasil (o caso das MPs) 1.6 Migração partidária no Brasil CAPÍTULO 2 - PARTICIPAÇÃO: DA CULTURA POLÍTICA AO CAPITAL SOCIAL 2.1 Cultura política Pode ser definida por normas, valores e crenças - dimensões subjetivas - que definem a situação na qual a ação política se dá. Assim, a cultura política fornece os instrumentos metodológicos necessários para uma compreensão sistemática de orientações e comportamento político). Os diferentes tipos de cultura política: a paroquial, a subjetiva e a participativa. 2.2 Capital Social: origens e evolução do conceito Na tradição da Ciência Política: de Alexis de Tocqueville a Robert Putnam CAPÍTULO 3 - PARTICIPAÇÃO NA CULTURA POLÍTICA BRASILEIRA 3.1 “Males de origens” (patrimonialismo, clientelismo, messianismo...) 3.2 Insolidarismo de Oliveira Vianna (individualismo, desconfiança, ausência de solidariedade social e hábitos de colaboração e cooperação entre as famílias, ausência do espírito público, interesse particular ao invés do interesse coletivo) 3.3 Homem cordial de Sérgio Buarque de Holanda (O aspecto conciliador das elites, preocupado em atrair simpatias pessoais, em reforçar alianças de interesse particulares, familiares, oligárquicas). 3.4 Coronelismo: teorização e prática (foi um sistema político nacional baseado na “troca de favores” entre o governo central e os detentores do poder local) 3.4.1 Revolução Federalista rio-grandense: uma guerra intraclasse (Chimangos e maragatos = coronel burocrata responsável pelo aliciamento dos eleitores com o objetivo de obter os votos necessários para o seu partido, que era, evidentemente, o mesmo partido do Estado, o republicano, no caso do RS) CAPÍTULO 4 - PARTICIPAÇÃO NAS MATRIZES DA CULTURA POLÍTICA DE IJUÍ 4.1. Conhecendo o objeto de estudo: (Localização, sociedade, história, economia, cultura e política) 4.2. Matriz Coronelista: Augusto Pestana e Antônio Soares de Barros (o Cel. Dico) - Fidelidade partidária ao Chefe do Estado (Republicanos) - Autocracia – Mandonismo local de longa duração: 13 anos Augusto Pestana e 22 anos Cel. Dico = 35 anos) - Violência política (capangas) 4.2. Matriz integralista: os camisas-verdes (tentativa de oposição ao coronelismo) 4.3. Matriz trabalhista Ijuí – dados gerais Área total do município: 689.1 km²; Área urbana: 31,7 km² (1990). População residente: 78.990 habitantes (2005) Homens: 38.083 (48,1%) Mulheres: 40.378 (51,1%). Rural: 11.064 pessoas, (14% da população); Urbana: 67.397 pessoas, (86% da população) PIB per capita: R$ 9.800,00 Fonte: IBGE e FEE Coronéis Augusto Pestana e Antônio Soares de Barros (Cel. Dico) Homens, mulheres e crianças integralistas de Ijuí CAPÍTULO 5 - PARTICIPAÇÃO POLÍTICO-SOCIAL E CAPITAL SOCIAL EM IJUÍ (1960- 2005) Experiências de Capital Social na década de 60 - A Cotrijuí - A FAFI/Fidene/Unijui - O Movimento Comunitário de Base (MCB) Comportamento político e capital social (2005) os resultados dos dados da pesquisa realizada em maio/agosto de 2005 com 400 pessoas residentes na zona urbana de Ijuí acima de 16 anos, distribuídos em 11 bairros da cidade. Escolaridade do ijuiense (%) Total 1968 2005 Sem instrução/ menos de um ano 12,3 2,0 Fundamental incompleto 70,8 53,5 Fundamental completo 4,6 7,3 Médio incompleto 1,9 16,0 Médio completo 5,7 7,0 Superior 4,7 14,3 N= 367 400 Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005 Faixa de renda per capita mensal do ijuiense 2005 (%) Total Até 1 Salário Mínimos 51,6 De 1 a 3 Salário Mínimos 43,5 De 3 a 5 Salário Mínimos 2,9 De 5 a 10 Salário Mínimos 1,3 Mais de 10 Salário Mínimos 0,6 N=400 Fonte: Dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. A religião do ijuiense 1968-2005 (%) Total 1968 2005 Católica 73,6 61,8 Protestantes (evangélicos luteranos) 16,9 5,8 Evangélicos (pentecostais) - 23,0 Ateu 1,1 2,5 Espírita 1,9 0,5 Não respondeu 0,2 4,0 Outros 6,3 2,5 N= 367 400 Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005 Cor ou etnia do ijuiense 2005 (%) Total 1968 2005 Branca 84,7 80 Negra 4,1 4,3 Morena/Parda/Mestiça 8,4 15,1 NR 2,8 0,6 N= 367 400 Fonte: Dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Participação em organizações ou grupos sociais 2005 (%) Total Associação religiosa - Igreja e grupo de jovens 12,5 Associação cultural e recreativa 8,3 Círculo de Pais e Mestres (escola) 2,3 Associação política - partido politico 2,0 Associação sindical – sindicato 2,0 Associação esportiva – time de futebol 1,8 Associação de moradores 1,5 Associação educacional - grêmio e dir. acadêmico 0,5 N=400 Fonte: Dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Confiança em instituições sociais e políticas 2005 (%) Total Confia muito Confia pouco Não confia Família 90 7,5 2,0 Igreja 60,8 27,8 10,5 Vizinhos 43 41 14,8 Judiciário 25,5 51,3 20,3 Associações comunitárias 23,8 50,8 19,5 Meios de Comunicação Social 21,8 54,3 20 Polícia 20,8 59 19,5 Sindicato 17,5 49,5 25,8 Governo Municipal 13 50,5 35 Governo Federal 10 53 36 Governo Estadual 5,3 54,5 38 Câmara de Vereadores 4,8 53,8 40 Partidos Políticos 3 43,3 51,5 Assembléia Legislativa 3 53 41,3 Congresso Nacional 1 50,8 47 N=400 Fonte: Dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. CAPÍTULO 6 - ANÁLISE DA VARIAÇÃO DO CAPITAL SOCIAL DE IJUÍ Diminuiu a participação na resolução dos problemas locais 1968 2005 Sim 91,8 32,8 Não 6,3 65,8 NS/NR 1,9 1,5 Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005 Uma sociedade onde impera o familismo amoral de Banfield “Geralmente você não encontra parceiros e sim concorrentes [...]. Ijuí trabalha em grupos familiares fechados e, particularmente, tive muita dificuldade de entrar neste grupo quando cheguei aqui em anos atrás”. Liderança que não se identificou Uma sociedade tipo bonding Ou seja, entre os três tipos de capital social desenvolvidos no trabalho (bonding, bridging e linking) a sociedade ijuiense pode ser considerada do tipo bonding, (relações para dentro – laços fortes), onde práticas de solidariedade dão-se apenas entre pessoas dos mesmos laços étnicos, ou grupos familiares fechados. Declínio na participação eleitoral Percentual de Comparecimento às urnas - eleições municiapis de Ijuí (1972-2004) 100 97,2 95 92,6 90 90 86,4 87,5 85,2 86,1 86,1 Percentual de Comparecimento 85 80 75 1972 1976 1982 1988 1992 1996 2000 2004 Dados elaborados pelo autor a partir de Pesquisa no TRE-RS Declínio das manifestações da política convencional Participação em reuniões políticas (%) Total 1968 2005 Sim/Já participou 27,8 24,3 Não 72 75 367 400 N= Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Participação em partidos políticos (%) 1968 2005 Sim/Já participou 20,5 18,3 Não 79,4 81,5 367 400 Total N= Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Participação em comícios (%) Total 1968 2005 Sim/Já participou 59,4 40,1 Não 38,7 59,5 367 400 N= Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Interesse por política (%) Total 1968 2005 Sim 29,7 26 Mais ou Menos 31 36 Não 38,7 37 N= 367 400 Fonte: Trindade (1968) e dados elaborados pelo autor a partir da Pesquisa: Desenvolvimento Sustentável e Capital Social - NIEM/ NUPESAL/ UNIJUÍ - 2005. Estagnação do PIB e declínio no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) Evolução da participação econômica da RNC no PIB do RS Desempenho econômico histórico do RNC: % do RS (1984-2004) 4 3,55 3,5 2,73 3 2,5 2,37 2,73 2,25 2,43 2,63 2 1,5 1 0,5 0 1984 1989 1994 1999 2002 2003 2004 Fonte: Luis Roque Klering (Disponível em www.terragaucha.com.br) Evolução do IDH de Ijuí (1970-1991) 1 0,951 0,926 0,9 0,8 0,7 0,755 0,742 0,692 0,651 0,6 0,808 0,754 0,618 0,536 0,544 0,577 1970 1980 0,5 1991 0,4 0,3 0,2 0,1 0 Educação Renda Longevidade Geral Municipal Fonte: PNUD/Atlas de Desenvolvimento Humano (www.pnud.org.br) Evolução do IDH de Ijuí (1991-2000) 1 0,9 0,926 0,847 0,8 0,742 0,676 0,7 0,742 0,72 0,803 0,748 0,6 1991 0,5 2000 0,4 0,3 0,2 0,1 0 Educação Renda Longevidade Geral Municipal Fonte: PNUD/Atlas de Desenvolvimento Humano (www.pnud.org.br) Colocação do PIB de Ijuí em relação aos demais municípios do RS - Ordem Crescente. Evolução da posição de Ijuí (1994-2004) 35 31 30 25 26 30 26 27 22 20 15 10 5 0 1994 1999 2001 2002 2003 2004 Ijuí - colocação entre os municípios do RS Evolução do PIB per capita de Ijuí e Panambi RS (1996-2003) Comparação PIB Per Capita R$ (1996-2003) 18.000 16.745 16.000 14.000 12.054 12.000 10.000 8.000 6.000 8.867 10.077 9.713 8.475 7.596 7.039 6.216 5.750 5.181 4.054 9.856 Ijuí 7.776 7.696 Panambi 4.285 4.000 2.000 0 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Fonte: Fundação de Economia e Estatística (FEE) Núcleo de Contabilidade Social Pouca alternância no poder local: predomínio de um só partido nos últimos 25 anos. Personalismo político (Mânica, Perondi, Burmann e Heck). Carência de novas lideranças políticas Enfraquecimento dos partidos mais à esquerda no espectro político. Baixa confiança interpessoas: (27% confiam, enquanto que 71,5% dos entrevistados responderam que não se pode confiar nas pessoa) Baixa confiança dos cidadãos ijuienses em relação às instituições políticas. Com 97,8% de pouca confiança e nãoconfiança, o Congresso Nacional, Partidos Políticos com 94,8%... No que se refere à participação em grupos e organizações sociais, 32,5% responderam que participam, enquanto que a maioria (67%) não participa de grupos ou organização social. Conclusões... A partir da análise comparativa dos resultados dos surveys aplicados no município, 1968 e 2005; das opiniões de lideranças locais; da análise do desempenho econômico e de IDH (IBGE e FEE) e da evolução da participação eleitoral (TRE-RS) é possível comprovar a hipótese geral do trabalho de tese. Isto é: houve um declínio de manifestações cívicas com a diminuição da participação política convencional (reuniões partidárias, partidos políticos, comícios, eleições); altos índices de desconfiança (interpessoal, instituições políticas); redução do associativismo e cooperação (individualismo, familismo amoral, baixa participação comunitária), além da estagnação econômica e da qualidade de vida – estas são algumas manifestações do impacto negativo do capital social de Ijuí que esta tese procurou evidenciar no decorrer de suas páginas. Agradecemos a atenção !!!