PARTE 3
NEUROCIÊNCIA
DOS MOVIMENTOS
Capítulo 12
O Alto Comando Motor
Estrutura e Função dos
Sistemas Supramedulares
de Comando e Controle
da Motricidade
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Os ordenadores do sistema
motor chegam aos
motoneurônios espinhais
através das vias
descendentes. À esquerda
estão aqueles que
compõem o subsistema
ventromedial, e à direita os
que compõem o subsistema
lateral. O pequeno encéfalo
indica o plano do corte
coronal à direita, e a luneta
indica o ângulo de
observação (dorsal) dos
troncos encefálicos
desenhados na parte de
baixo. A figura não mostra
os núcleos dos nervos
cranianos e suas vias.
Os axônios do feixe piramidal
(em vermelho) formam as
pirâmides bulbares
na •
superfície ventral do
tronco encefálico, e cruzam
na decussação piramidal,
visível a olho nu. A ilustração
é do histórico livro de
Anatomia do inglês Henry
Gray (1827-1861).
Os diferentes feixes medulares, entidades anatômicas que alojam as vias descendentes dos ordenadores motores,
ocupam regiões específicas da substância branca medular. No funículo lateral situam-se os feixes corticoespinhal
lateral e rubroespinhal, ambos componentes do subsistema motor lateral. No funículo ventromedial ficam os demais
feixes, componentes do subsistema medial (ou ventromedial). Na figura, os feixes estão representados apenas de
um lado da medula para simplificar o esquema e facilitar a compreensão. As fibras descendentes que emergem dos
feixes para terminar na medula o fazem topograficamente, representando as diferentes regiões do corpo (detalhe
acima). Desse modo, as fibras do funículo lateral inervam neurônios laterais do corno ventral, enquanto as do
funículo ventromedial inervam neurônios situados mais medialmente.
As vias descendentes do
sistema medial originam-se
de diferentes regiões do
tronco encefálico, mas todas
terminam em motoneurônios
mediais do corno ventral da
medula. A. Os feixes
reticuloespinhais originam-se
de neurônios da formação
reticular pontina e da
formação reticular bulbar, e
os axônios projetam para os
motoneurônios do mesmo
lado da medula. B. Os feixes
vestibuloespinhais originamse dos núcleos vestibulares
situados no bulbo, e projetam
a ambos os lados da medula.
C. O feixe tectoespinhal
origina-se no colículo
superior, e seus axônios
cruzam para o lado oposto
antes de chegar à medula.
Os desenhos representam
cortes transversais do tronco
encefálico, numerados em
correspondência com os
níveis representados no
pequeno encéfalo do quadro.
As vias descendentes do sistema lateral originam-se no córtex cerebral e no mesencéfalo,
terminando nos motoneurônios laterais do corno ventral da medula. Os feixes corticoespinhais
originam-se principalmente na área motora primária, mas só o maior deles (o lateral) cruza na
decussação piramidal antes de atingir a medula (o feixe corticoespinhal medial não está
ilustrado na figura). O feixe rubroespinhal origina-se no núcleo rubro e cruza no tronco
encefálico alto. Os desenhos representam cortes transversos numerados em correspondência
com os níveis representados no pequeno encéfalo do quadro.
Alguns dos circuitos posturais
têm origem nos órgãos
vestibulares (à direita), outros
nos fusos musculares dentro
dos músculos. Desses dois
órgãos receptores emergem
as vias aferentes (em azul).
As principais estruturas que
coordenam as reações
posturais são os núcleos
vestibulares, que comandam
a musculatura do corpo, e os
núcleos motores do globo
ocular, que comandam a
musculatura extraocular. Por
simplicidade, só estão
ilustradas (em vermelho) as
vias eferentes do cerebelo,
núcleo abducente e núcleos
vestibulares.
Os axônios de
comando dos
movimentos oculares
originam-se nos
núcleos dos nervos
motores do globo
ocular, com um
padrão específico de
inervação. À
esquerda estão
representados cortes
transversos do tronco
encefálico, cuja vista
dorsal está
representada à
direita. Os
movimentos de
estabilização do olhar
são comandados a
partir de informações
veiculadas pela retina
aos núcleos
pretectais, que por
sua vez emitem
projeções até os
núcleos dos nervos
cranianos
correspondentes.
Observar que apenas
o núcleo troclear
emite projeções
cruzadas.
A representação dos movimentos
oculares no colículo superior pode ser
revelada experimentalmente. O
pesquisador registra a atividade
neuronal no colículo superior (pontos
numerados, em B), e procura no
campo visual a posição dos campos
receptores correspondentes (círculos
brancos numerados, em A). Depois
estimula eletricamente a região
através do mesmo eletródio, e registra
o movimento ocular produzido (setas
em A). Observa-se assim que os olhos
do animal se movem do centro do
campo visual para o centro do campo
receptor, cada vez que a região
correspondente do colículo superior é
estimulada. O meridiano horizontal do
campo visual (em A) e sua
representação no colículo (em B)
estão representados por uma linha
pontilhada, e o meridiano vertical por
uma linha contínua grossa. Os demais
meridianos estão representados por
linhas contínuas finas. As cores
representam os quadrantes do campo
(em A), e correspondem às regiões do
colículo (em B).
Os movimentos sacádicos são
comandados pelo córtex frontal e
pelo colículo superior (neurônios
vermelhos) através da formação
reticular pontina do lado oposto.
Os neurônios desta (em azul)
projetam aos núcleos motores do
globo ocular.
As áreas motoras corticais estão
representadas em tons de azul.
As áreas representadas em tons
de verde conectam-se com as
primeiras, mas não são
consideradas partes do sistema
motor. O desenho de cima
ilustra a face lateral do
hemisfério esquerdo, e o
desenho de baixo ilustra a face
medial do hemisfério direito.
Todas as áreas representadas,
entretanto, existem em ambos
os hemisférios. Abreviaturas no
texto. Os números referem-se à
classificação citoarquitetônica de
Brodmann.
Ferrier (à esquerda) realizou seus experimentos em macacos, mas logo extrapolou os dados ••
para o cérebro humano. Segundo ele, os pontos motores do cérebro humano são os
numerados de 2 a 12, o que corresponde ao que se conhece atualmente.
Desenho à direita de D. Ferrier (1876) Functions of the Brain. Putnam, EUA.
A somatotopia é um
importante princípio de
organização de M1.
A. A estimulação
elétrica de partes do
giro pré-central
permite idealizar um
homúnculo que
representaria o “mapa
motor” do corpo
humano na superfície
cortical.
B. Os experimentos
feitos no cérebro de
macacos indicaram
que cada ponto
estimulado pode
provocar a ativação de
vários músculos. O
desenho de baixo
representa uma
ampliação do desenho
de cima, e os campos
em preto representam
as partes do corpo do
macaco que se
movem quando cada
ponto do córtex é
estimulado
eletricamente.
Divergência e convergência dos axônios corticoespinhais. A representa um único neurônio
corticoespinhal que projeta para diferentes motoneurônios (divergência), cada um deles
responsável pelo comando de um músculo diferente. B. A morfologia de um único axônio
corticoespinhal (em vermelho) revela ramificações em diferentes setores do corno ventral da
medula. C. A estimulação elétrica de um único axônio corticoespinhal (indicadapelo asterisco
sobre o traçado gráfico) ativa os músculos 1-4 (ondas assinaladas pelos pontos vermelhos), mas
não os músculos 5 e 6. D representa a convergência: vários neurônios corticoespinhais projetam
para um único motoneurônio medular.
Imagens de ressonância magnética funcional de um indivíduo durante o movimento dos
dedos da mão direita. Aparecem ativas lateralmente as áreas motora primária (M1) e
somestésica primária (S1), e medialmente a área motora suplementar (MS). A representa um
plano horizontal mais profundo que B, como indicado em C. S1 é ativada por que o próprio
movimento causa estimulação somestésica.
O experimento de Evarts. A. O
macaco era treinado a estender
ou fletir o punho, e o pesquisador
ao mesmo tempo registrava a
atividade neuronal do seu córtex
motor com um microeletródio. B.
O traçado azul representa o
disparo de potenciais de ação
(cada traço vertical) de um
neurônio motor cortical, enquanto
o traçado vermelho indica os
movimentos do punho. Observar
que o neurônio começa a
disparar antes da flexão (B1), e
que a frequência de PAs é maior
quando a força muscular
empregada é também maior (B2).
Quando a flexão é “ajudada” por
um peso colocado contra os
músculos extensores, o punho
flete sem mesmo a necessidade
de uma contração muscular (B3).
Na técnica de estimulação
magnética transcraniana
(A), estimulando-se o
córtex motor primário (M1),
obtém-se um potencial
evocado motor no músculo
oponente do polegar,
graças à ativação
corticoespinhal e ao
registro por meio de
eletrodos posicionados
sobre o músculo (foto
abaixo). À direita se pode
ver a região de
representação da mão de
um paciente biamputado e
bitransplantado, após 2 (B)
e 10 (C) meses da
realização da cirurgia.
Notar que com o tempo a
região cortical que
comanda a mão amplia-se
significativamente.
Cortesia do Laboratório de
Neuropsicologia da Ação,
Além da força muscular, os neurônios corticais também comandam a direção do movimento.
A. O macaco é treinado a realizar movimentos em determinadas direções, enquanto o
pesquisador registra a atividade elétrica dos neurônios corticais. B. O comprimento de cada
traço azul representa a frequência de disparo de PAs de um neurônio cortical antes de um
movimento direcionado. As setas pretas indicam a resultante da atividade da população
neuronal que dispara antes de cada movimento. Pode-se ver que a resultante é muito próxima
da direção efetiva do movimento.
Planejamento e comando
motor envolvem áreas
diferentes do córtex cerebral.
A. O movimento simples de
um dedo provoca a ativação
de M1 e S1 no hemisfério
esquerdo. B. Um movimento
complexo envolvendo vários
dedos em sequência provoca
a ativação de várias áreas em
ambos os hemisférios.
C. Pensar no movimento
anterior, sem executá-lo, ativa
apenas a região de
planejamento motor.
O experimento de
Passingham.
Enquanto o
indivíduo tenta
descobrir a
sequência correta
de movimentos
(A), as áreas
ativadas são
diferentes de
quando ele a
descobre (B).
A. Regiões onde foram
encontrados neurôniosespelho,
ligadas estritamente ao sistema
visuomotor do córtex (em azul),
a sistemas cognitivos
complexos (em verde), e ao
processamento de emoções
(em laranja, representando a
ínsulaA e a amígdalaA).
B. Buba ou quiqui, qual é um,
qual é o outro?
O cerebelo possui um córtex
na superfície e núcleos
profundos no seu interior. A.
Vista dorsal do cerebelo
(indicada pela luneta no
pequeno encéfalo acima e à
direita), com os núcleos
profundos desenhados em
verde “por transparência”.
B. Vista ventral do cerebelo
(luneta no pequeno encéfalo
abaixo à direita), com os
pedúnculos cerebelares
cortados.
A. Do ponto de vista das suas conexões, o cerebelo é subdividido em três regiões: verme,
hemisférios intermédios e hemisférios laterais. Os núcleos profundos recebem aferentes
seletivos de cada subdivisão, como se pode ver pela equivalência de cores. B. As subdivisões
conectivas do cerebelo são também funcionais, e relacionam-se com os subsistemas motores,
definindo o vestibulocerebelo, o espinocerebelo e o cerebrocerebelo. Os
diagramas de blocos representam os aferentes e os eferentes de cada subdivisão funcional.
Uma pequena fatia do córtex cerebelar (detalhe acima, à esquerda) é representativa de todas
as regiões. A representa as fibras aferentes do cerebelo (em vermelho). A seta aponta para um
glomérulo cerebelar. B representa as fibras eferentes do córtex cerebelar, que emergem das
células de Purkinje (em vermelho). C ilustra os interneurônios principais (também em vermelho).
O circuito básico do cerebelo
pode ser representado
esquematicamente. Notar que
as fibras que saem do cerebelo
a partir dos núcleos profundos
são excitatórias, mas as fibras
de Purkinje que sobre elas
incidem são fortemente
inibitórias. As fibras aferentes
que chegam ao cerebelo do
tronco encefálico e da medula
são excitatórias.
Os núcleos da base (em verde) ficam
no interior do encéfalo, e são
atravessados pela cápsula interna (em
azul). A. Representação “por
transparência” dos núcleos da base,
atravessados por dois dos feixes da
cápsula interna. B. Representação do
corte indicado pela linha branca em A,
mostrando também os núcleos da base
em relação à cápsula interna. Um plano
de corte oblíquo como esse permite
visualizar ao mesmo tempo os
componentes telencefálicos,
diencefálicos e mesencefálicos dos
núcleos da base. A substância
negra pode ser vista claramente acima
do pedúnculo cerebral, no mesencéfalo
(desenho de baixo em B).
As informações de entrada que o corpo estriado processa vêm de extensas regiões do córtex
cerebral (A), enquanto as informações de saída seguem para certos núcleos do tálamo, que as
transmite para as regiões motoras do córtex, e para o colículo superior do mesencéfalo (B). Os
núcleos da base constituem, entre si, um complexo circuito de processamento (C) que
transforma as informações de entrada em comandos para iniciar ou terminar um movimento
simples, uma sequência deles, ou mesmo comportamentos complexos e elaborados.
Os aferentes da
célula espinhosa
média do corpo
estriado são
conhecidos quanto à
sua origem, seu
local preciso de
terminação, e o seu
neurotransmissor.
ACh = acetilcolina;
Cd = caudado; DA =
dopamina; GABA =
ácido gamaaminobutírico; Glut
= glutamato; Pu =
putâmen; SN =
substância negra.
A. Representação dos
principais circuitos dos
núcleos da base em um
indivíduo normal, com os
neurônios inibitórios
representados em vermelho
e os excitatórios em azul. As
conexões recíprocas não
estão representadas, por
simplicidade. B. Nos
doentes parkinsonianos,
neurônios negro-estriados
degeneram. C. Nos
pacientes com balismo,
degeneram os neurônios
subtalâmico-pálidos, e nos
pacientes com doença de
Huntington (D), são os
neurônios espinhosos
médios do corpo estriado
que degeneram.
Alguns dos sintomas dessas
doenças podem ser
explicadas analisando os
circuitos (veja o texto). Cd =
caudado; GPe = globo
pálido externo; GPi = globo
pálido interno; Pu =
putâmen; SN = substância
negra; ST = núcleo
subtalâmico.
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