PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Direito
O ARTIGO 475 - J DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL E A APLICABILIDADE NO PROCESSO
TRABALHISTA
Autor: Heber Xavier e Silva
Orientador: Marco Aurélio Aguiar Barreto
HEBER XAVIER E SILVA
O ARTIGO 475 - J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A APLICABILIDADE NO
PROCESSO TRABALHISTA
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília, como requisito
parcial para obtenção do Título de
Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. M. Sc. Marco Aurélio
Aguiar Barreto.
Brasília
2009
Trabalho de autoria de SILVA, Heber Xavier e., intitulado “O ARTIGO 475 - J DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A APLICABILIDADE NO PROCESSO
TRABALHISTA” requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito,
defendida e aprovada, em ____ de ________________ de 2009, pela Banca
Examinadora constituída por:
___________________________________________________
Presidente: Prof. M. Sc. Marco Aurélio de Aguiar Barreto
Universidade Católica de Brasília
___________________________________________________
Integrante: Prof.
Universidade Católica de Brasília
___________________________________________________
Integrante: Prof.
Universidade Católica de Brasília
Brasília
2009
Dedico primeiramente a Deus o presente
trabalho que tem me sustentado com sua boa
mão nessa longa caminhada. A minha esposa
e filhas pela paciência e compreensão;
AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus por tudo, em especial o apoio que recebi na realização desta
pesquisa: Ao Prof. Marco Aurélio Aguiar Barreto dirijo gesto sensibilizado com o
melhor muito obrigado pelo apoio, paciência e excelência em sua orientação. Em
especial agradeço aos juízes e advogados atuantes no âmbito do Tribunal Regional
do Trabalho da 10ª Região. Agradeço aqueles que prestaram apoio a minha
pesquisa fornecendo livros e informações.
”Ai dos que decretam leis injustas e dos
escrivãos que escrevem perversidades, para
prejudicar os pobres em juízo, e para
arrebatarem o direito dos aflitos do meu povo, e
para despojarem as viúvas, e para roubarem os
pobres.” (Isaías 10: 1-2)
RESUMO
SILVA, Heber Xavier e. “O artigo 475 - J do Código de Processo Civil e a
aplicabilidade no processo trabalhista”. f.73. Trabalho de Conclusão de Curso
(Bacharelado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Católica de Brasília,
Brasília, DF, 2009.
Com a emenda constitucional n. º 45 de 2004, objetivou o legislador pátrio
impulsionar o grande número de processos existentes no Poder Judiciário,
mormente a morosidade na marcha processual, que vem se arrastando por longos
anos dentro do país. Neste contexto, visando dar mais celeridade, foi sancionada a
Lei n.º 11.232/2005 que, dentre um dos seus artigos, destaca-se o 475-J o qual
estipula que, caso o devedor não efetue o pagamento espontâneo do quantum
debeatur devido, incidirá a multa de 10% sobre o valor da condenação. A polêmica
atual reside na aplicação subjetiva do aludido artigo na esfera trabalhista já que a
Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT não é omissa quanto ao assunto. A
doutrina e a jurisprudência atual têm divergido, alguns defendendo o silêncio
eloqüente do legislador e outros à omissão da CLT sobre o tema. Ademais, é
questionado também o momento processual de sua aplicabilidade se incidente sobre
parcelas controversas ou incontroversas. Questiona-se também qual a efetividade
da referida norma já que, em virtude da grande dificuldade de satisfação do crédito
obreiro, impor-lhe um ônus maior, irá garantir o cumprimento da obrigação? Dúvidas
pairam, outrossim, quanto aos processos em execução em que não se encontram
mais os devedores: a aplicação do referido artigo se dá em relação aos novos
processos ou abarca os já existentes? Outra questão também se refere a aceitação
da referida multa por parte dos advogados trabalhistas ante as dúvidas existentes
quanto à sua aplicabilidade na seara laboral. Este estudo visa averiguar a
aplicabilidade do 475-J do Código de Processo Civil brasileiro na seara laboral, o
momento processual de sua aplicação e efetividade ao se utilizar o aludido artigo no
processo do trabalho.
Palavras Chaves: Processo de Execução art. 475 CPC; Processo de Execução
Trabalhista;
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................9
CAPÍTULO 1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMPLO ACESSO A JUSTIÇA A
EFETIVIDADE E DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO ....................................10
1.1 A EFETIVIDADE DO PROCESSO JUDICIAL .....................................................13
CAPÍTULO 2 A APLICAÇÃO DO ART. 475-J NO PROCESSO DO TRABALHO...19
2.1 MOMENTOS DE APLICAÇÃO DA MULTA DE 10% NO PROCESSO DO
TRABALHO ...............................................................................................................44
CAPÍTULO 3 A EFETIVIDADE DA APLICAÇÃO
DO ARTIGO 475-J: RESULTADOS PRÁTICOS......................................................54
CONCLUSÃO ...........................................................................................................70
REFERÊNCIAS.........................................................................................................71
9
INTRODUÇÃO
Muito tem se questionado da aplicabilidade ou não do artigo 475-J do Código
de Processo Civil na seara trabalhista. A doutrina e jurisprudência têm divergido
quanto ao assunto.
Parte da doutrina entende pela aplicabilidade do artigo em detrimento do
princípio da celeridade processual introduzido com a Emenda Constitucional 45 de
2004. Noutro giro, os contrários à aplicabilidade, afirmam que a Consolidação das
Leis do Trabalho não é omissa quanto ao tema, considerando que há previsão na
Consolidação das Leis do Trabalho, para que haja a penhora, caso não efetuado o
pagamento do quantum debeatur após a liquidação da conta.
Questiona-se, outrossim, a eficácia da aludida norma, uma vez que a
consolidação trabalhista já estipula as multas dos artigos 467 e 477, §8º, caso o
reclamado não cumpra com as suas obrigações trabalhistas.
Insta verificar também se a multa processual civil é bem aceita por parte dos
advogados trabalhistas, ante a divergência doutrinária e jurisprudencial quanto ao
assunto.
Busca-se, assim, no presente estudo verificar a aplicabilidade do artigo 475-J
do Código de Processo Civil no âmbito trabalhista, considerando-se as decisões
emanadas pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho – e o posicionamento
doutrinário sobre a questão. Outrossim, cabe identificar a eficácia da referida norma
ao processo do trabalho.
Para solucionar o problema poderá ser encontrada a padronização do
processo de aplicabilidade da referida multa visando uniformizar a jurisprudência
sobre o caso, com intuito de impedir que decisões contraditórias possa ser aplicadas
em processos diferentes.
10
CAPÍTULO 1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMPLO ACESSO A JUSTIÇA A
EFETIVIDADE E DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO
Todo o sistema jurídico se operacionaliza de forma concatenada decorrente
de princípios sobre os quais se organiza. Assim, destacam-se princípios gerais e
especiais, conforme a natureza de cada princípio.
Essa harmonização tem por escopo estabelecer uma certa coerência entre os
princípios gerais e especiais a fim de que estes não sobreponham àqueles.
Além da coerência lógica dos princípios, estes devem se harmonizar com
determinados fins como políticos, filosóficos, éticos e sociológicos. Busca-se, assim,
preservar os valores idealizados pela sociedade.
O doutrinador Jorge Miranda estabelece a importância dos princípios nos
seguintes termos:
“O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de atos de
vontade, ou mera concatenação de fórmulas verbais articuladas entre si, o
Direito é ordenamento ou conjunto significativo e não conjunção resultada
de vigência simultânea; é a coerência ou, talvez mais rigorosamente,
consistência; é unidade de sentido, é valor incorporado em regra. E esse
ordenamento, esse conjunto, essa unidade, esse valor, projeta-se ou
traduz-se em princípios logicamente anteriores aos preceitos. Os princípios
não se colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Direito
positivo); também eles – numa visão ampla, superadora de concepções
positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais – fazem parte do
complexo ordenamental. Não se contrapõem às normas, contrapõem-se
tão-somente aos preceitos; as normas jurídicas é que se dividem em
normas-princípios e normas disposições”. 1
Norberto Bobbio destaca a importância dos princípios gerais do direito como
fator relevante para toda integração do ordenamento jurídico, in verbis:
“... normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais
gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha questão entre
os juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não há dúvida; os
princípios gerais são normas como todas as outras. (...) Para sustentar que
os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos válidos;
antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios gerais
1
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional, 4 ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1990, tomo
1, p. 197-198.
11
são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva,
não se vê por que não devam ser normas também eles: se abstraio da
espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em
segundo lugar, a função para a qual são extraídos e empregados é a
mesma cumprida por todas as normas, isto é, a função de regular um caso.
E com que finalidade são extraídos em caso de lacuna? Para regular um
comportamento não-regulamentado: mas então servem ao mesmo escopo a
que servem as normas expressas. E por que não deveriam ser normas?
Ao lado dos princípios gerais expressos há os não expressos, ou
seja, aqueles que se podem tirar por abstração de normas específicas ou
pelo menos não muito gerais: são princípios, ou normas generalíssimas,
formuladas pelo intérprete, que busca colher, comparando normas
aparentemente diversas entre si, aquilo a que comumente se chma o
2
espírito do sistema”.
A Constituição Federal de 1988 confere aos princípios o status de autênticas
normas constitucionais, passando estes a serem fontes normativas primárias de
nosso sistema jurídico.
Celso Antonio Bandeira de Mello estabelece que os princípios surgem como o
espírito da lei, servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência:
“é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce
dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata
compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a
racionalidade dos sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá
sentido humano. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção
das diferentes partes componentes de todo unitário que há por nome
sistema jurídico positivo. Violar um princípio é muito mais grave que
transgredir uma norma. É a mais grave forma de ilegalidade ou
inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque
representa insurgência contra do o sistema, subversão de seus valores
fundamentais, costumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua
3
estrutura mestra”.
A Carta Política de 1988 ao estabelecer princípios gerais do processo o fez
considerando aspectos políticos e ideológicos. Nelson Nery afirma que “...por essa
razão, admitem que em contrário se oponham outros de conteúdo diverso,
dependendo do alvedrio do sistema que os está adotando”.4
Dentre os princípios estabelecidos pela Constituição Federal destaca-se o
princípio do contraditório. Estabelecido pelo art. 5º, LV, da Carta Magna, este implica
2
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10 ed. Brasília: Editora UnB, 1997, p. 158159.
3
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1995,
p, 538.
4
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo civil na Constituição Federal, 6ª ed. São Paulo:
RT, 2000, p.21.
12
que há a bilateralidade de ação geral a bilateralidade do processo, ou seja, às partes
envolvidas no processo podem se manifestar contrariamente as alegações
postuladas.
Complementando o princípio supra delineado, surge o princípio da ampla
defesa, com o intuito de possibilitar a outra parte contestar, recorrer ou produzir toda
a prova que lhe constitua fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito
perseguido pela oponente.
Outro princípio que se pode destacar é o devido processo legal.
Este
princípio está explícito no art. 5º, LIV, da CF, ao afirma que “ninguém será privada
da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Nelson Neri leciona que “bastaria a norma constitucional haver adotado o
princípio do due processo of law para que daí decorressem todas as consequências
processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um processo e uma sentença
justa. É, por assim dizer, o gênero do qual todos os demais princípios constitucionais
do processo são espécies”.5
Dentre os princípios elencados na Carta Magna, a Emenda Constitucional nº.
45/2004 visou dar mais celeridade e efetividade ao Poder Judiciário Brasileiro.
Em razão da longa marcha que caminhava o processo no Poder Judiciário,
criaram-se mecanismos que pudessem acelerar esse processo.
Com a inclusão do inciso LXXVIII no art. 5º da Carta Magna este garantiu a
todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os
meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Pretendeu-se firmar a idéia de
que não haveria porque deixar o jurisdicionado apenas com a esperança de um dia
ver satisfeito seu crédito.
Quando o cidadão recorre ao Poder Judiciário espera, num curto prazo de
tempo, ter reconhecido seu direito ou não. Ele quer, no momento, uma resposta do
Estado, ao invés de se utilizar da autotutela para conseguir seus objetivos.
Um Estado mal aparelhado emperra todo o processo judiciário, uma vez que
causa a demora no reconhecer e satisfazer o direito do sujeito.
5
NERY JUNIOR, 2000, p. 2.
13
“Não basta que se tenha uma estrutura montada do Poder Judiciário, com
suas jurisdições, competências, tribunais e juízos especializados. Impõe-se
que efetivamente tal máquina funcione e funcione a contento, não só no que
se refere à qualidade e mesmo, por que não dizer, quantidade de seus
julgamentos, mas também no que se relaciona a um razoável tempo de
entrega da prestação jurisdicional perseguida pelos litigantes,
principalmente, regra geral, por um deles, o que acionou a máquina
judiciária estatal.” (FURTADO, Emmanuel. Direito ao processo do
trabalho em tempo razoável. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 52,
30/04/2008
[Internet].
Disponível
em
http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2513
. Acesso em 29/10/2008.)
Na lição de Ney Stany Morais Maranhão:
“cônscio de que os escopos da jurisdição não estavam sendo alcançados, o
legislador moderno se arvorou a, ousadamente, repensar conceitos,
rediscutir institutos, redefinir idéias, tencionando, com isso, através de uma
ação na esfera legislativa, propiciar à esfera judicial um material de trabalho
apto a dar maior agilidade, racionalidade e eficiência à sistemática
processual”6
Se não houvesse uma profunda modificação na legislação que socorre todo o
direito processual a sua marcha continuaria operando de forma lenta, se arrastando
assim por longos anos.
1.1 A EFETIVIDADE DO PROCESSO JUDICIAL
O cerne da questão se viu durante muito tempo entre o reconhecer e o
satisfazer. Reconhecido o direito através de uma sentença transitada em julgado e
satisfazer o direito reconhecido mostravam-se distantes, eis que difícil era encontrar
patrimônio (bens, dinheiro, etc.) do devedor que pudesse satisfazer o credor. Na
maioria das vezes, o jurisdicionado apenas se encontrava com um pedaço de papel
embaixo dos braços, mas que ainda não teria lhe trazido qualquer benefício.
Com o intuito de garantir a efetividade da jurisdição, conforme o previsto no
inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal que, em 23 de dezembro de
2005, ocorreu a publicação da Lei nº. 11.2327, que alterou sensivelmente a forma de
execução do Código de Processo Civil brasileiro, terminando com a autonomia do
6
MARANHÃO, Ney Stany Morais. Prescrição Ex Officio e Processo do Trabalho. Revista LTr, vol.
71, n. 04, abril de 2007, p. 391.
7
BRASIL, Lei n.º 11.232 de 22 de dezembro de 2005. Publicação do Diário Oficial da União de 23
dez. 2005.
14
processo de execução nos títulos executivos judiciais. Fez-se, no presente caso, de
forma sincrética, a junção dos processos de conhecimento e de execução, não
sendo mais autônomos e sim um único processo.
Segundo lição de José Carlos Barbosa Moreira que, diferentemente do
processo de conhecimento, a execução se manifesta por meio de atos materiais,
destinados a “... modificar a realidade sensível, afeiçoando-a, na medida do
possível, àquilo que, segundo o direito, ela deve ser” 8.
Dentre as inovações trazidas pela Lei nº 11.232/2005, é inegável a relevância
que o novo artigo 475-J do Código de Processo Civil assume nesse contexto de
efetividade e celeridade da execução, uma vez que estabelece a possibilidade de
aplicação de multa de 10% (dez por cento) para o caso de o devedor não efetuar o
pagamento espontâneo do crédito devido no prazo de 15 dias.
O projeto de lei que deu origem a Lei n.º11.232 de 22.12.2005 foi o de n.º
3.253/2004. Este projeto foi apresentado junto à Câmara dos Deputados pelo IBDP
– Instituto Brasileiro de Direito Processual.
Na exposição de motivos do projeto de lei assim constou, in verbis:
“Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Submeto à consideração de Vossa Excelência o anexo Projeto de Lei que
“inclui e dá nova redação a dispositivos da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de
1973, Código de Processo Civil, relativamente ao cumprimento da sentença
que condena ao pagamento de quantia certa, e dá outras providências”.
2. Trata-se de proposta originária do Anteprojeto de Lei elaborado pelo
Instituto Brasileiro de Direito Processual, com objetivo de alterar dispositivos
do Código de Processo Civil, atinente ao cumprimento da sentença que
condena ao pagamento de quantia certa, para possibilitar que a execução
da sentença ocorra na mesma relação processual cognitiva.
3. Como fundamento de iniciativa, transcrevo a Exposição de Motivos que
acompanhou o Anteprojeto de Lei elaborado pelo Instituo de Direito
Processual, da qual são signatários o Sr. Ministro Athos Gusmão Carneiro,
Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Processual, o Sr. Ministro
Sálvio de Figueiredo Teixeira, o Sr. Petrônio Calmon Filho, e a Sra. Ministra
Fátima Nancy Andrighi, a qual denota a necessidade da adoção das normas
projetadas:
1. “Na Exposição de Motivos do vigente Código de Processo Civil, o
eminente professor ALFREDO BUZAID expôs os motivos pelos quais, na
trilha de modelos europeus, propugnava pela unificação das execuções da
sentença condenatória e dos títulos extrajudiciais, ficando destarte
8
MOREIRA, José Carlos Barbosa, Novo Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Forense, 22ª
ed., 2002, p. 185.
15
suprimidos a antiga ‘ação executiva’ do diploma processual de 1939 (com
base em título extrajudicial) e o executivo fiscal “como ações autônomas” (o
executivo fiscal, diga -se, retornou à sua ‘autonomia’ com a Lei no 6.830, de
22.09.1980).
Como magnífica obra de arquitetura jurídica, o Código de 1973 pouco terá
deixado a desejar. A prestação jurisdicional, no entanto, tornou-se sempre
mais célebre e eficiente. BARBOSA MOREIRA, escrevendo sobre as atuais
tendências do direito processual civil, a esse respeito referiu que “O trabalho
empreendido por espíritos agudíssimos levou a requintes derefinamento a
técnica do direito processual e executou sobre fundações sólidas projetos
arquitetônicos de impressionante majestade. Nem sempre conjurou,
todavia, o risco inerente a todo labor do gênero, o deixar-se aprisionar na
teia das abstrações e perder o contato com a IBDP – Instituto Brasileiro
de Direito Processual realidade cotidiana ........... (......) .......... Sente-se,
porém, a necessidade de aplicar com maior eficácia à modelagem do real
as ferramentas pacientemente temperadas e polidas pelo engenho dos
estudiosos” (‘RePro’m 31/199).
2. As várias reformas setoriais efetivadas no CPC sob iniciativa da ESCOLA
NACIONAL DA MAGISTRATURA e do INSTITUTO BRASILEIRO DE
DIREITO PROCESSUAL, já lograram, em termos gerais, bons resultados.
Basta, por exemplo, considerar o progresso, não só pragmático, mas
também em nível teórico, trazido pelo instituto da antecipação dos efeitos da
tutela (‘novo’ apenas em termos de sua generalização), pela célere
sistemática do agravo de instrumento (que inclusive muitíssimo reduziu o
uso anômalo e atécnico do mandado de segurança), pela maior eficiência
dada à ação de consignação em pagamento, pela introdução da ação
monitória, pela ampliação do elenco dos títulos executivos extrajudiciais,
pela eficácia potencializada das sentenças voltadas ao cumprimento das
obrigações de fazer e também das obrigações de entregar coisa, e assim
por diante.
Além disso, três novos projetos de lei, após anos de debates e de análise
de sugestões, vieram a ser aprovados e sancionados, com algumas
alterações e vetos, dando origem à Lei no 10.352, de 26.12.2001, à Lei no
10.358, de 27.12.2001 e à Lei no 10.444, de 07.05.2002.
Entre os pontos mais relevantes, foram limitados os casos de reexame
necessário, permitida a fungibilidade entre as providências antecipatórias e
as medidas cautelares incidentais, reforçada a execução provisória com a
permissão de alienação de bens sob caução adequada, atribuída força
executiva lato senso à sentença condenatória à entrega de bens, permitido
que o relator proceda à conversão do agravo de instrumento em agravo
retido, limitados os casos de cabimento do recurso de embargos
infringentes, melhor disciplinada a audiência preliminar, instituída multa ao
responsável (pessoa física) pelo descumprimento de decisões judiciais etc.
3. É tempo, já agora, de passarmos do pensamento à ação em tema
melhoria dos procedimentos executivos. A execução permanece
‘calcanhar de Aquiles’ do processo. Nada mais difícil, com freqüência,
que impor no mundo dos fatos os preceitos abstratamente formulados
mundo do direito.”
de
o
do
no
Pode-se observar que a intenção do IBDP era garantir a efetividade da
sentença uma vez que ainda não havia sido satisfeito o direito pleiteado
pelo autor.
16
“Com efeito: após o longo contraditório no processo de conhecimento,
ultrapassados todos os percalços, vencidos os sucessivos recursos,
sofridos os prejuízos decorrentes da demora (quando menos o ‘damno
marginale in senso stretto’ de que nos fala ÍTALO ANDOLINA), o
demandante logra obter ao fim a prestação jurisdicional definitiva, com o
trânsito em julgado da condenação da parte adversa. Recebe então a parte
vitoriosa, de imediato, sem tardança maior, o ‘bem da vida’ a que tem
direito? Triste engano: a sentença condenatória é título executivo, mas não
se reveste de preponderante eficácia executiva. Se o vencido não se dispõe
a cumprir a sentença, haverá iniciar o processo de execução, efetuar nova
citação, sujeitar-se à contrariedade do executado mediante ‘embargos’, com
sentença e a possibilidade de novos e sucessivos recursos.
Tudo superado, só então o credor poderá iniciar os atos executórios
propriamente ditos, com a expropriação do bem penhorado, o que não raro
propicia mais incidentes e agravos.
Ponderando, inclusive, o reduzido número de magistrados atuantes
em nosso país, sob índice de litigiosidade sempre crescente (pelas ações
tradicionais e pelas decorrentes da moderna tutela aos direitos
transindividuais), impõe-se buscar maneiras de melhorar o IBDP – Instituto
Brasileiro de Direito Processual desempenho processual (sem fórmulas
mágicas, que não as há), ainda que devamos, em certas matérias (e por
que não?), retomar por vezes caminhos antigos (e aqui o exemplo do
procedimentos do agravo, em sua atual técnica, versão atualizada das
antigas 'cartas diretas' ...), ainda que expungidos rituais e formalismos já
anacrônicos.
4. Lembremos que Alcalá-Zamora combate o tecnicismo da dualidade,
artificialmente criada no direito processual, entre processo de conhecimento
e processo de execução, Sustenta ser mais exato falar apenas de fase
processual de conhecimento e de fase processual de execução, que de
processo de uma e outra classe. Isso porque "a unidade da relação jurídica
e da função processual se estende ao longo de todo o procedimento, em
vez de romper-se em dado momento" (Proceso, autocomposicióny
autodefensa, UNAM, 2a ed., 1970, n. 81, p. 149). Lopes da Costa afirmava
que a intervenção do juiz era não só para restabelecer o império da lei, mas
para satisfazer o direito subjetivo material. E concluía: "o que o autor
mediante o processo pretende é que seja declarado titular de um direito
subjetivo e, sendo o caso, que esse direito se realize pela execução
forçada" (Direito Processual Civil Brasileiro, 2a ed., v.I,n. 72).
As teorias são importantes, mas não podem transformar-se em embaraço a
que se atenda às exigência naturais dos objetivos visados pelo processo, só
por apego a tecnicismo formal. A velha tendência de restringir a jurisdição
ao processo de conhecimento é hoje idéia do passado, de sorte que a
verdade por todos aceita é a da completa e indispensável integração das
atividades cognitivas e executivas. Conhecimento e dec laração sem
execução – proclamou COUTURE, é academia e não processo (apud
HUMBERTO THEDORO JÚNIOR, A execução de sentença e a garantia do
devido processo legal, Ed. Aide, 1987, p.74).
A dicotomia atualmente existente adverte a doutrina, importa a paralisação
da prestação jurisdicional logo após a sentença e a complicada instauração
de um novo procedimento, para que o vencedor possa finalmente tentar
impor ao vencido o comando soberano contido no decisório judicial. Há,
destarte, um longo intervalo entre a definição do direito subjetivo lesado e
sua necessária restauração, isso por pura imposição do sistema
procedimental, sem nenhuma justificativa, quer que de ordem lógica, quer
teórica, quer de ordem prática (ob. cit., p. 149 e passim).
17
5. O presente Anteprojeto foi amplamente debatido em reunião de
processualistas realizada nesta Capital, no segundo semestre de 2002, e
buscou inspiração em muitas críticas construtivas formuladas em sede
doutrinária e também nas experiências reveladas em sede jurisprudencial.
Nesse compasso, destaco as posições fundamentais pertinentes ao tema:
“As posições fundamentais defendidas são as seguintes:
a) (omisssis)
b) a ´efetivação` forçada da sentença condenatória será feita como etapa
final do processo de conhecimento, após um ´tempus iudicati´, sem
necessidade de um ´processo IBDP – Instituto Brasileiro de Direito
Processual autônomo` de execução (afastam-se princípios teóricos em
homenagem à eficiência e brevidade); processo ´sincrético`, no dizer de
autorizado processualista. Assim, no plano doutrinário, são alteradas as
´cargas de eficácia` da sentença condenatória, cuja ´executividade` passa a
um primeiro plano; em decorrência, ´sentença` passa a ser o ato “de
julgamento da causa, com ou sem apreciação do mérito”;
c) a liquidação de sentença é posta em seu devido lugar, como Título do
Livro I, e se caracteriza como ´procedimento` incidental, deixando de ser
uma ´ação` incidental; destarte, a decisão que fixa o ´quantum debeatur`
passa a ser impugnável por agravo de instrumento, não mais por apelação;
é permitida, outrossim, a liquidação ´provisória`, procedida em autos
apartados enquanto pendente recurso dotado de efeito suspensivo;
No texto do projeto encaminhado pelo presidente da república à Câmara dos
Deputados se inseria, dentre eles, o art. 475-J que assim dizia:
“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou
já fixada em liquidação, não o efetue diretamente ao credor no prazo fixado
na sentença, não superior a quinze (15) dias, o montante da condenação
será acrescido de multa no percentual de dez por cento (10%) e, a
requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II,
expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.”
Após a análise pela Câmara dos Deputados, o referido artigo passou a ter a
seguinte redação:
“Art. 475J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou
já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de 15 (quinze) dias, o
montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10%
(dez por cento) e, a requerimento do credor e observado o disposto no art.
614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
A redação do artigo no projeto de lei sofreu a alteração no sentido de se
excluir a obrigação de efetuar o pagamento no prazo fixado na sentença. Nesse
caso, se permanecesse o artigo elaborado no projeto de lei, o magistrado poderia
estipular prazo inferior aos 15 dias determinados em lei. Assim, poderia se estipular,
18
por exemplo, um prazo de 05 dias para pagamento da execução, não garantindo um
tempo razoável para que o devedor pudesse cumprir sua obrigação.
No Senado o artigo não sofreu alterações, permanecendo intacto no seu
conteúdo até a sanção presidencial.
Clauzer Mendes Castro Pinheiro9 afirma que, no âmbito do processo civil, são
diversos os elementos que justificam a aplicação da multa cominatória prevista no
aludido artigo. Dentre os quais se destaca:
a)
o fato de o recurso de apelação possuir em geral, efeito suspensivo, o
que retarda a satisfação do credor, gerando verdadeira penalidade ao
credor;
b)
dispensa-se, nos recursos regulados pelo procedimento comum, a
figura do depósito recursal, a fim de garantir futuramente execução, ficando
a parte vencedora à mercê da boa vontade do executado;
c)
não há a incidência de nenhum tipo de juros legais sobre o valor
executado, mas tão-somente a correção monetária.
E continua o doutrinador:
“Tem lógica, portanto, no processo comum que, em algum momento, a
partir da publicação do acórdão de apelação, à condenação seja agregada
a multa de 10% do art. 475-j do CPC, a fim de coagir o executado a
satisfazer de imediato o crédito do exeqüente”.
9
PINHEIRO, Clauzer Mendes Castro. Revista do Direito Trabalhista, Ano 15, n.º 02 Pág.19. Editora
Consulex.
19
CAPÍTULO 2 A APLICAÇÃO DO ART. 475-J NO PROCESSO DO TRABALHO
O dicionário Aurélio define a palavra integrar no sentido de tornar inteiro,
completar, inteirar. Segundo Carlos Henrique Bezerra Leite, a integração diz respeito
ao suprimento das lacunas presentes nos sistemas jurídicos, impelindo o julgador a
decidir sobre determinado objeto mesmo quando a lei seja omissa quanto ao tema.10
Para suprir tais lacunas, o intérprete vale-se de certas técnicas, que também
atuam como fontes subsidiárias do Direito. Estas técnicas ou fontes subsidiárias do
Direito estão previstas no art. 8º celetista quais sejam: a equidade, os princípios
gerais do direito e a analogia.
Sobre a analogia disserta o Doutor Sergio Pinto Martins ao afirmar que “a
analogia não é um meio de interpretação da norma jurídica, mas de preencher os
claros deixados pelo legislador. Consiste na utilização de uma regra semelhante
para o caso em exame”11
A utilização dessa técnica de integração, entretanto, não pode se dar de
forma indiscriminada, sob a pena de supressão legislativa por parte do julgador,
decidindo extra legem, consequência esta incompatível com o instituto.
Com efeito, o requisito essencial para que se admita a analogia é que haja
motivo para recorrer a normas que, pela sua finalidade prática social, não são as de
espécies em exame, pois não se justifica a aplicação analógica de determinado
dispositivo de lei se a norma que se quer integrar oferece solução, regendo a
hipótese, segundo a interpretação a que se tenha submetido.12
A norma que se busca integrar por meio da analogia deve ser omissa, ou
seja, não pode haver dispositivo em seu corpo que possa regular o tema. Em outros
termos, quando a lei que estabelece determinada causa jurídica preceitua também
seus efeitos, suas conseqüências. Significa dizer que não existe lacuna a ser
preenchida por meio da analogia.
Do contrário, estar-se-ia substituindo o papel do legislador ao aplicar, sobre
determinado sistema jurídico, dispositivo legal alienígena para disciplinar caso já
10
LEITE. Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 2.ed. São Paulo. LTr,
2004.
11
MARTINS. Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. Doutrina e Prática Forense. 26 Ed.
São Paula, Atlas, 2006, p. 35.
12
ESPINOSA. Eduardo. A Lei de introdução ao Código Civil Brasileiro. (Dec.Lei n.º 4.657,
4.9.1942, vol. 1., 3ed. Rio de Janeiro. Renovar, 1999, p. 107.
20
contemplado por aquele sistema normativo, o que não é o objetivo desta técnica de
integração.
No que se refere a aplicação do artigo 475-J do CPC no processo do trabalho,
parte da doutrina vem entendido que a CLT não é omissa quanto ao tema em
execução.
De um lado está o juiz do trabalho que, na fase de execução, deve adotar
procedimentos que assegurem a tão desejada efetivação da sentença, imprimindo
celeridade na tramitação da execução (Constituição da República, art.5º, LXXVIII),
por outro, precisa garantir às partes o devido processo legal.
A situação é completamente diversa do que ocorre no Processo Civil, afirma
Clauzer13, pois o processo do trabalho é extremamente penoso ao reclamado no
decorrer da reclamação e posterior execução de seu débito pelas seguintes razões:
a)
nada impede a realização da execução provisória após a prolação da
sentença monocrática, uma vez que o recurso ordinário não possuiu efeito
suspensivo;
b)
para a interposição dos recursos trabalhistas, faz-se necessária a
figura do depósito recursal, que visa segurar antecipadamente o pagamento
da execução comprometendo antecipadamente o patrimônio do executado;
c)
sobre o valor da execução, recai, além da correção monetária, custas
judiciais e juros de mora equivalente a TRD, além de mora de 1% ao mês.
João Batista Brito Pereira preleciona nos seguintes termos:
“A meu entender, a regra do art. 475-J do CPC não se ajusta ao processo
do trabalho no estágio de hoje, visto que a matéria possui disciplina
específica na CLT, objeto do seu art. 879, §§ 1º-B e 2º, verbis: .Sendo
ilíquida a sentença exeqüenda, ordenar-se-á, previamente, a sua liquidação,
que poderá ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos. § 1º-B As
partes deverão ser previamente intimadas para a apresentação do cálculo
de liquidação, inclusive da contribuição previdenciária incidente. § 2º
Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo
sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a
indicação dos itens e valores objeto da discordância, sob pena de
14
preclusão.”
Mallet se posiciona afirmando:
“...a imposição de ônus adicional de 10%, no caso de inadimplemento da
condenação no pagamento de quantia certa, na forma do art. 475-J do
Código de Processo Civil, busca tornar menos interessante, do ponto de
vista econômico, a mora do devedor no adimplemento da obrigação. Afinal,
caso se execute, pouco mais ou menos, o mesmo valor que deveria ser
13
14
MOREIRA, 2002, p. 185.
Rev. TST, Brasília, vol. 73, nº 1, jan/mar 2007. p. 21.
21
pago voluntariamente, é desprezível a vantagem decorrente do pronto
cumprimento do julgado. [...]. No processo do trabalho, ante a natureza
geralmente alimentar do crédito exeqüendo, sua rápida satisfação é ainda
mais importante, o que ficaria facilitado pela aplicação da providência agora
inserida no texto do Código de Processo Civil. O art. 880, caput, da
Consolidação das Leis do Trabalho, não se refere, porém, a nenhum
acréscimo para a hipótese de não-satisfação voluntária do crédito
exeqüendo, o que leva a afastar-se a aplicação subsidiária, in malam
partem, da regra contida no art. 475-J do Código de Processo Civil. Solução
diversa, ainda que desejável, do ponto de vista teórico, depende de reforma
15
legislativa.”
O doutrinador João Batista Brito Pereira esclarece:
“A sanção é de todo inaplicável ao processo do trabalho, ante a expressa
disposição do art. 880 da CLT, verbis: .O juiz ou presidente do Tribunal,
requerida a execução, mandará expedir mandado de citação ao executado,
a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as
cominações estabelecidas, [...] para que pague em 48 horas ou garanta a
execução sob pena de penhora. Enquanto isso, o § 1º do art. 457-J fixa
prazo superior, ao dispor: .Do auto de penhora e de avaliação será de
imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e
237), ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por
mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no
prazo de quinze dias.. Não se pode perder de vista, entretanto, que o art.
769 da CLT só permite a aplicação (e, assim mesmo, subsidiariamente) da
norma do processo comum se a lei processual do trabalho for omissa
quanto ao tema e, ainda, se for compatível com esta. Isto é, não basta que
o direito processual do trabalho seja omisso, é preciso que a norma a ser
aplicada supletivamente seja compatível com o processo do trabalho.”16
José Augusto Rodrigues Pinto, juiz aposentado do TRT da 5ª Região e da
Academia Nacional de Direito do Trabalho, ao tratar dessa questão, afirma a
natureza de astreinte dessa multa, afirmando a inaplicabilidade da norma do CPC na
execução trabalhista, nos seguintes termos:
“O art. 475-J reage com uma astreinte ao não cumprimento voluntário da
sentença transitada em julgado e, se for o caso, tornada líquida, [...]. A
importante regra adotada, além de indicar a procedência legal da constrição
pecuniária, que lhe dá a pura natureza de astreinte, define sua incidência
automática, ou seja, à forfait de requerimento do credor ou de prudente
arbítrio do juiz. Há uma determinação taxativa de agravar a obrigação
imposta pela sentença logo que se verifica a disposição do devedor de
negar-lhe obediência, tacitamente manifestada com o esgotamento do
prazo concedido para cumprimento espontâneo. Acreditamos que a norma
contribua eficazmente para atalhar o desfecho do dissídio, na medida em
que torna economicamente desestimulante ao devedor fazê-lo perdurar com
intuito procrastinatório. Malgrado a evidente afinidade do resultado que isso
propicia com o anseio de celeridade do processo trabalhista, em razão da
inferioridade econômica do trabalhador (não apenas do empregado, em
15
MALLET, Estevão. O processo do trabalho e as recentes modificações do código de processo
civil.Revista LTr, p. 669, jun./2006.
16
PEREIRA, João Batista Brito. Op. cit.,..
22
face da EC 45/2004) e da função alimentar dos créditos que vindica na
Justiça do Trabalho, não consideramos possível trazê-la do CPC para a
execução trabalhista, apesar do silêncio da CLT, no particular. É que, sendo
norma impositiva de coerção econômica, há que ter aplicação restrita,
forçando a caracterização do silêncio da legislação a ser suprida como
impeditivo e não omissão, e só esta última hipótese autorizaria o
suprimento.”17
As duas principais situações que se apresentam hoje com o advento do art.
475-J no âmbito trabalhista são:
a) Ao homologar os cálculos de liquidação, o juiz manda citar o devedor para
pagar a dívida, advertindo-o de que deverá fazê-lo em 48 horas sob pena de o
débito ser acrescido da multa e 10%, conforme delineado no art. 475-J do CPC. Aqui
contraria, em primeiro lugar, o art. 769 celetista, que não autoriza a utilização da
regra, desprezando a norma de regência do processo do trabalho; em segundo, o
próprio art. 475-J, que fixa o prazo para o devedor quitar a dívida em 15 dias, em
vez de 48 horas. O juiz do trabalho tem reduzido o prazo para 48 horas; se assim
procede a tanto inspirado na legislação processual própria, não pode impor a
sanção, visto que a norma trabalhista não a contempla.
b) Homologados os cálculos de liquidação, cita o devedor para pagar no
prazo de 15 dias o valor apurado, sob pena de ser acrescido de 10%, a título de
multa na forma do art. 475-J do CPC, seguida da penhora. Assim procedendo, o juiz
do trabalho nega vigência à norma processual trabalhista que sequer foi derrogada,
fazendo-o em flagrante ofensa ao art. 769 da CLT. Em ambos os procedimentos, o
juiz abandona a regra própria, importa a do processo civil, negando vigência aos
arts. 879, § 2º, e 880 da CLT.
Finalmente, vaticina o magistrado José Augusto Rodrigues Pinto:
“Não se desconhece que o legislador do processo comum vem
desenvolvendo grandes esforços para superar as mazelas emergentes da
indesejada lentidão do processo judicial, e o processo comum tem sido
contemplado com as mais significativas novidades introduzidas até aqui.
Não se tem dúvida de que quando o juiz do trabalho desenvolve esforços
para importar as novidades de lá para o processo do trabalho encontra-se
imbuído do mesmo espírito do legislador que engendrou a novidade. Isto é,
todos os atores visam a imprimir celeridade ao processo judicial, livrar-se de
formalismos, hoje inadequados, aprimorar a prestação jurisdicional e
emprestar efetividade à sentença. Entretanto, novidade como, por exemplo,
aquela inserta no art. 475-J não encontra abrigo no processo do trabalho,
17
PINTO, José Augusto Rodrigues. Compreensão didática da Lei nº 11.232, de 22.12.2005.
Revista LTr, p. 312/313, mar./2006.
23
primeiro porque neste não há previsão, segundo porque a via estreita do art.
769 da CLT somente trata da aplicação supletiva das normas do processo
comum condicionado a dois fatores (omissão e compatibilidade). Fora”.
desses dois fatores estar-se-ia diante de indesejada substituição dos
dispositivos da CLT por aqueles do CPC que se pretende aplicar sob o
signo da vanguarda. Por isso mesmo, provavelmente, nem sempre se
traduz na tão almejada efetivação do comando sentencial. Caso a baliza
inscrita no art. 769 da CLT, cuja preservação é a garantia da autonomia do
processo do trabalho, não seja preservada, o juiz do trabalho poderá
incorrer no pecado da desatenção aos princípios da legalidade e do devido
processo legal inscritos, como se sabe, no art. 5º, II e LIV, da Constituição
18
da República.” .
Manoel Antonio Teixeira Filho afirma que “certos setores da doutrina e da
própria magistratura trabalhista do primeiro grau de jurisdição vêm entendendo que
as disposições da Lei n° 11.232/2005, reguladoras do procedimento do
Cumprimento da Sentença, são aplicáveis ao processo do trabalho”.
Os fundamentos dessa corrente de pensamento são de diversas colorações,
algumas de natureza acentuadamente político-ideológica; em essência, contudo,
apresentam certos pontos-comuns, como as afirmações de que:
a) a Consolidação das Leis do Trabalho é omissa no tocante à matéria;
b) a aplicação do procedimento do cumprimento da sentença. Contribui para o
atendimento à cláusula constitucional da razoável duração do processo. (CF, art. 5°,
inciso LXXVIII).
Quanto à omissão da norma celetista, a primeira corrente costuma invocar,
em defesa de seu ponto de vista, a lição de Norberto Bobbio a respeito das lacunas
da lei, particularmente aquelas que este notável jurista classifica de lacunas
objetivas.
As lacunas, segundo Bobbio, decorrem da dinâmica das relações sociais, das
novas invenções, de fenômenos econômicos supervenientes, de progressos
tecnológicos, enfim, de todos aqueles fatores que provocam o envelhecimento dos
textos legais. Esse envelhecimento normativo autorizaria o magistrado a buscar, em
outros sistemas processuais, normas capazes de conceder maior efetividade ao
processo que a ele incumbe aplicar, ainda que este não seja tecnicamente lacunoso.
A lacuna seria, por assim dizer, não formal, mas, ideológica. Essa corrente
de pensamento traz, assim, implícita, a afirmação de que determinadas normas da
18
PEREIRA, João Batista Brito. Op. cit.,..
24
CLT, regentes da execução, podem ser substituídas por normas do processo
comum, especialmente, o civil, em nome da necessidade de tornar o processo do
trabalho mais célere e mais efetivo.
Em última análise, essa doutrina, que entende pela aplicabilidade da norma
processual, embora reconheça que a CLT contém regras estruturadoras da fase de
execução e, em particular, reguladoras dos embargos do devedor (art. 880),
sustenta ser possível a incidência de artigos do CPC, segundo o critério da
comparação valorativa dos sistemas normativos e do resultado que disso decorra.
Ou seja, cotejando-se as disposições da CLT com as do CPC e verificando-se
que estas são mais eficientes do que aquelas, aplicam-se as do CPC. Percebe-se,
assim, que a pretexto de dar ao art. 769 da CLT uma interpretação mais
consentânea com a realidade, essa doutrina acaba por negar vigência à referida
norma legal ao colocar de lado o pressuposto fundamental da omissão, nela
estampado.
João Batista Brito Pereira afirma que não é adepto e, quanto menos, defensor
do positivismo jurídico, que sói desaguar no dogma da completude do processo do
trabalho legislado, vendo-o, por isso, como um sistema ocluso, impenetrável por
normas de outros sistemas.
Ademais, João Batista Brito Pereira afirma que, a despeito da grande
admiração que esse autor tem a Bobbio, a Claus-Wilhelm Canaris, a Karl Engisch e
a tantos outros juristas de nomeada, ele entende que o pensamento destes
escritores não serve à causa daqueles que, ao contrário dele, sustenta a aplicação
do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho.
E mais: O ilustre João Batista Brito Pereira tem plena consciência da
incompletude do processo do trabalho legislado; essa existência lacunosa, aliás, foi
antevista pelo próprio legislador, como evidencia a regra integrativa inscrita no art.
769 da CLT. Em decorrência disso, o processo do trabalho vem adotando, ao longo
dos anos, em caráter supletório, normas do processo civil para colmatá-lo, para
torná-lo completo e, deste modo, propiciar-lhe meios e condições para atingir os fins
a que se destina . movido, sempre, nesse afanoso mister, pelo combustível da
celeridade.
Afirma também o doutrinador que não há necessidade de referir os inúmeros
dispositivos do CPC que têm sido aplicados, costumeiramente, ao processo do
trabalho.
25
É importante observar, isto sim, segundo João Batista Brito Pereira, que a
adoção supletiva de normas do processo civil não pode acarretar alteração do
sistema (procedimento) do processo do trabalho, que é a espinha dorsal deste, pois
se sabe que essa adoção só se justifica como providência necessária para atribuir
maior eficácia ao sobredito sistema e não, para modificar-lhe a estrutura em que se
apóia.
No sistema do processo do trabalho, a execução constitui processo
autônomo, previsto nos arts. 876 a 892 da CLT. O fato de o CPC haver deslocado a
liquidação e a execução por quantia certa, decorrente de título judicial, para o
processo de conhecimento não torna o processo do trabalho omisso ou lacunoso.
Sob este aspecto, é importante reiterar a observação de que o sistema
próprio do processo do trabalho possui a figura dos embargos à execução (art. 884),
onde o devedor poderá, em processo autônomo, resistir, juridicamente, aos atos
executivos.
Se as novas disposições do CPC, atinentes ao Cumprimento da Sentença,
são mais eficazes do que as da CLT, alusivas ao processo autônomo de execução,
é algo de que se pode cogitar no plano teórico ou erístico. O que não se pode
afirmar é que o processo do trabalho seja omisso no tocante à matéria.
Portanto, no que diz respeito, estritamente, à atitude do devedor diante do
título executivo judicial e de sua resistência jurídica aos atos que daí derivam, o
processo do trabalho é completo, ou seja, não é omisso, repelindo, por isso, a
aplicação supletória do art. 475-J do CPC.
A concessão única que se pode fazer, neste assunto, é quanto às matérias
que o devedor possa alegar em seus embargos, uma vez que a realidade prática
demonstrou serem insuficientes as enumeradas no art. 884, § 1°, da CLT. Neste
caso, porém, a adoção supletiva da norma do processo civil não implica
necessariamente a modificação do sistema próprio do processo do trabalho, e sim,
aprimoramento deste.
Não sendo, pois, o sistema atinente do processo do trabalho omisso ou
lacunoso quanto a possibilidade do devedor pode opor-se à execução, a aplicação
das
normas
do
processo
civil,
atinentes
ao
Cumprimento
(especialmente, o art. 475-J, caput, e § 1°), implicam em:
da
Sentença
26
a)
indisfarçável transgressão ao art. 769 da CLT, que coloca a omissão
como requisito fundamental para a adoção supletiva de normas do processo civil ao
processo do trabalho, não se configurando este pressuposto pelo simples fato de o
CPC haver sido dotado de novas disposições;
b)
arbitrária derrogação dos dispositivos celetistas que disciplinam o
processo de execução (os arts. 880 e 884), como se fosse juridicamente possível,
lege lata, normas editadas com vistas ao processo civil derrubarem expressas
disposições da CLT, que, como é óbvio, são específicas do processo do trabalho.
A esse respeito, é oportuno observar que tramita na Câmara Federal o
Projeto de Lei nº 7.152/200619, apresentado pelo, então, Deputado Luiz Antonio
Fleury, que pretende acrescentar ao art. 769 da CLT o parágrafo único, com a
seguinte redação:
Parágrafo único. O direito processual comum também poderá ser utilizado
no processo do trabalho, inclusive na fase recursal ou de execução, naquilo
em que permitir maior celeridade ou efetividade de jurisdição, ainda que
existente norma previamente estabelecida em sentido contrário.(destaque)
Lê-se na Justificação desse Projeto de Lei:
O art. 769 da Consolidação das Leis do Trabalho CLT determina que se
apliquem ao processo do trabalho as normas do processo civil, de modo
subsidiário, quando houver omissão sobre o tema na legislação trabalhista.
Porém, quando há disposição celetista sobre o tema, nos termos do referido
artigo, fica impedida a utilização, no processo do trabalho, das normas do
processo civil, ainda que propiciem maior celeridade e efetividade de
jurisdição.
Essa limitação legal, todavia, não teria razão de existir, pois cria uma
estagnação do processo do trabalho em relação aos avanços patrocinados no
âmbito do processo civil.
O texto ora proposto, ainda, elimina eventual controvérsia sobre futuras
alterações da processualística trabalhista, de modo a que as normas do processo
civil poderiam ser aplicadas apenas em relação às disciplinas preexistentes.
Assim, se o processo do trabalho resolver disciplinar de modo diverso uma
determinada situação, ainda que em confronto com a celeridade por todos almejada,
esta solução é que irá prevalecer, por mais recente que seja.
27
Aí está: somente por lei futura (de lege ferenda) é que se poderá afastar
determinadas normas da CLT, para, em seu lugar, introduzirem-se normas do CPC.
É importante ressaltar, ainda, o fato de o mencionado Projeto de Lei ser
posterior à Lei n° 11.232/2005: enquanto esta foi publicada em 23 de dezembro de
2005, aquele foi elaborado em 30 de maio de 2006. Com base nessa cronologia, é
razoável afirmar que esse Projeto de Lei traduz um reconhecimento expresso de que
o art. 769, caput, da CLT, como está, não autoriza a incidência, no processo do
trabalho, das disposições da Lei n° 11.232/2005, pertinentes ao Cumprimento da
Sentença.
Aliás, o trecho do Projeto de Lei nº 7.152/2006 citado acima deixa isso muito
evidente.
Não vem ao caso examinar se o objetivo e o conteúdo do referido Projeto de
Lei são bons ou maus. O que importa é ressaltar que ele constitui patente
demonstração do equívoco em que vêm incorrendo todos aqueles que sustentam a
possibilidade, de lege lata, de serem aplicadas normas do processo civil ao processo
do trabalho, mesmo quando este possua expressas disposições acerca do
procedimento que lhe é próprio, vale dizer, não seja omisso.
Poder-se-ia objetar o possível argumento de que, por exemplo, o art. 333 do
CPC vem sendo aplicado ao processo do trabalho, em que pese ao fato de a CLT
possuir norma própria expressa no art. 818 da CLT. Se assim vier a alegar, é
necessário redarguir, em caráter proléptico, que o argumento é imperfeito, pois a
incidência da referida norma do CPC no processo do trabalho tem sido admitida à
guisa de complementação ou de detalhamento da regra estampada no art. 818 da
CLT.
Logo, a adoção do art. 333 do CPC, pelo processo do trabalho, não se faz em
substituição ao art. 818 da CLT, e sim, a título de sua colmatação.
Sem que o Projeto n° 7.152/2006 se converta em Lei, portanto, toda
substituição de norma do processo do trabalho por norma do processo civil é
arbitrária; mais do que isso, é transgressora do preceito estampado no art. 769 da
CLT e de outros mais, conforme se demonstrou.
Ademais, ainda que se admitisse, apenas ad argumentandum, que a CLT
fosse omissa acerca da matéria, nem por isso se estaria autorizado a adotar as
normas do CPC, porquanto, nos termos do art. 889 da CLT, quando o texto
28
trabalhista for lacunoso, em tema de execução, a incidência supletiva será dos
dispositivos que regulam o processo de execução fiscal ou, para atualizar essa
dicção normativa, dos dispositivos da Lei nº 6.830/198020, que versa sobre a
execução da dívida ativa da Fazenda Pública.
E, nesta Lei, a resistência jurídica do devedor aos atos executivos se faz
mediante a figura tradicional dos embargos. Seria algo irônico asseverar que a
mencionada Lei também é lacunosa no tocante à multa a ser imposta ao devedor
que não cumprir, voluntariamente, a obrigação de pagar quantia certa, na forma do
art. 475-J do CPC, sabendo-se que, aqui, de modo geral, o devedor é o contribuinte.
Ada Pellegrini Grinover, escrevendo sobre a Lei n° 11.232/2005, concluiu,
com acerto:
Parece, assim que a Lei n° 11.232/2005 eliminou quase por completo, do
processo civil brasileiro, a categoria das chamadas sentenças
condenatórias puras, ou seja, aquelas que demandavam um processo de
execução autônomo..
[...]
Não sobra espaço, pois, no âmbito do novo sistema processual civil
brasileiro para as sentenças condenatórias puras, restritas agora ao
processo trabalhista e ao processo de execução contra a Fazenda Pública,
que têm disciplina própria. 21
No que tange, em particular, aos magistrados que vêm aplicando o art. 475-J
do CPC ao processo do trabalho, a nota característica tem sido a falta de
uniformidade procedimental, porquanto:
a)
alguns aplicam por inteiro as disposições dessa norma forânea,
adotando, assim, o procedimento nela descrito: 15 dias para cumprir, de maneira
espontânea, a obrigação, sob pena de multa de dez por cento sobre o total da
dívida, e 15 dias para impugnar a sentença, desde que garantida a execução;
b)
outros as aplicam de maneira parcial, fragmentada, fazendo constar,
por exemplo, do mandado executivo que o devedor disporá de cinco, de oito, de dez
ou de quinze dias para pagar a dívida, sob pena de o montante ser acrescido da
multa de dez por cento (CPC, art. 475-J, caput). Neste caso, não estabelecem que,
após a garantia patrimonial da execução, o devedor terá o prazo de quinze dias para
20
Lei de Execução Fiscal
(In Mudanças Estruturais no Processo Civil Brasileiro, Revista IOB de Direito Civil e Processual
Civil, São Paulo, n. 44, nov.-dez./2006, p. 35/55).
21
29
impugnar o título executivo (como estatui o art. 475-J, § 1°, do CPC), e sim, de cinco
dias para oferecer embargos à execução, nos termos do art. 880, caput, da CLT.
O doutrinador João Batista Pereira afirma:
“... esse insólito hibridismo processual, mais do que surrealista, revela
traços de autêntica teratologia, por gerar um terceiro procedimento
(tertiusgenus), resultante da imbricação arbitrária de normas do processo
civil com as do trabalho, sem que se possa ver, nisso, a configuração do
devido processo legal, assegurado pela Constituição da República (art. 5°,
LIV). Ademais, esse hibridismo infunde uma inquietante insegurança jurídica
no espírito dos jurisdicionados, por deixá-los à mercê do entendimento
pessoal e idiossincrático de cada magistrado.22
E continua o autor ao afirmar que “Num Estado Democrático de Direito, como
é este em que se funda a República Federativa do Brasil (CF, art. 1°, caput), é
fundamental que as pessoas em geral (CF, art. 5°, caput) possuam um mínimo de
segurança jurídica”.23
Com relação a aplicação do procedimento do cumprimento da sentença
existente na cláusula constitucional da razoável duração do processo (CF, art. 5°,
inciso LXXVIII), Manoel Teixeira afirma que o aludido princípio assegura, tanto no
âmbito judicial quanto no administrativo, a razoável duração do processo e os meios
que garantam a celeridade de sua tramitação embora fosse mais apropriado à
técnica que se cogitasse, na alusão ao âmbito administrativo, de procedimento.
Nada obstante, ao contrário do que têm sustentado alguns estudiosos, as
disposições do CPC pertinentes ao cumprimento da sentença, em especial a que
estipula a multa de 10% sobre o valor da condenação, caso o devedor não realize o
pagamento do montante no prazo de quinze dias (art. 475-J, caput), não estão
jungidas à cláusula constitucional da razoável duração do processo.
Se assim estivessem, ficaria difícil explicar a razão pela qual:
a)
o § 5° do mesmo dispositivo do CPC concede ao credor o largo prazo de
seis meses para requerer a execução, sabendo-se que no sistema daquele processo
a execução somente poderá ser iniciada a requerimento do credor;
b)
se fixou o prazo de quinze dias para o pagamento da dívida (art. 475-J,
caput) e de outros quinze dias para a impugnação do título executivo (ibidem, § 1°),
22
(In Mudanças Estruturais no Processo Civil Brasileiro, Revista IOB de Direito Civil e Processual
Civil, São Paulo, n. 44, nov.-dez./2006, p. 35/55).
23
Rev.TST_73-1.p.65 57 07/04/2008.
30
quando, antes, o devedor dispunha, apenas, de dez dias para oferecer embargos à
execução (art. 738);
c)
se facultou ao juiz a possibilidade de atribuir efeito suspensivo à
impugnação (art. 475-M).
Logo, persistem pelos doutrinadores dúvidas quanto à aplicação de
disposições do CPC ao processo do trabalho, possibilidade que, em sede de
argumentação, traria algum efetivo benefício ao credor, em termos de celeridade, na
hipótese de o devedor pretender impugnar o título executivo”.
A norma processual trabalhista dispensa o uso da analogia, pois, para sua
causa legal, (mandado de citação para pagamento da execução), estabelece com
propriedade e inteireza todas as conseqüências de seu descumprimento (penhora
dos bens do executado no valor da condenação, acrescidos de custas e juros de
mora), não havendo que se falar em lacuna quanto à execução trabalhista.
A jurisprudência produzida no Colendo Tribunal Superior do Trabalho vem se
posicionando quanto a aplicação do artigo do CPC no âmbito trabalhista, persistindo
correntes doutrinárias que defendem e, ao mesmo tempo, entende pela sua
inaplicabilidade.
Em julgamento de Recurso de Revista pela 4ª Turma do C. TST, sob a
relatoria da Exmo. Ministro FERNANDO EIZO ONO (Processo n.º AIRR-2457/1988011-03-41)24 publicado em 8.10.2008, concluiu-se pela aplicabilidade do artigo 475-J
do CPC no âmbito trabalhista. Peço, permissa vênia, para transcrever trecho do
referido acórdão:
Tribunal Superior do Trabalho
Feito: AIRR-2457/1988-011-03-41
Data de Publicação: 19/12/2008
Relator: FERNANDO EIZO ONO
Ementa:AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA.
PROCESSO EM FASE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. MULTAS COMINADAS. JUROS DE
MORA. Não demonstrada a hipótese de cabimento do recurso de revista
prevista no art. 896, § 2º, da CLT. Fundamentos da decisão denegatória não
desconstituídos. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
Inteiro Teor:
4ª TURMA GMFEO/EGA/CJJ.AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO
DE REVISTA. PROCESSO EM FASE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA.
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. MULTAS COMINADAS.
24
BRASIL,Tribunal Superior do Trabalho, AIRR-2457/1988-011-03-41, Data de Publicação: 19 dez.
2008.
31
JUROS DE MORA. Não demonstrada a hipótese de cabimento do recurso
de revista prevista no art. 896, § 2º, da CLT.
Fundamentos da decisão denegatória não desconstituídos. Agravo de
instrumento a que se nega provimento. Vistos, relatados e discutidos estes
autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR2457/1988-011-03-41.4 , em que é Agravante BANCO DO BRASIL S.A. e
são Agravados ONILDO ALFREDO e CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS
FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL-PREVI .
O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região denegou seguimento
ao recurso de revista interposto pelo BANCO DO BRASIL S.A., o que
ensejou a interposição do presente agravo de instrumento. O Reclamante
apresentou contraminuta ao agravo de instrumento e contra-razões ao
recurso de revista. Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do
Trabalho.
É o relatório.
VOTO
1. CONHECIMENTO Atendidos os pressupostos legais de admissibilidade
do agravo de instrumento, dele conheço.
2. MÉRITO Foi denegado seguimento ao recurso de revista interposto pelo
BANCO DO BRASIL S.A. , em que se discutiam os seguintes temas:
a)negativa de prestação jurisdicional; b) multas cominadas; e c)juros de
mora.
O Agravante insiste no processamento do recurso de revista, sob a
alegação de que foram demonstrados os requisitos do art. 896 da CLT.
O recurso de revista foi interposto com fundamento em violação de preceito
de lei e da Constituição Federal.
Examinados o teor do acórdão regional, as alegações do recurso de revista
e os fundamentos da decisão denegatória, constata-se que, no agravo de
instrumento, o Agravante não apresenta argumentos suficientes para
desconstituir a decisão agravada, que corretamente negou seguimento ao
recurso de revista.
Repete as alegações já apresentadas no recurso de revista.
Diante disso, adoto como razões de decidir os fundamentos da decisão que
denegou o processamento do recurso de revista, nestes termos:
CONSIDERAÇÕES INICIAIS Tratam-se de recursos de revista interpostos
contra decisão proferida em sede de execução, a suscitar o exame,
exclusivamente, sob o ângulo de ofensa à Constituição da República, a teor
do art. 896, parágrafo 2°, da CLT. Desse modo, afastam-se, de plano,
alegações de violação infraconstitucional ou divergência jurisprudencial.
RECURSO DE: BANCO DO BRASIL S.A. E OUTRA (.) PRELIMINAR DE
NULIDADE-NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Alegação(ões ):
-violação do(s) art(s). 5°, incisos LIV e LV; 93, inciso IX da CF.
Não se verifica a alegada nulidade por negativa de prestação jurisdicional,
uma vez que a Eg. Turma julgadora examinou todas as questões que lhe
foram submetidas a julgamento, fundamentando como prescreve a lei (art.
832 da CLT), com a independência que esta lhe faculta (art. 131 do CPC),
não restando violado o dispositivo constitucional apontado, pertinente à
ausência de tutela judicante (OJ 115/SDI-I/TST).
32
MULTA ART. 475-J CPC-APLICABILIDADE AO PROCESSO DO
TRABALHO Alegação(ões) :
-violação do art. 5°, incisos II, LIV e LV da CF.
Consta do v. Acórdão (f. 2252/2253):
Insurge-se o agravante contra as multas que lhe foram cominadas (art.
601 e 475-J do CPC), incidindo sobre o valor corrigido da causa e sobre o
crédito exeqüendo; respectivamente.
Razão não lhe assiste.
No caso concreto as multas foram corretamente aplicadas, restando
constatado o intuito meramente protelatório utilizado pelo agravante ao
interpor o seu agravo, reutilizando argumentos já devidamente rebatidos na
1ª instância, (fls. 2169/2170 e fls. 2176/2177).
Sua conduta obviamente é protelatória, mesmo porque todas as questões
impugnadas no agravo foram devidamente analisadas e decididas na
decisão de embargos às fls. 2176/2177.
A litigância de má-fé resta patente, podendo o agravante ser enquadrado
nas hipóteses dos incisos VI e VII do art. 17/CPC.
Quanto à multa do art. 601, esta decorre da evidente oposição maliciosa à
execução (inciso II do art. 600/CPC), não merecendo maiores
esclarecimentos em face da detalhada fundamentação de fls. 2226/2234, da
mesma forma quanto à multa prevista no art. 475-J do CPC. Não há que se
falar em qualquer exclusão.
Não há ainda qualquer irregularidade pela acumulação das multas já que a
legislação processual civil prevê em dois dispositivos diversos as condutas
assumidas pelo executado, não tendo o legislador nada disposto sobre a
impossibilidade de cominação simultânea das multas previstas no art. 475-J
e no art. 601/CPC .
Não se patenteia a pretendida vulneração literal e direta dos dispositivos
constitucionais apontados, na medida em que o entendimento firmado
encontra respaldo em normas processuais (artigos 17, 475-J, 600 e 601 do
CPC).
Assim, se ofensa houvesse à Carta Magna, o que não é o caso, seria
indireta e reflexa.
JUROS DE MORA Alegação(ões ):
-violação do(s) art(s). 5°, inciso XXXVI da CF.
Consta do v. Acórdão (f. 2251/2252):
No caso concreto, inocorreu qualquer violação aos dispositivos
constitucionais apontados ou arbitrariedade, tendo apenas sido aplicada a
moderna Lei 9756/98 que visou atender aos princípios da economia e
celeridade processual orientadores do Processo do Trabalho, por
constatada a manifesta improcedência do recurso.
A própria IN.17/TST que uniformiza a interpretação da Lei 9756/98, com
relação ao recurso de revista, admite expressamente a aplicação do
disposto no art. 557/CPC (por ela alterado), no Processo do Trabalho, não
havendo qualquer irregularidade ou afronta ao princípio da ampla defesa
(art. 5º, LV da C.F./88).
Frise-se ainda que o art. 557/CPC foi considerado constitucional pelo TST,
de acordo com o Precedente 73 da SDI2 daquele Tribunal inserido em
08/11/00.
Tal entendimento encontra-se ratificado pelo STJ, que através da Súmula
253, considerou aplicável o art. 557/CPC inclusive nos recursos oficiais (DL.
779/69).
Quanto aos juros de mora, não há falar em absurdo jurídico, eis que correm
normalmente.
A matéria objeto do agravo de petição, como se verifica às fls.
2226/2234, restou adequadamente analisada e constatado o
descumprimento da exigência legal prevista no § 1° do art. 897 da CLT,
inexistindo delimitação quanto aos valores impugnados, não havendo
qualquer razão plausível para aquele recurso, senão procrastinar ainda
mais a já demorada execução .
33
Não se delineia na tese perfilhada ofensa à literalidade do dispositivo
indicado.
Na verdade, a v. decisão atacada não alçou a matéria atinente aos juros de
mora ao patamar constitucional, valendo observar que o fundamento
utilizado à f. 2252 é no sentido de que a parte não observou a determinação
contida no artigo 897, parágrafo 1º, da CLT, pois não delimitou os valores
impugnados.
CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista (fls. 1007/1011).
Nos termos do § 2º do art. 896 da CLT e do entendimento constante da
Súmula nº 266 deste Tribunal, a admissibilidade do recurso de revista em
fase de execução depende de demonstração de violação direta e literal de
norma da Constituição Federal. Sendo assim, a análise do recurso de
revista se restringe à alegação de violação dos arts. 5º,(II, XXXVI, LIV e LV)
e 93, IX, da CF/88.
O Supremo Tribunal Federal firmou a sua jurisprudência no sentido de
afastar a alegação de violação direta da Constituição Federal, nestes casos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO-MATÉRIA TRABALHISTA-APLICAÇÃO DE
ENUNCIADO DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO-ALEGAÇÃO DE
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL-INOCORRÊNCIA
AUSÊNCIA DE OFENSA DIRETA À CONSTITUIÇÃO- RECURSO
IMPROVIDO.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pronunciando-se em causas
de natureza trabalhista, deixou assentado que, em regra, as alegações de
desrespeito aos postulados da legalidade, do devido processo legal, da
motivação dos atos decisórios, do contraditório, dos limites da coisa julgada
e da prestação jurisdicional podem configurar, quando muito, situações de
ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circunstância essa que
impede a utilização do recurso extraordinário.
Precedentes (ARGR. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 238.917-9,
Relator Min.
Néri da Silveira, DJ 20.10.2000).
Acrescente-se, quanto à alegação de nulidade por negativa de prestação
jurisdicional , que o Tribunal Regional declinou os fundamentos fáticos e
jurídicos que motivaram a decisão recorrida, esclarecendo todos os pontos
relevantes para a solução da controvérsia.
Ressalte-se que o ordenamento jurídico não exige que o juízo se manifeste
sobre todas as alegações das partes. A exigência legal é a de que a
decisão seja fundamentada (art. 131 do CPC) e os limites da controvérsia
sejam observados (arts. 128 e 460 do CPC). A esse respeito, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
O art. 93, IX, CF/88, não exige o exame pormenorizado de cada uma das
alegações ou provas apresentadas pelas partes, nem que sejam corretos os
fundamentos da decisão; exige, apenas, que a decisão esteja motivada, e o
acórdão recorrido não descumpre esse requisito (AI 614.139-AgR, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, DJ 13.4.2007. No mesmo sentido: RE 477.721AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 29/9/2006).
Quanto à alegada afronta ao art. 93, inc. IX, da Constituição da República,
esta não se justifica, pois o mencionado dispositivo constitucional não exige
que a decisão seja amplamente fundamentada, bastando que o juiz ou o
tribunal aponte as razões de seu convencimento (AI 608.295-AgR, Rel. Min.
Cármen Lúcia, DJE 1º/2/2008).
No que tange ao art. 93, IX, o que se exige é que o Tribunal dê as razões do
seu convencimento, não sendo necessário que a decisão seja
extensamente fundamentada. Uma coisa é a falta de fundamentação, outra,
a fundamentação deficiente ou equivocada. Ter-se-á, nesta última hipótese,
quando muito, error in judicando que não representa, ademais, negativa de
prestação jurisdicional (RE 162.308-0, Carlos Velloso).
Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.
CONCLUSÃO
ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho,
34
à unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.
Brasília, 10 de dezembro de 2008.
FERNANDO EIZO ONO Relator NIA: 4602031
Por outro lado, a jurisprudência produzida pelo Colendo Tribunal Superior do
Trabalho vem entendo ainda que, se a norma trabalhista deixou de contemplar em
seus dispositivos regra de multa em caso de não cumprimento espontâneo de
obrigação de pagar quantia certa, é porque o legislador infraconstitucional adotou,
como já pontuado, o chamado silêncio eloquente na referida norma.
O silêncio eloquente, concepção de índole jurídica de procedência alemã,
significa que em dada situação, a lacuna ou o silêncio do legislador se reveste de
um propósito estratégico que tem significado pró-ativo.
Noutros termos, se o legislador deixou de contemplar na Consolidação das
Leis do Trabalho regra sobre multa por não pagamento espontâneo de obrigação,
trata-se de opção legislativa que assim entendeu mais adequado dentro do sistema
processual trabalhista.
Destaque-se que a divergência está presente, haja vista que em julgamento
de Recurso de Revista pela Sexta Turma do C. TST, sob a relatoria do Ministro
Aloysio Corrêa da Veiga a turma diverge quanto à aplicação do aludido artigo, in
verbis:
NÚMERO ÚNICO PROC: RR - 668/2006-005-13-40
PUBLICAÇÃO: DJ - 28/03/2008
ACÓRDÃO
6ª Turma RECURSO DE REVISTA. MULTA DO ART. 475-J DO
CPC. INCOMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO. REGRA
PRÓPRIA COM PRAZO REDUZIDO. MEDIDA COERCITIVA NO
PROCESSO TRABALHO DIF E RENCIADA DO PROCESSO CIVIL.
O art. 475-J do CPC determina que o devedor que, no prazo de quinze
dias, não tiver efetuado o pagamento da dívida, tenha acrescido multa de
10% sobre o valor da execução e, a requerimento do credor, mandado de
penhora e avaliação. A decisão que determina a incidência de multa do art.
475-J do CPC, em processo trabalhista, viola o art. 889 da CLT, na medida
em que a aplicação do processo civil, subsidiariamente, apenas é possível
quando houver omissão da CLT, seguindo, primeiramente, a linha traçada
pela Lei de Execução fiscal, para apenas após fazer incidir o CPC. Ainda
assim, deve ser compatível a regra contida no processo civil com a norma
trabalhista, nos termos do art. 769 da CLT, o que não ocorre no caso de
cominação de multa no prazo de quinze dias, quando o art. 880 da CLT
determina a execução em 48 horas, sob pena de penhora, não de multa.
Recurso de revista conhecido e provido para afastar a multa do art. 475-J
do CPC.
(...)
MULTA DO ART. 475-J DO CPC
35
O Eg. Tribunal Regional manteve a aplicação da multa do art. 475-J do
CPC, afirmando que se trata de medida preventiva de protelação ao
cumprimento da obrigação imposta na sentença, sendo plenamente
aplicável ao processo do trabalho, e, nos termos do art. 769 da CLT, é
compatível com a CLT, que não prevê aplicação de multa pelo não
cumprimento da obrigação de pagar imposta na sentença. O reclamado
aponta violação do art. 889 da CLT, afirmando que deve ser aplicada a lei
de execuções fiscais em detrimento do CPC, e alega divergência
jurisprudencial. Não é possível se proceder à reforma pretendida.
Dispõe o art. 475-J do CPC da seguinte forma:
Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa
ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o
montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por
cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso
II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
O art. 889 da CLT define que:
Art. 889 - Aos trâmites e incidentes do processo da execução são
aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os
preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança
judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.
Conforme da v. decisão recorrida, aplicou-se a norma inscrita no art.
769 da CLT, que dispõe:
Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte
subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for
incompatível com as normas deste Título.
Ocorre, todavia, que o art. 889 da CLT explicitamente determina a
aplicação do processo dos executivos fiscais aos trâmites e incidentes do
processo da execução, a aplicação do processo dos executivos fiscais.
Deste modo, deve ser provido o agravo de instrumento para melhor
exame da violação apontada.
(...)
CONHECIMENTO
Dispõe o art. 475-J do CPC:
Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já
fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da
condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a
requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta
Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
O eg. Tribunal Regional manteve a aplicação da norma processual civil
ao processo do trabalho, por entender que se trata de medida preventiva de
protelação ao cumprimento da obrigação imposta na sentença, nos termos
do art. 769 da CLT, por ser compatível com a CLT, que não prevê aplicação
de multa pelo não cumprimento da obrigação de pagar imposta na
sentença.
Sustenta a reclamada a ofensa do art. 889 da CLT, que dispõe:
36
Art. 889 - Aos trâmites e incidentes do processo da execução são
aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os
preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança
judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.
A violação à literalidade do dispositivo em epígrafe resta demonstrada,
na medida em que determina a aplicação de norma do processo do
executivo fiscal, naquilo em que não contravier ao presente Título, enquanto
que a v. decisão recorrida manda aplicar norma do Código de processo
Civil, claramente incompatível com a regra própria do processo do trabalho,
contida no art. 880 da CLT, que dispõe:
Requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal
mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de
que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e
sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de
pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas
à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou
garanta a execução, sob pena de penhora.
Conheço, por violação do art. 889 da CLT.
MÉRITO
Discute-se se aplicável no processo do trabalho a norma inscrita no
art. 475-J da CLT, que determina multa de 10% ao executado, se não pagar
a dívida no prazo de quinze dias.
Retrata tal medida coercitiva um estímulo à efetividade do processo,
diante do longo tempo entre o reconhecimento judicial do direito e o
pagamento da dívida executada.
No entanto, é necessário verificar se a nova regra se aplica à
execução trabalhista, visto que enquanto a CLT d e termina a citação em 48
horas, sob pena de penhora, a regra processual civil determina a majoração
do valor da execução em 10%, se não adimplida a obrigação no prazo de
quinze dias, remetendo à regra do art. 614, II, do CPC, que dispõe:
Art. 614 - Cumpre ao credor, ao requerer a execução, pedir a citação
do devedor e instruir a petição inicial:
(..)
II - com o demonstrativo do débito atualizado até a data da
propositura da ação, quando se tratar de execução por quantia certa;
(Alterado pela L-008.953-1994) (...)
A regra contida no art. 880 da CLT contém prazo de 48 horas para que
se proceda ao pagamento da execução, após a citação, embora não haja
cominação de multa pelo inadimplemento.
Para se deixar de considerar a regra contida no art. 880 da CLT criarse-ia verdadeiro imbróglio processual, não só em relação ao prazo para
cumprimento da obrigação, mais dilata do no processo civil, como também
em relação à penhora.
Ou seja, deveria o julgador cindir a norma legal para utilizar o prazo de
48 horas, menor, da CLT, com a multa disciplinada no CPC, ou se aplica o
prazo do CPC, maior que o da CLT, com a multa e a penhora.
37
Considerando-se que a regra processual civil conflita, em relação ao
prazo e à cominação contida no dispositivo da CLT, é incompatível a regra
ali contida, o que impossibilita a sua aplicação, nos exatos termos do
art. 769 da CLT.
O rito, inclusive, no processo do trabalho é diferenciado, pois
determina a citação por Oficial de Justiça, co n forme prevê o §2º do art. 880
da CLT.
Ressalte-se, ainda, que há expressa previsão no art. 882 da CLT,
quando do não pagamento da dívida no prazo legal, a gradação a ser
respeitada, mediante dinheiro ou penhora:
Art. 882 . O executado que não pagar a importância reclamada poderá
garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida
das despesas processuais, ou nomeando bens à penhora, observada a
ordem preferencial estabelecida no Art. 655 do Código Processo Civil.
O dispositivo não possibilita verificar que há lacuna no processo de
execução, pois ao remeter ao não pagamento da execução, explicitamente
determina que seja garantida a execução, observada a gradação contida no
art. 655 do CPC.
Não fosse isso, o art. 883 da CLT, explicitamente determina:
Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á
penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da
condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qual
quer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial.
Dou provimento ao recurso de revista para determinar a exclusão da
multa do art. 475-J do CPC.
ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal
Superior do Trabalho, por unanimidade, dar provimento ao agravo de
instrumento para, destrancando o recurso de revista, dele conhecer apenas
quanto ao tema multa do art. 475-J do CPC , por violação do art. 889 da
CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar a exclusão da multa
do art. 475-J do CPC.
Brasília, 20 de fevereiro de 2008.
ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA
Ministro Relator
NÚMERO ÚNICO PROC: RR - 765/2003-008-13-41 PUBLICAÇÃO: DJ 22/02/2008
ACÓRDÃO
I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EXECUÇÃO
ARTIGO 475-J
DO CPC AO PROCESSO DO TRABALHO
INAPLICABILIDADE DO
Ante possível violação ao artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da
República, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento para determinar o
processamento do apelo denegado.
II - RECURSO DE REVISTA EXECUÇÃO INAPLICABILIDADE DO
ARTIGO 475-J DO CPC AO PROCESSO DO TRABALHO
38
1.
Segundo a unânime doutrina e jurisprudência, são dois os requisitos
para a aplicação da norma processual comum ao Processo do Trabalho:
i) ausência de disposição na CLT a exigir o esforço de integração da
norma pelo intérprete;
ii) compatibilidade da norma supletiva com os princípios do processo do
trabalho.
2.
A ausência não se confunde com a diversidade de tratamento:
enquanto na primeira não é identificável qualquer efeito jurídico a certo fato
a autorizar a integração do direito pela norma supletiva na segunda se
verifica que um mesmo fato gera distintos efeitos jurídicos,
independentemente da extensão conferida à eficácia.
3. O fato juridicizado pelo artigo 475-J do CPC não-pagamento espontâneo
da quantia certa advinda de condenação judicial possui disciplina própria
no âmbito do Processo do Trabalho (art. 883 da CLT), não havendo falar em
aplicação da norma processual comum ao Processo do Trabalho.
4. A fixação de penalidade não pertinente ao Processo do Trabalho importa
em ofensa ao princípio do devido processo legal, nos termos do artigo 5º,
inciso LIV, da Constituição da República.
Recurso de Revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento
em Recurso de Revista nº TST-RR-765/2003-008-13-41.8 , em que é
Recorrente COMPANHIA ENERGÉTICA DA BORBOREMA CELB e são
Recorridos ANTÔNIO SILVA VICENTE e CAMPINA PREST SERVICE
LTDA.
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto às fls. 2/7, ao despacho
de fls. 132/133, que negou seguimento ao Recurso de Revista da 2ª
Reclamada.
Sem contraminuta ou contra-razões, conforme certidão de fls. 137.
Os autos não foram encaminhados ao D. Ministério Público do
Trabalho, nos termos do artigo 82 do Regimento Interno desta Corte.
É o relatório.
VOTO
AGRAVO DE INSTRUMENTO
I - CONHECIMENTO
Conheço do Agravo de Instrumento, porque regularmente formado,
tempestivo (fls. 2, e 134) e subscrito por profissional habilitada (fls. 9). A
autenticidade das cópias trasladadas foi declarada às fls. 8.
II - MÉRITO
O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, em acórdão de fls.
118/123, negou provimento ao Agravo de Petição, mantendo a sentença,
que aplicara a multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil à 2ª
Reclamada. Eis os fundamentos:
39
Sustenta a Agravante que a norma, contida no art. 475-J do CPC, é
inaplicável ao processo do trabalho, porquanto a CLT contém regramento
explícito relativo ao processo executório.
A Lei nº 11.232/05 produziu uma revolução no processo de execução,
uma vez que o extinguiu como processo autônomo, tornando-o uma mera
fase executiva do processo.
Trata-se de inovação condizente com o princípio constitucional da
duração razoável do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF), assim como ao
princípio da efetividade da tutela jurisdicional.
Nessa linha de raciocínio, a reforma criou um mecanismo inovador de
pressão psicológica do devedor para pagamento da dívida, ao introduzir o
art. 475-J no CPC.
Dispõe o artigo 769 da CLT que, nos casos omissos, o Direito
Processual Comum será fonte subsidiária do Direito do Trabalho, exceto
naquilo em que for incompatível.
Nesses termos, comungo com o entendimento do Juízo de 1º grau, no
sentido de que a multa civilista é perfeitamente aplicável ao processo do
trabalho, tendo em vista que a execução trabalhista é omissa no que se
refere as multas, e o art. 769 da CLT autoriza a utilização das regras
insertas no CPC em caso de lacuna na lei trabalhista, desde que não haja
incompatibilidade.
Aliás, quanto ao último requisito, tenho que a sua existência é plena,
uma vez que, sendo certo que o Processo do Trabalho tem como fim
efetivar direitos fundamentais, o que torna a Justiça do Trabalho uma justiça
distributiva, com muito maior razão a incidência da multa, deve ser nele
aplicada.
Assim, em que pese os argumentos de alguns doutrinadores em
sentido contrário, a exemplo do renomado José Augusto Rodrigues Pinto,
para quem "norma impositiva de coerção econômica, há que ter aplicação
restrita, forçando a caracterização do silêncio da legislação a ser suprida
como impeditivo e não omissivo - e só esta última hipótese autorizaria o
suprimento", (Revista LTr. v. 70, n. 3, mar. 2006, p. 313), tenho que este
não é o melhor raciocínio aplicável à hipótese, que, acaso acompanhado,
impediria também a aplicação subsidiária no processo do trabalho de outras
penalidades constantes no caderno processual civil, a exemplo da multa por
ato atentatório ao exercício da jurisidição (CPC, art. 14, parágrafo único), da
multa por litigância de má-fé (CPC, arts. 17 e 18), da multa por embargos
protelatórios (CPC, artigo 538, parágrafo único), da multa por ato atentatório
à dignidade da justiça (CPC, art. 601) e das próprias astreintes (CPC, arts.
461 e 461-A), dentre outras. Em suma, entendo que a multa, em análise, é
plenamente aplicável ao Processo do Trabalho.
Conforme já exposto acima, dada a novidade da matéria, a
jurisprudência acerca do tema ainda é incipiente. Mas já há precedentes
acerca da questão, conforme aresto da Quarta Turma do TRT 3ª Região, na
forma a seguir transcrita:
"MULTA - ARTIGO 475-J DO CPC. A multa prevista no art. 475-J do
CPC, com redação dada pela Lei 11.232/05, aplica-se ao Processo do
Trabalho, pois a execução trabalhista é omissa quanto a multas e a
compatibilidade de sua inserção é plena, atuando como mecanismo
compensador de atualização do débito alimentar, notoriamente corrigido por
mecanismos insuficientes e com taxa de juros bem menor do que a
40
praticada no mercado. A oneração da parte em execução de sentença,
sábia e oportunamente introduzida pelo legislador através da Lei 11.232/05,
visa evitar argüições inúteis e protelações desnecessárias, valendo como
meio de concretização da promessa constitucional do art. 5º, LXXVIII pelo
qual "A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados o tempo
razoável do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação." Se o legislador houve por bem cominar multa aos créditos
cíveis, com muito mais razão se deve aplicá-la aos créditos alimentares, dos
quais o cidadão-trabalhador depende para ter existência digna e compatível
com as exigências da vida.
A Constituição brasileira considerou o trabalho fundamento da
República - art.1, IV e da ordem econômica - art.170. Elevou-o ainda a
primado da ordem social - art. 193. Tais valores devem ser trazidos para a
vida concreta, através de medidas objetivas que tornem realidade a
mensagem ética de dignificação do trabalho, quando presente nas relações
jurídicas". (Processo nº 00987-1998-103-03-00-6-AP, publicado em
02/12/2006, Juiz Relator: Desembargador Antônio Alvares da Silva.
Portando, plenamente aplicável a multa constante do artigo 475-J do Código
de Processo Civil, pelo que deve suportar a executada agravante com a
penalidade que lhe foi imposta. (fls. 121/123)
No Recurso de Revista, a Reclamada afirmou que o art. 880, da CLT
regula a matéria de forma integral, o que afasta a aplicação do artigo 475-J,
do CPC. Aduziu que não pode haver aplicação subsidiária in mala partem
da multa do art. 475-J, do CPC. Argumentou que a primeira fonte
subsidiária do processo de execução trabalhista é a Lei de Execução Fiscal,
sendo que o Código de Processo Civil seria utilizado apenas como segunda
fonte supletiva. Apontou violação ao artigo 5º, LIV, da Constituição da
República.
O primeiro juízo de admissibilidade, às fls. 132/133, denegou
seguimento ao apelo com espeque na Súmula n os 297, do TST.
No Agravo de Instrumento, a 2ª Reclamada renova os fundamentos do
Recurso de Revista.
Discute-se nos presentes autos a compatibilidade da norma insculpida
no artigo 475-J, do CPC, com a redação conferida pela Lei nº 11.232/2005.
Segundo a nova sistemática aplicável ao processo civil, o nãopagamento espontâneo e no prazo legal da quantia certa fixada na
liquidação obriga o executado a suportar o acréscimo de 10 (dez) por cento
do montante, a título de multa. Eis o dispositivo:
Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa
ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o
montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por
cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso
II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
O processo civil, como se sabe, tem aplicação subsidiária ao processo
do trabalho, nos termos do artigo 769 da CLT. No tocante especificamente à
execução, é o artigo 889 da CLT que prevê a regra de integração do
processo laboral, apontado a Lei de Execução Fiscal como norma
subsidiária aplicável.
Segundo a unânime doutrina e jurisprudência, são dois os requisitos
para a aplicação da norma processual comum:
41
i)
ausência de disposição na CLT a exigir o esforço de integração da
norma pelo intérprete ;
ii) compatibilidade da norma supletiva com os princípios do processo
do trabalho.
A presente hipótese não se conforma à primeira exigência, porquanto
não se identifica, no processo do trabalho, ausência em relação ao tema
tratado no artigo 475-J do CPC. Para melhor elucidação da matéria, é
preciso diferenciar com clareza a ausência da diversidade de tratamento
legal.
A ausência se caracteriza pela inexistência, na lei, de fixação de
conseqüências jurídicas para o fato ato ou negócio tratado pela legislação
suplementar. Na ausência, se constata que o legislador, por desinteresse ou
imprevisão, não emprestou qualquer significado jurídico a dado fato do
mundo real. É dizer, para o legislador, determinado fato não alcança a
importância necessária a ponto de gerar qualquer efeito no mundo do
direito.
Outra é a hipótese da diversidade. Em tal circunstância, o legislador
afirma a importância de certo fato, atrelando a ele os efeitos jurídicos que
entende devidos, na ocasião de sua realização. Contudo, aqui, os efeitos
jurídicos advindo da legislação principal se diferenciam daqueles
emprestados pela legislação supletiva. Assim, nessa situação, a distinção
de tratamento, ainda que caracterizado pela omissão quanto a certos
efeitos, não caracterizam ausência, mas sim o silêncio eloqüente não raro
identificável nos textos legais.
Pois bem.
Discute-se a aplicabilidade do artigo 475-J, do CPC, ao Processo do
Trabalho. O dispositivo, como referido, diz respeito às conseqüências
jurídicas do não-adimplemento espontâneo da condenação em pagamento
de quantia certa. Este, portanto, precisamente o fato juricizado pela norma:
não-pagamento espontâneo de quantia certa advinda de condenação
judicial.
A verificação da aplicabilidade do dispositivo, como afirmado, depende
da investigação da existência, ou não, de tratamento pela legislação
processual trabalhista do mesmo fato. Assim que, confirmado que a
legislação trabalhista empresta ao mesmo fato outros efeitos, ainda que
reduzidos em relação ao paradigma comum, não há falar em ausência legal,
mas sim em diversidade de tratamento.
Essa precisamente a hipótese em teste. O artigo 883 da CLT dispõe
precisamente sobre o mesmo fato: não-pagamento espontâneo pelo
executado.
Confira-se a redação:
Art. 883 - Não pagando o executado, nem garantindo a execução,
seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da
importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo
estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a
reclamação inicial.
Como se vê, no Processo do Trabalho, o mesmo fato que gera os
efeitos previstos no artigo 475-J do CPC importa na penhora dos bens no
limite da importância da condenação acrescida de custas e juros de mora.
42
Delimitado no âmbito do Processo do Trabalho os precisos efeitos do
fato em discussão, não se admite a utilização do disposto na legislação
supletiva.
É importante sublinhar que, nessa hipótese, o silêncio do legislador em
relação a qualquer outro efeito, entre eles, a aplicação de multa deve ser
interpretado no contexto do silêncio eloqüente, ou seja, a ausência de
cominação de multa representa uma opção política do legislador, e não
negligência ou imprevidência.
Conclui-se, portanto, que a fixação de penalidade não pertinente ao
Processo do Trabalho importa em ofensa ao princípio do devido processo
legal, positivado no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da República.
Assim, dou provimento ao Agravo de Instrumento para mandar
processar o Recurso de Revista e determinar seja publicada certidão, para
efeito de intimação das partes, dela constando que o julgamento do recurso
dar-se-á na primeira sessão ordinária subseqüente à data da publicação,
nos termos da Resolução Administrativa nº 938/2003 desta Corte.
Como se pode observar, há uma colisão de princípios constitucionais uma vez
que uma corrente defende a aplicação do art. 475-J no âmbito do processo
trabalhista fincado no princípio da razoável duração do processo. Ao revés, a outra
se embase no princípio da legalidade ante a previsão já consubstanciada na norma
celetista, o que afastaria sua aplicação subsidiária ante o silencio eloqüente do
legislador.
Em geral, as colisões das regras jurídicas são resolvidas através de critérios
abstratos – hierárquico, cronológico e de especialidade. É possível que o princípio
inspirador de determinada regra constitucional entre em tensão, num caso concreto,
com outro princípio constitucional. Neste caso, a eventual não-aplicação do primeiro
princípio, em decorrência de uma ponderação de interesses, levará também à nãoincidência da regra que dele for um desdobramento.
Suponha-se que uma decisão judicial, numa ação coletiva, determine o
reajustamento de benefícios pagos aos segurados da Previdência. Os valores
vencidos devem ser pagos através de precatório judicial, mas os vincendos os são
imediatamente exigíveis. Pode não haver, porém, previsão orçamentária para o
pagamento destes valores vincendos. Neste caso, há uma colisão entre os
princípios da legalidade da despesa pública e da observância das decisões judiciais.
Se o segundo prevalecer numa ponderação de interesses, várias regras
jurídicas decorrentes do primeiro não poderão ser aplicadas ao caso (arts. 167, II, V
e VI, 85, VI, 166 e 169 da CF). Elas permanecerão no ordenamento, mas serão
ineficazes naquela hipótese.
43
Convém não olvidar que na jurisdição constitucional, como em qualquer
outra, o juiz encontra-se vinculado à ordem jurídica, que estabelece limites para a
sua atuação. Dentro destes limites, ele tem certo espaço para buscar a solução mais
justa para o caso concreto, mas não pode transcendê-los, pois a legitimidade da sua
atuação decorre do seu respeito ao ordenamento.
Conforme a Exma Ministra Ellen Gracie no Hábeas Corpus 95.045 do STF
julgamento em 9-9-08, DJE de 26-9-0825 , a razoável duração do processo (...),
logicamente,
deve
ser
harmonizada
com
outros
princípios
e
valores
constitucionalmente adotados no Direito brasileiro.
Na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho,
realizada entre 21 e 23 de novembro de 2007, na sede do Tribunal Superior do
Trabalho, Brasília/DF, evento este realizado pela ANAMATRA, TST e ENAMAT, com
o apoio do Conselho de Escolas de Magistratura Trabalhista – CONEMATRA –
também participando juristas, ministros, desembargadores, juízes, procuradores,
advogados, dentre outros, discutiram intensamente nas sete comissões temáticas e,
ao final, na plenária, os temas que desafiaram a Justiça do Trabalho após a
ampliação de sua competência com a Emenda Constitucional nº 45/2004.
Nesse evento foram publicados 79 enunciados aprovados, os quais, segundo
entendimento da ANAMATRA, tiveram o propósito de contribuir para a evolução da
jurisprudência do judiciário trabalhista.
Dentre eles se destaca o enunciado nº. 71 que entende pela aplicabilidade do
artigo 475-J do CPC no âmbito laboral26:
“71. ART. 475-J DO CPC. APLICAÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO. A
aplicação subsidiária do art. 475-J do CPC atende às garantias
constitucionais da razoável duração do processo, efetividade e celeridade,
tendo, portanto, pleno cabimento na execução trabalhista.
Entendido assim a aplicabilidade do referido artigo, passa-se ao momento
processual de sua aplicação.
25
“A razoável duração do processo (CF, art. 5°, LXXVIII), logicamente, deve ser harmonizada com
outros princípios e valores constitucionalmente adotados no Direito brasileiro, não podendo ser
considerada de maneira isolada e descontextualizada do caso relacionado à lide penal que se
instaurou a partir da prática dos ilícitos”
http://www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/verDiarioProcesso.asp?numDj=182&dataPublicacaoDj=26/09/
2008&numProcesso=95045&siglaClasse=HC&codRecurso=0&tipoJulgamento=M&codCapitulo=5&nu
mMateria=30&codMateria=3 Acessado em 09.5.2009.
26
1ª Jornada de Direito material e processual na Justiça do trabalho, Enunciados aprovados.
São Paulo. LTr.2008, pág. 46
44
2.1 MOMENTOS DE APLICAÇÃO DA MULTA DE 10% NO PROCESSO DO
TRABALHO
A discussão relacionada à aplicação do artigo 475-J do Código de Processo
Civil no âmbito do processo do trabalho é bastante recente. Não obstante, boa parte
dos doutrinadores brasileiros já emitiu seu parecer a respeito: alguns se
posicionando de maneira favorável à aplicação e, outros, embora de maneira
minoritária, defendendo posicionamento pela não aplicação supletiva do artigo do
CPC.
Assim, considerando-se a utilização do aludido artigo para seus defensores,
deve-se passar à análise do momento em que deverá ou poderá, ante a divergência
já colocada, ocorrer ou não a aplicação da multa de dez por cento no âmbito do
processo laboral, observadas as peculiaridades existentes no processo trabalhista
em detrimento do direito processual comum.
Ao contrário do que ocorre com a matéria relacionada à aplicação do aludido
artigo na seara trabalhista, a doutrina nacional é escassa com relação a
posicionamentos no que tange ao momento em que deverá ocorrer tal aplicação.
Mesmo os defensores da aplicação supletiva do artigo 475-J do Código de Processo
Civil brasileiro não estabelecem o momento exato em que deverá ocorrer sua
aplicação. Em outras palavras, apenas afirmam que deverá haver a aplicação da
multa processual, mas não definem o momento em que isso deverá ocorrer.
Assim, como ocorre em toda e qualquer alteração legislativa – sobretudo nas
mais polêmicas, como é o caso, com certeza, do artigo em estudo –, caberá ao
tempo o dever de uniformizar tanto a jurisprudência como a doutrina, que, com a
emissão de seus fundamentados ensinamentos, o que, certamente, irão contribuir
para a pacificação da matéria.
A questão relacionada ao momento de aplicação da multa de 10% deverá ser
enfrentada com cautela pelos operadores do direito brasileiro, vez que, conforme
afirma Oliveira27, tratando-se de norma “importada” do direito processual comum,
“deverá haver uma adaptação desta à realidade trabalhista para que possa cumprir
o seu papel de coadjuvante”.
27
OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 3 ed. rev.
atual. E ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
45
Assim, não basta apenas se utilizar de uma norma processualista civil,
inserida naquele diploma legal observando a realidade existente no direito
processual comum, e simplesmente, colocá-la no processo trabalhista. Deve-se
efetuar a aplicação da norma em questão analisando os princípios e peculiaridades
existentes dentro da processualística trabalhista, sob pena de total desvirtuamento
do ordenamento jurídico trabalhista existente em nosso País.
No que tange ao artigo 475-J do Código de Processo Civil, essa adaptação
torna-se por mais que necessária, uma vez que, ao revés do que ocorre no processo
civil, no processo do trabalho existe uma interpenetração entre os módulos de
liquidação/execução de sentença, consubstanciada na possibilidade de discussão
do quantum debeatur após a realização da garantia do juízo, conforme ocorre nos
embargos à execução e no agravo de petição.
No âmbito do direito processual comum, ramo no qual o artigo em estudo
originalmente foi inserido, toda controvérsia existente acerca do crédito exequendo
(liquidação de sentença) ocorre antes da garantia do juízo. Neste trilhar, o momento
de aplicação da multa de 10% parece claro, uma vez que, após a homologação dos
cálculos, o valor será líquido, não cabendo mais nenhum outro qualquer recurso ou
impugnação sobre tais valores. Assim, será certa a possibilidade de aplicação
imediata desta multa em caso de não-pagamento espontâneo.
Já na esfera do direito processual do trabalho, a situação muda
completamente de figura, tendo em vista a existência de vários momentos em que
poderá haver discussão acerca do valor da condenação, que poderá ser impugnado
tanto em período anterior à garantia da execução – por exemplo, na hipótese de o
juiz conceder vistas às partes para impugnação fundamentada, exercendo a
faculdade prevista no § 2º do artigo 879 da Norma Consolidada28 – como após a
garantia da execução, uma vez que, tanto em embargos à execução como em
agravo de petição, poderá o devedor discutir os valores devidos no processo.
Assim, uma vez que a redação do artigo 475-J do processo civil é bastante
clara no sentido de apenas determinar a aplicação da multa de 10% nas sentenças
em que não couber mais nenhuma discussão sobre o valor devido, deverá haver um
grande cuidado por parte dos juízes trabalhistas no que concerne ao momento de
28
Art. 879, § 2º, CLT: “Elaborada a conta e tornada líquida, o juiz poderá abrir às partes prazo
sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores
objeto da discordância, sob pena de preclusão.”
46
sua aplicação no direito processual do trabalho, sob o risco de determinar a
aplicação da multa em processos cujo quantum debeatur ainda carece de discussão,
sem saber ainda qual o valor exato da condenação.
A redação do § 2º do artigo 879 da Consolidação das Leis do Trabalho é
bastante cristalina ao afirmar que, após a elaboração da conta, o juiz poderá abrir
vistas às partes para impugnação fundamentada. Dessa forma, conclui-se que a
abertura de prazo às partes para impugnação da conta elaborada constitui-se em
mera faculdade do magistrado, não se constituindo em nenhum tipo de obrigação.
Assim, de acordo com os dizeres contidos no § 2º do artigo 879 do
Consolidado Trabalhista, o juiz poderá adotar dois procedimentos distintos antes da
execução propriamente dita:
I – intimar as partes para impugnarem os cálculos apresentados, sob pena de
preclusão ou;
II – simplesmente homologar os cálculos apresentados e determinar o
prosseguimento da execução, deixando a impugnação para o momento processual
posterior. No caso em tela, o da oposição dos embargos à execução29.
Desse modo, entende-se que, de acordo com o procedimento a ser adotado –
observadas as peculiaridades pertinentes a cada caso hipótese desse procedimento
–, existirão diferentes momentos em que será cabível a aplicação da multa de 10%.
Para fins meramente didáticos, inicia-se o debate tratando de casos em que o
juiz determina a intimação das partes para a contrariedade aos cálculos de
liquidação apresentados. Após, abordar-se-á outro tipo de procedimento que pode
ser adotado pelo juiz. Assim, segundo o primeiro procedimento, transitada em
julgado a sentença, as partes deverão ser intimadas para a apresentação de
cálculos de liquidação30; posteriormente, independentemente da parte que realizou a
liquidação dos cálculos – exeqüente, executada ou perito judicial –, o juiz intimará a
parte contrária para apresentar impugnação fundamentada dos valores, sob pena de
preclusão.
No que tange a essa impugnação, o § 2º do artigo 879 é bastante claro ao
afirmar que esta deverá ser fundamentada, havendo a indicação dos itens e valores
objeto da discordância, sob pena de preclusão. Assim, não são permitidas as
29
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 2007. p. 997.
Art. 879, § 1º-B, CLT: “As partes deverão ser previamente intimadas para a apresentação do
cálculo de liquidação, inclusive da contribuição previdenciária.”
30
47
impugnações genéricas, em que a parte (exeqüente ou executado) não apresenta o
quantum no qual reside sua irresignação. Neste sentido transcrevo precedentes do
Eg. TRT da 10ª Região:
Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região
Tipo do Processo: AP
Número do Processo: 00245
Ano do Processo: 2007
Turma: 3ª TURMA
Origem: 18ª VARA - BRASÍLIA/DF
Partes:
Agravante: Transportadora Wadel Ltda.
Agravado: Fabiano Gomes Lins
Relator: MÁRCIA MAZONI CÚRCIO RIBEIRO
Revisor: BRAZ HENRIQUES DE OLIVEIRA
Data: 16/04/2008
MÉRITO EXECUÇÃO. IMPUGNAÇÃO AOS CÁLCULOS. MOMENTO
PROCESSUAL. PRECLUSÃO Trata-se de agravo de petição interposto
pela executada contra a decisão que não admitiu os embargos à execução
opostos pelo agravante, por considerar preclusa a manifestação quanto aos
cálculos. Eis o inteiro teor da decisão agravada, verbis: " (...) Verifico, de
pronto, a inviabilidade de se admitir os embargos opostos. Ora, o pleito de
redução do valor da dívida encontra-se fulminado pela preclusão, ante o
decurso de prazo para tanto, conforme certificado às fls. 35. Por outro lado,
revela-se descabida a insurgência da Embargante acerca da penhora
realizada às fls. 58, eis que a requerente, tenta defender em nome próprio
direito alheio, o que é inadmissivel. Por tais motivos, não admito os
embargos opostos" (à fl. 68). A executada sublinha o desacerto da r.
decisão agravada, aduzindo que "os embargos oportunamente opostos às
fls. 59/64 não tratam da penhora que fora pelo MM Juiz citada, e sim do
auto de penhora e avaliação constante de fls. 58/58v, que para garantia da
execução penhorou um ônibus de placa JJC-0719, que não é de
propriedade da empresa Agravante" (à fl. 78). Não assiste razão à
agravante. Conforme transcrição anterior, o Juízo da execução entendeu
pelo não conhecimento dos embargos à execução opostos pela executada,
quanto à matéria relativa aos cálculos. Sublinhou que a matéria encontravase fulminada pela preclusão, conforme o decurso de prazo certificado à fl.
35. Contrariamente ao pretendido pela executada, o prazo para impugnar os
cálculos não pode ser contado a partir da segunda penhora realizada (à fl.
58). Vejamos. Inadimplente a executada quanto ao valor acordado à fl. 15, o
Juízo determinou a expedição de mandado de citação, penhora e avaliação
(à fl. 22), restando o Juízo garantido pela penhora de fl. 27, abrindo-se
prazo para a apresentação de embargos, que decorreu in albis, conforme a
certidão de fl. 35. Pelo que dos autos emerge, esse foi o momento em que a
executada teve vista dos cálculos. Nesse sentir, correta a decisão agravada
que entendeu pela preclusão da matéria referente à impugnação aos
cálculos. Conjugados esses dados, tem-se que não cabe qualquer análise
acerca dos cálculos originários, tendo em vista que a matéria encontra-se
sepultada pelo instituto da preclusão, segundo expressa previsão legal
constante no art. 879, §2º, da CLT, que externa a intenção do legislador de
coibir manifestações meramente protelatórias, verbis: "Elaborada a conta e
tornada líquida, o juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo de 10 (dez)
dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores
objeto a discordância, sob pena de preclusão" (destaquei). Cito, a propósito,
48
os seguintes arestos jurisprudenciais: "PRECLUSÃO. Concedida vista dos
cálculos para a executada se manifestar, consoante diretriz estampada na
Lei 8.432/92, e deixando esta de apresentar sua impugnação no decêndio
previsto, precluso está o seu direito e voltar a questionar a exatidão da
conta de liquidação em embargos executórios." (TST, 1ª T., ED-AI146.515/94.9, in CLT Comentada, Eduardo Gabriel Saad, p. 648).
"LIQUIDAÇÃO
PRECLUSÃO.
DE
SENTENÇA.
IMPUGNAÇÃO
DOS
CÁLCULOS.
Na medida em que, na fase de liqüidação, se tenha dado oportunidade às
partes visando a uma cognição específica sobre os valores devidos, é
inadmissível que, omitindo-se aquelas, possam, na execução, levantar
questões que muito bem já poderiam estar esclarecidas e dirimidas.
Ocorrência de preclusão." (TRT da 15ª Região, Ac. nº 007557.92, Rel. Juiz
Carlos Alberto Moreira Xavier).
Dessarte, a matéria ventilada nos embargos à execução (às fls. 59/61), que
versa sobre suposta incorreção na conta de liquidação, resta fulminada pelo
instituto da preclusão.
Esclareço à agravante que, a partir do conceito jurisprudencial que nega a
possibilidade de eternização das execuções, tenho que, após a
homologação dos cálculos e facultada a manifestação das partes,
demonstrada a ausência de insurgência da executada na primeira
oportunidade que teve para se manifestar nos autos sobre os cálculos, resta
atraída a incidência da preclusão.
Constatando eventuais vícios nos cálculos, deveria a executada ter se
manifestado na primeira oportunidade que teve para falar nos autos. Em
não o fazendo, fez incidir a preclusão. A incidência da preclusão dá-se em
razão da possibilidade de manifestação das partes, independentemente de
fazerem, ou não, uso dessa faculdade. Assim, nego provimento ao agravo
de petição.
Pela forma de tramitação do aludido procedimento, no momento em que o
executado apresentar sua impugnação, poderá haver uma delimitação no que tange
aos valores, podendo ser verificada a existência de valor incontroverso nos autos.
Como exemplo, imagine-se uma ação trabalhista em que houve a condenação da
reclamada ao pagamento de horas extras e adicional de insalubridade.
Intimado para a apresentação dos cálculos de liquidação, o reclamante
apresenta a conta de R$15.000,00 (quinze mil reais). Em ato consequente, o
magistrado abre vistas à reclamada que, de forma fundamentada, impugna a base
de cálculo do adicional de insalubridade, ao afirmar que o valor correto dos cálculos
seria de R$10.000,00 (dez mil reais).
Nesse exemplo, observa-se existir uma divergência de R$5.000,00 (cinco mil
reais) entre os valores apresentados pelas partes. Não obstante, no momento da
apresentação da impugnação da reclamada restou incontroverso o fato de ser
devedora da quantia de R$10.000,00 (dez mil reais), que, não tendo sido impugnado
49
nesse momento, torna-se precluso31 e, portanto, impossível de discussão no
restante do processo.
Assim, conclui-se que, no referido caso, o momento para a aplicação da multa
de 10% – incidente, no caso, sobre os R$10.000,00 – nasce a partir da referida
impugnação, ante a liquidez e a incontrovérsia assumida por tais valores. Continuase a discussão em torno dos R$5.000,00 (cinco mil reais), podendo ser objeto de
embargos à execução e agravo de petição. Contudo, os R$10.000,00 (dez mil reais)
tornam-se líquidos, fazendo-se necessária a aplicação imediata da multa processual,
caso não ocorra o pagamento espontâneo dentro de quinze dias.
Ainda no tocante ao primeiro procedimento, outra forma que se entende
possível à aplicação imediata da multa de 10% se dá quando a parte for intimada
para a apresentação de impugnação fundamentada e deixa transcorrer in albis o
prazo para tanto.
O § 2º do artigo 879 da Norma Consolidada, que vai de frente ao sistema de
nulidades trabalhistas descrito no caput do artigo 79532 do referido dispositivo legal,
é contundente em afirmar que a não realização de impugnação fundamentada
acarreta pena de preclusão. Assim, não poderá renovar-se a discussão em
momento posterior.
Continuando no mesmo exemplo, na hipótese de o exequente apresentar os
cálculos de liquidação no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) e, ofertado prazo à
impugnação da executada, a mesma deixar transcorre-lo, não poderá mais discutir
futuramente tais valores. Assim, entende-se que, nesta hipótese, a aplicação da
multa de 10% – aqui, sobre os R$10.000,00 – poderá ser determinada no dia
posterior ao término do prazo para impugnação patronal ou, no máximo, quando da
homologação dos cálculos por parte do julgador33, haja vista a liquidez assumida
nesse momento.
Pelas mesmas razões, a aplicação da multa de 10% deverá ocorrer no prazo
descrito no parágrafo anterior, no caso de a executada não indicar os valores que
entende controversos, uma vez que estabelece o § 2º do artigo 879 a
31
De acordo com a redação dada pela parte final do § 2º do artigo 879 da Consolidação das Leis do
Trabalho.
32
Art. 795, CLT: “As nulidades não serão declaradas senão mediante provocação das partes, as
quais deverão argüi-las à primeira vez que tiverem que falar em audiência ou nos autos.”
33
Uma vez que o magistrado não está adstrito aos cálculos apresentados pelas partes e/ou perito
judicial, podendo efetuar ex officio alguma modificação nos cálculos, fato muito raro, mas que não é
impossível de acontecer.
50
obrigatoriedade de realização de tal indicação. Não havendo a delimitação das
parcelas que entende incorretas, a impugnação não deverá ser conhecida pelo juiz,
homologando de pronto, os cálculos apresentados pelo exequente e tornando
líquida a conta, motivo pelo qual poderá ocorrer a imediata aplicação da multa de
10%.
Ainda no tocante ao primeiro procedimento, outra hipótese bastante comum
de acontecer ocorre quando o magistrado homologa os cálculos de liquidação e a
executada, opõe embargos à execução. Nesta hipótese, deverá ser redobrada a
atenção acerca do momento em que a aplicação da referida multa ocorrerá, sob
pena de determinar tal aplicação sobre valores controvertidos, uma vez que, ao
revés do que acontece no processo comum, no processo do trabalho é permitida a
discussão sobre o valor devido após a garantia da execução, conforme ocorre nos
embargos à execução e no agravo de petição.
Dessa forma, apenas podendo haver a aplicação da multa de 10% sobre os
valores incontroversos, deverá haver uma total atenção por parte do julgador – e,
principalmente, do advogado do exequente – no sentido de observar as preclusões
que possam existir, bem como as parcelas que porventura se tornem incontroversas
após a oposição dos embargos à execução ou quando da interposição do agravo de
petição em momento futuro, uma vez que ambos os institutos exigem a delimitação
das parcelas objeto de sua irresignação.
Para se exemplificar, imagine-se uma ação trabalhista em que a parte ré é
condenada pagamento de horas extras, adicional de insalubridade e diferenças de
FGTS. Transitada em julgado a decisão de 1º grau, o reclamante apresenta os
cálculos de liquidação no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais). Facultado o prazo
para impugnação previsto no § 2º do artigo 879 da CLT, a executada impugna
apenas a base de cálculo do adicional de insalubridade, apresentando cálculos no
importe de R$22.000,00 (vinte e dois mil reais). O magistrado homologa os cálculos
apresentados pelo exequente, no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais) e,
posteriormente, a executada garante o juízo e opõe embargos à execução, onde
impugna a base de cálculo do adicional de insalubridade e das horas extras. Neste
sentido, uma vez que a executada não apresentou irresignação quanto ao cálculo
das horas extras na impugnação (art. 879, § 2º, CLT), não poderá discutir essa
matéria nos embargos à execução, operando-se, no caso, a preclusão no tocante às
horas a extras.
51
Para ficar no exemplo apresentado, imagine-se que o juiz homologue a conta
de liquidação apresentada pelo exequente, no importe de R$10.000,00 (dez mil
reais), e, após a garantia da execução, a executada oponha embargos à execução34,
afirmando, desta feita, que o valor correto dos cálculos seria de R$9.000,00 (nove
mil reais).
Conforme
afirmado
anteriormente,
entende-se
que,
no
tocante
aos
R$9.000,00 (nove mil reais), a aplicação da multa de 10% deverá ser determinada
quando da apresentação da impugnação por parte da executada, eis que a aludida
quantia tornou-se incontroversa naquele momento. Assim, a discussão limitar-se-á
aos R$1.000,00 (mil reais) remanescentes e que ainda se encontram em discussão.
Contudo, uma vez que os embargos à execução ofertados pela executada
trouxeram novo valor devido como correto (R$9.000,00), houve mais R$1.000,00
(um mil reais) que se tornaram incontroversos no processo. Assim sendo, o
momento oportuno para determinar a incidência da multa sobre os R$ 1.000,00 (um
mil reais) seria o dia subsequente à apresentação dos embargos à execução.
O mesmo ocorre no caso das partes se utilizarem do agravo de petição, uma
vez que o § 1º do artigo 897 da Consolidação das Leis do Trabalho35 estabelece que
as matérias e valores impugnados atinentes ao respectivo recurso são um dos
requisitos de sua admissibilidade sendo que, na hipótese de ocorrência de novo
valor incontroverso quando da interposição do agravo de petição, deverá ser
determinada a aplicação da multa sobre os valores que se tornaram incontroversos.
Com relação à impugnação à liquidação realizada em sede de embargos à
execução e/ou agravo de petição, uma discussão que pode ser suscitada reside na
possibilidade de aplicação da multa de 10%, uma vez já garantido o juízo, prevista
no artigo 884 da Norma Celestista.
Contudo, inexiste óbice a que o artigo 475-J do Código de Processo Civil seja
aplicado em tais momentos, uma vez que o instituto supracitado tem como escopo
garantir celeridade e efetividade à execução, evitando manobras com o intuito
meramente protelatório por parte do executado.
34
Art. 884, CLT: “Garantida a execução ou penhorados os bens, terá o executado cinco dias para
apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exeqüente para impugnação.”
35
Art. 897, § 1º, CLT: “O Agravo de Petição só será recebido quando o agravante delimitar,
justificadamente, as matérias e os valores impugnados, permitida a execução imediata da parte
remanescente até o final, nos próprios autos ou por carta de sentença.”
52
Assim sendo, uma vez que muitos dos subterfúgios utilizados pelos maus
devedores ocorrem justamente nos atos de alienação do patrimônio, entende-se que
a não-aplicação da multa de 10%, sob a alegação de que existem bens penhorados,
vai completamente de encontro à intenção do legislador ao criar o artigo 475-J do
Código de Processo Civil, uma vez que se estará concedendo uma espécie de “carta
branca” ao executado que, garantido o juízo, poderá realizar todo e qualquer tipo de
manobra protelatória.
Assim, nessa hipótese de procedimento, entende-se que a aplicação da multa
de 10% independe da garantia do Juízo, devendo apenas haver a averiguação da
certeza e da liquidez dos valores objetos da execução. Cuida-se, assim, evitar-se
que seja determinada a aplicação de multa sobre valores que ainda se encontram
sub judice.
No segundo procedimento que pode ser adotado pelo juiz de 1º Grau, as
cautelas acerca do momento de aplicação da multa de 10% deverão ser
observadas, uma vez que a primeira oportunidade em que terá o executado para se
insurgir contra o valor devido ocorre após a homologação dos cálculos de liquidação,
com a oposição dos embargos à execução após a garantia do juízo.
Para se ilustrar, toma-se como exemplo uma ação trabalhista em que ocorreu
a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras, equiparação salarial e
indenização por danos morais. Após o trânsito em julgado, o magistrado intima as
partes para a apresentação dos cálculos de liquidação36, sendo que o exequente os
apresenta no montante de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais). Não se dando vista
à parte executada, o magistrado homologa a conta apresentada e determina a
expedição de mandado de citação ao executado, nos moldes do artigo 880 do
consolidado trabalhista37. Tomando ciência dos cálculos apresentados, o executado
garante o juízo e, no prazo do artigo 884 Consolidado, opõe embargos à execução,
impugnando a conta no que pertine à equiparação salarial e à indenização por
danos morais, alegando que o valor correto seria na ordem de R$16.000,00
(dezesseis mil reais).
36
De acordo com a redação dada pelo § 1º-B do artigo 879 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Art. 880, CLT: “O juiz ou presidente do Tribunal, requerida a execução, mandará expedir mandato
de citação ao executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as
cominações estabelecidas, ou, em se tratando de pagamento em dinheiro, incluídas as contribuições
sociais devidas ao INSS, para que pague em quarenta e oito horas, ou garanta a execução, sob pena
de penhora.”
37
53
Na hipótese supracitada, observa-se que a primeira oportunidade que o
executado teve para impugnar a conta apresentada ocorreu justamente com a
oposição dos embargos à execução, sendo completamente impossível aplicar a
multa de 10% sobre os valores homologados pelo juiz, uma vez que não houve a
instauração do contraditório sobre tais valores38.
Contudo, com a oposição dos embargos à execução por parte do executado,
o valor de R$16.000,00 (dezesseis mil reais) tornou-se incontroverso. Entende-se
que, a partir do dia subseqüente à oposição de embargos à execução poderá haver
a aplicação da multa de 10% sobre tais valores, ficando o debate em torno dos
R$9.000,00 (nove mil reais) restantes, devendo sempre ser observada as hipóteses
de preclusão e a existência de novas parcelas incontroversas, conforme foi referido
quando se analisou o primeiro procedimento.
Dessa forma, seja qual for o procedimento a ser utilizado por parte do juiz no
que tange à execução, apenas deverá ser determinada a aplicação da referida multa
quando inexistir qualquer tipo de discussão acerca do valor devido. Razões pelas
quais, deverá haver o respeito ao contraditório, pois através deste meio entende-se
que pode haver a incontrovérsia quanto aos valores apresentados, devendo os
operadores do direito – especialmente o advogado do credor – estarem atentos às
preclusões e valores incontroversos que porventura possam surgir no decorrer do
processo.
38
Aqui, novamente é importante ressaltar que, ao contrário do que ocorre no processo comum, no
processo do trabalho poderá haver a impugnação do quantum debeatur após a garantia do Juízo,
como ocorre nos embargos à execução e no agravo de petição.
54
CAPÍTULO
3
A
EFETIVIDADE
DA
APLICAÇÃO
DO
ARTIGO
475-J:
RESULTADOS PRÁTICOS
A pergunta que não quer calar é se, realmente, a aplicação do aludido
dispositivo processual terá eficácia na seara laboral.
Preliminarmente, cumpre fazer uma breve análise dos processos em
execução que tramitam na justiça especializada.
Como exemplo, traz-se à baila o TRT da 10 Região – Distrito Federal e
Tocantins.
O Distrito Federal tem características peculiares dos demais entes da
federação destacando-se, principalmente, a mão de obra terceirizada através da
prestação de serviços aos entes públicos, estes, tomadores de serviço.
Segundo dados estatísticos fornecidos pela Secretaria da Corregedoria do
TRT da 10 Região, o número de reclamações trabalhistas que são ajuizadas
mensalmente, chegam ao montante aproximado de 150 processos por Vara, não
obstante o acúmulo de processos já existentes em arquivo provisório, que chega a
totalidade de 28.882.39
Muitos destes processos em execução pendentes se devem em razão da
dificuldade de localizar patrimônio suficiente para garantia do débito trabalhista.
Não se encontrando bens suficientes ou dinheiro para pagamento destes
processos, os mesmos são arquivados, provisoriamente, até que o credor se
manifeste quanto à localização de possíveis bens passíveis de penhora ou quando o
magistrado vislumbra a possibilidade de pagamento da execução, quer por
declaração de grupo econômico ou notícias dos sócios proprietários da empresa
reclamada.
Em se tratando de processos que aguardam solução, seria possível a
aplicação do artigo 475-J, mesmo os que ainda não estão solucionados?
A lei nova atinge o processo em curso, independentemente de sua situação,
no momento em que ela entrar em vigor, sendo assegurada a inteira eficácia dos
atos processuais já praticados. São os atos subsequentes à lei nova que se
regularão conforme os preceitos desta.
39
(http://www.trt10.jus.br/institucional/informacoes/corregedoria/estatisticas/2009/fase_execucao_feve
reiro_2009.pdf, acesso em 21 abr.2009).
55
No que tange a execução de sentença iniciada em período anterior à vigência
da Lei 11.232/2005, o doutrinador Humberto Theodoro Júnior se posiciona nos
seguintes termos:
"As ações de execução de sentença iniciadas antes da vigência da Lei nº
11.232/2005 prosseguirão até o final dentro dos padrões da actio iudicati
prevista no texto primitivo do Código. As sentenças anteriores que não
chegaram a provocar a instauração da ação autônoma de execução
submeter-se-ão ao novo regime de cumprimento instituído pela Lei nº
11.232/2005, mesmo que tenham transitado em julgado antes de sua
40
vigência”.
Como é sabido, a correção monetária e os juros moratórios praticados em um
processo judicial não recompõem devidamente a perda do poder aquisitivo do
crédito judicial.
Basta verificar a distância que se verifica entre os juros praticados pelo
mercado financeiro, em detrimento ao que recorre o credor, enquanto não satisfeita
a obrigação que o Juízo impõe ao devedor, e os percentuais praticados
judicialmente. Assim, onerar o devedor, tornando realmente prejudicial ao mesmo a
mora no adimplemento da obrigação judicial, se afigura como medida necessária
para a obtenção da celeridade desejada no curso do cumprimento da sentença?
Um destaque à aplicação da referida norma deve ser feito. Por impor o
cumprimento efetivo da obrigação, com o pagamento da quantia a que foi
condenado o devedor, resta claro que a referida multa apenas tem cabimento nas
execuções definitivas, haja vista que a provisória trata apenas de depósito de
valores, o que revela a intenção de apenas garantir o Juízo, demonstrando a
idoneidade financeira do devedor, não em anuência a obrigação imposta e
consequente pagamento ao credor. Aliás, havendo pagamento do crédito por parte
do devedor no curso de uma execução provisória, entende-se que o ato, por ser
incompatível com o interesse de recorrer e de impugnar, implicaria em renúncia aos
recursos já interpostos e autorizaria a conversão imediata da execução provisória
em definitiva.
O que é provisório é tão somente o título na medida em que fora impugnado
por recurso desprovido de feito suspensivo, o que demonstra a possibilidade de
eventual alteração daquele no caso de provimento, mesmo que parcial, do recurso
interposto.
40
THEODORO JÚNIOR, Humberto As Novas Reformas do Código de Processo Civil, Rio de
Janeiro, ed. Forense, 2006, p; 125.
56
A provisoriedade ou definitividade encontra-se relacionada tão-somente ao
título embasador da execução. Com relação aos títulos executivos extrajudiciais, é
certo que sua definitividade ocorre quando da sua formatação. A provisoriedade está
ligada ao título judicial e não a execução, já que aquela ainda se encontra passível
de alteração em razão do recurso interposto.
Neste sentido, enquanto não for encerrado por definitivo o seguimento
recursal, ainda haverá a possibilidade de modificação da condenação imposto ao
executado.
Não obstante, considerando que a execução provisória seja regida em linhas
gerais pelo art. 475-J, caso se trate de pagamento de quantia, surge a indagação
acerca da ampla aplicabilidade desse dispositivo legal, inclusive no que tange à
multa processual nele prevista em caso de não pagamento tempestivo pelo
reclamado, tratando-se da seara trabalhista.
Existem doutrinadores como Wambier e Humberto Theodoro que defendem a
necessidade de ao menos ter ocorrido o trânsito em julgado do título provisório para
que o prazo previsto no aludido artigo passe a fluir. Isto é, considerando que tal
dispositivo prevê que a multa de 10% incidirá somente após o prazo de 15 dias em
caso de não pagamento pelo condenado, e como o termo a quo desse prazo dar-seá ao menos como o transito em julgado, conforme exposto outrora, demonstra-se
impossível a imposição dessa sanção na execução provisória.
O tema da aplicabilidade do artigo 475-J, em sede de execução provisória, já
foi discutido pelo Ministro Maurício Godinho Delgado41 nos seguintes termos:
Tribunal Superior do Trabalho
Feito: RR-314/2005-023-03-41
Data de Publicação: 26/09/2008
Relator: MAURICIO GODINHO DELGADO
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA.
EXECUÇÃO PROVISÓRIA. MULTA PREVISTA NO ART. 475-J CPC.
VIOLAÇÃO DO ART. 5º, LIV E LV DA CF. OFENSA DIRETA.
CONFIGURAÇÃO.
Inteiro Teor:
6ª Turma MGD/vln/md/fbi.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO
PROVISÓRIA. MULTA PREVISTA NO ART. 475-J CPC. VIOLAÇÃO DO
ART. 5º, LIV E LV DA CF. OFENSA DIRETA. CONFIGURAÇÃO.
Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia
os requisitos do art. 896 da CLT, ante a constatação, em tese, de afronta ao
art. 5º, LIV e LV, da CF. Agravo de instrumento provido.
RECURSO DE REVISTA. MULTA PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC.
EXECUÇÃO TRABALHISTA. SITUAÇÕES DE COMPATIBILIDADE.
EXECUÇÃO PROVISÓRIA E DE ACORDO JUDICIAL. NÃO-INCIDÊNCIA.
41
http://www.informajuridico.com.br/isapi.int/netserver/frmDocumento. Acesso em 09 mai. 2009.
57
A multa executória do novo art. 475-J do CPC (Lei nº 11.232/2005),
instituída para dar efetividade às decisões judiciais relativas ao pagamento
de quantia certa ou já fixada em liquidação, em obediência a comando
constitucional enfático (art. 5º, LXXVIII, da CF), não se aplica ao processo
do trabalho quando for incompatível, seja por se tratar de execução
meramente provisória (Súmula 417,III, TST), seja por se tratar de execução
de acordo, quando este já estabelecer cominação específica (non bis in
idem ).
Tratando-se, porém, de execução definitiva, determinante do pagamento
incontinenti em dinheiro, conforme jurisprudência firmemente consolidada
(Súmula 417, I e II, TST, ratificando as anteriores Ojs 60 e 61 da SBDI-2 da
Corte Superior), que autoriza, inclusive, o imediato bloqueio bancário do
valor monetário correspondente à conta homologada (convênio BACENJUD), desponta clara a compatibilidade da nova regra cominatória do CPC
com o processo executório trabalhista, que sempre priorizou a celeridade e
efetividade da prestação jurisdicional.
Nesse item anterior, o Exmo Ministro Maurício Godinho Delgado trata dos dois
temas, execução definitiva e provisória havendo a diferenciação dos momentos
processuais. E continua:
Em conseqüência, sendo definitiva a execução e não adimplido em dinheiro
o crédito exeqüendo, seja por depósito espontâneo, seja por bloqueio via
BACEN-JUD, tendo sido o executado intimado cominatoriamente para o
adimplemento monetário até 15 dias, incidirá a multa estipulada pelo
art.475-J do CPC, no importe de 10% sobre o montante da condenação.
Na hipótese dos autos, contudo, além de se tratar de execução provisória, o
executado sequer foi notificado da possibilidade de sofrer a majoração da
execução pela imposição da referida multa, o que de fato evidencia a
afronta aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa, insculpidos no art. 5º, LIV e LV, da CF. Recurso de revista provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista TST-RR314/2005-023-03-41.0 , em que é Recorrente SEBRAE SERVIÇO DE
APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS DE MINAS GERAIS e
Recorrido MARCELO VITOI ZAGHLOUL.
A Presidência do TRT da 3ª Região denegou seguimento ao recurso de
revista do Reclamado, por entender não demonstrada a apontada violação
de norma constitucional, como exige o art. 89, § 2º da CLT (fls. 379-380).
Inconformado, o Reclamado interpõe o presente agravo de instrumento,
sustentando que seu recurso de revista reunia condições de admissibilidade
(fls. 02-10). Foram apresentadas contraminuta ao agravo de instrumento
(fls.383-385), sendo dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público
do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, II, do RITST. É o relatório.
VOTO
AGRAVO DE INSTRUMENTO I) CONHECIMENTO CONHEÇO o agravo
interposto, pois preenchidos os requisitos de admissibilidade.
II) MÉRITO MULTA DO ART. 475-J DO CPC O Eg. TRT da 3ª Região
negou provimento ao agravo de petição interposto pela Reclamada,
mantendo a aplicação de multa de 10% sobre o valor da condenação
imposta com fundamento no art. 475-J do CPC. Esta decisão foi baseada
na aplicabilidade supletiva do CPC em relação às multas relacionadas à
fase de execução, já que omissa a CLT a respeito dessa matéria.
O recurso de revista interposto em face desta decisão teve seu seguimento
denegado, ao argumento de não ter sido demonstrada a violação à norma
constitucional e ser interpretativa a matéria acerca da aplicabilidade no
processo do trabalho do art. 475-J do CPC. Essa decisão recebeu a
seguinte fundamentação:
MULTA Alegação(ões):-violação do art. 5°, incisos II, LIV e LV da CR/88.
58
Consta do v. Acórdão:
" 2.2.4-Multa do Artigo 475-J da CLT Por se tratar de quantia certa, que será
atualizada por mero cálculo, a Vara intimará o devedor para que pague o
montante da condenação em 48 horas, sob pena de multa de 10%,
conforme dispõe o art. 475-J do CPC, com redação dada pela Lei
11.232/05, plenamente compatível com o processo do trabalho, na forma do
art. 769 da CLT, fazendo esta determinação parte integrante do presente
acórdão.
A CLT é omissa em relação a multas na execução e a compatibilidade com
o processo do trabalho é plena, pois se trata de crédito de natureza
alimentar, atualizado de modo notoriamente inferior às taxas de juros
praticados no mercado.
O presente processo já dura exatos 02 anos e 03 meses, e está sendo
corrigido de forma insuficiente para atualizar a defasagem da moeda.
A multa de 10% sobre o valor da condenação atuará como mecanismo
compensatório desta correção e como meio de evitar protelações inúteis e
garantir a promessa constitucional do art.5º, LXXIII, da Constituição Federal.
. ." (f. 780).
Não se vislumbram as ofensas constitucionais apontadas, uma vez que a
matéria não escapa do âmbito de interpretação da legislação
infraconstitucional pertinente (art. 475-J, do CPC).
Assim, se violação houvesse, seria meramente reflexa, o que não autoriza o
seguimento do recurso, conforme reiteradas decisões da SDI-I/TST (ERR
1600/1998-002-13-40.4, Rel. Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ
19/05/2006, dentre várias).
Na mesma linha vem se orientando o Excelso Supremo Tribunal Federal,
quando da admissibilidade do recurso extraordinário, também dotado de
natureza jurídica especial como o de revista (Ag.158.982-PR, Rel.
Min.Sydney Sanches-Ag. 182.811-SP, Rel. Min. Celso de Mello-Ag 174.473MG, Rel. Min. Celso de Mello-Ag.188.762-PR, Rel. Min. Sydney Sanches).
CONCLUSÃO DENEGO seguimento ao recurso de revista. (fls. 379-380) A
Reclamada interpôs agravo de instrumento, alegando violação do art. 5º, II,
LIV e LV, da CF, sob a alegação de ser inaplicável no processo do trabalho
a multa prevista no art. 475-J do CPC. Ademais, alega ter indicado bem
garantidor da execução assim que recebeu a citação, mas não foi
comunicado da penalidade de aplicação da referida multa se não efetuasse
o pagamento. Por fim, a hipótese prevista no CPC trata de não pagamento
da dívida devidamente quantificada; contudo, afirma que, na presente
hipótese, além de se tratar de execução provisória, as partes ainda
discutiam o quantum debeatur . Com razão a Reclamada.
A multa executória prevista no art. 475-J do CPC (Lei nº 11.232/2005) não
se aplica ao processo do trabalho em se tratando de execução provisória.
Diante do exposto, deve ser dado provimento ao agravo de instrumento,
para melhor análise de argüição de afronta ao art. 5º, LIV e LV, da CF.
Com estes fundamentos, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento
para admitir o processamento do recurso de revista.
B) RECURSO DE REVISTA I) CONHECIMENTO Conforme ressaltado no
exame do agravo de instrumento, o Reclamante demonstrou a violação do
art. 5º, LIV e LV, da CF, pois, além de não ter sido notificado previamente
da cominação da inovatória multa prevista no art. 475-J do CPC, também,
não se mostra razoável a incidência da penalidade imposta, em se tratando
de execução provisória.
CONHEÇO , pois, do recurso de revista interposto.
II) MÉRITO MULTA DO ART. 475-J DO CPC. SITUAÇÕES DE
COMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO Antes de
adentramos no mérito da demanda, são necessárias algumas
considerações.
Mostra-se perfeitamente aplicável no processo do trabalho a multa prevista
no art. 475-J do CPC, em se tratando de execução definitiva. Isto porque,
considerado o princípio da celeridade e efetividade na prestação
59
jurisdicional (art. 5º, LXXVIII, da CF), o direito processual do trabalho, atento
a essa exigência constitucional, deve oferecer meios para a garantia da
execução efetiva e rápida. Nessa interpretação, o art. 475-J do CPC se
encaixa perfeitamente ao Processo do Trabalho, pois compatível com os
princípios que regem a execução trabalhista. Dispõe o artigo 475-J do
Código de Processo Civil: Caso o devedor, condenado ao pagamento de
quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze
dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de
dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art.
614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação
(Incluído pela Lei nº 11.232/05) O artigo 769 da CLT disciplina os requisitos
para aplicação subsidiária do Direito Processual Comum ao Processo do
Trabalho nas hipóteses de omissão do diploma consolidado e desde que
haja compatibilidade com os princípios norteadores do direito trabalhista,
sendo que estes requisitos foram preenchidos. Também deve ser ressaltada
a permissividade do art. 880 da CLT, no que diz respeito às cominações
impostas na fase processual executória, e, portanto, o acréscimo pecuniário
relativo à multa do art. 475-J do CPC poderá, inclusive, constar do mandado
de citação, penhora e avaliação.
Perfeitamente lógico admitir a existência de lacuna da lei em relação à
mencionada multa, de forma a ser aplicável o art. 769 da CLT, no sentido de
se adotar supletivamente o diploma processual civil na fase de execução
trabalhista. Tal intelecção prestigia os princípios informadores do processo
do trabalho, pois a coercitividade imposta ao devedor em cumprir o
comando exaurido do título executivo é forma de proteção ao
hipossuficiente que pretende ver adimplido crédito trabalhista, cuja natureza
é eminentemente alimentar.
Diferentemente do processo trabalhista, a sentença proferida perante a
Justiça Comum, regra geral, apresenta-se de forma líquida. Contudo, no
Direito do Trabalho, por apresentar normalmente cumulação de pedidos em
decorrência da diversidade de verbas inadimplidas pelo Empregador, há a
necessidade da liquidação da sentença. Assim, o prazo de 15 dias para
pagamento previsto no art. 475-J do CPC, sob conseqüência da multa de
10%, mostra-se razoável e compatível com o processo do trabalho.
O mencionado prazo, contudo, deve ser contado a partir da notificação à
Parte da homologação dos cálculos de liquidação, devendo, ainda, estar
expressa a cominação da penalidade prevista no art. 475-J, a fim de se
evitarem argüições de ofensa a outros princípios constitucionais, em
especial o do contraditório e da ampla defesa e o do devido processo legal.
Entretanto, em se tratando de acordo homologado judicialmente, por meio
do qual, geralmente, já existe a previsão de multa pelo descumprimento do
pactuado, inadmissível a aplicação da pena pecuniária imposta, pois
representa bis in idem , já que imputa dupla penalidade ao devedor pelo
mesmo fato.
Da mesma forma, em se tratando de execução provisória, a parte tem a
opção de oferecer bens para a garantia do juízo, consoante entendimento já
consolidado nesta Corte por meio da Súmula 417. Portanto, neste caso, a
exigência de depósito em dinheiro não se mostra razoável, o que, por
corolário, também inviabiliza a incidência da multa do art.475-J do CPC.
Em síntese: A multa executória do novo art. 475-J do CPC (Lei nº
11.232/2005), instituída para dar efetividade às decisões judiciais relativas
ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, em obediência a
comando constitucional enfática (art. 5º, LXXVIII, da CF), não se aplica ao
processo do trabalho quando for incompatível, seja por se tratar de
execução meramente provisória, seja por se tratar de execução de acordo,
quando este já estabelecer cominação específica (non bis in idem).
Tratando-se, porém, de execução definitiva, determinante do pagamento
incontinenti em dinheiro, conforme jurisprudência firmemente consolidada
(Súmula 417, I e II, TST, ratificando as anteriores Ojs 60 e 61 da SBDI-2 da
Corte Superior), que autoriza, inclusive, o imediato bloqueio bancário do
60
valor monetário pendente à conta homologada (convênio BACEN-JUD),
desponta clara a compatibilidade da nova regra cominatória do CPC com o
processo executório trabalhista, que sempre priorizou a celeridade e
efetividade da prestação jurisdicional. Em conseqüência, sendo definitiva a
execução e não adimplido em dinheiro o crédito exeqüendo, seja por
depósito espontâneo, seja por bloqueio via BACEN-JUD, tendo sido o
executado intimado cominatoriamente para o adimplemento monetário até
15 dias, incidirá a multa estipulada pelo art. 475-J do CPC, no importe de
10% sobre o valor da condenação.
Assim sendo, na hipótese dos autos, contudo, além de se tratar de
execução provisória, o executado sequer foi notificado da possibilidade de
sofrer a majoração da execução pela imposição da referida multa, o que de
fato evidencia a afronta os princípios do devido processo legal, do
contraditório e da ampla defesa, insculpidos no art. 5º, LIV e LV, da CF.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de revista, por se tratar de
execução provisória (fica registrada a ressalva de entendimento dos
Ministros Aloysio Corrêa da Veiga e Horácio Senna Pires, quanto à efetiva
possibilidade de aplicação da multa mesmo em execução definitiva).
CONCLUSÃO
ACORDAM os Ministros da Egrégia Sexta Turma do Tribunal Superior do
Trabalho, por unanimidade: I-dar provimento ao agravo de instrumento
interposto, para determinar o processamento do recurso de revista; II
conhecer do recurso de revista por ofensa ao art. 5º, LIV, LV, da CF, e, no
mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação a multa prevista no
art. 475-J do CPC, por se tratar de execução provisória, com ressalva de
fundamento dos Exm os . Ministros Aloysio Corrêa da Veiga e Horácio
Senna Pires quanto à possibilidade de aplicação em execução definitiva.
Brasília, 17 de setembro de 2008.
MAURICIO GODINHO DELGADO Relator NIA: 4515172
Como se deprende do v. acórdão do Exmo Ministro Maurício Godinho
Delgado, não existe a possibilidade de, em sede de execução provisória, ser
aplicável a aludida multa, já que nesta fase não é permitida a penhora de valores
numerários sendo realizado tão-somente a penhora de bens, nos termos da Súmula
417, III, do C. TST, in verbis:
“Em se tratando de execução provisória, fere direito líquido e certo do
impetrante a determinação de penhora em dinheiro, quando nomeados
outros bens à penhora, pois o executado tem direito a que a execução se
processe da forma que lhe seja menos gravosa, nos termos do art. 620 do
CPC.”
O perigo de se aplicar a referida multa em sede de execução provisória
esbarra na reforma da sentença de primeiro grau. Se, após valer-se o réu dos
recursos previstos no consolidado trabalhista, a sentença for totalmente modificada
e, sendo aplicada a multa do art. 475-J, haveria uma inadequação da conta já que,
após extraída a Carta de Sentença e homologado provisoriamente os cálculos,
entendeu por bem a instância superior anular todo o comando sentencial de origem.
61
Ademais, do número de processos que tramitam junto ao Eg. Tribunal
Regional do Trabalho da 10ª Região, poucos são os advogados que tem se
aventurado em peticionar no sentido da aplicação da referida multa, ante a
controvérsia instaurada de sua aplicabilidade e aceitação da supletividade
processual no âmbito trabalhista.
A exemplo dos aproximados 145 processos recebidos em fase de
conhecimento no mês de abril de 2009 junto a 13ª Vara do Trabalho de Brasília,
apenas um destes requereu a aplicação da multa processual, que restou deferida
pelo Exmo Juiz José Leone Cordeiro Leite, nos seguintes termos:
“Deverão as Reclamadas, no prazo de 15 dias após o trânsito em julgado,
pagar o valor do apurado, sob pena da multa do art. 475-J, da CLT.
(Precedente: Proc. 000811-2007-821-10-00-7 - RO. Ac. 2ª T., Rel. Des.
João Amílcar) (Processo nº : 00138-2009-013-10-00-7)
As normas sociais não são geradas por acaso. Não obstante, visam alcançar
certos resultados sociais. Como processo de adaptação social que é, o Direito se
apresenta como fórmula capaz de resolver problemas de convivência e de
organização da sociedade. O atributo eficácia significa que a norma jurídica
produziu, realmente, os efeitos sociais planejados. Para que a eficácia se manifeste
indispensável é que seja observada socialmente. Eficácia pressupõe, contudo,
efetividade.
A indagação persiste se a aplicabilidade da multa reduzirá o número de
processos existentes em execução considerando-se a inadimplência patronal no
pagamento de haveres rescisórios.
Quando há intenção por parte do empregador de quitar os débitos trabalhistas
ele o faz na primeira oportunidade que possa ter, seja no acerto rescisório após a
emissão do Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho – TRCT, seja na Comissão
de Conciliação Prévia ou, na primeira audiência designada pelo juízo.
Ocorre, não obstante, que o “mau pagador” desde o encerramento da relação
de emprego já demonstra o ânimo de não querer adimplir verbas trabalhistas. E
essa já é a razão das multas celetistas previstas nos art. 467 e 477, § 8º da CLT.
Inúmeros processos de execução não são resolvidos porque a reclamada
fechou as portas, não se encontrando bens suficientes dos sócios para pagamento
do débito exeqüendo. A imposição de um multa de 10% após o transito em julgado
fará com que o devedor solva a sua dívida?
62
A norma é válida, porém, não se vislumbra a eficácia.
Segundo assevera TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR, “a questão da
validade jurídica das normas e do próprio ordenamento jurídico é uma questão de
zetética, logo, uma questão aberta”.
E continua o doutrinador afirmando que “do ângulo dogmático, porém, é uma
questão fechada, portanto, diferente, pois não se pergunta que é validade e como se
define, mas sim, busca-se identificar a validade das normas dentro de um dado
ordenamento jurídico”. 42
A doutrina aponta, com base em Kelsen, a existência de duas teorias, quais
sejam: a teoria estática e a teoria dinâmica. Estas têm lugar conforme o
conhecimento jurídico-científico se destine às normas que devem ser aplicadas ou
aos atos de produção e/ou aplicação. Para a primeira, o Direito configura-se como
um sistema de normas, estudado em seu estado de repouso. As normas de direito
positivo são colocadas em confronto, numa unidade coerente e sistemática, sob o
enlace de preceitos normativos e de norma básica, mostrando o uno (sistema) no
múltiplo (pluralidade de normas).
Para a teoria dinâmica, o Direito está em movimento, tendo por objeto o
processo jurídico em que é produzido e aplicado. Assim, só interessando à Ciência
Jurídica os atos de produção e aplicação do Direito enquanto formam o conteúdo
das normas jurídicas. 43
HANS KELSEN situa os fatos e acontecimentos cotidianos no campo
ontológico do ser, ao passo que a norma, que empresta ao fato o caráter de ato
jurídico ou antijurídico quer significar algo que deve ser. Diz KELSEN que, "Com o
termo 'norma', se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que
um homem se deve conduzir de determinada maneira".44
O ato de vontade, segundo a ótica kelseniana, fixa a norma e quando dirigido
como um comando regulador da vontade dos outros, estabelece um "dever ser",
uma prescrição.
Considerando que a norma resulta da vontade de seu criador ou constituinte,
conclui-se que esta norma manifesta-se como o sentido subjetivo dos atos que a
prescrevem. E nessa ótica vem a afirmativa de que "o sentido subjetivo de um ato
42
FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas,
1994.
43
DINIZ, Maria Helena. A ciência jurídica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 46.
44
Ibid., p. 46.
63
humano dirigido à conduta de outrem só é interpretado como o sentido objetivo
desse ato se for uma norma válida". 45
Na visão da dogmática jurídica, uma norma, para ser válida, deve,
preliminarmente, estar integrada no ordenamento jurídico, onde cumprir-se-ão seus
processos de formação e produção, de acordo com as diretrizes e requisitos do
próprio ordenamento. "Cumprido esse processo", diz TERCIO SAMPAIO FERRAZ
JUNIOR, "temos uma norma válida." (...) "Sancionada a norma legal, para que se
inicie o tempo de sua validade, ela deve ser publicada. Publicada a norma, diz-se,
então, que a norma é vigente. (...) Vigente, portanto, é a norma válida (pertencente
ao ordenamento) cuja autoridade já pode ser considerada imunizada, sendo
exigíveis os comportamentos prescritos". 46
Mas não é este o único sentido que se atribui à validade da norma. LUIZ
ANTONIO RIZZATTO NUNES, afirma que a validade tanto pode referir-se ao
aspecto técnico-jurídico ou formal quanto ao aspecto da legitimidade. "No primeiro
caso, cuida-se de a norma jurídica ser válida quando criada segundo os critérios já
estabelecidos no sistema jurídico (...). No outro, fala-se do fundamento axiológico,
cuja incidência ética seria a condição que daria legitimidade à norma jurídica,
tornando-a válida".47
Induzem à reflexão as ponderações lançadas por REINALDO DE SOUZA
COUTO FILHO, ao dizer que no ordenamento jurídico pátrio, a validade de uma
norma jurídica depende do critério adotado pelo titular do Poder Constituinte
(Congresso Nacional), seja originário ou derivado, não pelo jurista que representa
apenas um interprete dos critérios de validade adotados pela norma jurídica, sem
qualquer poder real de criação do Direito.
Segundo o autor, os que têm uma visão do Direito como linguagem afirmam
que o jurista tem uma importância fundamental no preenchimento do conteúdo
semântico de uma norma. Contudo, o mesmo não tem o poder de criar, pois
ninguém nega que o Direito, hodiernamente, se origina basicamente do Estado. E
acrescenta o autor:
"A validade da norma jurídica pode ser vista como o vínculo estabelecido
entre a proposição jurídica, considerada na sua totalidade lógico-sintática e
45
DINIZ, 1995, p. 47.
FERRAZ JUNIOR, 1994, p. 196.
47
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Manual de introdução ao estudo do direito, p. 175. Apud LEITE,
Carlos Henrique Bezerra. Justiça, validade eficácia das normas jurídicas. Revista Bonijuris, Ano
XIII, n.º 454, setembro/2001, p. 05.
46
64
o sistema de Direito posto, de modo que ela é válida se pertencer ao
sistema, mas para pertencer a tal sistema dois aspectos devem ser
observados: a adequação aos processos anteriormente estabelecidos para
a criação da proposição jurídica (exceto no caso da recepção pela
Constituição) e a competência constitucional do órgão criador. Por isso, o
48
jurista não tem o condão de criar uma norma jurídica válida."
No mesmo entendimento, que vincula a validade da norma à condição de
emanar de uma autoridade superior e mediante processo legislativo próprio, é o
ensinamento de MIGUEL REALE, quando afirma: "Para empregarmos uma
expressão popular, densa de significado, a primeira impressão que nos dá a lei é de
algo feito 'para valer', isto é, de uma ordem ou comando emanado de uma
autoridade superior." 49
NORBERTO BOBBIO, ao mencionar a questão referente à solução dos
conflitos gerados pela antinomia de duas normas válidas, aponta quatro âmbitos
distintos de validade da norma jurídica: temporal, espacial, pessoal e material. 50
Este mesmo entendimento é esposado por ANDRÉ FRANCO MONTORO,
quando afirma que "Toda norma jurídica tem, assim, um âmbito temporal, espacial,
material e pessoal, dentro dos quais ela tem vigência ou validade." 51
PAULO DE BARROS CARVALHO situa a questão da validade da norma
como relação de pertinência com o sistema e afirma: "Se partirmos do postulado
segundo o qual o sistema é formado pelo conjunto das normas válidas, a validade
passou a ser critério indispensável para pensar-se o sistema de direito positivo.
Nada obstante os conceitos fundantes são sempre de difícil delimitação e a validade
experimenta forte instabilidade entre os vários modelos conhecidos. Daí porque
Diego Martin Farrell declare que 'Las normas jurídicas se consideran válidas cuando
concuerdan con el criterio adoptado por el jurista. Puede decirse, entonces, que la
validez no es una propiedad de las normas, sino una relación entre la norma y el
criterio elegido: cuando la norma se ajusta al criterio se la considera válida'."52
48
COUTO FILHO, Reinaldo de Souza. Considerações sobre a validade, a vigência e a eficácia
das normas jurídicas.Revista Jurídica Eletrônica JusNavigandi: www.jus.com.br (09/08/2001).
49
REALE, Miguel. Teoria tridimensional do direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 15.
50
BOBBIO, 1997, p, 87-88.
51
MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do direito. II v. 5. ed. São Paulo: Martins, 1973,
p. 146.
52
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário. Fundamentos jurídicos da incidência. 2. ed.
São Paulo: Saraiva, 1999, p. 49.
65
E conclui PAULO DE BARROS CARVALHO: "...ao dizermos que u'a norma 'n'
é válida, estaremos expressando que ela pertence ao sistema 'S'. Ser norma é
pertencer ao sistema, o 'existir jurídico específico' a que alude Kelsen." 53
Assim, para que uma norma possa ser considerada válida é necessário, antes
de tudo, que tenha integrado o ordenamento jurídico vigente, através de processo
legítimo de criação normativa.
Segundo KELSEN, "com a palavra 'vigência' designamos a existência
específica de uma norma. Quando descrevemos o sentido ou o significado de um
ato normativo dizemos que, com o ato em questão, uma qualquer conduta humana é
preceituada, ordenada, prescrita, exigida, proibida; ou então consentida, permitida
ou facultada. Se, como acima propusemos, empregarmos a palavra 'dever ser' num
sentido que abranja todas estas significações, podemos exprimir a vigência
(validade) de uma norma dizendo que certa coisa deve ou não deve ser, deve ou
não ser feita." 54
Existem outras considerações importantes lançadas pelo notável autor
alemão, para explicitar que a existência de norma positiva torna-se autônoma e
independente em relação à existência da vontade que a criou, afirmando KELSEN
que quando a norma entra em vigor, o ato de vontade de seu instituidor já deixou de
existir. 55
A norma, portanto, expressa sua força e impõe a conduta, mesmo que seu
instituidor já não queira que isso ocorra e continua valendo mesmo quando este já
não mais figure no rol dos vivos.
A propósito, segundo KARL LARENZ, "a teoria 'objectivista' da interpretação
afirma não apenas que a lei, uma vez promulgada pode, como qualquer palavra dita
ou escrita, ter para outros uma significação em que não pensava o seu autor – o que
seria um truísmo - , mas ainda que o juridicamente decisivo é, em lugar do que
pensou o autor da lei, uma significação 'objectiva', independente dele e imanente à
mesma lei. Com o que se sustenta, antes de tudo, que há uma oposição
fundamental entre a interpretação jurídica e a histórico-filosófica. Enquanto esta
procura descobrir nas palavras o sentido que o autor lhes ligou, o fim da
interpretação jurídica será patentear o sentido racional da lei olhada como um
53
CARVALHO, 1999, p. 50.
KELSEN,Hans.Teoria pura do Direito. p. 11.
55
Idem.
54
66
'organismo espiritual', no dizer de Kohler. As opiniões e intenções subjectivas do
legislador, dos redactores da lei ou das pessoas singulares que intervieram na
legislação, não têm relevo; a lei é 'mais racional' do que o seu autor e, uma vez
vigente, vale por si só." 56
Para PAULO DE BARROS CARVALHO, "Viger é ter força para disciplinar,
para reger, cumprindo a norma seus objetivos finais. A vigência é propriedade das
regras jurídicas que estão prontas para propagar efeitos, tão logo aconteçam, no
mundo fático, os eventos que elas descrevem. Há normas que existem e que, por
conseguinte, são válidas no sistema, mas não dispõem dessa aptidão. A despeito de
ocorrerem os fatos previstos em sua hipótese, não se desencadeiam as
conseqüências estipuladas no mandamento. Dizemos que tais regras não têm vigor,
seja porque já o perderam, seja porque ainda não o adquiriram." 57
Pode-se de tais excertos concluir que o termo "vigência" traduz a existência
específica de uma norma e que não se confunde com validade. Uma norma pode
ser válida, se regularmente completou o processo de integração ao ordenamento
jurídico, cumprindo os requisitos de produção para que sua gênese atendesse às
exigências do ordenamento, mas pode ainda não ser vigente, por depender da
verificação de condição suspensiva ou de vacância, ou mesmo ter tido sua vigência
exaurida ou encerrada.
Ao contrário, toda norma vigente haverá que ser necessariamente válida,
posto que a validade é sinônimo de integração da norma ao ordenamento, que por
sua vez é pressuposto para a vigência.
Da mesma forma, uma norma pode ter vigência. Não obstante, pode não ser
dotada de eficácia, posto que vigência e eficácia também constituem características
diferentes da norma jurídica.
A vigência de uma norma pode ser temporária ou indeterminada, segundo
disposição de seu instituidor no momento da elaboração. Se fixado um período
delimitado de vigência, esta findará ao término do mesmo, quando chegará ao seu
termo final. Na fixado o prazo de sua vigência, presume-se a indeterminação.
A vigência também poderá ser interrompida pela ocorrência de revogação,
seja na hipótese de ab-rogação (supressão total da norma anterior), ou derrogação
56
LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 5. ed. (Tradução de José Lamego, revisão de
Ana Freitas). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p. 36.
57
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p.
82-83.
67
(supressão parcial da norma anterior). No primeiro caso a norma perde seus efeitos
totalmente. No segundo, apenas em relação à parte regulada por nova lei ou cujos
efeitos tenham sido expressamente revogados.
Dependendo, ainda, no momento em que a norma ingressa no ordenamento
jurídico ou faz incidir seus efeitos, poderemos falar em vigência imediata, vigência
futura, ou mesmo em vigência retroativa, quando as disposições da norma jurídica
alcançam um fato ocorrido no passado.
O ordenamento pátrio aceita a retroatividade da norma, em certos casos. A
regra, contudo, é que a norma em vigor tem efeito imediato e geral, valendo para o
futuro, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
Quando falamos em eficácia da norma, devemos utilizar-se da expressão em
dois sentidos: a eficácia social e a eficácia jurídica.
A eficácia social, segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, "designa uma efetiva
conduta acorde com a prevista pela norma; refere-se ao fato de que a norma é
realmente obedecida e aplicada; nesse sentido, a eficácia da norma diz respeito,
como diz Kelsen, ao 'fato real de que ela é efetivamente aplicada e seguida, da
circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na ordem dos
fatos'. É o que tecnicamente se chama efetividade da norma. Eficácia é a
capacidade de atingir objetivos previamente fixados como metas." 58
Tratando-se de normas jurídicas, complementa o autor, a eficácia consiste na
capacidade de atingir os objetivos nela traduzidos, que vêm a ser, em última análise,
realizar os ditames jurídicos objetivados pelo legislador. Por isso é que se diz que a
eficácia jurídica da norma designa a qualidade de produzir em maior ou menor grau,
efeitos jurídicos, ao regular, desde logo, as situações, relações e comportamentos
de que cogita; nesse sentido, a eficácia diz respeito à aplicabilidade, exigibilidade ou
executoriedade da norma, como possibilidade de sua aplicação jurídica. 59
MARIA HELENA DINIZ aponta a seguinte distinção: "Como se vê, a eficácia é
condição da validade. A eficácia de uma norma consiste em que esta é, em geral,
efetivamente cumprida e, se não cumprida, é aplicada. A validade consiste em que a
norma deve ser cumprida, ou, se não o for, deve ser aplicada. Assim, se uma norma
proíbe matar animal de uma certa espécie, ao ligar a tal matar uma pena como
58
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed., São Paulo:
Malheiros, 1999, p. 65.
59
Ibidem, p. 66.
68
sanção, perderia sua validade se aquela espécie de animal desaparecesse e, por
conseguinte, não fosse possível nem o cumprimento nem a aplicação da norma
jurídica." 60
Vigência, validade e eficácia, portanto, podem interagir no que pertine à
norma, mas constituem qualidades distintas da mesma e não precisam estar
presentes em todas as hipóteses.
Tanto é assim que uma norma pode ser válida, vigente e eficaz; pode ser
válida e vigente e não ter eficácia; pode ser válida e não possuir vigência nem
eficácia, como também pode apresentar-se destituída de todas essas qualidades,
não possuindo validade, nem vigência, nem eficácia.
Assim, por exemplo, se uma determinada norma, editada segundo os
processos legislativos adequados, portanto válida, devidamente sancionada e
publicada, logo vigente, que disponha que todos os carros deverão possuir
obrigatoriamente um determinado item de segurança, que por força da quebra ou
desativação da única indústria que o produzia, deixou de existir no mercado, será
ineficaz quanto a esta imposição.
HANS KELSEN assinala que uma norma jurídica é considerada como
objetivamente válida apenas quando a conduta humana que ela regula lhe
corresponde efetivamente, pelo menos numa certa medida e que, se uma norma
nunca é aplicada nem respeitada em parte alguma, não será considerada como
norma válida.61
Contra esta assertiva insurge-se FERRAZ JUNIOR, para quem a ineficácia de
uma norma, faltando-lhe o mínimo de eficácia a que se refere Kelsen, nem assim
deixaria de ser válida, posto que a norma editada validamente entrou para o
ordenamento jurídico, ainda que nunca tenha produzido efeitos. Lembra, ainda, que
a eficácia social ou efetividade de uma norma não se confunde com sua
observância, já que há normas que nunca são obedecidas e mesmo assim guardam
relevância social. As que não são observadas por longo tempo caem no desuso,
podendo falar-se na perda de seu sentido normativo, mas não da validade. 62
A eficácia, no sentido jurídico, diz respeito com a capacidade da norma de
produzir efeitos. Essa capacidade possui uma larga faixa de incidência, podendo ser
60
DINIZ.1997, p. 47.
KELSEN. p. 12.
62
FERRAZ JUNIOR. 1994. p. 198.
61
69
total ou parcial e, ainda, cabendo falar-se em normas que são apropriadas a produzir
efeitos mais ou menos intensos e relevantes.
Em sede de Direito Constitucional, costuma-se dizer que a eficácia social
precede a eficácia jurídica, pois uma constituição que não atende aos anseios de
seu povo e não merece observância jamais chega a ser respeitada como uma Lei
Maior.
No campo das legislações ordinárias, entretanto, ocorre o inverso, a nosso
ver. Só após integrar o ordenamento jurídico e tornar-se apta a produzir efeitos,
logo, dotada de validade, vigência e eficácia, é que uma lei poderá passar pelo crivo
da observância social, para ter eficácia social. Neste caso, a eficácia jurídica é que
precede à social.
Finalmente, a eficácia de uma norma pode ainda sofrer limitações ou mesmo
depender de outra norma para se realizar. É o caso das normas de eficácia limitada
ou de eficácia contida, que a despeito de erigirem previsão de conduta, asseveram
que determinado conceito ou fator será ditado por norma complementar, ou nos
termos da lei, quando a lei ainda não foi editada.
Obviamente, por estar umbilicalmente dependente da validade, qualquer fator
externo que alcance a norma para invalidá-la ou obstar seus efeitos, total ou
parcialmente,
como
ocorre
nos
casos
de
revogação,
declaração
de
inconstitucionalidade ou suspensão de efeitos por liminar dotada de amplitude erga
omnes, atingirá na mesma intensidade a sua eficácia.
70
CONCLUSÃO
Como delineado supra, vê-se que a matéria concernente a aplicabilidade do
referido artigo na seara trabalhista ainda encontra divergências, quer por parte da
doutrina, quer por parte da jurisprudência.
Ante a controvérsia existe certa resistência quanto a sua aplicabilidade e se
alcançara os resultados práticos tão desejados no processo comum.
Neste compasso, defendo a corrente pela inaplicabilidade do referido artigo
em virtude de inexistência da norma celetista quanto ao tema.
Diferentemente do processo civil, o rito trabalhista já vem se atualizando,
tornando-se célere, eis o porquê da inaplicabilidade do artigo, eis que o rito
processual comum demora anos até a entrega do provimento jurisdicional.
Ressalvado meu entendimento, caso seja aplicada a referida a multa, deve
o D. Magistrado ater-se aos princípios do contraditório e da ampla defesa,
visando
resguardar
os
princípios
constitucionais.
Ademais,
devem
os
procuradores das partes verificar o efetivo cumprimento da multa, caso deferida,
evitando nulidades futuras durante o processo.
Até que a jurisprudência pacifique seu entendimento, as partes estarão a
mercê do entendimento dos magistrados quanto ao assunto, arriscando-se a
peticionar neste sentido.
No futuro, acredito que o Colendo Tribunal Superior do Trabalho irá definir
a sua aplicabilidade, pois a divergência persiste dentro do próprio órgão superior
trabalhista.
71
REFERÊNCIAS
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Paulo. LTr.2008, pág. 46
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros,
1995.
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10 ed. Brasília: Editora UnB, 1997.
BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho. Diário Oficial da União, 14 set. 2001.
BRASIL. Lei n.º 11.232. de 22 de dezembro de 2005. Altera a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973
– Código de Processo Civil, para estabelecer a fase de cumprimento das sentenças no processo.
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