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INÍCIO DO PRAZO PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DE
SENTENÇA CONDENATÓRIA:
ANÁLISE DOS ARTIGOS 475- B E 475- J DO CPC
Janete Ricken Lopes De Barros*
Introdução
Trata o presente artigo da discussão acerca da contagem do prazo de quinze dias para
cumprimento voluntário de sentença condenatória de quantia certa, interstício inserido
no nosso sistema processual com o advento da Lei 11.232/2005, bem como da questão
da necessidade ou não de intimação pessoal do devedor para o cumprimento da
obrigação.
Com o trânsito em julgado da sentença, a sistemática processual estabeleceu dois
caminhos a seguir: o art. 475-A, na hipótese de sentença ilíquida, ou o art. 475-B,
caput, para sentença que dependa apenas de cálculos aritméticos.
A ênfase da discussão doutrinária está centrada no comando do art. 475-J do CPC, o
que será devidamente analisado no presente artigo, em consonância com os demais
dispositivos da reforma do cumprimento de sentença e dos princípios e garantias
constitucionais.
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2. Condenação ao pagamento de quantia certa:
A exigibilidade do cumprimento de sentença condenatória de quantia certa se dá com o
trânsito em julgado, contudo para que o título goze de liquidez é necessário que o
devedor saiba exatamente o valor a ser depositado.
Então, vejamos na prática um exemplo: uma sentença que em seu dispositivo condena
o réu ao pagamento do valor de R$ 50.000,00 à título de danos materiais, valor a ser
corrigido a partir da data do evento danoso, acrescido de juros de mora, correção
monetária, honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, bem
como das custas processuais.
Esse réu hipotético toma conhecimento, por meio de seu advogado particular
constituído nos autos, de que a sentença transitou em julgado na 2ª instância, bem
como que seu prazo para pagamento voluntário é de quinze dias e começou a fluir.
O devedor, a fim de não arcar com a incidência da multa prevista no art. 475-J do
CPC, procura imediatamente a Secretaria da Vara na qual foi proferida a sentença para
efetuar o depósito judicial. Os autos ainda não retornaram à Vara de origem, perguntase: qual o valor da guia a ser expedida para a realização do depósito? Quem deverá
informar o valor? O escrivão? O devedor? O magistrado?
Diante dessa questão que ora se coloca, torna-se de máxima importância dar especial
atenção ao caput do art. 475-B do CPC, a saber:
Quando a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo
aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença, na forma do art. 475-J desta
Lei, instruindo com a memória discriminada e atualizada do cálculo.
O art. 475-J, assim estabelece:
Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação,
não o efetue no prazo de quinze (15) dias, o montante da condenação será acrescido de
multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o
disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
Extrai-se, a partir do exemplo acima e da análise dos artigos, que o credor deverá
requerer o cumprimento da sentença, apresentando os cálculos aritméticos, para que o
título executivo judicial passe a gozar do requisito da liquidez.
Vejamos o que diz Araken de Assis [01] a respeito
O art. 475-J, caput, não estabelece qualquer procedimento especial para se realizar o
depósito. Mas, como o prazo de espera flui a partir do momento em que o crédito se
torna exigível, e a exigibilidade assenta na liquidez, presume-se que o executado
conheça precisamente o valor da dívida.
Ousa-se discordar de Araken, para sustentar que o procedimento para realizar o
depósito está sim previsto e é o estabelecido no art. 475-B, porque no momento em
que vivemos de estabilização da Democracia e do desenvolvimento de uma cultura
realmente democrática no Brasil, não é possível se falar em presunção do executado
em saber precisamente o valor da dívida. Nessa linha de argumentação, caberá ao
credor indicar o valor.
Ressalta-se, ainda, que a aplicação da multa prevista no art. 475-J é momento posterior
ao decurso do prazo de pagamento voluntário, quer seja, ocorrerá com o início dos atos
executórios, que consistem na expropriação de bens do patrimônio do devedor para
garantia do crédito do credor.
"A pretensão a executar pressupõe o inadimplemento da condenação", concorda-se
agora com as afirmações de Araken de Assis [02].
Estabelecido que o credor deverá fornecer o valor para que viabilize o pagamento por
parte do devedor, permanece a questão: a partir de quando começará a fluir o prazo de
quinze dias para o pagamento voluntário do débito?
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3. Necessidade de intimação do devedor
Apresentado o valor do débito pelo credor, art. 475-B, ou liquidado o valor da
condenação, art. 475-A, para o início da contagem do prazo de quinze dias deverá o
devedor ser intimado, obedecidas às regras processuais previstas para as intimações, a
teor dos artigos 234 e seguintes do CPC:
Art. 234: Intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do
processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa.
É tão certo que o legislador não quis suprimir atos de intimação que, em caso de
eventual demora na realização da intimação do devedor, previu a seguinte situação
para a execução de título extrajudicial:
Art. 652 do CPC: O executado será citado para, no prazo de três (3) dias, efetuar o
pagamento da dívida.
...
§ 4º A intimação do executado far-se-á na pessoa de seu advogado; não o tendo será
intimado pessoalmente.
§ 5º Se não localizar o executado para intimá-lo da penhora, o oficial certificará
detalhadamente as diligências realizadas, caso em que o juiz dispensará a intimação ou
determinará novas diligências.
Vale lembrar que é obrigação das partes manterem seus endereços atualizados nos
autos, sob pena de, em não fazendo, arcar com as implicações legais. Vejamos o teor
do art. 238 do CPC:
Art. 238. Não dispondo a lei de outro modo, as intimações serão feitas às partes, aos
seus representantes legais e aos advogados pelo correio, ou, se presentes em cartório,
diretamente pelo escrivão ou chefe de secretaria.
Parágrafo único. Presumem-se válidas as comunicações e intimações dirigidas ao
endereço residencial ou profissional declinado na inicial, contestação ou embargos,
cumprindo às partes atualizar o respectivo endereço sempre que houver modificação
temporária ou definitiva.
Agregados aos dispositivos das intimações constantes no sistema processual, estão os
princípios constitucionais, dentre eles, o do devido processo legal e da segurança
jurídica.
Assim, não há que se falar em contagem de prazo com início nas instâncias superiores,
quando sequer os autos retornaram à Vara de origem, local definido como competente
para processar os atos de execução, acrescido da informação do valor a ser depositado,
necessários ao cumprimento da sentença.
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4. Quem deverá ser intimado: o devedor ou seu advogado?
A presente questão apresenta necessidade de maiores discussões na comunidade
jurídica, principalmente ao se tratar de devedor assistido pela Defensoria Pública.
Resgatando-se o exemplo criado no item 2 dessas considerações, o devedor que
procurou prontamente a Secretaria da Vara para efetuar o pagamento voluntário,
esbarrando com a questão do valor a ser depositado, o fez porque foi intimado por seu
advogado particular constituído nos autos, que tem o dever de acompanhar as
publicações no Diário Oficial, em qualquer instância e tribunal.
Convenhamos, essa não é a realidade brasileira da maioria dos jurisdicionados.
Ademais, a parte assistida pela Defensoria Pública não precisa apresentar a procuração
geral para o foro, nos termos da Lei 1060, de 5.3.50 (Lei de Assistência Judiciária):
Art. 16.. ..
Parágrafo único. O instrumento de mandato não será exigido, quando a parte for
representada em juízo por advogado integrante da entidade de direito público
incumbida, na forma da lei, de prestação judiciária gratuita, ressalvados:
a)os atos previstos no art. 38 do Código de Processo Civil.
Transcreve-se o que reza o art. 38 do CPC:
Art. 38. A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou
particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo,
salvo para receber citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido,
transigir, desistir, renunciar ao direto sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e
firmar compromisso.
Pondera-se, então, que, no caso da parte representada pela assistência judiciária oficial,
a solução será a determinação de juntada de procuração com poderes específicos para
receber a intimação para pagamento, ou melhor exegese será a intimação pessoal do
devedor?
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5. Obrigações pessoais
Ao lado de questionarmos quem deverá ser intimado para o pagamento no
cumprimento de sentença, é importante ressaltar o que são as obrigações pessoais
tratadas no Direito Civil, que vinculam uma pessoa à outra, através das declarações de
vontade e da lei, tendo por objeto determinada prestação.
Washington de Barros Monteiro [03]entende mais completa a definição de obrigação
como sendo a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e
credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa,
devida pelo primeiro ao segundo, garantido-lhes o adimplemento através de seu
patrimônio.
Cândido Rangel Dinamarco [04] acentua que a finalidade perseguida pelo Estado na
execução "é um resultado que o próprio obrigado deveria realizar e só à falta desta
realização é que os órgãos públicos (em princípio) intervêm: nisso reside o caráter
substitutivo da atividade estatal na execução.
A obrigação, portanto, corresponde à relação de natureza pessoal, quer seja, só a
própria pessoa vinculada à relação é que está obrigada ao cumprimento da prestação.
Assim, não há que se falar em intimação do advogado, Defensor Público, ou
publicação em Diário Oficial, para o pagamento de condenação.
Caso a intimação para o pagamento se torne entrave para o cumprimento da sentença,
o nosso ordenamento jurídico contempla diversos dispositivos, a exemplos dos
colacionados nessas linhas, para fazer valer o poder do Estado, tudo com respeito às
garantias processuais e constitucionais.
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Conclusões
A Lei 11.232/2005 passou a tratar o processo de execução de título judicial como
apenas uma fase distinta da cognição de um mesmo processo, diante da unidade da
relação jurídica e de que a função jurisdicional não se esgota com a sentença, porque
dependerá de atos que serão concretizados na fase executória, dispensando-se inclusive
a citação, o que não significa dizer que o devedor não terá que ser intimado para
efetuar o pagamento da condenação.
Ressalta-se que a Constituição Federal garante a todos o acesso à justiça, o que se
realiza através do devido processo legal, que se encontra no patamar de garantia
fundamental, na base dos demais princípios constitucionais, proporcionando em
conjunto a busca de resultados justos.
O princípio do acesso à ordem jurídica, ao lado do princípio do devido processo legal,
formam no entender de Mendonça [05]
fundamento básico de todo o sistema processual de efetivação das normas e de
proteção dos direitos constitucional e infraconstitucionalmente prescritos. Ambos
emergem como garantias substanciais da realização do Estado Democrático de Direito
ao assegurarem para todos, indistintamente, a possibilidade de perseguir pela via
judiciária, desenvolvida por autoridade estatal competente, com base no princípio do
contraditório, através de instrumentos legais, dialéticos, igualitários e eficazes, a
observância dos seus direitos.
É importante ressaltar que fundamental ao processo é assegurar a participação das
partes para, querendo, exercerem as faculdades que a lei lhes coloca à disposição, sem
dificultar com a imposição de formas desnecessárias, bem como, sem suprimir as
garantias processuais, alicerces da segurança jurídica e do devido processo legal.
Assim, afirma-se que cabe ao credor fornecer o cálculo aritmético do seu crédito, a
teor do art. 475-B do CPC, e, em seguida, o devedor deverá ser intimado pessoalmente
para que se inicie a contagem dos quinze dias para pagamento voluntário da dívida.
Somente após o decurso do interstício de quinze dias, sem o cumprimento da
obrigação, que será aplicada a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC e, a partir
desse momento processual, se darão início aos atos de execução, consubstanciados na
penhora e demais constrições legais.
O elo de ligação do Processo Civil com a Constituição está na observância aos
princípios que se compatibilizem com a realidade e cultura da sociedade. É o que
afirma Pedro Miranda de Oliveira [06]
O direito processual tem, dessa forma, sua base no direito constitucional, que lhe fixa
os fundamentos essenciais, mormente quanto ao direito de ação e de defesa e ao
exercício da jurisdição, função soberana e indelegável do Estado. Ajustando-se essa
afinidade à circunstância de que são os princípios que distinguem e revelam os
sistemas processuais, conclui-se que, por trás dos princípios que informam as normas
processuais, sempre está um comando constitucional. Interligam-se, dessa forma, os
preceitos constitucionais e os princípios que informam o processo, razão pela qual
muitas vezes se identificam nos dois ramos do direito os mesmos princípios.
O sincretismo processual é uma tendência moderna do processo civil, que diz respeito
a essa relação entre o processo de conhecimento e o processo de execução, se
contrapondo ao princípio da autonomia, efetivado através da Lei 11.232/2005, que
trouxe agilidade à prestação jurisdicional.
Contudo, não podemos, agarrados na falsa idéia de uma rápida prestação jurisdicional,
tornar o processo civil um túnel do terror, no qual não se sabe qual o próximo susto se
vai tomar.
Acima de tudo, devemos preservar o acesso à justiça, o devido processo legal e a
segurança jurídica, para podemos, ao final, afirmarmos que estamos construindo uma
cultura verdadeiramente democrática no nosso país.
Diante das ponderações levantadas, da doutrina e legislação analisadas, conclui-se que
as alterações implementadas pela Lei 11.232/2005 ao processo de execução de título
judicial, modificou a sistemática processual, sem contudo abalar as bases processuais
garantidas na Constituição Federal.
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5. Referências Bibliográficas
ASSIS, Araken de. Cumprimento de Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
Constituição da República Federativa do Brasil– obra coletiva de autoria da Editora
Revista dos Tribunais. 13 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil IV. 2. ed.
São Paulo: Malheiros Editores, 2004.
MENDONÇA, J.J. Forentino Santos, Deluse Amaral Rolim Florentino. Instrumentos
para a efetivação do acesso à justiça. Recife: Bagaço, 2005.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Vol. IV. São Paulo:
Saraiva, 2006.
NEGRÃO, Theotônio e GOUVÊA, José Roberto F. Código de Processo Civil e
legislação processual em vigor. 39. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
OLIVEIRA, Pedro Miranda de Constituição, Processo e o Princípio do Due Process Of
Law. Texto extraído do Direito Civil e Processo, Estudos em Homenagem ao
Professor Arruda Alvim, 2008.
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Notas
ASSIS, Araken de. Cumprimento de sentença, 2007, p. 212.
Idem op. cit., p. 211.
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, vol. IV, 2006, p. 8.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, Vol. IV,
2004, p.53.
MENDONÇA, J.J. Florentino Santos. Instrumentos para efetivação do acesso à justiça.
2005, p. 161.
OLIVEIRA, Pedro Miranda de. Constituição, Processo e o Princípio do Due Process
Of Law. p. 1096.
* Analista Judiciário. Diretora de Secretaria da 1ª Vara Cível de Samambaia do
TJDFT. Especialização em Processo Civil. Mestranda em Direito Constitucional do
IDP.
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12567
Acesso em: 22 abr. 2009.
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