Violência Doméstica Lei nº112/09, de 16 de Setembro. Ana Marinho de Castro Viseu, 21 de Novembro de 2009 Lei nº112/09, de 16 de Setembro A (des)armonia do sistema jurídico Lei ousada e integral/integrada? Normas de aplicação imediata? Aumento das participações criminais Dados estatísticos do Distrito Judicial de Lisboa Crimes contra as pessoas 32.527 em 2008 e 32.392 em igual período de 2009 Violência doméstica regista 8.336 em 2009, 3.188 no 3º trimestre Lei nº112/09 (Cont) O carácter prioritário na prevenção e na investigação – art.4º/1 a) da Lei 38/2009, de 20.7. Carácter urgente (art.28º) – novidade (?) Uma nova postura dos magistrados no combate/repressão deste tipo de crime, na sensibilização/educação para a cidadania, na construção de valores essenciais de cidadania. Especialização/formação específica. Enquadramento jurídico internacional Compromissos internacionais no âmbito das Nações Unidas, da UE, do Conselho da Europa têm sido assumidos no sentido da eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres; reafirmação do princípio da igualdade; de uma cultura de consciencialização das vítimas para os seus direitos e do reforço das medidas para a sua protecção e repressão do agressor. Instrum Juríd Internacionais. Estruturas Nacionais Decisões-quadro, Deliberações, Resoluções, Rec, Estratégias, Convenções, Roteiros… É neste quadro normativo que se enquadram os Planos Nacionais contra a VD; a Comissão para Cidadania e Igualdade de Género (CIG) e, no XVII Governo constitucional, a Sec. Estado da Igualdade, responsável pela execução das políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção e defesa da igualdade de género sob a tutela do Ministro da Presidência. ESTATUTO DE VÍTIMA Quadro de direitos e de deveres. Protecção da vítima desde a fase de inquérito Para sua atribuição: apresentação de queixa + não existam fortes indícios que é infundada = (quase) sempre. Excepcionalmente pode ser atribuído pelo organismo competente da Adm. Pública Atenção: ainda não está em vigor DIREITOS DA VÍTIMA Direito à informação (art.15º) Direito à audição e à apresentação de provas (art.16º) – estatuto de assistente Garantias de comunicação (art.17º): intérprete Assistência específica (art.18º): advogado e apoio judiciário Reembolso de despesas (art.19º) DIREITOS DA VÍTIMA (Cont) Direito à protecção (art.20º): segurança e protecção -Remete para o regime jurídico da protecção de testemunhas estabelecido pela Lei nº93/99, de 14.7, alterado pela lei nº29/2008, de 4.7 e pelo DL nº227/09, de 14.9 À tomada de declarações por videoconferência e para memória futura. Direitos das vítimas (cont) Direito à indemnização (art.21º) Previsto na Lei nº104/2009, de 14 Setembro. O requerimento, nos termos do art.10º nº4, pode ser apresentado pelo Ministério Público actualmente perante Comissão para a Instrução de Pedidos de Indemnização às Vítimas de Crimes Violentos. Direitos das vítimas (cont) Direito à restituição dos bens (nº4) Não é uma medida de aplicação judicial Já anteriormente podia ser posta em prática Apoio dos OPC Entrada dos OPC no domicílio: questões Revistar o agressor nos termos do art.251º nº1 a) do Código de Processo Penal se o detiverem ou não o fazendo tiverem fortes suspeitas que ele oculta objectos relacionados com o crime. Normas tutela policial e judicial Normas a aplicar de imediato: Art.25º Art.28º Art.29º Art.30º Art.31º Art.32º Art.33º Art.38º Acesso ao direito (consulta e apoio) Celeridade processual Denúncia do crime Detenção Medidas de Coacção Urgentes recurso à vídeo e teleconferência Declarações para memória futura Comunicação obrigatória de dados Denúncia do crime – art.29º já prevista com o auto de notícia/denúncia padronizado; formação policial/mais-valia; avaliação de risco - sua aplicação; solicitação de medidas de coacção urgentes (?!) Declarações da vítima Evitar dupla vitimização Por: Vídeo ou teleconferência. Caso esteja impossibilitada de comparecer pode ser ouvida em qualquer local que se encontre (art.34º). Para memória futura (art.271ºCPP) Para vítimas residentes fora do país A possibilidade de as prestar “imediatamente” Comunicação ao arguido se o houver. Presença obrigatória do Defensor. Detenção em flagrante delito Deve manter-se até o detido ser apresentado a audiência de julgamento sob a forma sumária ou a primeiro interrogatório judicial ou no Ministério Público (art.143º nº3); OPC pode -como já podia- apreender armas no interior da residência (arts.177º nº3, 178º CPP;107º nº1 b) da Lei das Armas e Lei 5/2006, de 23.2 com as alterações da Lei nº17/2009, de 6.5 Detenção Fora de flagrante delito Para além dos casos já previsto no art.257º nos.1 e 2 do CPP “houver fundadas razões para crer que o visado não se apresentaria espontaneamente no prazo que lhe fosse fixado”, o MP/Juiz -cada um na fase de que é titular- em casos de perigo de continuação da actividade criminosa ou ser imprescindível protecção da vítima pode emitir mandados independentemente da moldura penal do crime em causa (até 5 anos ou mais) Detenção Fora de flagrante delito Autoridade de Polícia Criminal quando naqueles casos em que se verifique perigo de continuação da actividade criminosa ou necessidade de protecção da vítima e não seja possível contactar a autoridade judiciária em tempo útil. Já não há requisito da moldura penal. Trata-se de um regime especial face ao CPP. MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º 48h após a constituição de arguido o Tribunal pondera sua aplicação. Constituição ou validação? Pondera ou aplica mesmo? As medidas previstas são as já constantes do CPP. Não há novidade. Os pressupostos de aplicação são os do art.204ºCPP (máximo superior a 3 anos): Fuga, perigo de fuga; Perigo de perturbação do inquérito/instrução; Perigo de continuação da actividade criminosa MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Novidade: cumprimento mediante vigilância electrónica. Já disponível? Medida de afastamento da vítima não foi prevista e podia tê-lo sido neste elenco que apenas reproduz o CPP. Julgo que esta não pode resultar do art.200 nº1 d) CPP por violação dos pr. da tipicidade e legalidade. MC é restritiva de direitos, liberdades e garantias. Art.32º nº4 da CRP. MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Prisão preventiva: só a VD grave nos termos do art.152º nº3 CP e art.202º nº1 alínea a) do CPP. A VD dos nos. 1 e 2 só o permitirá através do disposto no art.202º nº1 alínea b) do CPP e art.1º alínea j) do CPP (“criminalidade violenta”). 31º nº2 doutrina já assente. MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Se é detido a questão não se coloca pois em 48h tem que ser sujeito a 1º interrogatório judicial; Não sendo detido, como APLICAR MC em 48h? OPC comunica ao MP e MP pondera e submete ao JIC que tem que ponderar e aplicar. MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Queria falar-se de Tribunal ou de MP? Depois de feita a ponderação (em 48h) o Tribunal tem que notificar o arguido ou emitir mandados de detenção para o efeito que têm que ser cumpridos pelo OPC. Em 48 horas? Só mediante emissão de mandados e mesmo assim… MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Ou pretende que o Tribunal não ouça o arguido? Pode fazê-lo em casos de impossibilidade devidamente fundamentada (excepção) mas como contornar a “audição prévia do arguido” exigida pelo art.194º nº3 do CPP que constitui a regra? MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º A constituição de arguido exige fundadas suspeitas da prática de crime que as mais das vezes só se alcançam no final do inquérito. é nesta fase que se pretendem ver aplicadas Medidas de Coacção? Ou logo no início do processo para protecção da vítima? MEDIDAS DE COACÇÃO URGENTES – art.31º Ou mesmo antes de ele ter início com a adopção de medidas de protecção policiais que não exigem a constituição de arguido e protegem a vítima de imediato com célere comunicação ao MP para sujeição a validação judicial em 48h? Esta solução protege a vítima e é exequível em 48h. A prevista no art.31º não. MEDIDAS CAUTELARES/POLICIAIS O legislador terá feito nesta matéria “confusão” entre medidas de coacção e medidas cautelares, de polícia. O resultado é o do art.31º… Retirar armas ainda que legalmente detidas, afastar agressores das residências seriam medidas cautelares úteis a prever para adopção pelos OPC Comunicação obrigatória –art.37º Decisões de atribuição do estatuto de vítima Não será antes “da atribuição do estatuto de vítima”; a atribuição é excepcional; Das decisões finais dos processos: arquivamentos, SPP, sentenças/acórdãos. Que dados? Os factos? Sem dados nominativos. Medidas de apoio à reinserção do agente – art.38º Criação de condições de apoio psicológico e psiquiátrico aos arguidos quer em situações de execução das penas quer de suspensão provisória do processo que parece ter sido esquecida no nº2. Encontro restaurativo – art.39º Apesar de não estar regulamentada importa reflectir sobre a bondade desta opção do legislador… MPenal vocacionada para a pequena criminalidade cujo conflito pode ser superado mediante uma reparação pecuniária. Prevê-se que durante a SPP de um processo de VD introduzir a mediação penal? Será um caso para mediação? MP tem o dever legal de zelar para que os intervenientes na mediação penal não estejam em posição de desigualdade. Não será o caso? APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL NO TEMPO Dispõe o art.5º nº1 do CPP “A lei processual penal é de aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior” – tutela dos actos juridicamente perfeitos Dispõe o art.5º nº2 “a lei processual penal não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar: Aplicação da lei no tempo (cont) a) “agravamento sensível e ainda evitável da posição processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa” – tutela da posição processual do arguido b)quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo – tutela da continuidade do acto processual Aplicação da lei no tempo (Cont) Aplicação imediata do art.30º? Pode o Ministério Público emitir mandados de detenção fora de flagrante delito para aplicação de medida de coacção a processos pendentes antes da data de 15 de Setembro? Aplicação da lei no tempo (Cont) As normas constantes dos art.30º e 31º são normas processuais penais proprio sensu e não materiais estas sim sujeitas ao princípio da legalidade criminal, de aplicação retroactiva proibida pelo art.29º nº4 da CRP que impõe a aplicação das normas mais favoráveis ou menos desfavoráveis ao arguido Argumentos no sentido da aplicação imediata Não há limitação do direito de defesa do arguido; Intenção do legislador patente no art.31º na aplicação imediata das medidas coacção; Fala-se em situação processual e não em estatuto, este é estático e aquela actualizável a todo o momento. Não é passado, é presente tal como as medidas cautelares só têm sentido no presente pois só aí se verificam ou não os seus pressupostos; O arguido não tem expectativas juridicamente relevantes neste domínio que sejam tuteladas. Se não houver arguido constituído a questão nem se coloca. Argumentos no sentido da não aplicação imediata antes não podiam ser emitidos os mandados e agora podem; privação da liberdade (detenção vs liberdade) contende agravando de forma evitável a situação processual do arguido Críticas As reformas de 2007 ao nível do Código de Processo Penal contribuíram neste, como noutros planos, a um retrocesso na matéria da vd. As normas de carácter processual penal deviam ter sido introduzidas no Código de Processo Penal (detenção, memórias futuras). Princípio da igualdade. Carácter geral e abstracto das normas. Críticas (cont) Assiste-se a uma proliferação de códigos penais e processuais penais especiais; A lei devia ser verdadeiramente integral e não conter normas meramente programáticas e não exequíveis; A prioridade/urgência devia constar da lei que define as prioridades de política criminal; As medidas de coacção deviam ter sido consagradas como medidas cautelares de polícia; Críticas (cont) O art.31º introduz prazos irreais e seu conteúdo constava já do Código de Processo Penal; inexequível Consagração da medida de afastamento da vítima; Mediação penal neste domínio não será pacífica; Falta de norma transitória que disponha quanto à aplicação das normas processuais penais proprio sensu aos processos pendentes causa dúvidas evitáveis.