Universidade Candido Mendes Instituto a Vez do Mestre A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR MEDIADOR NA PRESPECTIVA DE VIGOTSKY Elizabeth da Cruz Ribeiro Prof. Orientador Vilson Sergio Rio de Janeiro/ Tijuca 2007 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR MEDIADOR NA PRESPECTIVA DE VIGOTSKY Monografia de conclusão do Curso de Pós-Graduação Universidade Candido Mendes - Instituto a Vez do Mestre Psicopedagogia Elizabeth da Cruz Ribeiro 3 Agradeço a todos que estiveram, de certa forma, envolvidos no processo e na realização deste trabalho, minha família, amigos e professores. 4 SUMÁRIO Resumo 5 Introdução 6 Capítulo I - A PERSPECTIVA SÓCIO-HISTÓRICA DO CONHECIMENTO 9 Capítulo II - CONCEITO DE MEDIAÇÃO 17 Capítulo III - A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR MEDIADOR 30 Considerações Finais 39 5 RESUMO Este trabalho objetivou discutir e compreender a prática pedagógica do professor mediador no processo de construção do conhecimento da criança, baseado na perspectiva sócio-histórica de Vygotsky, onde o conceito de mediação é definido, já que ele é o ponto central de sua abordagem. Na perpectiva sócio-histórica, Vygotsky procurou desenvolver um método que permitisse a compreensão do comportamento humano, mas acabou sistematizando uma nova abordagem sobre o processo de desenvolvimento do pensamento e das funções cognitivas de um sujeito contextualizado e, portanto, histórico. Assim, deixou idéias sugestivas para a educação, onde a definição do papel do professor mediador se caracteriza pelo fato de permitir que o aluno seja capaz de pensar, criar, questionar, errar, enfim, seja ativo e interativo do processo de construção do conhecimento. Dessa forma, o professor não se perde no processo, as acelera possibilitando a aprendizagem, respeitando a natureza do indivíduo e, principalmente, do processo de construção do conhecimento das crianças. 6 INTRODUÇÃO O presente tema, foi escolhido devido a minha afinidade e o meu interesse maior pelas teorias do conhecimento. Encantei-me com as teorias psicológicas de Skinner, Freud, Piaget, Vygotsky e Wallon, e elas despertaram meu interesse em agregar mais informações sobre o desenvolvimento infantil, nos seus diferentes aspectos: cognitivo, afetivo e social. O interesse em me aprofundar na teoria de Vygotsky, vem do quanto considero importante que a criança construa o seu conhecimento na interrelação com os outros e com o meio em que está inserida. E o quanto à questão sócio-cultural influencia neste processo. Partindo do pressuposto de que há uma enorme riqueza e complexidade presente nesse processo de desenvolvimento e aprendizagem infantil, pretendo neste trabalho articular a teoria de Vygotsky com a prática pedagógica do professor mediador. Nesse sentido, será necessário uma breve apresentação da perspectiva sócio-histórica do conhecimento, a fim de fornecer uma visão mais ampla das contribuições de Vygotsky ao processo de ensino-aprendizagem. Além disso, será conceituada mediação, um dos temas centrais da abordagem Vygotskyana, para que se possa entender o papel de um professor mediador na construção do conhecimento do indivíduo. Trata-se de uma pesquisa de caráter teórico, bibliográfico, que foi realizada a partir de autores referenciais no assunto. A análise do desenvolvimento da criança terá como referencial teórico o pensamento de Vygotsky (1998). Para ele, desde o nascimento o ser humano vive rodeado por seus pares em um ambiente impregnado pela cultura, defendeu que o próprio desenvolvimento da inteligência e o produto dessa convivência. Para ele, na ausência do outro o homem não se constrói homem. A premissa é de que o homem constitui-se como tal através de suas interações sociais, portanto, é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações produzidas numa determinada cultura. 7 A pesquisa aborda também a visão de outros autores como: Vasconcellos; Valsiner (1995), que abordam o desenvolvimento como sendo resultado das interações sociais, voltadas para uma perspectiva construtivista do desenvolvimento humano, atentos à questões educacionais. Segundo pensamento dos autores, para Vygotsky o desenvolvimento da criança é produto de instituições sociais e sistemas educacionais, como família, escola, igreja, que ajudam a construir seu próprio pensamento e descobrir o significado da ação do outro e de sua própria ação; Matui (1995), além de discutir como se dá a construção dos conhecimentos no ser humano, retrata a abordagem construtivista sócio-histórica aplicada ao ensino; Benjamin (1984), destaca a participação ativa da criança e a natureza lúdica e prazerosa no qual aprendese brincando; Bertoldo (2000), mostra a importância do estimulo do outro para o desenvolvimento infantil; Este estudo enfocará o quanto às crianças podem ser beneficiadas em seu desenvolvimento se puderem criar, construir seu conhecimento através da sua interação com o objeto de conhecimento, a partir da participação do professor como mediador no processo de desenvolvimento. A educação atualmente não é vista como uma ciência isolada e sim como um fenômeno complexo e repleto de múltiplas perspectivas e enfoques. Assim, os estudos provenientes da Psicologia têm dado contribuições bastante relevantes que nos permitem conhecer o desenvolvimento infantil nas diferentes áreas (sensório-motora, sócio-afetiva, simbólica e cognitiva) possibilitando a compreensão de como as crianças constroem o seu conhecimento. Essas informações são especialmente importantes, pois delas retiraremos subsídios fundamentais para a prática pedagógica. Nesse sentido, a teoria de Vygotsky poderia estar auxiliando com eficácia a compreensão dos fenômenos educativos, pois nessa perspectiva construir conhecimentos implica numa ação partilhada, já que é através dos outros que as relações entre sujeito e objeto de conhecimento são estabelecidas. 8 Cabe aos profissionais de educação estar atentos às teorias psicológicas do conhecimento e principalmente ao valor das interações sociais no contexto educacional, entendendo como sendo uma condição necessária para a produção de conhecimento por parte dos alunos. 9 CAPÍTULO I A PERSPECTIVA SÓCIO-HISTÓRICA DO CONHECIMENTO O presente trabalho tem como objetivo, compreender a função do professor mediador no processo de aquisição do conhecimento da criança, a partir do conceito de mediação presente na perspectiva sócio-histórica de Vygotsky. Nesse sentido, faz-se necessário uma breve apresentação dessa abordagem, a fim de permitir uma compreensão mais abrangente do processo de desenvolvimento do indivíduo. Além disso, é importante saber quem foi Lev Semyonovitch Vygotsky, que nasceu 5 de novembro de 1896, na cidade de Orsha na Bielo-Rússia. Sua família era de origem judaica. De 1914 a 1917, Vygotsky estudou Direito e Literatura, na Universidade de Moscou. Fez cursos na Faculdade de Medicina, primeiramente em Moscou e depois em Kharkov. Lecionou literatura e psicologia numa escola em Gomel. Também criou um laboratório de psicologia no Instituto de Treinamento de Professores, onde dava curso de psicologia. Entre 1925 e 1934, reuniu em torno de si um grande grupo de jovens cientistas que trabalhavam nas áreas da psicologia e no estudo das anormalidades físicas e mentais. Morreu de tuberculose em 11 de junho de 1934 aos 37 anos. A perspectiva Sócio-Histórica (ou histórico-cultural) do psiquismo, também conhecida como abordagem sócio-interacionista elaborada por Vygotsky, visa caracterizar os aspectos tipicamente humanos do comportamento e elaborar hipóteses de como essas características se formaram ao longo da história humana e de como se desenvolvem durante a vida de um indivíduo. (VYGOTSKY, 1984) 10 Nesta perspectiva, Vygotsky (1998) considera o desenvolvimento da complexidade da estrutura humana como um processo de apropriação pelo homem da experiência histórica e cultural. Segundo ele, organismo e meio exercem influência recíproca, portanto o biológico e o social não estão dissociados. Assim, a premissa é de que o homem constitui-se como tal através de suas interações sociais, portanto, é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações produzidas numa determinada cultura, é por isso que seu pensamento pode ser chamado de sóciointeracionista. Conforme afirmam Vasconcellos & Valsiner (1995), Vygotsky tentou elaborar, em sua breve vida acadêmica, uma teoria onde cada indivíduo aparece como ativo participante de sua própria existência, construída na interrelação com outros sociais. Para ele, nos diferentes momentos de desenvolvimento, a criança adquire a capacidade com a qual ela pode, competentemente, afetar o seu meio social e a si mesma. Segundo Cole e Scribner apud Rego (2001), Vygotsky procurou desenvolver um método que permitisse a compreensão da natureza do comportamento humano, enquanto parte do desenvolvimento histórico geral de nossa espécie. Acabou sistematizando uma abordagem nova sobre o processo de desenvolvimento do pensamento e das funções cognitivas complexas de um sujeito contextualizado e, portanto, histórico. A essência deste novo método é o princípio de que todos os fenômenos têm uma história caracterizada por mudanças qualitativas e quantitativas, portanto devem ser estudadas como processos em constante transformação. Ao admitir a interação do indivíduo com o meio como característica definidora da constituição humana, Vygotsky (1998) refuta as teses antagônicas e radicais que dicotomizavam o inato e o adquirido: as abordagens ambientalistas e nativistas. Suas proposições parecem apontar para uma superação das oposições consagradas no campo da Psicologia, na medida em que indicam novas bases para a compreensão da atividade humana. A 11 complexidade da estrutura humana deriva do processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas relações entre individual e social. Conforme afirma Vygotsky (1998), no processo da constituição humana é possível distinguir, duas linhas qualitativamente diferentes de desenvolvimento, diferindo quanto à sua origem: de um lado, os processos elementares (afeto, percepção, reflexo, motricidade), que são de origem biológica; de outro, as funções psicológicas superiores (memória, pensamento, atenção, linguagem), de origem sócio-cultural. A história do comportamento da criança nasce do entrelaçamento dessas duas linhas. Desta forma, Rego (2001) demonstra que estas funções são consideradas sofisticadas e superiores, porque se referem a mecanismos intencionais, ações conscientemente controladas, processos voluntários que dão ao indivíduo a possibilidade de independência em relação às características do momento e espaço presente. Assim, estes processos não são inatos, eles se originam nas relações entre indivíduos humanos e se desenvolvem ao longo do processo de internalização de formas culturais de comportamento. Na concepção de Cole apud Rego (2001), o estudo dos processos psicológicos na abordagem sócio-histórica tem permitido a definição de diversas linhas de pesquisa, tais como: estudo do desenvolvimento de uma criança, de um grupo cultural e da dissolução de processos psicológicos, uma vez que as doenças e traumatismos desfazem aquilo que a evolução e a experiência cultural ajudaram a construir. Para Rego (2001.), Vygotsky destaca que as características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem são mero resultados das pressões do meio externo. Elas resultam da interação dialética do homem e seu meio sócio-cultural. Ao mesmo tempo em que o ser humano transforma o seu meio para atender suas necessidades básicas, transforma-se a si mesmo. Desta forma, quando o ser humano modifica o ambiente através de seu próprio comportamento, essa mesma modificação irá influenciar seu comportamento futuro. 12 Para ela, aquilo que é inato, isto é as funções psicológicas elementares (afeto, percepção, motricidade, reflexo) não são suficientes para produzir o indivíduo humano, na ausência do ambiente social. As características individuais (modo de agir, de pensar, de sentir, valores, conhecimentos, visão de mundo etc.) dependem da interação do ser humano com o meio físico e social. Vygotsky chama atenção para a ação recíproca existente entre o organismo e o meio e atribui especial importância ao fator humano presente no ambiente. No entanto, o desenvolvimento mental humano não é dado a priori, não é imutável e universal, não é passivo, nem tampouco independente do desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida humana. A cultura é, portanto, parte constitutiva da natureza humana, já que sua característica psicológica se dá através da internalização dos modos historicamente determinados e culturalmente organizados de operar com informações. A sua pesquisa traduzia a tentativa de buscar uma abordagem alternativa, que superasse as tendências antagônicas presentes na psicológica de sua época. Baseado nos princípios do materialismo dialético, procurou construir uma nova psicologia, com o intuito de integrar, numa mesma perspectiva, o homem enquanto corpo e mente, enquanto ser biológico e social, enquanto membro da espécie humana e participante de um processo histórico. Um dos pontos cruciais desses princípios, é que todos os fenômenos sejam estudados como processos em movimento e em mudança. Na concepção de Rego (2001), o objetivo deste projeto ou pesquisa, seria responder a três questões essenciais que, segundo ele, vinham sendo tratadas de forma inadequada pelos estudiosos interessados na psicologia humana e animal. A primeira se referia à tentativa de compreensão da relação entre os seres humanos e o seu ambiente físico e social. A segunda, à intenção de identificação das novas formas de atividade que fizeram com que o trabalho fosse o meio fundamental de relacionar homem e natureza, assim como examinar as conseqüências psicológicas dessas formas de atividade. A 13 terceira questão se relacionaria à analise da natureza das relações entre o uso de instrumentos e o desenvolvimento da linguagem. Para Vasconcellos & Valsiner (1995), é de fundamental importância, a participação de Vygotsky e outros teóricos soviéticos no projeto de implementação de uma Psicologia de acordo com os princípios marxistalenistas. Princípios que adotavam as noções de um psiquismo humano formado a partir do contexto social, no qual o indivíduo se desenvolve, e propunham a compreensão de que o conhecimento é socialmente construído e culturalmente transmitido, em diálogo com os outros sociais que convivem com o sujeito em formação. Para Vygotsky (1998), a teoria marxista da sociedade também teve um papel fundamental em seu pensamento. De acordo com Marx, mudanças históricas na sociedade e na vida material produzem mudanças na “natureza humana” (consciência e comportamento). Elaborou de forma criativa as concepções de Engels sobre o trabalho humano e o uso de instrumentos como os meios pelos quais o homem transforma a natureza. Portanto, o conhecimento envolve sempre um fazer, um atuar do homem. Baseado no pensamento de Marx, Vygotsky (1984) defende que “não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência”. A mente do homem é a forma mais elevada de reflexo (como no espelho) da realidade sócio-histórica. É necessário ressaltar que, na abordagem vygotskiana, o que ocorre não é uma somatória entre fatores inatos e adquiridos e sim uma interação dialética que se dá, desde o nascimento, entre o ser humano e o meio social e cultural que se insere. Rego (2001), cita em sua obra, um caso verídico de duas crianças (conhecidas como meninas-lobas) que foram encontradas na Índia, vivendo no meio de uma manada de lobos, demonstra-se que para ser humanizado o indivíduo precisa crescer num ambiente social e interagir com outras pessoas. Quando encontradas, praticamente não apresentavam um comportamento humano: não conseguiam permanecer em pé, andavam com o apoio das 14 mãos, não falavam, se alimentavam de carne crua ou podre, não sabiam usar utensílios (como garfo, copo, etc.) nem pensar de modo lógico. Quando isolado, privado do contato com outros sujeitos, entregues apenas a suas próprias condições e a favor dos recursos da natureza, o homem é fraco e insuficiente. Outro caso semelhante é o filme, “O enigma de Kasper Hauser”, com direção de Werner Herzog. Um personagem real e enigmático, que desde pequeno foi preso numa sala escura, pequena e baixa, tão baixa que ele não podia ficar em pé. Quando encontrado numa cidade conhecida como Nuremberg, com supostamente 30 anos, não sabia falar, o seu andar era descoordenado, semelhante aos primeiros esforços de uma criança e não se comportava como humano. Apresentava dificuldades na percepção e representação. Até hoje o seu enigma persiste: apesar de muitas hipóteses e suspeitas, não se descobriu sua origem. Apoiando-me em estudos de Vygotsky, que indicam que a percepção depende, sobretudo, da práxis social, necessária para gestar o referencial cultural de apreensão da realidade. Pôdese observar, como o isolamento social comprometeu o desenvolvimento cognitivo de Kaspar Hauser. Nesta perspectiva, Matui (1995), afirma que não há essência humana desde o nascimento. Ela se forma pelo relacionamento, ou seja, o homem se constrói pelas interações. Assim, “o homem, não isolado, mas relacionado com o mundo e rico de possibilidades, é o sujeito e o agente da história.” Devido a essas características humanas torna-se impossível considerar o desenvolvimento do sujeito como um processo previsível, universal, linear ou gradual. No entanto o desenvolvimento está intimamente associado ao contexto sócio-cultural em que a pessoa se insere e se processa de forma dinâmica (e dialética) através de rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas reorganizações por parte do indivíduo. De acordo com Rego (2001), desde o nascimento, o bebê está em constante interação com os adultos, que não só asseguram sua sobrevivência mas também mediam a sua relação com o mundo. Os adultos procuram 15 incorporar as crianças a sua cultura, atribuindo significado às condutas e aos objetos culturais que se formaram ao longo da história. Inicialmente, sua atividade psicológica é bastante elementar e determinada por sua herança biológica. Vygotsky ressalta que os fatores biológicos têm preponderância sobre os sociais somente no início da vida da criança. Aos poucos as interações com seu grupo social e com os objetos de sua cultura passam a governar o comportamento e o desenvolvimento de seu pensamento. Com a ajuda do adulto, as crianças assimilam ativamente aquelas habilidades que foram construídas pela história social ao longo de milênios: ela aprende a sentar, a andar, a controlar os esfíncteres, a falar, etc., através das intervenções constantes do adulto (e de crianças mais experientes), assim, os processos psicológicos mais complexos começam a se formar. Deste modo, a escola, o professor como mediador do conhecimento são fundamentais para promover a construção do sujeito. Vygotsky (1984) rejeita os modelos baseados em pressupostos inatistas, que pré-escrevem características comportamentais universais do ser humano, como por exemplo, as definições de comportamento por faixa etária, por entender que o homem é um sujeito datado, atrelado às determinações de sua estrutura biológica e de sua conjuntura histórica. Discorda também da visão ambientalista pois, para ele, o indivíduo não é resultado de um determinismo cultural, isto é, não é um receptáculo vazio, um ser passivo, que só reage frente as pressões do meio, e sim um sujeito que realiza uma atividade organizadora na sua interação com o mundo, capaz de renovar a própria cultura. Constata-se, que o desenvolvimento humano é compreendido não como a decorrência de fatores isolados que amadurecem, nem tampouco de fatores ambientais que agem sobre o organismo controlando seu comportamento, mas sim através de trocas recíprocas, que se estabelecem durante toda a vida, entre indivíduos e meio, cada aspecto influindo sobre o outro. 16 Portanto, a abordagem marxista que orientou os estudos de Vygotsky, representou uma mudança significativa na interpretação que até então vinha se dando, nas pesquisas acerca dos fenômenos psíquicos e da caracterização do ser humano. O indivíduo, agora contextualizado (histórico e social), pode ser estudado dialeticamente com relação às leis de sua evolução biológica e às leis de seu desenvolvimento sócio-histórico. Embora Vygotsky não tenha elaborado uma pedagogia, deixou idéias sugestivas para a educação, apresentando uma visão de desenvolvimento humano baseado na idéia de um organismo ativo cujo pensamento é constituído em um ambiente histórico e cultural: a criança reconstrói internamente uma atividade externa, como resultado de processos interativos que se dão ao longo do tempo. De acordo com Matui (1995), o Construtivismo Sócio-histórico postula que nada está pronto, acabado, e que o conhecimento não é dado em nenhuma instância, como algo terminado. Ele é constituído pela interação do indivíduo com o meio físico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais. Não é apenas a soma do sujeito e do objeto. O conhecimento só acontece na interação dos dois, é qualitativamente superior, porque tem uma visão de movimento dialético, de totalidade e de saltos de qualidade. Ainda na visão do autor, vale ressaltar, que tanto a mente como o conhecimento, por serem de origem social e histórica, são socializados e construídos na situação social de dialogicidade. Para ele, a historicidade do sujeito humano é a base do construtivismo sócio-histórico. 17 CAPÍTULO II CONCEITO DE MEDIAÇÃO Segundo Matui (1995), o processo de formação do conhecimento se dá através das interações sociais. Todo objeto de conhecimento é cultural e está presente na rede das relações sociais por mediação de símbolos e signos (palavras). Assim, o conceito de mediação é uma contribuição fundamental da teoria de Vygotsky, significa a ação que se interpõe entre o sujeito e o objeto de conhecimento. É pela mediação dos recursos sociais que o indivíduo conhece o mundo e constrói sua representação do real. Desta forma, “o conceito de mediação vem ampliar o conceito de objeto como fonte de conhecimentos.” (MATUI, 1995) Para Vygotsky (1998), a palavra é o elemento mais importante do pensamento e da cultura humana, isso porque o conceito de palavra (signos) está intimamente associado com a idéia de mediação. Desta forma, os signos e palavras constituem para as crianças, primeiro e acima de tudo um meio de contato social com as outras pessoas. As funções cognitivas e comunicativas da linguagem tornam-se então, a base de uma forma nova e superior de atividade nas crianças, distinguindo-as dos animais. Conforme afirma Oliveira (1995) Mediação é “o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a relação deixa então de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento”. Entende-se por relação direta, a relação do sujeito com o objeto real, concreto. É ela que fornece a experiência física e o próprio conhecimento físico. E relação mediada é o conhecimento desse objeto de significação através dos seus significantes simbólicos, os signos/palavras. Poderão ser mediadores de um determinado aluno, além da função simbólica, os colegas ou professores. Uma situação mediada é sempre aquela que se interpõe entre o sujeito e o objeto. Segundo Freitas (1995), Vygotsky acreditava que a possibilidade de transformar o mundo material, mediante o emprego de ferramentas, 18 estabelecia as condições para a modificação da própria atividade reflexa e sua transformação qualitativa em consciência. Este processo, porém, se completava mediado pela construção de uma classe especial de ferramentas: aquelas que permitissem realizar transformações nos outros, ou no mundo material através dos outros. Ele chamou essas ferramentas de signos e considerava que eram proporcionados pela cultura, pelas pessoas do meio e pelos outros. Esses signos, ao interiorizarem-se, transformando-se em meios de regulação interna e auto-regulação, iriam modificar dialeticamente a estrutura da conduta externa e, essa não seria mais mera expressão de reflexos. Conforme afirma Matui (1995), a interação social é uma forma privilegiada de acesso à informação ou ao objeto de conhecimento. O ser humano, em virtude das funções psicológicas superiores, não restringe suas respostas a comportamentos condicionados; muito ao contrário, estabelece conexões indiretas entre si e o objeto da aprendizagem por meio de vários elos de mediação. Nesta perspectiva há dois tipos de mediação: -Instrumentais: exercem controle sobre o meio; instrumentos e técnicas de trabalho para transformar a natureza ou a sociedade, bem como técnicas de estudo e amplificadores culturais para dominar o conhecimento. É a função indireta de um objeto como meio para se realizar alguma atividade. -Signos e palavras: lembranças ou memórias, palavras e valores simbólicos que atuam internamente no sujeito, “experiência da experiência”, ação sobre a consciência, auto-regulação, controle interno do indivíduo. Neste aspecto, Rego (2001), traz em sua obra uma interessante comparação feita por Vygotsky, entre a criação e a utilização de instrumentos como auxilio nas ações concretas e os signos, que ele chama de “instrumentos psicológicos”, com a função de auxiliar o homem nas suas atividades psíquicas, portanto, internas ao indivíduo: 19 a Invenção e o uso de signos auxiliares para solucionar um dado problema psicológico (lembrar, comparar coisas, relatar, escolher, etc.) é análoga à invenção e uso de instrumentos, só que agora no campo psicológico. O signo age como um instrumento da atividade psicológica de maneira análoga ao papel de um instrumento no trabalho (VYGOTSKY, 1984) Segundo Vygotsky (1998), a função do instrumento é servir como um condutor da influência humana sobre o objeto da atividade; ele é orientado externamente. O signo, por outro lado não modifica em nada o objeto da operação psicológica; é orientado internamente. Essas atividades são muito diferentes uma da outra, que a natureza dos meios por elas utilizados não pode ser a mesma. Além disso, Vygotsky argumentou que o efeito do uso de instrumentos sobre os homens é fundamental não apenas porque os ajuda a se relacionar mais eficazmente com seu ambiente, como também devido aos importantes efeitos que o uso de instrumentos tem sobre as relações internas e funcionais no interior do cérebro humano. Com o auxilio dos signos, o homem pode controlar voluntariamente sua atividade psicológica e ainda ampliar sua capacidade de memória e acúmulo de informações, como por exemplo, pode se utilizar de um barbante no dedo para não esquecer um encontro, escrever um diário para não esquecer detalhes vividos, etc. Conforme pesquisas realizadas, pode-se observar que as operações com signos aparecem como o resultado de um processo prolongado e complexo, sujeito a todas as leis básicas da evolução psicológica. Isso significa que a atividade de utilização dos signos nas crianças não é inventada e tampouco ensinada pelos adultos; ao invés disso, ela surge de algo que originalmente não é uma operação com signos, tornando-se uma operação desse tipo somente após uma série de transformações qualitativas. 20 Rego (2001), entende que, a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, pois é mediada por meios, que se constituem nas ´ferramentas auxiliares`da atividade humana. A capacidade de criar essas ferramentas é exclusiva da espécie humana. O pressuposto da mediação é fundamental na perspectiva sócio-histórica justamente porque é através dos instrumentos e signos que os processos de funcionamento psicológico são fornecidos pela cultura. É por isso que Vygotsky confere à linguagem um papel de destaque no processo de pensamentos. No entanto, a cultura e a sociedade oferecem não simplesmente interações sociais, mas uma teia de relações muito ricas com os objetos de aprendizagem. Essa teia de relações pela qual as pessoas têm interesse é o próprio mundo ou a realidade física e social: é o lugar comum de interesse que interliga os indivíduos, servindo de autêntica mediação. Segundo Freire apud Matui (1995), “é ai que ocorre o diálogo entre as pessoas: o encontro dos homens mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo”. Não se esgotando na relação eu-tu. Nessa teia de relações sociais, a linguagem ou a fala tem dois usos importantes para o conceito de mediação: serve para indicar ou mostrar o objeto (função indexical): isso acontece em relação a um objeto específico, e na sua presença; e também representar o objeto (função simbólica): na ausência do objeto, a palavra é o seu representante. Assim, a mediação tem no centro a palavra. Matui, (1995) resgata a idéia de mediação em Hegel, se Vygotsky aplicou-a na psicologia, foi Hegel quem a definiu filosoficamente: Para Hegel, o conceito de mediação era visto como um aspecto característico da razão humana. 21 “A razão é tão engenhosa quanto poderosa. A sua engenhosidade consiste principalmente em sua atividade mediadora, a qual, fazendo com que os objetos ajam e reajam uns sobre os outros, respeitando a sua própria natureza e, assim, sem qualquer interferência direta no processo, realiza as intenções da razão.” (VYGOTSKY, 1998) Os sistemas simbólicos (entendidos como sistemas de representação da realidade), mediadores especialmente que possibilita a linguagem, a funcionam comunicação entre como os elementos indivíduos, o estabelecimento de significados compartilhados por determinado grupo cultural, a percepção e interpretação dos objetos, eventos e situações do mundo circundante. É por essa razão que Vygotsky afirma, que os processos de funcionamento mental do homem são fornecidos pela cultura, através da mediação simbólica. Neste parecer Oliveira (2001) afirma que, primeiramente o indivíduo realiza ações externas, que serão interpretadas pelas pessoas a seu redor, de acordo com os significados culturalmente estabelecidos. A partir dessa interpretação é que será possível para o individuo atribuir significados a suas próprias ações e desenvolver processos psicológicos internos que podem ser interpretados por ele próprio a partir dos mecanismos estabelecidos pelo grupo cultural e compreendidos por meio dos códigos compartilhados pelos membros desse grupo. A aprendizagem, o conhecimento, é socializada e só ocorre na situação de dialogicidade. Para Vygotsky, como ressalta Matui (1995), a idéia de aprendizado inclui a interdependência dos indivíduos envolvidos no processo. Nesse sentido, a figura do professor como mediador é fundamental, pois ele é um elo entre o aluno e o conhecimento. 22 Ao se falar em mediação, não se pode deixar de mencionar outro conceito de destaque na teoria de Vygotsky, a Zona de Desenvolvimento Proximal. Conforme afirma Oliveira (2001), a questão da relação entre os processos de desenvolvimento e de aprendizagem é central no pensamento de Vygotsky. Assim, do mesmo modo que o desenvolvimento não é um processo espontâneo de maturação, a aprendizagem não é fruto apenas de uma interação entre individuo e o meio. A relação que se dá na aprendizagem é essencial para a própria definição desse processo, que nunca ocorre no indivíduo isolado. Segundo Vygotsky (1998), o ponto de partida para a discussão deste tema é o fato de que o aprendizado das crianças começa muito antes delas freqüentarem a escola. Qualquer situação de aprendizado com a qual a criança se defronta na escola tem sempre uma história prévia. Pode-se dizer que aprendizado e desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro dia de vida da criança. Matui (1995), aborda que para Vygotsky a aprendizagem deve ser coerente com o nível de desenvolvimento da criança. No qual, existe uma relação entre determinado nível de desenvolvimento e a capacidade potencial de aprendizagem. Ainda na visão do autor, justamente pela ênfase de Vygotsky, nos processos sócio-históricos, a idéia de aprendizado inclui a interdependência dos indivíduos envolvidos no processo. O termo que ele utiliza em russo (obuchenie) significa algo como processo de ensino-aprendizagem, incluindo sempre aquele que aprende, aquele que ensina e a relação entre essas pessoas. No entanto, o autor opta pelo uso da palavra aprendizado, menos comum que aprendizagem, para lembrar-nos que o conceito em Vygotsky tem um significado mais abrangente, sempre envolvendo interação social. Koffka apud Vygotsky (1998), admite que a diferença entre o aprendizado pré-escolar e o escolar está no fato de o primeiro ser um aprendizado não sistematizado e o último um aprendizado sistematizado. Mas 23 essa sistematização, não é o único fator; há inclusive o fato de que o aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo no desenvolvimento infantil. Conforme afirma Vygotsky (1998), não podemos limitar-nos à determinação de níveis de desenvolvimento, se o que queremos é descobrir as relações reais entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de aprendizado. O nível de desenvolvimento real ou efetivo, é o nível das funções mentais da criança que se determinaram como resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados. Na concepção de Rego (2001), este nível pode ser entendido como àquelas conquistas já efetivadas, que já estão consolidadas na criança, aquelas funções que ela já aprendeu e domina, pois já é capaz de realizar sozinha, sem assistência de alguém mais experiente da cultura (pai, mãe, criança mais velha etc.). Por exemplo, quando digo que uma criança já sabe amarrar o sapato sozinha, andar de bicicleta, resolver determinado problema matemático sem necessitar da ajuda de outras pessoas. Quando determinamos a idade mental de uma criança utilizando testes, estamos quase sempre tratando do nível de desenvolvimento real. Nos estudos de desenvolvimento mental das crianças, geralmente admite-se que só é indicativo da capacidade mental das crianças aquilo que elas conseguem fazer por si mesmas. Por mais de uma década, mesmo os pensadores mais sagazes nunca questionaram esse fato; nunca consideraram a noção de que aquilo que a criança consegue fazer com ajuda dos outros poderia ser muito mais indicativo de seu desenvolvimento mental do que aquilo que consegue fazer sozinha. Matui (1995), afirma que para descobrir a relação entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de aprendizagem não basta determinar o nível de desenvolvimento real; é necessário também descobrir o nível de desenvolvimento potencial. 24 O nível de desenvolvimento potencial, refere-se ao ponto que a criança pode alcançar em matéria de aprendizagem, com auxilio do professor ou de outras pessoas. É o ponto até onde o aluno pode chegar, é determinado por intermédio da solução de problemas sob a mediação do professor e dos colegas. É a capacidade do aluno desempenhar tarefas com a ajuda de outros. Para Rego (2001), nesse caso, a criança realiza tarefas e soluciona problemas através do diálogo, da colaboração, da imitação, da experiência compartilhada e das pistas que lhes são fornecidas. Como por exemplo, uma criança de cinco anos pode não conseguir, numa primeira vez, montar sozinha um quebra-cabeça que tenha muitas peças, mas com a assistência de seu irmão mais velho ou mesmo de uma criança de sua idade mas que já tenha experiência neste jogo, pode realizar a tarefa. Vygotsky toma a idade mental como ponto de partida e quer saber até onde o aluno pode chegar. O que ele encontra é uma variabilidade muito grande entre as crianças. Neste aspecto, Vygotsky apud Matui (1995) aponta um exemplo que melhor explicará esta idéia: “Estamos perante duas crianças com uma idade mental de 7 anos, mas uma, com um pouco de auxilio, pode alcançar testes até um nível mental de 9 anos, e a outra, apenas um nível mental de 7 ½ anos”. Ambas têm o mesmo nível de desenvolvimento real, mas diferentes níveis de desenvolvimento potencial. Portanto, o ponto até onde o aluno pode chegar varia de um para outro,depende de como o conhecimento foi mediado. Portanto, a zona de desenvolvimento proximal, é a distancia entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (VYGOTSKY, 1998) 25 Esse conceito elucida bem a visão vygotskiana de desenvolvimento: que através da mediação ocorre a apropriação e internalização de instrumentos proporcionados por agentes culturais de interação, que levam à elaboração de funções psicológicas que estavam próximas de se completar e que, se completando, propiciam novas aprendizagens. Na concepção de Vygotsky (1998), pode-se dizer que a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que ainda estão em estado embrionário. É nesse sentido que Oliveira (2001), destaca que o olhar prospectivo de Vygotsky torna-se digno de menção e é especialmente relevante para a educação: tão essencial ao próprio conceito de educação, ganha particular destaque em uma concepção que enfatiza o interesse em compreender, no curso de desenvolvimento, a emergência daquilo que é novo na trajetória do individuo, os “brotos” ou “flores” do desenvolvimento, ao invés de “frutos” do desenvolvimento. Assim, a ZDP permite-nos delinear o futuro imediato das crianças e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso não somente ao que já foi alcançado, como também aquilo que está em processo de maturação. Vasconcellos & Valsiner (1995), apresentam o significado da palavra russa “blizahaishego” que é o superlativo de junto, próximo. Na proposta de Vygotsky, o conceito de zona de desenvolvimento proximal, é de se trabalhar sempre com uma estimativa das potencialidades da criança, visando ao desenvolvimento futuro. Vygotsky apresenta esse conceito como sendo possível também, fora de situação de interação social imediata, levando-o para o mundo mediado por objetos. Na concepção de Oliveira (2001), a zona de desenvolvimento proximal é, portanto, o domínio da constante transformação. Em termos de atuação pedagógica, essa postulação traz consigo a idéia de que o papel explícito do professor de provocar nos alunos avanços que não ocorreriam 26 espontaneamente, consiste perfeitamente em uma interferência na zona de desenvolvimento proximal dos alunos. Para Vygotsky, “o único bom ensino é aquele que se adianta ao desenvolvimento.” (p.60). Nota-se aqui, a relevância do papel do professor mediador no processo de desenvolvimento e aprendizagem do aluno. Portanto, a mediação impulsiona a aprendizagem. Neste sentido, Vygotsky (1998) afirma: aquilo que é a zona de desenvolvimento proximal hoje, será o nível de desenvolvimento real amanhã – ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã. Propõe também, que um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar a zona de desenvolvimento proximal; isto é, o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte das construções do desenvolvimento independente da criança. Nessa perspectiva, aprendizado não é desenvolvimento; portanto, o aprendizado organizado resulta em desenvolvimento mental colocando em movimento diversos processos de desenvolvimento que, de outra forma seriam impossíveis de acontecer. Assim, “o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas.” (VYGOTSKY, 1998) Sintetizando, o processo de desenvolvimento caminha de forma mais lenta e atrás do processo de aprendizado, desta seqüenciação resultam as zonas de desenvolvimento proximal. Cabe ressaltar, que o estado de desenvolvimento mental de uma criança somente poderá ser determinado se forem revelados os seus dois níveis: o nível real de desenvolvimento e a zona de desenvolvimento proximal. Conforme pesquisas realizadas, a zona de desenvolvimento proximal pode, portanto tornar-se um conceito poderoso nas pesquisas do desenvolvimento, conceito este que pode aumentar de forma eficaz a utilização de métodos diagnósticos do desenvolvimento mental a 27 problemas educacionais. Cabe mencionar ainda, a questão da brincadeira e da imitação como outra forma de mediação, e sua relevância no processo de construção dos conhecimentos das crianças. Pôde-se observar, que é principalmente na fase da Educação Infantil, que a criança deve ter acesso há meios que a ajudem a se desenvolver e a construir o seu conhecimento, onde o lúdico, a imitação, contribui ainda mais no processo de ensino-aprendizagem. Nesta abordagem Rego (2001), afirma que a brincadeira tem uma função significativa no processo de desenvolvimento infantil. Ela é responsável por criar uma zona de desenvolvimento proximal, porque através da imitação realizada na brincadeira, a criança consegue internalizar regras de conduta, valores, modos de agir e pensar de seu grupo social, passando a orientar o seu próprio comportamento e desenvolvimento cognitivo. Na visão de Rego (2001), toda situação imaginária contém regras de comportamento condizentes com aquilo que está sendo representado. Por exemplo, ao brincar de “lojinha” e desempenhar o papel da vendedora ou de cliente, a criança buscará agir de modo bastante próximo àquele que ela observou nos vendedores e clientes no contexto real. Desta forma, o esforço em desempenhar com fidelidade aquilo que observa em sua realidade faz com que ela atue num nível bastante superior ao que na verdade se encontra, na imitação ou brincadeira a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade. Para Vygotsky (1998), a imitação oferece a oportunidade de reconstrução (interna) daquilo que o indivíduo observa externamente, ou seja, é uma das formas do indivíduo internalizar o conhecimento externo. É principalmente através dos jogos e brincadeiras que a criança começa a se desenvolver socialmente e culturalmente. 28 Deste modo, Benjamin (1984), destaca o quanto a participação ativa da criança e a natureza lúdica, prazerosa, inerentes a diferentes tipos de brincadeiras têm servido de argumento para fortalecer a concepção segundo a qual aprende-se brincando. Em uma palestra no Leningrad Pedagogigal Institute, em maio de 1933, devotado ao brincar, Vygotsky reivindica a tal atividade do repertório infantil, e explicitamente argumenta que brincar cria zonas de desenvolvimento proximal. Para ele, a brincadeira também cria necessidade de um domínio mais geral da situação representada, que se explicita nas mudanças que se encontram por trás da própria forma de brincar. Segundo Vygotsky apud Vasconcellos & Valsiner (1995), A ação da criança no campo imaginário, a situação imaginada, a construção de intenção involuntária, a formação do plano de vida, a força de vontade, tudo isto emerge na brincadeira e... a torna zona privilegiada de desenvolvimento, na idade pré-escolar. A psicologia animal e Kohler, retrataram bem esta questão da imitação, para eles, os primatas podem aprender bastante através do treinamento, mas não podem ser ensinados através da imitação. Não se pode fazê-lo mais inteligente, pelo fato de não possuírem zona de desenvolvimento proximal. Por isso, os animais são incapazes de aprendizado no sentido humano do termo; “o aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam.” (VYGOTSKY, 1998) Conforme Vasconcellos & Valsiner (1995) afirmaram, apenas a criança humana é capaz de imitar os outros, sendo exatamente a capacidade de imitação que torna possível o surgimento da zona de desenvolvimento proximal. Desta forma, Vygotsky percebeu a imitação como o primeiro mecanismo presente na ontogênese, propiciador do desenvolvimento da criança. 29 Para Vygotsky (1998), as crianças podem imitar uma variedade de ações que vão muito além dos limites de suas próprias capacidades. Numa atividade coletiva ou sob a orientação de adultos, utilizando a imitação, as crianças são capazes de fazer muito mais coisas. Esse fato, é de extrema importância na medida que demanda uma alteração radical de toda a doutrina que trata da relação entre aprendizado e desenvolvimento em crianças. 30 CAPÍTULO III A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR MEDIADOR Nas últimas décadas, tem se tornado cada vez mais evidente a importância da educação na construção de uma sociedade democrática. Nesse sentido, a escola passa a fazer parte de um cenário onde a educação, pode ser compreendida como um instrumento crucial para o enfrentamento dos impasses e incertezas do nosso tempo. Assim, a escola é vista tendo uma função social (pois compartilha com as famílias a educação das crianças), uma função política (porque contribui para a formação de cidadãos) e uma função pedagógica (na medida em que é o local privilegiado para a transmissão e construção de conhecimentos relevantes e de formas de operar intelectualmente segundo padrões deste contexto social e cultural). Desta forma, o processo de construção do conhecimento constitui um quadro epistêmico para dar conta da produção dos conhecimentos. Nesse quadro, adiciona-se, aos pólos sujeito/objeto, a mediação do outro, do grupo, da teia de relações sociais, que apresenta a aprendizagem num círculo bem mais amplo. Assim, Vygotsky, ressalta o conceito de mediação, que contribui intensamente para o construtivismo sócio-histórico. Para Matui (1995), o que importa é o estabelecimento de relação do aluno com o objeto de aprendizagem, pois sem essa interação sujeito / objeto não ocorre experiência. Este relacionamento pode acontecer direta ou indiretamente. Acontecerá diretamente na relação imediata do sujeito com o objeto da aprendizagem. E indireto, nos casos em que o aluno se relaciona com o objeto pela mediação de outros (como professor e colegas), símbolos e signos sociais, ou ainda, por mediação que se dá através de memórias, recordações de relações anteriores do próprio sujeito com o objeto. Vimos que, para Vygotsky, a palavra é o termo celular da explicação do comportamento humano, e que, o conceito (palavra/signo) é o termo celular de 31 aplicação ao ensino. Os conceitos se expressam através das palavras e representam generalizações de objetos, acontecimentos e fenômenos. Na concepção de Rego (2001), Vygotsky apresenta duas linhas de formação de conceitos: a dos conceitos espontâneos ou cotidianos e a dos conceitos científicos. Os conceitos espontâneos são adquiridos pela criança fora do contexto escolar ou de qualquer instrução formal e deliberada; são aqueles formados no curso da atividade prática e nas relações comunicativas travadas em seu dia-a-dia. Pode-se dizer que, eles abrem caminhos para os conhecimentos científicos, os quais são desenvolvidos no processo de construção de conhecimentos comunicados sistematicamente à criança durante o ensino escolar. Neste sentido, a construção dos conceitos científicos pela mediação da escola e dos professores desempenha papel decisivo na conscientização da criança a respeito dos seus próprios processos mentais. A contribuição de Vygotsky é aplicar a experiência no contexto sóciohistórico. Para ele, todos os objetos, mesmo os da natureza, são culturais. Apresentam nomes, já foram classificados, as suas características e propriedades são conhecidas. Portanto, conhecer um objeto, para uma criança, significa descobrir o que a humanidade já sabe dele. Assim, os signos/palavras que representam os objetos são os autênticos mediadores do conhecimento. Os mediadores são elos entre o sujeito e o objeto, funcionam como uma espécie de filtro através do qual o sujeito é capaz de ver o mundo e operar sobre ele. Na visão de Matui (1995), Vygotsky defende que a interação social é o grande palco onde ocorre a experiência do aluno com o objeto da aprendizagem. O aluno interage com as matérias de aprendizagens nas atividades de participação e cooperação com outras pessoas, isto é, nas atividades interpessoais. E nas interações com outras pessoas que o aluno participa e coopera nas questões de leitura e escrita, de matemática, de artes, de esporte, etc. 32 Não é qualquer didática que consegue assimilar as ricas contribuições do construtivismo. Assim, a didática fundamental, multidimensional e crítica, tem recursos para resgatar e alinhar a vasta contribuição do construtivismo sócio-histórico, tendo em vista a sua aplicação ao ensino. Conforme o pensamento de Moretto (2000), o ensino adquire, assim, uma nova conotação: ele deixa de ser uma transmissão de conhecimentos (verdades prontas), para ser um processo de elaboração de situações didáticopedagógicas que facilitem a aprendizagem, isto é, no sentido de favorecerem a construção de relações significativas entre componentes de um universo simbólico. Segundo Matui (1995), o construtivismo trabalha o ambiente sob novos princípios. Na pedagogia tradicional e tecnicista, a escola e a sala de aula apresentam uma organização linear, de cima para baixo, baseada no autoritarismo. No construtivismo, a escola e a sala de aula devem ter uma organização fundamentada na reciprocidade, na cooperação e na reversibilidade motora e cognitiva, onde a sala de aula passa a funcionar como grupo ou equipe. Outra importante função mediadora que o professor desempenha é trabalhar com o ambiente e a experiência dos alunos, conseguir que os alunos cheguem à construção de conhecimentos através da interferência no ambiente, dispondo elementos e atividades. É muito importante criar ambientes e situações que gerem conhecimentos, a fim de, manter um clima democrático, para que se possa agir dentro dele. A rigidez e a disciplina imposta cedem lugar para a naturalidade e a criatividade. Neste ambiente multidimensional, as atividades devem ser contextualizadas, partir da realidade do aluno e de uma problematização. Nessa perspectiva, um mero contato ou experiência com os objetos é sinônimo de aprendizagem. Padilha (2002) defende a construção do projeto político-pedagógico da escola alicerçado na relação pedagógica, que se estabelece desde a sala de aula, fundamentada na dialogicidade sensível, crítica, conflitiva, reflexiva, criativa, permanentemente política e transdisciplinar. Dessa 33 forma, possibilitamos aos alunos espaços de convivência e de descoberta dos caminhos a serem trilhados, para que aprendam não só a conhecer, a fazer, a viver juntos e a ser. Baseado nos princípios de Vygotsky, Rego (2001), defende uma escola em que as pessoas possam dialogar, duvidar, discutir, experimentar, questionar e compartilhar saberes. Onde há espaço para transformações, para as diferenças, para o erro, para as contradições, para a colaboração mútua e para a criatividade. Uma escola em que professores e alunos tenham autonomia, possam pensar, refletir sobre o seu próprio processo de construção de conhecimentos e ter acesso a novas informações. Uma escola em que o conhecimento já sistematizado não é tratado de forma dogmática e esvaziado de significado. Para isso a idéia de mediação social é perfeita. O ato de mediar pressupõe a existência de algo que está em processo. No construtivismo, o que está em processo é o pensamento que se movimenta da ação para a conceituação, de conceitos espontâneos para conceitos científicos; a mediação é o elo entre o aluno e a matéria, o que confirma o papel do professor. (MATUI, 1995) Neste sentido, Bertoldo; Rushel (2000), destaca o papel do professor no processo de construção do conhecimento. Ele é responsável por criar condições, para que os alunos se tornem cidadãos, que pensem e atuem por si mesmos e que consigam ter a capacidade de pensar e examinar criticamente as idéias que lhes são apresentadas e a realidade social que partilham. Portanto, é preciso estimular a criança a operar com idéias, a analisar os fatos e a discuti-los. O professor desempenha o papel de servir como elo entre o aluno e a matéria de aprendizagem, tornando-se assim, um autêntico mediador. Como propõe Chauí apud Matui (1995): 34 “O diálogo do aluno se dá com o pensamento, com a cultura corporificada nas obras e práticas sociais transmitidas pela linguagem e pelos gestos do professor, simples mediador”. Matui (1995) acredita que o papel de mediação atribuído ao professor vem resgatar a figura desse profissional, atualmente desgastada na sociedade. Com o movimento das escolas novas, a ação do tecnicismo no ensino, o burocratismo sistêmico e o behaviorismo/ associacionista, o professor estava perdendo sua função. O construtivismo resgata esse professor, dando-lhe um papel mediador específico. Para ele, o construtivismo ainda não é um método, mas uma postura pedagógica, a definição do papel do professor é muito importante. Assim, o papel do professor é promover a interação aluno/objeto de conhecimento. O que quer que o professor faça nas atividades pedagógicas, se não resultar na interação do aluno com o objeto de aprendizagem e vice-versa, nada acontecerá de ação construtivista. Conforme afirma Wachowicz apud Matui (1995): O confronto que se passa na sala de aula não se passa entre alguém que sabe um conteúdo (o professor) e alguém que não sabe (o aluno), mas entre pessoas e o próprio conteúdo, na busca de sua apropriação. Cabe ao professor sistematizar essa rica interação, relacionando os conteúdos de sua matéria com a prática social, pautados na dialogicidade. Conforme afirma Matui (1995), é necessário, que o diálogo aconteça num clima de liberdade e cooperação, não em um ambiente de dominação, de um professor que faz questão do autoritarismo dentro da sala de aula. O diálogo só acontece, moralmente, num ambiente de autonomia e de cooperação, de respeito e, politicamente falando num ambiente social de liberdade e democracia. 35 Foi para superar a situação sufocante da educação tradicional que Freire apud Matui (1995), definiu a situação de dialogicidade e a aplicou à educação libertadora. Sendo uma comunicação, ou melhor, uma intercomunicação, “a educação autêntica, repitamos, não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A com B mediatizados pelo mundo”. Completando o que Freire diz, não há relação pedagógica sem diálogo amoroso e conflitivo, da mesma forma que não há relação amorosa que resista a falta de diálogo e à ausência do conflito. Na visão de Moura apud Matui (1995), o pensamento de Freire referente ao diálogo implica uma relação do tipo horizontal, que exige um respeito mútuo dos interlocutores e uma atitude de busca constante. Portanto, não há mais lugar para a dominação, o dogmatismo, o fanatismo, o fatalismo. Assim, os homens em conjunto procuram e tentam encontrar-se uns com os outros e consigo próprios. A cooperação substitui, então, a dominação. Segundo Matui (1995), é absolutamente relevante no construtivismo identificar o pensamento do aluno e acompanhá-lo. Não é o aluno que acompanha o raciocínio do professor, o professor é que acompanha o raciocínio do aluno. Na concepção de Moretto (2000), primeiramente é preciso que o professor conheça as características psicossociais e cognitivas de seus alunos para que seu ensino seja eficaz. Para ele, não basta conhecer matemática, português, ciências, história, geografia, etc. ou dominar conceitos e conteúdos. É necessário também, que o professor conheça as tecnologias disponíveis para o apoio pedagógico e a melhor forma de intervenção, de modo a criar uma aprendizagem significativa. Na visão de Rego (2001), o professor deve ser capaz de desenvolver nos alunos capacidades intelectuais que lhes permitam assimilar plenamente os conhecimentos acumulados. Isto quer dizer, que ele não deve restringir à transmissão de conteúdos, mas, principalmente, ensinar o aluno a pensar, ensinar formas de acesso e apropriação do conhecimento elaborado, de modo, que ele possa praticá-las autonomamente ao longo de sua vida. 36 Sendo assim, Freire acreditava que em vez do professor transferir os conhecimentos ou conceitos, era necessário convidar a consciência a assumir uma atitude ativa sem a qual é impossível criar o conhecimento. É impossível abordar corretamente a conscientização como se fosse um passatempo intelectual ou a construção de uma racionalidade desvinculada do concreto. Conforme o pensamento de Freire apud Nóvoa (1979), no qual aborda: a conscientização, que se identifica com a ação cultural para a liberdade, e o processo mediante o qual se adquire, na relação sujeito-objeto, a capacidade de captar criticamente a unidade dialética entre o eu e o objeto. Por isso, é necessário insistir que a conscientização é impossível fora da práxis, fora da teoria e prática, fora da unidade reflexão-ação. Na concepção de Rego (2001), é necessário que, no cotidiano, o professor estabeleça uma relação de diálogo com as crianças, e ainda crie situações que elas possam expressar aquilo que já sabem. Enfim, o professor deve ouvir atentamente os alunos notando as manifestações infantis. O professor, por ser o elemento central e único detentor do saber, é quem corrige, avalia e julga as produções e comportamentos dos alunos, principalmente seus erros e dificuldades, detendo-se quase que exclusivamente no produto da aprendizagem, naquilo que a criança já consegue fazer sozinha. Assim, as possibilidades de sucessão do professor estão relacionadas a sua competência de promover situações propícias para que se processem associações entre estímulos e respostas corretas, pois o erro deve ser eliminado. Pode-se dizer que não há erro no pensamento quando ele é espontâneo e genuíno. O erro está em não pensar, ou nas respostas emitidas sem pensar. Embora, os alunos não possam ser condenados quando dão respostas sem pensar, pois quase sempre as atividades ou questões formuladas pelos 37 professores não estimulam o raciocínio. Isto significa que, o professor deve montar situações mais desafiadoras. Segundo Matui (1995), o erro aqui é colocado numa posição de destaque, não para ser condenado, mas para ser utilizado como importante mediador de aprendizagem. Para começar ninguém aprende sem errar. Nesse sentido, o professor deve saber que, sem a mediação dos erros, os processos de ação-reflexão-ação ou do movimento de passagem da ação para a conceituação, isto é, das atividades interpessoais para as atividades intrapessoais não aconteceriam ou não teriam sentido. Assim, como deixa o aluno falar e pensar, o professor construtivista deixa errar. Errar é um direito do aluno, mas compete ao professor fazer com que ele tome consciência dos erros cometidos. Nesta postura pedagógica o papel do professor é encorajar o aluno através de atividades que lhe causem desequilíbrio ou o coloquem em ação. Afinal o aluno é que está construindo o conhecimento, mas o professor entra como mediador dessa construção, não somente apresentando atividades, mas questionando, interrogando, fazendo o aluno pensar. Nesta perspectiva, Weisz apud Matui (1995), entende que o professor é mediador da aprendizagem do aluno. “Para o exercício dessa mediação, o professor precisa ter instrumentos para detectar com clareza o que os alunos já sabem e o que eles ainda não sabem.”. A presença de uma avaliação contínua, como afirma Matui (1995), tem como objetivo detectar dados sobre desenvolvimento do aluno, nível real, potencial e área de desenvolvimento proximal, buscando uma interpretação rigorosa dos dados coletados, a fim de, auxiliar o aluno no seu desenvolvimento e aprendizagem. Nesta concepção, a avaliação para ser construtivista, tem de ser mediadora. Assim, Jussara Hoffmann foi a primeira pesquisadora a conseguir fazer uma avaliação realmente construtivista. Trata-se de um acompanhamento permanente por parte do professor; uma prática que desafia o aluno para 38 novas questões a partir de respostas formuladas; uma busca incessante de compreensão das dificuldades do educando; compreensão do processo de cognição: pensar como o aluno e entender por que ele pensa dessa maneira. Vale dizer: onde ocorre a aprendizagem por mediação, ocorre também a avaliação mediadora. É preciso apenas tomar consciência disso e usar as situações de mediação como situações de avaliação. Segundo Matui (1995) como mediador, o professor não se perde no processo, mas acelera possibilitando a aprendizagem, respeitando a natureza do sujeito e do objeto e, principalmente, do processo de construção de conhecimentos. È de uma enorme complexidade ser professor hoje em dia, além de ser o mediador do processo de ensino-aprendizagem, existem ainda, algumas competências necessárias para que a prática docente seja eficaz. Dentre elas as que mais se destacam segundo Nóvoa (1992) são, a compreensão do conhecimento por parte do professor, pois não basta deter o conhecimento para o saber transmitir a alguém, é necessário compreender o conhecimento, ser capaz de o reorganizar, de o reelaborar e de transpô-lo em situação didática em sala de aula. E a outra, é o professor reflexivo, ou seja, aquele que reflete sobre a sua prática, que pensa, que elabora em cima dessa prática. 39 CONSIDERAÇÕES FINAIS Pude constatar através deste trabalho, que embora Vygotsky não tenha elaborado uma pedagogia, deixou idéias sugestivas para a educação, apresentando uma visão de desenvolvimento humano baseado na idéia de um organismo ativo cujo pensamento é constituído em um ambiente histórico e cultural, no qual a criança reconstrói internamente uma atividade externa, como resultado de processos interativos que se dão ao longo do tempo. Neste aspecto, o conhecimento é socialmente construído e culturalmente transmitido, em diálogo com os outros sociais que convivem com o sujeito em formação. Ênfase ao fator humano presente no ambiente. Sua abordagem também conhecida como sócio-interacionista, mostra que as características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, elas resultam da interação dialética do homem e seu meio sócio-cultural. O conhecimento só acontece na interação do sujeito com o objeto. Na verdade, essa abordagem vê a construção do conhecimento como uma construção social, que resulta da apropriação de sujeito, dos conhecimentos e das produções culturais da sociedade em que vive, por intermédio da mediação da própria sociedade. Assim, entende-se por mediação a ação que se interpõe entre o sujeito e o objeto de conhecimento. Vygotsky também confere à linguagem um papel de destaque no processo de pensamentos. Pois, ela funciona como elemento mediador, que possibilita a comunicação entre os indivíduos. Assim, na teia das relações sociais, a linguagem ou a fala pode ser usada para indicar ou mostrar um objeto, tanto na sua presença quanto ausência. Deste modo a escola, o professor como mediador do conhecimento são fundamentais para promover a construção do sujeito. No entanto, é imprescindível destacar o papel do professor no processo de construção do conhecimento, pois ele é um elo entre o aluno e o conhecimento. Nesse 40 sentido, o professor é o mediador do processo de ensino-aprendizagem, portanto, atua na zona de desenvolvimento proximal, onde sua intervenção é direta e sistematizada, pois ele deve auxiliar a criança a avançar. Cabe ressaltar ainda, que o professor deve conhecer as características psicossociais e cognitivas de seus alunos, criar ambientes e situações que gerem conhecimentos e ainda, propor atividades contextualizadas, partir da realidade do aluno, de experiências vivenciadas e de uma problematização. É essencial, que o professor conheça as tecnologias disponíveis para o apoio pedagógico e a forma mais adequada de intervenção, de modo a criar uma aprendizagem significativa. Concluí-se então, que o trabalho do professor é encorajar o aluno através de atividades que lhe causem desequilíbrios, afinal o professor é o mediador do processo de construção dos conhecimentos, não somente apresentando as atividades, mas questionando, interrogando, fazendo o aluno pensar. Como pude observar Vygotsky defende uma escola democrática, onde as pessoas possam dialogar, duvidar, discutir, questionar e compartilhar saberes. Onde há espaço para transformações, para as diferenças, para o erro, para as contradições, para a colaboração mútua e para a criatividade. Uma escola em que professores e alunos tenham autonomia, possam pensar, refletir sobre o seu próprio processo de construção de conhecimentos e ter acesso a novas informações. Penso que a escola é um espaço privilegiado para que a criança se aproprie dos conhecimentos sistematizados. Nesse caso a aprendizagem não mobiliza apenas a dimensão cognitiva, mas também afetos, emoções e relações interpessoais presentes neste contexto. Portanto, a função do professor mediador é levar o aluno adiante, pois quanto mais ele aprende, mais se desenvolve mentalmente. Para tanto se deve fazer uso dos melhores recursos que a psicologia nos oferece. 41 Através desta pesquisa, pude compreender melhor e refletir sobre a função do professor mediador, a fim de, possibilitar a construção de uma escola viva, composta por cidadãos críticos, participativos, autônomos e criativos. 42 REFERÊNCIAS BENJAMIN, Walter. Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo: Sumus, 1984. FREITAS, Maria Teresa de Assunção. Vygotsky e Bakhtin: psicologia e Educação. São Paulo: Editora Ática, 1995. MATUI, Jiron. Construtivismo: teoria construtivista sócio-histórica aplicada ao ensino. São Paulo: Moderna, 1995. MORETTO, Vasco Pedro. Construtivismo: a produção do conhecimento em aula. 2.ed. Rio de Janeiro: Editora DP&A, 2000. NÓVOA, Antônio. Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. NÓVOA, Carlos Alberto Torres. Diálogo com Paulo Freire. São Paulo: Loyola, 1979. OLIVEIRA, Marta Kohl de et al. Piaget – Vygotsky: novas contribuições para o debate. 6.ed. São Paulo: Editora Ática, 2001. PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento Didático: como construir o Projeto Político-Pedagógico da escola. São Paulo: Cortez, 2002. PIATTELLI-PALMARINI, Massimo, org. Teorias da linguagem, teorias da aprendizagem. São Paulo: Editora Cultrix, 1983. REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 11.ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2001. VASCONCELLOS, Vera M. R. de; VALSINER, Jaan. Perspectiva Coconstrutivista na psicologia e na educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.