Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Paraná
1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO A
JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº2010.70.59.000695-9/PR
RELATORA
: Juíza Federal Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RECORRIDO
: MARIA IVERLI SERRATO RIPKA
VOTO
Trata-se de recurso interposto
procedente o pedido de restabelecimento do
pela autora desde 10.07.1999, o qual foi
irregularidade identificada pela autarquia,
concessórios.
pelo INSS contra sentença que julgou
benefício de pensão por morte recebido
cessado em 01.10.2009, após suposta
em um processo de revisão de atos
A decisão recorrida consignou que a irregularidade identificada pelo
INSS não se sustenta, de modo que a autora faz jus ao restabelecimento do benefício
desde o dia da indevida cessação.
A parte recorrente se insurge contra o reconhecimento da qualidade de
segurado especial do instituidor da pensão, bem como aponta que o de cujus não
detinha qualidade de segurado no momento do óbito.
Assiste razão ao recorrente.
Conforme INFBEN anexado junto com a inicial, o benefício titularizado
pela autora tem DIB em 10.07.1999 e DDB em 12.08.1999. Já a revisão levada a efeito
pela autarquia previdenciária culminou com a cessação do benefício em 02.10.2009,
conforme o mesmo documento aponta.
Verifico que a beneficiária foi notificada em 08/04/2009 acerca da
medida da autoridade administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar
o benefício. Desse modo, nesse momento foi interrompido o prazo decadencial.
No que diz respeito ao prazo para o INSS revisar o benefício em questão,
faz-se necessário breve estudo da sucessão legislativa sobre o tema.
Anteriormente à edição da Lei nº 9.784/99, a revisão de benefício por
parte do INSS era permitida uma vez que, sendo o órgão integrante da Administração
Pública Indireta, a ele se aplicava a Súmula nº 473 do e. STF (editada em 1969) que
assim dispõe:
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Súmula 473: A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los,
por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e
ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Posteriormente foi editada a Lei nº 9.784/99, a qual estabelece em seu
artigo 54 o prazo decadencial de cinco anos para o desfazimento de atos
administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários. O e. STJ
consolidou entendimento segundo o qual, para os benefícios concedidos anteriormente
à edição da lei, o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de início de
vigência do referido diploma, ou seja, a partir de 01/02/1999.
Sobreveio, então, a Medida Provisória nº 138, de 19/11/2003 (que entrou
em vigor na data de sua publicação, em 20/11/2003), posteriormente convertida na Lei
Lei nº 10.839/2003, que acrescentou à Lei nº 8.213/91 o artigo 103-A:
“O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram
efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em
que foram praticados, salvo comprovada má-fé”.
Quanto à sucessão de prazos, o entendimento pretoriano firmou-se no
sentido de que, como quando a Medida Provisória 138/2003 entrou em vigor ainda não
haviam decorrido cinco anos a contar do advento da Lei nº 9.874/99, os prazos que
tiveram início sob a égide desta lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, de
tanto tempo quanto necessário para atingir o total de 10 (dez) anos.
Sobre o instituto da decadência em relação aos benefícios cujo prazo
decadencial tenha se iniciado sob a égide da Lei nº 9.784/99, o TRF/4, nos autos da
Apelação nº 2008.72.08.003736-1/SC, firmou entendimento nesse mesmo sentido:
MANDADO DE SEGURANÇA.
PREVIDENCIÁRIO.
ADMINISTRATIVO.
PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA DE EX-COMBATENTE.
REVISÃO. LIMITES AO DESFAZIMENTO DE ATO CONCESSÓRIO POR PARTE
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
1. Há e sempre houve limites para a Administração rever atos de que decorram
efeitos favoráveis para o particular, em especial aqueles referentes à concessão de
benefício previdenciário.
2. O cancelamento de benefício previdenciário pressupõe devido processo legal,
ampla defesa e contraditório.
3. A Administração não pode cancelar um benefício previdenciário com base em
simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado.
4. A Lei 6.309/75 previa em seu artigo 7º que os processos de interesse de
beneficiários não poderiam ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão
final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse
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prazo. Assim, em se tratando de benefício deferido sob a égide da Lei 6.309/75, ou
seja, até 14/05/92 (quando entrou em vigor a Lei 8.422, de 13/05/92, que em seu
artigo 22 revogou a Lei 6.309/75), caso decorrido o prazo de cinco anos, inviável a
revisão da situação, ressalvadas as hipóteses de fraude, pois esta não se consolida
com o tempo
5. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, para os benefícios deferidos antes do
advento da Lei 9.784/99 o prazo de decadência deve ser contado a partir da data de
início de vigência do referido Diploma, ou seja, 01/02/1999. Mesmo nestas situações,
todavia, há necessidade de respeito ao princípio da segurança jurídica, à luz das
circunstâncias do caso concreto.
6. Com o advento da Lei 9.784/99 (art. 54), foi instituído expressamente prazo
decadencial de cinco anos para desfazimento de atos administrativos de que
decorram efeitos favoráveis para os destinatários, incluídos os atos de concessão de
benefício previdenciário.
7. A MP 138 (de 19/11/03, publicada no DOU de 20/11/03, quando entrou em vigor),
instituiu o art. 103-A da Lei 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos
para a Previdência Social anular os atos administrativos de que decorram efeitos
favoráveis para os seus beneficiários.
8. Como quando a Medida Provisória 138 entrou em vigor não haviam decorrido
cinco anos a contar do advento da Lei 9.784/99, os prazos que tiveram início sob a
égide desta Lei foram acrescidos, a partir de novembro de 2003, quando entrou em
vigor a MP 138/03, de tanto tempo quanto necessário para atingir o total de dez
anos. Assim, na prática todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei
9.784/99, passaram a observar o prazo decadencial de dez, anos aproveitando-se,
todavia, o tempo já decorrido sob a égide da norma revogada (grifo meu)
9. O prazo decadencial somente será considerado interrompido pela Administração
quando regularmente notificado o segurado de qualquer medida de autoridade
administrativa para instaurar o procedimento tendente a cancelar o benefício.
10. Em toda situação na qual se aprecia ato de cancelamento de benefício
previdenciário, (em especial para os benefícios deferidos entre a revogação da Lei
6.309/75 e o advento da Lei 9.784/99), há necessidade de análise do caso concreto,
considerando-se, por exemplo, o tempo decorrido, as circunstâncias que deram causa
à concessão do amparo, as condições sociais do interessado, sua idade, e a
inexistência de má-fé, tudo à luz do princípio constitucional da segurança jurídica.
11. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário compete ao INSS o
ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório, pois este se
reveste de presunção de legitimidade
12. No caso concreto, conquanto não tenha ocorrido a decadência, estando a
beneficiária de boa-fé, tendo idade avançada, e decorridos muitos anos entre a data
da concessão da aposentadoria, bem assim da pensão, e da adoção de critérios para
reajuste, a manutenção do benefício da autora nas condições em que vinha sendo
pago está em princípio justificada, em homenagem ao princípio constitucional da
segurança jurídica, já que uma das funções precípuas do Direito, repita-se, é a
pacificação
social.
É importante destacar, ainda, que a jurisprudência pátria posicionou-se
no sentido de que, embora a norma que instituiu a decadência em matéria
previdenciária não tenha efeitos retroativos, deve ter efeitos e aplicação imediata,
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atingindo tanto os atos que ocorram a partir de sua vigência, quanto os anteriores, de
modo que o prazo vigente à época da concessão do benefício não se incorpora ao
patrimônio jurídico do segurado. Na esteira desse raciocínio, ficou também
evidenciado que a natureza do prazo previsto no art. 103-A da Lei nº 8.213/91 é
prescricional, muito embora tenha o legislador utilizado a expressão decadência, e,
portanto, pode ser interrompido ou suspenso.
Fixadas essas premissas, verifico, então, que o INSS somente decairia do
direito de proceder à revisão do benefício da recorrente em agosto de 2009. Contudo,
esse prazo foi interrompido com a notificação da beneficiária pela autoridade
administrativa em 08/04/2009.
Com efeito, não operou a decadência.
Passo, então, a analisar o mérito da causa.
A decisão recorrida entendeu comprovado o exercício de atividade rural
pelo Sr. Francisco, enfatizando que o fato de que ele possuía um bar paralelamente
àquele trabalho não interferia na essencialidade do labor rurícola para sua subsistência.
Sem demérito da sentença, entendo que o exercício da atividade no bar
pelo instituidor descaracteriza sua condição de segurado especial.
Com efeito, não há como caracterizar a atividade rural em regime de
economia familiar se, ao mesmo tempo, o instituidor exercia atividade de comércio
como proprietário de um bar. Houve comprovação nos autos de que o bar era aberto
todos os dias e, segundo a autora, a finalidade era complementar a renda da família. E
para ser considerado segurado especial a renda advinda da atividade campesina deve
ser indispensável ao sustento do grupo familiar. Se havia outro meio de subsistência,
sendo o labor rurícola mero complemento da renda, descaracterizado está o alegado
regime de economia familiar.
Nesse sentido, já decidiu o TRF/4:
PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE ATIVIDADE RURAL. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO. NÃO HÁ INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ATIVIDADE DE
COMÉRCIO (BAR) CONCOMITANTE. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR. REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
1.Não há como caracterizar a atividade rural em regime de economia familiar se, no
mesmo período em que o autor alega ter exercido o labor rural em terras de seu pai,
este exerceu atividade de comércio como proprietário de um bar, onde também
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explorava a atividade de "secos e molhados e miudezas", de forma ininterrupta por
mais de 21 anos, até se aposentar por idade.
2. Pagará o autor ao INSS honorários advocatícios fixados em R$ 350,00, que ficam
suspensos em face do autor litigar ao abrigo da AJG.
3. Revogada a tutela antecipada.
(Apelação Cível nº 2002.04.01.015960-2/SC, Rel. Luís Alberto Dazevedo Aurvalle,
d.j.u. 09/08/2006)
Portanto, entendo que a parte autora não faz jus ao restabelecimento do
benefício, porquanto sua concessão encontra óbice na ausência de qualidade de
segurado do instituidor da pensão por morte.
Nos termos do voto, revogo os efeitos da antecipação de tutela.
Oficie-se ao chefe do setor de benefícios da APS responsável pela sua
concessão para que cesse imediatamente o benefício concedido por meio de
antecipação de tutela na sentença.
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Sem honorários.
Curitiba, (data do ato).
Assinado digitalmente, nos termos do art.
9º do Provimento nº 1/2004, do Exmo. Juiz
Coordenador dos Juizados Especiais
Federais da 4ª Região.
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Juíza Federal Relatora
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