ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO I ÇA TRI B U L DE JU ST NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. FRAUDE EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA GERIDA DE FATO POR SERVIDORES MUNICIPAIS MEDIANTE INTERPOSTAS PESSOAS. Viola os princípios administrativos da impessoalidade, moralidade e legalidade, contidos no artigo 37, caput, da CF, a contratação de empresa gerida de fato por servidores públicos concursados do ente público contratante mediante “testas-de-ferro”. Incidência específica dos artigos 9º, III, da Lei de Licitações e 152, IX, XVII e XVIII da Lei Municipal nº 1.041/90 de Estância Velha. Confissão de sócio de terem repassado a titularidade da empresa a familiares e conhecidos, incorrendo em ato previsto no artigo 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, permanecendo na administração de fato e participando de licitação com o empregador. Prática de conduta vedada independentemente de dano ao erário ou enriquecimento do agente ou de terceiros, por se tratar de ato ímprobo formal. Inexistência dos vícios previstos no art. 535 do CPC. A inconformidade da parte com a valoração conferida aos elementos probatórios não pode ser veiculada em embargos declaratórios, os quais não se prestam à rediscussão do mérito. EMBARGOS DECLARATÓRIOS DESPROVIDOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO Nº 70048531065 SEGUNDA CÂMARA CÍVEL COMARCA DE ESTÂNCIA VELHA LUIZ RAFAEL FERREIRA BARBOSA EMBARGANTE LUIS GUSTAVO FUENTES SILVA EMBARGANTE MINISTERIO PUBLICO MIRIAN GLADIS MACIEL MONTEIRO EMBARGADO INTERESSADO 1 U TRI B I ÇA PODER JUDICIÁRIO L DE JU ST ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desacolher os embargos declaratórios. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. ARNO WERLANG (PRESIDENTE) E DES. PEDRO LUIZ RODRIGUES BOSSLE. Porto Alegre, 16 de maio de 2012. DES. ALMIR PORTO DA ROCHA FILHO, Relator. RELATÓRIO DES. ALMIR PORTO DA ROCHA FILHO (RELATOR) Trata-se de Embargos de Declaração interpostos por LUIZ RAFAEL FERREIRA BARBOSA E LUÍS GUSTAVO FUENTES SILVA atacando acórdão que, nos autos da ação civil pública por atos de improbidade que lhes move o MINISTÉRIO PÚBLICO, deu parcial provimento ao recurso do Parquet. Em suas razões recursais, afirmam que não restaram comprovados os fatos narrados pelo Ministério Público, sobretudo o prejuízo ao erário. Ressaltam o depoimento do embargante Luis Gustavo Fuentes Silva. Aduzem que o desconhecimento dos acusados relativamente à ilicitude do procedimento adotado por eles e pela comissão licitante não pode ser considerado dolosa. “O desconhecimento está mais para 2 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO I ÇA TRI B U L DE JU ST NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL modalidade culposa”. Defendem ser presumível a boa-fé, ao contrário da má-fé, que deve ser comprovada, o que não ocorreu na espécie. Apontam contradição no julgado, visto que não demonstrado o dolo dos agentes, ainda que genérico, tampouco o prejuízo ao erário. Houve, ainda, aprovação das contas municipais pelo Tribunal de Contas do Estado no período em comento. Restou indevidamente presumido o dolo genérico. Buscam o provimento dos embargos, em razão de contradição, concedendo-se-lhes efeitos infringentes para negar provimento ao apelo do MP. É o relatório. VOTOS DES. ALMIR PORTO DA ROCHA FILHO (RELATOR) Os embargos de declaração são oponíveis quando há na decisão os vícios previstos no art. 535 do CPC 1, ou seja, omissão, obscuridade ou contradição. Neste sentido farta doutrina e jurisprudência, inclusive das Cortes Superiores. Tratando do tema o Professor Vicente Miranda, reportando-se ao jurista Alberto dos Reis, leciona: “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento, ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apóiam para sustentar sua pretensão”. (Embargos de Declaração no Processo Civil Brasileiro, ed. Saraiva, 1990, pág. 54) 1 Art. 535. Cabem embargos de declaração quando: I - houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição; II - for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal 3 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO I ÇA TRI B U L DE JU ST NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL Os embargos não servem para rediscutir matéria já apreciada, quando não estão presentes as máculas retro referidas. No caso concreto, não se configuram os vícios alegados. Reproduzo trechos que isto demonstram: “Inicialmente, ressalto que os tipos contidos no artigo 10 da Lei retro reproduzido, dispensam a demonstração de dolo do agente, sendo possível a imputação na forma culposa: Nesse sentido, a recente e pacificada jurisprudência do STJ: (...) E na forma do art. 11, para a configuração de “ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração”, basta que “viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições”. Não há necessidade de dano efetivo ao patrimônio público. Nesse sentido, aliás, é a expressão “se houver” contida no inciso III, do art. 12. Na hipótese do art. 11, deve a conduta imputada ser praticada com dolo. A espécie culposa está prevista expressa e exclusivamente no art. 10 do diploma, não se podendo conferir interpretação ampliativa ao dispositivo subsequente se este não foi o intento do legislador. Por outro lado, o dolo reclamado é genérico, não sendo exigida a comprovação de intenção específica de violar princípios administrativos. O STJ já firmou posição sobre o tema: (...) Consoante cópias dos atos societários da Option Informática Ltda. (fls. 82 a 94), constituída em 01/07/2003, a empresa era inicialmente composta por Luiz Rafael Ferreira Barbosa e Luiz Gustavo Fuentes Silva, ambos sócios-gerentes. Em 27/01/2004, retiraram-se, cedendo as cotas às suas mães, Nancy Ferreira Barbosa e Maria Miriam Fuentes Silva. Em segunda alteração social, em 16/08/2004, houve nova modificação do quadro societário, excluindo-se da sociedade Nancy Ferreira Barbosa e Maria Miriam Fuentes Silva, que cederam as cotas a Karina Koch e João Carlos Koch Júnior. 4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO I ÇA TRI B U L DE JU ST NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL Por fim, em 19/01/2005, regressou Maria Miriam Fuentes Silva à sociedade na qualidade de sócia-gerente, desta vez acompanhada de Luiz Eduardo Ferreira Barbosa, em substituição aos predecessores. Em depoimento pessoal prestado nestes autos, o réu Luiz Rafael, ao ser indagado sobre o funcionamento da empresa Option, afirmou (fls.659/ 660): (...) O réu confessou claramente que as sequências de transferências da titularidade da empresa ocorreram apenas no plano formal, em razão de dívidas, continuando os ex-sócios como proprietários de fato, dirigindo a empresa. Luís Gustavo Fuentes Silva, reticente em seu depoimento prestado em juízo, também refere as transferências da titularidade da empresa (fls. 656-v a 659): (...) A conduta dos réus Luis Gustavo e Luiz Rafael de contratar confessadamente, mediante terceiros, com a fazenda pública que os empregava na qualidade de servidores concursados, basta, por si só, para configurar ato de improbidade administrativa, atentatória aos princípios da moralidade, da legalidade e da impessoalidade. A Lei Municipal nº 1.041/90 de Estância Velha, que instituiu o regime único dos servidores daquele Município, expressamente proscreveu a prática: (...) Também há a vedação na Lei de Licitações: (...) Como visto, a configuração da prática atentatória aos princípios administrativos, sobretudo o da impessoalidade, independe de quaisquer resultados concretos em benefício do contratante ou em prejuízo da administração pública. A reprovabilidade jaz na mera conduta do agente público, independentemente da vantagem auferida, tratando-se de ato ímprobo formal. (grifei) Nesse sentido, importa destacar que o sócio Luís Gustavo também declarou ao Ministério Público que “souberam [referindo-se a Luiz Rafael] pelo Contador que não poderiam participar de licitações em função dos cargos que possuíam no Município” (fl. 187). (grifei) Demonstrada, portanto, a ciência inequívoca acerca da proibição legal, também presumível por se tratar de servidores públicos 5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO I ÇA TRI B U L DE JU ST NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL concursados regidos pela referida Lei dos servidores municipais de Estância Velha. Resta comprovado o dolo na conduta destes réus, configurando-se improbidade administrativa por violação a princípios da administração pública (...).” (grifei) Patente o intuito de rediscussão do mérito e de reapreciação dos elementos probatórios. Não se configuram quaisquer dos vícios elencados no artigo 535 do CPC, havendo mera inconformidade dos embargantes com o resultado do julgamento. Ainda, a relevância do elemento volitivo no âmbito da improbidade administrativa foi devidamente analisada por este Colegiado, não havendo omissão ou contradição nesse sentido. Por outro lado, jamais se falou em presunção de dolo, tratando-se de provável equívoco de interpretação do acórdão por parte dos embargantes. O descontentamento com a análise dos itens que aponta não enseja embargos declaratórios, pois inexistentes os vícios previstos no art. 535 do CPC. Ante o exposto, não existindo omissão, obscuridade ou contradição na decisão atacada, desacolho os presentes embargos de declaração. DES. ARNO WERLANG (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. PEDRO LUIZ RODRIGUES BOSSLE - De acordo com o(a) Relator(a). DES. ARNO WERLANG - Presidente - Embargos de Declaração nº 70048531065, Comarca de Estância Velha: "DESACOLHERAM OS EMBARGOS DECLARATÓRIOS. UNÂNIME." 6 U TRI B I ÇA PODER JUDICIÁRIO L DE JU ST ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL NA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RS APRF Nº 70048531065 2012/CÍVEL Julgador(a) de 1º Grau: ROSALI TEREZINHA CHIAMENTI LIBARDI 7