Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Versão: Português 1 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Presidente: Ada Pellegrini Grinover 1º Vice Presidente: Helio Nicoletti 2o Vice Presidente: Celso de Souza Azzi Secretário Geral: Giacomo Guarnera Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação Vicente Bagnoli (coordenador) Gabriella Tuna Garamvölgyi e Silva Mamede Bruno Falcone 2 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Sumário: Apresentação I – A Defesa da Concorrência II – Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência III – Atos de Concentração IV – Condutas Anticoncorrenciais V – Defesa Comercial e Defesa da Concorrência VI – Propriedade Industrial e Defesa da Concorrência VII – PPI – “Iso da Concorrência” 3 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Apresentação Durante o ano de 2006, o Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria constituiu diversos grupos de estudo para analisar temas pré-selecionados, de interesse dos empreendedores, sugeridos pelos membros do Comitê. O grupo de estudo que se dedicou à defesa da concorrência, constituído pelos advogados Vicente Bagnoli, Gabriella Tuna Garanvölggi e Silva Mamede e Bruno Falcone, produziu como resultado da sua atividade este documento, que tenho o prazer de apresentar. Redigido em português e traduzido para o italiano pela equipe da Câmara, o documento informa, numa linguagem clara e direta, por meio de pergunta e resposta, relacionada às idéias fundamentais sobre a defesa da concorrência, dedicando-se ao sistema brasileiro de defesa da concorrência, seus órgão, os atos de concentração, a conduta anticoncorrencial, como denunciá-las, os riscos de participação em um cartel, as penalidades e os reflexos aos administradores, a propriedade industrial e a defesa da concorrência, o preço de exclusividade, abuso de direito de propriedade industrial/intelectual, o crime da concorrência desleal, o “ISO” da concorrência e as regras para a sua obtenção e revogação, sempre indicando aos empreendedores e seus advogados um caminho seguro para moverem-se neste verdadeiro campo minado e como se defenderem de atos concorrenciais desleais dos concorrentes. Um documento que aborda em profundidade a matéria, de fácil e agradável leitura, constituindo um itinerário preciso e detalhado, claro e acessível, que contribui para evitar os riscos da conduta anticoncorrencial e para a melhora das relações entre as empresas brasileiras. O Comitê Jurídico agradece aos autores pelo trabalho tão importante para toda a Comunidade da Câmera. São Paulo, março de 2007. Ada Pellegrini Grinover Presidente do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria 4 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria I – A Defesa da Concorrência1 I.1 - Para que serve a defesa da concorrência? Em uma economia de mercado, na qual estão envolvidos diversos relacionamentos econômicos (trocas), a concorrência é algo fundamental, uma vez que ela além de possibilitar uma maior variedade de produtos e o aprimoramento na qualidade dos mesmos, contribui diretamente para a redução de preços. A concorrência se revela a essência da relação de equilíbrio entre a oferta e a procura. As empresas, num mercado concorrencial, têm a necessidade de investir em pesquisas e desenvolvimento de produtos e serviços, bem como estudar a peculiaridade de cada mercado e o anseio dos respectivos consumidores, para não perderem espaço para seus concorrentes. Com isso, o mercado e, conseqüentemente os consumidores, obtêm os benefícios gerados pela concorrência. Percebe-se que a concorrência existe para garantir o desenvolvimento dos mercados e, como grandes beneficiados, os consumidores, já que são eles que irão usufruir as melhorias decorrentes da concorrência. Além do bem-estar econômico do consumidor propiciado pela concorrência, ela também contribui fortemente para o aprimoramento da economia de um país para ingressar e permanecer competitiva no mercado externo. I.2 - O que é poder econômico e posição dominante? No estudo do Direito da Concorrência, muitas vezes os conceitos de poder econômico e posição dominante aparecem como sendo institutos que além de se relacionarem, são utilizados para definir situações comuns. Quando se fala em posição dominante entende-se a participação que determinada empresa tem num certo mercado. Esta participação pode ser resultado de sua eficiência concorrencial que lhe garantiu uma posição de destaque em decorrência da opção dos consumidores. Até então, nada se tem de anticoncorrencial. A antijuridicidade iniciaria se tal empresa, detentora de expressiva participação no mercado, abusasse de sua posição, o que ensejaria a repressão (ou a prevenção se o ato ainda não estiver consumado) das autoridades de defesa da concorrência. Este abuso decorreria da relevante posição da empresa dentro de um mercado, que lhe permitisse abusar dessa situação limitando a oferta, aumentando os preços, impor condições aos seus compradores, dentre outras diversas possibilidades de condutas anticoncorrenciais. Portanto, a posição dominante estaria relacionada diretamente com a participação de mercado (market share), e seria alvo da atuação das autoridades antitrustes no caso do agente detentor dessa condição abusar dela em desfavor do mercado. 1 Utilizou-se como fonte as seguintes obras: BAGNOLI, Vicente. “Introdução ao Direito da Concorrência: Brasil-Globalização-União Européia-Mercosul-ALCA”. São Paulo: Singular, 2005; BAGNOLI, Vicente. “Direito Econômico”. São Paulo: Atlas, 2005. 5 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Já o poder econômico, diz respeito à condição econômica da empresa (compreendida em conjunto ao grupo econômico ao qual faz parte) e a possibilidade dessa empresa intervir no mercado, mesmo que detentora de pequena participação (market share), de maneira a impor aos outros players condição tal que não consigam resistir à disputa. É óbvio que nesta situação, a empresa com poder econômico que queira ingressar no mercado e faça isso, por exemplo, com preços promocionais para os seus produtos ou serviços, não estaria cometendo ilícito concorrencial algum. A antijuridicidade concorrencial dar-se-ia se tal empresa, abusando do seu poder econômico coloque preços tão abaixo das condições mínimas para o funcionamento no mercado (preços predatórios), que as demais concorrentes não consigam acompanhá-la e aos poucos vão perdendo participação e até mesmo “quebrando”. O poder econômico se traduziria em poder de mercado, ou seja, a empresa detentora de poder econômico teria condições de impor seus anseios ao mercado, já que detentora de poder de mercado. I.3 - O que é mercado relevante? Para efetuar qualquer análise antitruste é necessário saber o conceito de mercado relevante, pois é a partir dessa conceituação, aplicada a cada caso concreto, que se poderá determinar, ou ao menos prever, eventual concentração ou prática potencialmente prejudicial à concorrência. Delimitar o mercado relevante é fundamental para que se proceda na análise de efeitos competitivos potenciais de operações entre empresas que resultam em concentrações de mercado, ou de efeitos competitivos de condutas adotadas por empresas em condição de impor seus interesses ao mercado, uma vez que é nesse espaço em que a autoridade de defesa da concorrência deverá atuar, prevenindo ou reprimindo eventuais abusos ou infrações concorrenciais. A conceituação de mercado relevante, cujo objetivo é definir o espaço geográfico e material onde se estabelece a concorrência, reúne empresas cuja produção tenha um efeito imediato e substancial no comportamento dos diversos agentes econômicos desse mercado, notadamente no que se refere a preços e produção. Assim, o mercado relevante é o palco onde as relações concorrenciais são travadas e o local de atuação do agente econômico, cuja conduta, ainda que potencial, é analisada. Percebe-se que a análise do mercado relevante engloba duas conceituações distintas, mas inseparáveis: mercado relevante material e mercado relevante geográfico. O mercado relevante material, assim denominado e que incorpora produtos e serviços, compreende todos os produtos e serviços considerados pelos consumidores substituíveis entre si em razão das suas características, preços e utilização. As diversas características dos produtos e serviços, e o modo como os consumidores percebem a capacidade de utilização desses produtos e serviços concorrem para a determinação do mercado, ou dos mercados, nos quais os produtos são vendidos e os serviços prestados. Em linhas gerais, pode-se dizer que identificada a necessidade do consumidor por determinado produto ou serviço, deve-se verificar se ele está disposto a substituí-lo por outro. Em caso positivo, esses produtos ou serviços são fungíveis, detém intercambialidade, então fazendo parte do mesmo mercado relevante material. 6 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria A análise do mercado relevante geográfico considera a área, o espaço, onde acontece a competição, que pode ser entendida como anticoncorrencial, ou mesmo a área onde determinada operação econômica poderá produzir seus efeitos, mesmo que potenciais. Ou seja, não basta determinar abstratamente a localização do agente econômico; a natureza do produto, a existência de barreiras à entrada e a conduta praticada também são fundamentais para precisar o mercado relevante geográfico. As barreiras à entrada são desestímulos ao ingresso dos novos entrantes no mercado, fatores existentes num mercado que colocam um potencial concorrente em desvantagem em relação aos agentes econômicos já estabelecidos, dentre os quais pode-se citar: (i) custos fixos elevados; (ii) custos irrecuperáveis ou afundados (sunk costs); (iii) barreiras legais ou regulatórias; (iv) recursos de propriedade das empresas instaladas; (v) economias de escala ou de escopo; (vi) grau de integração da cadeia produtiva; (vii) fidelidade dos consumidores às marcas; e (viii) a ameaça de reação dos competidores instalados. O mercado relevante geográfico compreende, portanto, a área na qual os agentes econômicos ofertam e procuram produtos ou serviços em condições concorrenciais equivalentes de preços, preferências dos consumidores e características dos produtos ou serviços. Deve-se identificar os obstáculos ao ingresso de empresas situadas fora dessa área para ofertarem produtos ou serviços, como também a possibilidade de empresas ingressarem nesse mercado quando da elevação dos preços pela empresa nele já situada. Assim, o mercado relevante geográfico detém elevada importância na análise concorrencial, pois é da área geográfica que provêm os produtos considerados pelos consumidores como sendo substitutos. Isso dependerá da característica do bem procurado, dos custos de transação e em particular do custo de transporte. No caso desses custos serem baixos em relação ao valor do produto, é possível ingressar em mercados distantes. Por outro lado, sendo o custo de transporte muito relevante, o acesso ao mercado só poderá ser feito por empresas localizadas próximas aos locais de consumo. II – Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência2 O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), integrado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia vinculada ao Ministério da Justiça, pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) do Ministério da Fazenda, tem como objetivo principal a promoção de uma economia competitiva por meio da prevenção e da repressão de ações que possam limitar ou prejudicar a concorrência, com base na lei antitruste (Lei nº 8.884/94). A atuação do SBDC divide-se basicamente em duas vertentes: (i) o controle de concentrações (ou controle de estruturas de mercado), via apreciação de fusões, aquisições e incorporações de empresas; e (ii) a repressão a condutas anticoncorrenciais. No que se refere ao controle de estruturas, os órgãos que integram o SBDC têm atribuição legal de proceder à análise concorrencial de toda operação que enseja qualquer forma de concentração econômica, seja por meio de fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de 2 Utilizou-se como fonte o seguinte trabalho: “Informativo da Concorrência”, Ano I Nº 1, elaborado por Bagnoli e Gonçalves Advogados, 2004. 7 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria agrupamento societário, que implique participação de empresa ou grupo de empresas resultante em 20% (vinte por cento) de um mercado relevante, ou em que qualquer dos participantes tenha registrado faturamento bruto anual no último balanço equivalente a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais). A repressão a práticas anticoncorrenciais consiste na apuração de condutas de empresas que possam configurar infração à ordem econômica, quais sejam: (i) limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; (ii) dominar mercado relevante de bens ou serviços; (iii) aumentar arbitrariamente os lucros; e (iv) exercer de forma abusiva posição dominante. São exemplos de condutas anticoncorrenciais: as vendas casadas, os acordos de exclusividade e a prática de cartel - adoção de conduta concertada entre empresas que atuam em um mesmo mercado, por meio de fixação de preços, de divisão de mercados ou de falseamento em licitações públicas. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas, além de outras cominações legais: (i) no caso de empresa, multa de um a trinta por cento do valor do faturamento bruto no seu último exercício; e (ii) no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável pela infração cometida por empresa, multa de dez a cinqüenta por cento do valor daquela aplicável à empresa, de responsabilidade pessoal e exclusiva ao administrador. III – Atos de Concentração III.1. O que são atos de concentração? Entende-se por atos de concentração, os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços. III.2. Quando os atos de concentração deverão ser submetidos à apreciação do CADE? Deverão ser submetidos à apreciação do CADE os atos de que visem a qualquer forma de concentração econômica, seja através de fusão ou incorporação de empresas, constituição de sociedade para exercer o controle de empresas ou qualquer forma de agrupamento societário, que implique participação de empresa ou grupo de empresas resultante em 20% de um mercado relevante, ou em que qualquer dos participantes tenha registrado faturamento bruto anual no último balanço equivalente a R$ 400 milhões. Na aplicação do critério do faturamento para apresentação de atos para apreciação do CADE, considera-se relevante o faturamento bruto anual registrado exclusivamente no território brasileiro pelas empresas ou grupo de empresas participantes do ato de concentração. III.3. Exigências para apresentação do ato ao CADE. Além de diversas informações contidas no Anexo I da Resolução nº 15 do CADE, tais como descrição da operação e detalhes das empresas requerentes, deverá ser efetuado o recolhimento de taxa no valor de R$ 45 mil. 8 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria III.4. Qual o prazo para o CADE analisar e julgar o ato de concentração? Observando o que dispõe a Lei de Defesa da Concorrência, o prazo para o julgamento da operação pelo CADE é de 120 dias, incluindo neste prazo as análises e pareceres da SDE, SEAE, Ministério Público Federal e Procuradoria do CADE. Entretanto, esse prazo poderá ser menor ou maior, dependendo das características do ato, que poderá determinar uma análise sumária da operação, ou se estender por aproximadamente dois anos. III.5. Como o CADE pode decidir após a análise de um ato de concentração? Em respeito aos ditames constitucionais da livre iniciativa e livre concorrência, o objetivo do CADE é sempre aprovar os atos de concentração. Caso da análise fique demonstrado eventual limitação à concorrência, o CADE poderá aprovar o ato, aplicando medidas que restrinjam a operação, mas permita a concorrência no mercado. Em casos em que o CADE entenda inviável a aprovação, ainda que sob condições, o CADE poderá vetar o ato de concentração, determinando, inclusive, a desconstituição da operação. Para que o ato de concentração seja aprovado pelo CADE, deverá atender quesitos de eficiências, assim demonstrados: i) tenham por objetivo, cumulada ou alternativamente: a) aumentar a produtividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviço; ou c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; ii) os benefícios decorrentes sejam distribuídos eqüitativamente entre os seus participantes, de um lado, e os consumidores ou usuários finais, de outro; iii) não impliquem eliminação da concorrência de parte substancial de mercado relevante de bens e serviços; iv) sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os objetivos visados. Também poderão ser considerados legítimos os atos, desde que atendidas pelo menos três das condições assinaladas anteriormente, quando necessários por motivo preponderantes da economia nacional e do bem comum, e desde que não impliquem prejuízo ao consumidor ou usuário final. IV – Condutas Anticoncorrenciais IV.1. O que são e quais são as condutas anticoncorrenciais? As condutas anticoncorrenciais têm como objetivo (ainda que não alcançado) a dominação de mercado, o abuso de posição dominante, e o aumento arbitrário dos lucros, podendo assim provocar a restrição ou a eliminação da concorrência. As práticas infrativas se dão (i) horizontalmente, ex.: entre produtores, concorrentes (empresas que se encontram no mesmo nível da cadeia mercadológica) ou (ii) verticalmente, ex.: entre produtores e distribuidores (empresas em diferentes estágios da cadeia de produtiva). Algumas dessas condutas são exemplificadas na própria Lei. Dentre as mais comuns, estão: 9 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria (a) Criação de Cartéis, através de acordos entre concorrentes (ainda que não explícitos), para fixação de preços, limitar a produção ou restringir a distribuição e dividir territorialmente a atuação de cada participante, criando barreiras de acesso ao mercado de novos competidores; (b) Imposição de condutas acertadas para membros de Associações de Categorias; (c) Prática de preços predatórios, abaixando os preços abaixo do custo de produção com o objetivo de eliminar a concorrência, para posteriormente, estando em posição praticamente monopolista, aplicar preços abusivos; (d) Imposição de preços de revenda a distribuidores/revendedores; (e) Divisão de mercado, por produtos ou geograficamente, quanto à atuação de distribuidores ou entre concorrentes; (f) Acordos de exclusividade, exigindo e proibindo o revendedor (ou vice-versa o produtor) de vender produtos concorrentes; (g) Recusa da venda de produtos, tanto da parte do fornecedor, quanto do comprador; (h) Venda de um produto/oferta de um serviço condicionada à venda de outra/o (venda casada); (i) Aplicação de preços diferentes para compradores do mesmo produto/serviço (discriminação); (j) Impedir acesso de concorrentes à fontes de tecnologia, criação de obstáculos ou barreiras à pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e, impedir a livre exploração de direitos de propriedade industrial. IV.2. Posso denunciar a conduta anticoncorrencial de um concorrente? Sim, através de DENÚNCIA (Representação) fundamentada e por escrito ao SBDC. Essa denúncia pode ser feita por qualquer pessoa física, jurídica, associações, órgãos, autoridades ou entidades públicas (e principalmente por Concorrentes), que tomem conhecimento ou sofram as conseqüências de atos que estejam ou possam vir a lesar a livre concorrência. Os fatos denunciados serão analisados e investigados pelo SBDC, sendo instaurada uma Averiguação Preliminar, caso as autoridades não julguem haver evidências suficientes. Averiguações preliminares podem ser inclusive instauradas diretamente pelo próprio SBDC. No caso do SBDC considerar fortes indícios de infração, será instaurado um Processo Administrativo pelo qual seu autor poderá ser condenado, podendo ser adotadas medidas inibitórias preliminares, além da imposição de multas diárias pelo seu eventual não cumprimento. No curso das averiguações preliminares e até o julgamento/arquivamento do processo administrativo, o SBDC poderá determinar: i) a prestação de informações, produção de provas, inquisição de testemunhas (ex.: quaisquer funcionários da empresa ou terceiros); 10 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria ii) inspeções na sede da empresa ou em qualquer outro lugar em que possam ser encontradas provas da conduta anticoncorrencial, sendo permitida a inspeção de estoques, livros comerciais, computadores; iii) busca e apreensão de objetos, papéis, livros contábeis, computadores e arquivos eletrônicos e magnéticos, de empresas ou pessoas físicas tanto na sede; iv) medidas preventivas – liminar impondo ao investigado a obrigação de não-fazer, desde que haja fortes indícios de que a prática possa vir a causar lesão irreparável, ou de difícil reparação ou que a condenação se torne ineficaz à época da sua implementação. Contudo, poderão ser firmados: i) compromissos de cessação da prática, tratando-se de adesão espontânea, que não importa em confissão, e têm como resultado a imediata cessação da conduta tida anticoncorrencial; ii) acordos de leniência, extinguindo-se a punibilidade (inclusive na esfera criminal) ou reduzindo a penalidade a ser aplicada, ao primeiro que se prontificar a colaborar na comprovação do ato anticompetitivo, especialmente nos casos de formação de cartéis. IV.3. Que tipo de condenações o SBDC pode aplicar contra condutas anticoncorrenciais? A empresa condenada poderá, isolada ou cumulativamente: i) ser multada no valor de 1% a 30% de seu faturamento bruto apurado em seu último exercício; ii) ser obrigada a publicar a decisão condenatória em jornal de grande circulação, em meia página por até três semanas consecutivas; iii) ser proibida de participar de licitações públicas ou contratar com instituições financeiras por até 5 anos; iv) ser inscrita no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor; v) ser obrigada a cindir a sociedade, transferir seu controle acionário, vender seus ativos (como marcas), cessar parcialmente suas atividades; vi) ter suas patentes licenciadas compulsoriamente; vii) ter cancelado/proibido (a) o parcelamento de pagamento de tributos federais, (b) incentivos fiscais e (c) subsídios públicos. Pessoas físicas, associações, ou pessoas jurídicas públicas ou privadas, ainda que sem fins lucrativos, também podem ser condenadas por condutas anticoncorrerciais, e, da mesma forma, poderão ser multadas em até aproximadamente R$ 6 milhões. Empresas do mesmo Grupo Econômico (filiais, sucursais, escritórios ou estabelecimentos de empresas estrangeiras situadas no Brasil), responderão solidariamente pelo pagamento de multas. 11 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Poderão ser aplicadas multas diárias de até aproximadamente R$ 100 mil no caso de descumprimento da condenação ou recusa de prestar informações, ou ainda multas em dobro, no caso de reincidência. Ditas penalidades administrativas, não excluem a possibilidade de condenação judicial na esfera civil por perdas e danos ou criminal. IV.4. Minha empresa participa de um cartel: quais os riscos? No Brasil, a formação de Cartéis, é considerada CRIME, sujeitando os condenados à PRISÃO, nos termos da Lei Penal (Crimes Contra a Ordem Econômica). Dessa forma, além da empresa sofrer sanções pecuniárias (penalidades impostas pelo SBDC por conduta anticoncorrencial), seus Administradores respondem penal e pessoalmente. Além das penalidades impostas pelo SBDC, co-autores poderão ser judicialmente demandados por concorrentes ou consumidores, para a composição dos danos sofridos. IV.5. Em que medida as associações de classe podem intervir nas atividades de minha empresa? Muitas vezes, as próprias Associações de Classe podem impor regras e condições coletivas de comportamento no mercado, que podem resultar na criação de barreiras de acesso ao mercado aos não-sócios ou até mesmo dificultar a condução das atividades de seus associados, no mercado, restringindo ou até eliminando a concorrência em determinados setores da economia e, portanto, a livre concorrência. Nestas condições, mesmo as Associações de classe estão sujeitas a terem suas práticas denunciadas ao SBDC, para averiguação e eventual condenação. De fato, sendo as Associações de Classe ambientes de troca de informações e entendimentos entre concorrentes, podem ocorrer ajustes sobre preços e outras condições comerciais ou para a divisão de mercados, tipificando-se, ainda que inconscientemente, infrações e até a formação de cartéis. IV.6. Corro algum risco pessoal, na qualidade de administrador, no caso de condenação da empresa por conduta anticoncorrencial? Sim. O Administrador poderá ser igualmente condenado, respondendo pessoalmente com seus bens, ao pagamento de multa no valor de 10% a 50%, do valor daquela aplicada à empresa (de até 30% do faturamento bruto), além da possibilidade RECLUSÃO, pela condenação de crime contra a ordem econômica. V – Defesa Comercial e Defesa da Concorrência3 Aparentemente a defesa comercial e a defesa da concorrência não guardam relação, entretanto as matérias estão surpreendentemente ligadas. 3 Utilizou-se como fonte os seguintes trabalhos: BAGNOLI, Vicente. “Introdução ao Direito da Concorrência: Brasil-Globalização-União Européia-Mercosul-ALCA”. São Paulo: Singular, 2005; BAGNOLI, Vicente. “Defesa da Concorrência e Defesa Comercial”. artigo publicado no jornal Valor Econômico, 24-05-2006, p. E2. 12 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria Em linhas gerais, a defesa da concorrência tem como principal objetivo assegurar a concorrência no mercado. Garantindo-se a plena e equilibrada competição, as empresas que concorrem entre si esforçam-se para oferecer produtos e serviços de melhor qualidade e a preços mais atrativos ao consumidor. Percebe-se que ao se defender a concorrência em prol do mercado, o grande beneficiado é o consumidor. Já as chamadas práticas predatórias no comércio internacional, tais como o dumping, em linhas gerais significa colocar num país mercadoria com preço inferior ao praticado no mercado do país de origem, e os subsídios, aplicações de formas de ajuda a produção ou exportação, que tornam irreal o preço final da mercadoria destinada ao mercado externo, além de distorcerem a economia mundial, podem “quebrar” setores econômicos inteiros de países que não combatem tais abusos. Assim, enquanto o direito da concorrência tem como objeto o tratamento jurídico da política econômica de defesa da concorrência, com normas a assegurar a proteção de interesses individuais e coletivos, em conformidade com a ideologia adotada no ordenamento jurídico, a defesa comercial se aplica às práticas abusivas internacionais do comércio, e é o meio utilizado para o Estado defender sua indústria nacional no âmbito da OMC. Os instrumentos de defesa comercial são utilizados contra as práticas de dumping e subsídios, sempre que comprovado: (i) a existência de dano à indústria nacional do produto ou similar ao importado em razão do dumping; (ii) a ocorrência de dano à indústria nacional do produto semelhante ao importado causado por subsídio; ou (iii) a indústria nacional de produto semelhante ou diretamente concorrente sofrer grave prejuízo em decorrência de um surto de importações. Nas ocasiões em que a defesa comercial é exigida, aplicam-se determinados instrumentos. Para a ocorrência de dumping, utilizam-se direitos anti-dumping, a fim de neutralizar os efeitos danosos à indústria doméstica, por meio da aplicação de taxas às importações realizadas a preço de dumping. Já nas situações de utilização de subsídios são utilizados os direitos compensatórios, no intuito de neutralizar os efeitos danosos à indústria doméstica, com a imposição de taxas às importações de produtos que tenham sido beneficiados com subsídios. O sistema institucional brasileiro interveniente no comércio internacional é composto por órgãos da administração direta federal que se ocupam dessas questões de defesa comercial, dentre os quais têm destaque: (i) a Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Turismo – SECEX, cuja responsabilidade é formular a política de comércio exterior, orientando e coordenando a execução das medidas necessárias para a expansão das transações comerciais; e (ii) o Departamento de Defesa Comercial – DECOM, órgão que está diretamente ligado a SECEX, e com a atribuição de executar a política de comércio ditada por referida Secretaria e encarregado de analisar os pedidos de redução e aumento das alíquotas de importação. VI – Propriedade Industrial e Defesa da Concorrência VI.1. Marcas, patentes, desenhos industriais, segredos de indústria e de fábrica e direitos autorais - o que são e quais as vantagens advindas de sua obtenção/manutenção? Os Direitos de Propriedade Industrial/Intelectual (este último, no caso de direitos de autor) - DPIS - são, essencialmente, instrumentos da concorrência. Eles oferecem vantagens competitivas em relação aos concorrentes. 13 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria De fato, a marca ganha a confiança e a preferência do consumidor (desde que inconfundível com as outras presentes no mercado, para distinguir produtos iguais ou afins), impulsionando as vendas. No entanto, uma marca, por melhor que seja, só emplacará se identificar um produto ou serviço diferenciado (ou seja, que aporte algum tipo de tecnologia inovativa, resultando em um produto/serviço de melhor qualidade e melhor preço). Se uma empresa investe em pesquisa e desenvolvimento, almejando inovações tecnológicas, pode pleitear a devida proteção, conferida através de: (i) patentes de invenção de produtos ou meios de obtenção de produtos; (ii) modelos de utilidade (invenções que se traduzem em uma utilidade/funcionalidade para os objetos já existentes no mercado); (iii) desenhos industriais (que reformulam o aspecto estético de produtos); (iv) direitos autorais para criações intelectuais (como o software, por exemplo). melhor Há ainda, a possibilidade de proteção como segredos industriais e de fábrica, indicada para produtos que são mercadologicamente/potencialmente destinados a um aproveitamento por prazo ilimitado. De fato, para estes produtos, tais como fórmulas de perfumes e de bebidas, a proteção através de patentes ou modelos de utilidade pode ser desaconselhada, por estar limitada no tempo, após o que cairia no domínio público, possibilitando a utilização irrestrita por outros agentes econômicos. Enfim, os DPIS conferem ao seu titular a exclusividade de exploração durante um longo período (ou no caso de segredos industriais, pelo período em que o segredo for mantido), o que não só traz uma enorme vantagem competitiva em relação aos concorrentes, traduzida em ganhos financeiros e de mercado, como possibilita a compensação dos investimentos incorridos em sua obtenção. VI.2. O preço da exclusividade Como ferramentas da concorrência, os DPIS possuem um caráter diverso das propriedades comuns, como no caso de um carro ou apartamento, pela função social que exercem. Se há livre e leal concorrência, baseada na conquista de mercado pela maior eficiência obtida através do desenvolvimento de produtos e serviços originais e competitivos (traduzidos nos direitos acima), os preços tendem a baixar e a qualidade sobe, caso contrário, os preços sobem, a qualidade cai e se tem a criação ou reforço de monopólios ou oligopólios, que, acomodados e incontestados, aumentam cada vez mais o seu poder econômico, gerando barreiras quase instransponíveis à entrada de novos players no mercado, prejudicando o desenvolvimento econômico do país e o consumidor, diminuindo, portanto, o bem estar geral (pela não criação de novos empregos e oportunidades e, assim, contribuindo para a desigualdade social). Por essa razão, os DPIS conferem ao seu titular não só benefícios, mas deveres, como a obrigação de utilizá-los, por si, por cessão ou através de licenciados, tendo em vista sua função de promover o desenvolvimento, a justiça social e proteger o interesse público (em linha com a ordem econômica estabelecida no Brasil, que é baseada na livre iniciativa e no princípio da livre concorrência). A função social dos DPIS tem tanta importância, que o Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI, pode, inclusive, conceder uma licença compulsória em caso de: 14 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria (a) não exploração de patente no território brasileiro, pela não fabricação local ou pela falta de uso do produto patenteado; (b) comercialização insatisfatória que não atenda à demanda e necessidades do mercado (como no caso da licença compulsória dos medicamentos contra AIDS, erroneamente chamada pelos jornais de “quebra de patentes”). ou ainda, no caso de comprovado exercício de ditos direitos, com abuso de poder econômico. A licença compulsória é, portanto, um instrumento legal valiosíssimo, e se presta a reprimir o uso abusivo dos DPIS. De fato, o SBDC pode impor, dentre outras penas aplicadas pela prática de infrações à ordem econômica, a recomendação de concessão de licença compulsória, pelo INPI, de patente de titularidade do infrator, além da venda de ativos (como marcas, que, na maioria das vezes, têm valor muito superior a qualquer ativo tangível da empresa). VI.3. Infrações cometidas pelo uso abusivo de DPIS Embora os DPIS garantam ao titular um monopólio legal para sua exploração, em troca do investimento feito na sua obtenção, existem limitações quanto ao seu uso. Dentre as condutas que podem ser consideradas como infrações cometidas por abuso de direitos de propriedade industrial/intelectual podem ser citadas: (i) venda casada – imposta pelo abuso do poder/importância que uma marca, identificadora de determinado produto/serviço, exerce sobre a aquisição de outro bem acessório da mesma origem; (ii) distribuição exclusiva – o abuso do poder econômico gerado por uma marca, impondo restrições a distribuidores e fornecedores quanto à possibilidade de venda de produtos concorrentes e impondo a divisão geográfica do mercado de atuação dos mesmos; (iii) impedimento de concorrentes às fontes de tecnologia existentes; (iv) restrição/impedimento à pesquisa e desenvolvimento de tecnologias ou, ainda, à exploração de DPIS; (v) licença exclusiva – os DPIS podem e devem ser cedidos, ou explorados diretamente seja por seus titulares ou por licenciado, exclusivo ou não. No entanto, algumas práticas podem ser consideradas como abusivas, tais como: - impor condições restritivas ao licenciado para manutenção da licença; - impedir a pesquisa e desenvolvimento tecnológico, por parte do licenciado, no mesmo nicho mercadológico do produto licenciado; - impor preço de venda e revenda (no caso de sub-licença) do objeto licenciado; - subordinar a licença à aquisição de insumos, componentes ou matérias primas do licenciante; - estender as obrigações para produtos e serviços diversos dos DPI licenciados; - uso da licença para encobrir a cartelização4. 4 News Letter/Circular – “O USO ABUSIVO DE DIREITOS DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL (DPI) COMO ATOS INFRATIVOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA”– Advocacia Pietro Ariboni – Novembro de 2002. 15 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria VI.4. Crimes de concorrência desleal Além das infrações concorrenciais cometidas pelo uso abusivo dos DPIS, constituem crimes de concorrência desleal (na esfera privada, mas, com possíveis reflexos no mercado como um todo), sujeitos a penas de detenção e multa, dentre outros: (i) o emprego de meio fraudulento para desvio da clientela de terceiros; (ii) a divulgação de dados confidenciais utilizáveis industrialmente, sem o consentimento de seu titular, obtidos através de relação empregatícia ou por meios ilícitos; (iii) a divulgação de informações falsas sobre concorrentes para obter vantagens competitivas; e (iv) a atribuição de distinção, como meio de propaganda, a que não teve mérito. Verifica-se, portanto, que embora à primeira vista, antagônicos, os direitos de propriedade intelectual e o direito concorrencial nada mais são que essenciais à implementação um do outro. De fato, ainda que um vise à constituição de um direito de exclusividade e a tutelar as relações privadas, enquanto que o outro combata justamente tal exclusividade e vise proteger a coletividade, ambos convergem para um único fim - o de promover o desenvolvimento social, econômico e tecnológico do País. VI.5. Manutenção das DPIS Os DPIS têm, na maioria das vezes, valor muito superior a qualquer ativo tangível da empresa, sendo, portanto, de suma importância buscar obter, mas principalmente, manter a proteção conferida por meio das DPIS (seja perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, ou demais órgãos competentes), tanto no caso de extensão de direitos obtidos no exterior, como no caso de inovações introduzidas localmente, por filiais, licenciados, etc, adotando inicialmente a seguinte estratégia: (i) manter constante vigilância do mercado, legitimando distribuidores e licenciados a defender tais direitos de eventuais usos abusivos; (ii) tomar sempre todas as medidas legais necessárias, seja opondo-se na esfera administrativa, seja judicialmente, para assegurar a integridade do DPIS (não importando quão insignificante possa parecer o efeito de uma contrafação ou uso abusivo por parte de terceiros, à época de sua ocorrência); (iii) no caso de fusões ou aquisições que envolvam a cessão (compra) ou mesmo a subrogação na licença (“locação”) de DPIS, certificar-se primeiramente do status legal, valor patrimonial e mercadológico dos mesmos no Brasil (fator este que pode influir decisivamente sobre o valor de uma operação ou até mesmo, sobre sua viabilidade); (iv) reinvestir continuamente na pesquisa e desenvolvimento de novos produtos/serviços, e manter-se sempre atualizado sobre todas e quaisquer inovações; (v) manter, na fase industrial, a confidencialidade sobre quaisquer projetos que possam eventualmente resultar em objetos de DPIS, antes de utilizá-los comercialmente; 16 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria (vi) no caso de depósito de pedido de registro de marcas5, realizar sempre a busca prévia, para averiguar a existência de qualquer anterioridade que possa impedir seu uso, antes de seu lançamento no mercado; (vii) não escolher, nem utilizar marcas, que possam ser facilmente confundíveis com aquelas já presentes no mercado para identificar produtos ou serviços idênticos ou afins, escolhendo uma marca original, e que não faça menção ao próprio produto/serviço, permitindo a automática identificação por parte do consumidor, na escolha de seu produto/serviço; (viii) utilizar a marca como sinônimo do produto/serviço a que se destina identificar; (ix) não depositar o pedido de proteção dos DPIS, nos países para os quais se pretende exportar; (x) não atribuir a devida importância aos DPIS, deixando de tratá-los como bens patrimoniais e parte do ativo societário de sua empresa. VII. PPI – “Iso da Concorrência” VII.1 - A minha empresa pode obter um certificado que ateste a condução de suas atividades em conformidade com as Leis de Defesa da Concorrência? Sim, os Programas de Prevenção de Infrações à Ordem Econômica (PPIs) poderão ser depositados na Secretaria de Direito Econômico (SDE) por quaisquer pessoas jurídicas de direito público ou privado, bem como por quaisquer associações de entidades ou pessoas, mesmo que exerçam atividades sob regime de monopólio legal, desde que o depositante não tenha sido condenado pelo CADE por prática de infração da ordem econômica nos últimos dois anos e não esteja sendo investigado pelo Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC). O objetivo do depósito constitui na obtenção de Certificado expedido pela autoridade antitruste brasileira, reconhecendo que a organização tem o compromisso de evitar a prática de infrações da ordem econômica. VII.2. Como faço para obter dito Certificado e quais as vantagens? O PPI adota procedimento análogo ao de uma certificação ISO. A empresa que se propõe a obter o Certificado deve elaborar seu próprio PPI e diligenciar para sua efetiva execução, fixando métodos e procedimentos a serem seguidos visando à observância das normas de defesa da concorrência e respeito à livre iniciativa e livre concorrência. O PPI pode ser adaptado a empresas e associações de acordo com o porte e o tipo de atividade econômica desenvolvida pela entidade. Após o protocolo do requerimento de depósito do PPI junto à SDE, o Departamento de Proteção de Defesa Econômica – DPDE - verificará a existência dos requisitos mínimos (vide item VII.3, a seguir) e elaborará parecer sobre a conveniência e oportunidade da emissão do Certificado de Depósito do PPI, podendo também recomendar a inserção de medidas no PPI, a fim de lhe conferir maior efetividade, bem como, sob pena de 2 News Letter/Circular “I DIECI PECCATI MORTALI DELL’IMPRENDITORE – IL DECALOGO DELL’IMPRENDITORE NEI RAPPORTI CONCORRENZIALI” – Advocacia Pietro Ariboni – Fevereiro de 2002 17 Cartilha de Defesa da Concorrência no Brasil: Grupo de Estudo de Direito da Concorrência e Regulação do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria arquivamento, requisitar ao depositante o fornecimento de informações e documentos adicionais. Se o PPI atender as diretrizes estabelecidas na Portaria nº 14, de 09 de março de 2004, após a emissão de parecer favorável pelo DPDE, será emitido o certificado de depósito do PPI pela SDE. Além de reduzir o risco de infrações à ordem econômica, a principal vantagem em implementar e depositar um PPI é o fortalecimento da imagem institucional da empresa perante seus pares, concorrentes, clientes e entidades governamentais. Trata-se também de importante instrumento para a melhoria do ambiente corporativo interno. Ademais, há a possibilidade da SDE recomendar a redução das penas aplicadas pelo CADE por infração da ordem econômica, sendo certo que poderá beneficiar-se desta sugestão de redução de pena qualquer empresa que, mesmo não possuindo o Certificado de Depósito do PPI, comprove ter implementado um PPI quando do início das investigações, pela SDE, por infração contra a ordem econômica. VII.3. Qual o ônus que devo assumir para obtenção do PPI? A empresa ou associação interessada em protocolizar o requerimento de depósito do PPI junto à SDE, deve comprovar, entre outros, (i) a implementação de padrões e procedimentos claros com relação ao cumprimento da legislação de defesa da concorrência, (ii) a institucionalização de uma comissão responsável pela punição de eventuais envolvidos em infrações à ordem econômica, (iii) a contratação de serviços de auditoria externa e independente sobre matérias relativas à defesa da concorrência, que deverá ser realizada em um intervalo máximo de dois anos e (iv) o conhecimento do PPI por parte dos diretores, gerentes e participantes de reuniões de entidades de classe. VII.4. Qual o prazo de validade da certificação? O Certificado de depósito do PPI terá validade de dois anos, renovável por períodos idênticos, desde que atualizadas as informações prestadas à autoridade antitruste. VII.5. Pode o certificado de depósito do PPI ser revogado? Em que condições? A SDE pode, a qualquer tempo, revogar o Certificado de Depósito do PPI, desde que: (i) seja constatada a ausência dos requisitos previstos na Portaria nº 14/2004, (ii) o depositante tenha descumprido qualquer das obrigações assumidas no PPI, (iii) tenha omitido informação relevante ao requerer o depósito do PPI ou (iv) tenha sido condenado judicial ou administrativamente por infração da ordem econômica. 18