Prática Processual Penal
17 de Dezembro 2007
I
Ontem à noite, depois de ter bebido uns copos enquanto meditava na situação de
penúria em que se encontrava, Claudemiro, contabilista, concluiu que a “culpa” era
dos impostos que tivera de pagar na véspera. Concretamente € 3.000,00 de IRS.
Resolveu então assaltar a repartição de finanças que encontrou à saída do bar, para
“reaver” o montante pago. Pelas 23h55m partiu um vidro da porta para entrar e
retirou exactamente € 3.000,00 da caixa, ali deixando a nota de liquidação do IRS,
para documentar a operação. De seguida, dirigiu-se ao Multibanco e efectuou o
depósito de € 3.000,00 em numerário, utilizando o envelope para o efeito
disponibilizado pela máquina e guardando o respectivo talão de depósito no bolso.
Hoje de manhã, ao chegar à repartição de finanças, a policia descobriu a nota de
liquidação na caixa e, na investigação que logo iniciou, veio a encontrar Claudemiro
a dormir num banco do jardim da Cordoaria, efectuando a sua detenção às 11h30m.
No acto da detenção, Claudemiro foi revistado tendo sido apreendido o talão de
depósito dos € 3.000,00 e exibidos ambos ao detido (talão de depósito e nota de
liquidação), que nada respondeu.
Constituído arguido, com cumprimento de todas as formalidades, foi de imediato
presente ao Juiz, para primeiro interrogatório com a indicação circunstanciada dos
motivos da detenção e das provas que a fundamentavam. O Juiz confrontou-o com o
factos mas omitiu qualquer referencia aos documentos apreendidos e nada fez
constar no auto quanto à razão da omissão. O arguido recusou prestar declarações.
No final do interrogatório, foi aplicada ao arguido medida de coacção de prisão
preventiva.
Imagine que se encontrava de escala no TIC e foi nomeado defensor de Claudemiro
para aquele interrogatório, não tendo chegado a falar com ele, por falta de tempo, e
que só no final do interrogatório, enquanto aguardava que o auto lhe fosse presente
para ser assinado, foi informado por Claudemiro da existência desses documentos
apreendidos. Ao ler o auto, constatou que o mesmo era absolutamente omisso
quanto aos documentos ou à razão da omissão.
Também o despacho de aplicação da medida de coacção, a ambos notificado nesse
momento, era omisso quanto aos documentos ou razão da omissão.
Grupo I
Considerando exclusivamente os dados do enunciado, e sem esquecer a
fundamentação legal, responda às seguintes questões:
1ª Analise a legalidade da detenção e da revista. (4 valores)
2ª Como reagiria à omissão de referência aos documentos no interrogatório e no
auto? (4 valores)
3º Como reagiria à omissão de referência aos documentos no despacho que aplicou
a medida de coacção? (4 valores)
4ª Em que dia termina o prazo para interpor recurso da medida de coacção aplicada
? (4 valores)
Grupo II
Responda de forma sintética, mas sem esquecer a fundamentação legal, às
seguintes questões:
1ª - Em processo abreviado, tendo o MP deduzido acusação, qual o prazo que o
arguido tem, à luz da lei actual, para requerer o debate instrutório? (1 valor)
2ª Maria prestou declarações como testemunha na fase de instrução. No julgamento,
ao ser identificada, declarou ter casado com o arguido dois dias antes desta
audiência.
Em que circunstâncias é admissível a leitura em audiência das declarações por si
prestadas na instrução? (3 Valores)
Grelha de Correcção
17 Dezembro 2007
Grupo I
Questão 1 – serão admissíveis as seguintes duas hipóteses.
Hipótese a) – como Claudemiro não foi encontrado logo após o
crime não há Flagrante delito (256º “à contrário”) pelo que a
detenção só poderia verificar-se nos termos do disposto no art.
257º, o que não aconteceu
Por isso a detenção é ilegal
Sendo a detenção ilegal também é ilegal a revista porquanto só
poderia ser efectuada com o consentimento do visado ou
Mediante despacho da autoridade judiciária
(arts. 256º, à contrário, 257º, 174º, nº 3 e 5, do CPP)
4
Hipótese b) – há flagrante delito porque Claudemiro foi
encontrado logo após o crime e com sinais que mostram
claramente que acabou de o cometer (o talão de depósito) pelo
que a detenção é legal
Sendo igualmente legal a revista já que feita aquando da
detenção em flagrante delito por crime a que corresponde pena
de prisão
( arts. 255, nº1, al.a), 256º, nº2, 174º, nº5, al. c)
4
4
Questão 2 – serão admissíveis as seguintes duas hipóteses
Hipótese a ) a omissão da referência no auto de interrogatório,
sendo em si a violação de uma mera formalidade que não
inquina o valor do acto praticado, constitui uma irregularidade, a
arguir antes que o acto esteja terminado.
(arts. 141º, nº4, 118º, nº2, 123º, nº1 e 95º, nº1)
4
Hipótese b) – a omissão da referência no auto de interrogatório,
porque configura a omissão de parte de um acto legalmente
obrigatório, constitui uma nulidade, a arguir antes que o acto
esteja terminado.
(arts. 141º, nº4, 272º, nº1, 120º, nº2, al. d) e nº 3, al. a) e 95º,
nº1)
4
4
Questão 3 – a omissão de referência no despacho que aplicou a
medida de coacção configura uma nulidade respeitante ao
inquérito, a arguir até ao encerramento do debate instrutório ou,
não o havendo, até cinco dias após a notificação do despacho
que tiver encerrado o inquérito, podendo ainda ser arguida em
eventual recurso da medida de coacção.
(arts. 194º, nº4, 118º, nº1, 120º, nº3, al. c, e 410º, nº3)
4
Questão 4 – Arguido e defensor notificados pessoalmente em
17/12
Primeiro dia do prazo 18/12
Prazo 20 dias
Último dia do prazo 7/01
(113/1/a, 103/2/a, 104º, do CPP, 279/b/e do CC, 144/1/2 do
CPC, 411/1/a)
Grupo II
4
Questão 1 – o arguido agora não tem qualquer prazo já que em
processo abreviado, deixou de haver lugar a debate instrutório
(arts. 391º-A a 391º-F do CPP)
1
Questão 2 – Desde que aceite prestar declarações; e
Exista acordo entre M.P., Arguido e Assistente; ou
Na parte necessária ao avivamento da memória se declarar que
já não recorda certos factos; ou
Se houver entre elas e as feitas em audiência contradições ou
discrepâncias.
( arts. 134º, 290/2, 356º/2/b e 356º/3/a/b
3
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Enunciado / Grelha de correcção de Prática Processual Penal