O uso da arbitragem como meio de soluções de conflitos Prof. Dra. Evelyn Santinon [email protected] O Brasil tem hoje 86,6 milhões de processos judiciais em tramitação. A Justiça Estadual é a mais demandada, com 18,7 milhões de casos novos só em 2009, o que corresponde a 74% dos novos processos que foram ajuizados no país. De cada 100 processos em andamento na Justiça brasileira em 2010, 29 tiveram decisão definitiva até o final do ano. Os outros 71 ficaram na chamada taxa de congestionamento do Poder Judiciário. Alternative Dispute Resolution (ADR) Mediação Negociação Conciliação Arbitragem Arbitragem Instituto pelo qual as partes com uma controvérsia decidem que sua resolução não venha pela participação de juízes togados, senão pela atuação de árbitros, que decidirão a pendência segundo a lei e o procedimento escolhido por elas. Arbitragem – Conceito “A arbitragem , de forma ampla, é uma técnica para a solução de controvérsias através de intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes das partes para a solução de uma controvérsia privada, decidindo com base nesta convenção, sem intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença judicial” (Cortes Arbitrais, p. 52 = Carlos Alberto Carmona). A arbitragem surgiu no Brasil, pela primeira vez, através da Constituição Federal de 1824, que facultou às partes que instituíssem a arbitragem como meio de solução de conflitos. No Direito Brasileiro, somente com o Código Comercial foi criada a arbitragem obrigatória, para causas comerciais, sendo facultativa para as demais. Foi revogada, porém, pelo Decreto n.° 3.900 de 1867. Natureza Jurídica da Arbitragem • Em essência, a conciliação, mediação e arbitragem representam um equivalente jurisdicional, na medida em que buscam a pacificação social mediante a solução do conflito entre as partes. Logo, equivalem à jurisdição, substituindo-a. Correntes: privatista, a arbitragem não possui natureza jurisdicional, ou seja, não é jurisdição. Trata-se de atividade negocial, regida pelo Direito das Obrigações. Corrente publicista, ao contrário, defende que a arbitragem realiza uma atividade idêntica à da Justiça Pública. Logo, em essência, se constitui numa atividade jurisdicional. Corrente intermediária: a decisão arbitral não é sentença, mas, tanto uma como a outra tem a mesma função de dirimir a controvérsia Quem é o árbitro? Qualquer pessoa, desde que seja civilmente capaz e tenha a confiança das partes. Pode ser um advogado, um engenheiro, um médico, um contador, um mecânico, um pescador, etc. O que importa é que ele esteja em condições de entender e decidir a questão. Naturalmente, serão necessários conhecimentos a respeito do processo arbitral, para que a arbitragem tenha validade. Requisitos para configurar a arbitragem Objetivos: 1. Em relação ao objeto = o objeto da disputa deve ser relativo a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1.°, LA); 2. Quanto ao conteúdo = a) nomes, sobrenomes, domicílio e profissão das pessoas que instituírem o juízo arbitral e dos árbitros, b) as especificações e valor do objeto do litígio, isto é, da controvérsia que os árbitros deverão solucionar, c) local em que será proferida a sentença arbitral, d) o prazo em que a sentença deve ser proferida, e) a autorização para que o árbitro ou árbitros julguem por eqüidade, f) a fixação dos honorários dos árbitros e a proporção em que deverão ser pagos, (art. 10 e 11, LA). Arbitragem Subjetivos: 1. Capacidade de se comprometer = “abrangendo, além da capacidade em geral para os atos da vida civil, a possibilidade dos contratantes de dispor dos direitos em controvérsia e de ser parte em juízo, por envolver a submissão da controvérsia aos árbitros.” (Diniz, p. 283); 2. Capacidade de ser árbitro = só pode ser árbitro “quem quer que tenha a confiança das partes, excetuando-se: a) os incapazes; b) os analfabetos; e c) os legalmente impedidos de servir como juiz (CPC, art. 134; Lei n.° 9.307/96, art. 13), ou os suspeitos de parcialidade (CPC, art. 135). PJ não pode ser árbitro O que pode ser resolvido via arbitral? O professor Carmona conceitua a arbitragem como: Meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja para solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor. CARMONA, op. cit.: página 43. Direitos disponíveis são são aqueles referentes a patrimônio em que as partes podem usar, gozar e dispor, que podem transacionar livremente, de acordo com a vontade, pactuando entre si situações em conformidade com seus anseios. Onde podemos usar? Ações de cobrança, algumas questões de família, questões condominiais, demandas de responsabilidade civil, negócios societários, relações de consumo, e muitas outras, podem ser objeto de tramitação perante a Justiça Arbitral. Para se promover a pacificação de conflitos por meio da Câmara Arbitral, é necessária a inclusão de cláusula compromissória nos contratos, nas atas das Assembleias dos Condomínios. Com base nessa cláusula compromissória, as partes escolhem a Câmara Arbitral e ou o (s) Árbitros de sua preferência, passando assim a regular o “foro de eleição para a solução dos conflitos e dúvidas” que porventura possam surgir. Amparo Legal no Brasil Constituição Federal Título I – Dos Princípios Fundamentais Art. 4° - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: Inciso VII – solução pacífica dos conflitos; Amparo Legal no Brasil A constitucionalidade da Lei 9.307/96 já foi expressamente declarada pelo Supremo Tribunal Federal, em decisão de 2001. Amparo Legal no Brasil Lei da Arbitragem Lei 9.307/96, de 23 de Setembro de 1996 Art. 18 – O Árbitro é Juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário. Art. 31 – A sentença Arbitral produz entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo. 5-10 anos – em média um processo demora para ser resolvido. 180 dias – no máximo por procedimento arbitral Números da arbitragem A arbitragem está tornando-se cada vez mais popular. Segunda o jornal GAZETA DO POVO, os índices de acordos fechados por este processo são em média nos Estados Unidos e no Canadá de 80%. Na Argentina 45% de acordos são fechados e na província de Buenos Aires, a aceitação é ainda maior, com índice de 70% de acordos. Ainda, a República Popular da China pratica muito a mediação nos conflitos interpessoais, comunitários e cíveis através dos Comitês Populares de Conciliação e dos tribunais de conciliação (Ginsberg, 1978 e Li, 1978, 1988)". Fonte: Câmara de arbitragem de SP Quanto custa? Quanto custa Máximo – para uma empresa é R$ 82 mil. Em média ao trocar a Justiça pelo procedimento, as partes economizam, em média, 58% — considerando o tempo que uma ação leva para ser julgada na Justiça. A Câmara de Arbitragem de São Paulo determina uma taxa para o registro do procedimento, que será estabelecido conforme a quantia de demanda analisada. A entidade prevê até R$ 3 mil, que deve ser paga pela autora. Confira a tabela abaixo de preços abaixo: Também é descontada uma taxa de administração de 2% do valor da causa. Essa quantia, no entanto, não pode ultrapassar R$ 60 mil e deve ser dividida em 50% para cada parte. “Depois, vem a indicação dos três árbitros, sendo que o honorário de cada um é R$ 350 a hora e, em média, cada procedimento gasta 100 horas para encerrar. Algumas características a. Só é admissível mediante convenção de arbitragem* (compromisso entre as partes ou cláusula compromissória inserida no contrato (art. 3.°, Lei n.° 9.307); b. Limita-se aos litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1.°); c. A cláusula compromissória tem validade relativa, não valendo quando inserida em contratos de adesão, salvo se observadas determinadas condições (art. 4.°, § 2.°); d. As partes precisam ser capazes (art. 1.°) e. As partes podem escolher quais as regras de Direito Material a serem aplicadas na arbitragem, podendo ainda convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio (art. 2.°, §§ 2.° e 3.°); Características f) g) h) i) j) Não há necessidade de homologação judicial da sentença arbitral (art. 31); Sentença arbitral produz os mesmos efeitos entre as partes dos julgados proferidos pelo Poder Judiciário, valendo como título executivo, se for condenatória; A sentença arbitral pode ser submetida a controle jurisdicional ulterior, a ser provocado pela parte interessada (art. 33, caput e §§); As sentenças arbitrais proferidas no exterior podem ser reconhecidas e executadas (arts. 34 e ss.); Os árbitros não são investidos de poder jurisdicional estatal, não podendo realizar a execução de suas próprias sentenças e nem impor medidas coercitivas (art. 22, § 4.°). Como instituir a arbitragem? Claúsula compromissória (lide futura/contratual) CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM Clause compromissoire Ou cláusula arbitral. Compromisso arbitral (lide já existente) art.9 da Lei de Arbitragem Brasileira Procedimento da arbitragem A lei brasileira não estabelece procedimento específico para o desenvolvimento da arbitragem, deixando ao alvitre dos interessados – ou, subsidiariamente, ao do árbitro – a eleição do rito a ser seguido (art. 21 e seu parágrafo primeiro). Sigilo. Árbitro tem que ser por livre convencimento racional. Prática: procedimento é realizado por sessões. Não é obrigatório presença de advogado. Mas tem que respeitar o contraditório. Uso de provas: todas admitidas em direito. E se a testemunha falta? O árbitro solicita à autoridade judiciária sua condução coercitiva, bastando para isso a prova da existência da convenção de arbitragem (art. 22, § 2). Procedimento Revelia? A lei também trata do instituto da revelia, não lhe atribuindo, porém, idênticos efeitos aos previstos pelo CPC. Limita-se a lei a dispor que a revelia da parte não impedirá a prolação da sentença arbitral. Sentença de arbitragem Não cabe recurso. É fruto da vontade das partes. Mas como fazer a execução? Pegar a sentença arbitral e mandar para o Poder Judiciário. É TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL! Mesmo sistema da sentença normal. O devedor será citado para pagar em 15 dias sob pena de multa – paragrafo único, art. 475 – CPC. 14.09.05 – TJRJ - Ementa: Agravo de Instrumento. Execução de titulo judicial, decorrente de sentença arbitral. Procedimento iniciado como ação de conhecimento. Decisão agravada que revoga despacho anterior, a fim de imprimir novo rito processual, consoante artigos 584, vi e 632, ambos do código de processo civil. Medida de correção adequada a espécie. Agravo de instrumento conhecido e não provido. 1. As provas dos autos estão a demonstrar que o procedimento de arbitragem atende aos ditames da lei n. 9.307/96, ensejando titulo judicial. 2. Mostra-se acertada a correção do rito processual levada a efeito pelo magistrado que prolatou a decisão agravada, para dar inicio ao processo de execução de titulo judicial. 3. Não ocorrência de lesividade a parte agravante, diante das possibilidades de apresentação de defesa no processo executivo e de eventual reconhecimento e direito as benfeitorias. (Processo Nº 303431300, Tribunal de Justiça - RJ, DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL, Relator: RUY FRANCISCO THOMAZ, Julgado em 14/09/2005) 02.05.02 – TJGO - Apelação Civil. Execução De Sentença Arbitral. Nulidade da Execução. Ausência de Titulo Executivo e do Demonstrativo do Debito. Nulidade da Penhora e da Sentença Arbitral. Não Configurado. A alegada ausência de titulo a acompanhar a exordial da ação na hipótese, Laudo Arbitral, não resultou em óbice a execução, tendo em vista estar a sentença acoplada ao processo de arresto, acessório preparatório daquele, não comportando o seu desentranhamento para juntá-la a ação principal, quando o feito cautelar esta apensado a esta. Estando o cálculo do debito devidamente discriminado no titulo executivo, não se faz necessário a sua demonstração através de planilha anexada a inicial. Citados os executados para pagarem a divida ou para oferecerem bens a penhora, mas deixando de comparecerem espontaneamente nos autos, nesta hipótese, o arresto deverá ser, necessariamente, convertido em penhora. Havendo opção das partes pelas Cortes Arbitrais, na composição de conflitos, submetem-se aos procedimentos da lei de arbitragem, cuja decisão não se sujeita a recurso ou homologação pelo Poder Judiciário, a exceção de nulidade da sentença arbitral, em caso de infração aos preceitos do art. 32 (LA). A lei de arbitragem acolheu o instituto da revelia em seu artigo 22, por isso, incidem-se em seus efeitos os reclamados que, devidamente notificados não comparecem e nem justificam suas ausências na audiência designada. Se a sentença arbitral foi proferida de acordo com as normas do direito positivo, constitui titulo executivo judicial, líquido, certo e exigível. Apelo conhecido e improvido." Projeto (...) “O projeto também permite ao Judiciário suspender liminarmente (em caráter provisório) os efeitos da arbitragem antes de julgar o mérito de uma ação de anulação da sentença arbitral. Atualmente, a lei não prevê essa possibilidade”. A Câmara analisa o Projeto de Lei 2937/11, do deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), que amplia as possibilidades de anulação de sentença arbitral pela Justiça. A sentença arbitral é proferida por um ou mais árbitros nomeados pelas partes para a solução de litígios geralmente relacionados a contratos. A arbitragem foi criada para reduzir o número de ações judiciais e desafogar o Judiciário. A proposta acrescenta o seguinte item à relação de causas de nulidade da sentença arbitral: se estiver fundada em erro de fato resultante de atos ou de documentos, falsas premissas ou se for proferida sem realização de perícia técnica requerida por qualquer das partes para comprovação de direito, indispensável para o julgamento do litígio. O projeto também permite ao Judiciário suspender liminarmente (em caráter provisório) os efeitos da arbitragem antes de julgar o mérito de uma ação de anulação da sentença arbitral. Atualmente, a lei não prevê essa possibilidade. Além disso, a proposta amplia as hipóteses de suspensão do procedimento arbitral. A lei atual prevê a suspensão quando surgir, no decorrer da arbitragem, controvérsia relativa a direitos indisponíveis. O projeto acrescenta controvérsias relativas a: ordem pública, prescrição, decadência e áreas protegidas pelo meio ambiente ou tombadas pelo patrimônio histórico. Nesses casos, a arbitragem fica interrompida até o julgamento da controvérsia pelo Poder Judiciário. Domingos Sávio diz que o projeto representa um avanço na lei e no procedimento arbitral, pois exige mais rigor dos árbitros. O Poder Judiciário se fortalece para corrigir erros e injustiças cometidas, visando maior transparência e imparcialidade nas decisões arbitrais, acrescenta. Tramitação O projeto tramita em caráter conclusivo e será analisado apenas pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Íntegra da proposta: PL-2937/2011 O uso da arbitragem no setor trabalhista (...) “A maioria das decisões no Tribunal Superior do Trabalho (TST), porém, envolve trabalhadores comuns. No nosso caso já é diferente, pois os altos executivos têm uma relação muito mais igual com o empregador. Em geral, são tão disputados no mercado que podem negociar cada detalhe da sua contração”. Em uma decisão ainda rara no Judiciário, a 76ª Vara do Trabalho de São Paulo reconheceu a validade de uma cláusula arbitral presente em um contrato trabalhista entre um alto executivo do mercado de capitais e o BTG Pactual. A Justiça do Trabalho é normalmente contra o uso da arbitragem para conflitos trabalhistas. Nesse caso, porém, o juiz Hélcio Luiz Adorno Júnior considerou que o documento foi firmado por um alto executivo de notável formação acadêmica e expressivos vencimentos. Após ter sido demitido em 2008, o executivo propôs uma ação judicial contra o BTG Pactual pleiteando o pagamento do chamado bônus de retenção - premiação com o objetivo de reter talentos e evitar a saída de empregados estratégicos para a concorrência. Segundo o contrato, o executivo poderia receber cerca de R$ 500 mil, em três parcelas a vencer em 2011, 2012 e 2013, caso permanecesse na empresa. A companhia alegou na Justiça que o contrato tinha uma cláusula compromissória, segundo a qual qualquer conflito deveria ser levado à Câmara de Arbitragem do Rio de Janeiro e não ao Judiciário. De acordo com o magistrado, a indisponibilidade dos direitos trabalhistas e a hipossuficiência do trabalhador são os motivos que têm impedido o reconhecimento de cláusulas arbitrais no contrato de trabalho. Contudo, essa não seria a situação discutida no processo. O juiz Hélcio Luiz Adorno Júnior entendeu que o executivo não teria sido coagido a aceitar os termos do contrato de gratificação por ter condições para negociar livremente sua contratação. Além disso, o magistrado considerou que o bônus de retenção foge do padrão dos títulos de natureza trabalhista, declarando extinto o pedido formulado. A Justiça do Trabalho tem considerado inválidas as cláusulas arbitrais por entender que os direitos trabalhistas são indisponíveis - ou seja, verbas das quais não se poderia abrir mão. Há também o entendimento de que o empregado é a parte mais frágil da relação trabalhista e poderia ser coagido a assinar contratos com previsão arbitral. A maioria das decisões no Tribunal Superior do Trabalho (TST), porém, envolve trabalhadores comuns. No nosso caso já é diferente, pois os altos executivos têm uma relação muito mais igual com o empregador. Em geral, são tão disputados no mercado que podem negociar cada detalhe da sua contração, afirma. DO USO DA ARBITRAGEM NO DIREITO DO TRABALHO No âmbito do Direito do Trabalho, a análise do instituto da arbitragem deve respeitar as peculiaridades próprias dos conflitos coletivos e dos conflitos individuais. Para os conflitos coletivos, prepondera o entendimento no sentido da possibilidade de se utilizar da arbitragem como meio alternativo à solução de conflitos trabalhistas[15], enquanto a controvérsia maior da doutrina e da jurisprudência reside na sua utilização para os conflitos individuais. O artigo 114 da Constituição Federal, com a nova redação que lhe deu a Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, estabelece a competência da Justiça Trabalho e, em seus parágrafos 1º e 2º, prevê, expressamente, a possibilidade dos conflitos coletivos serem julgados por um juízo arbitral: CF Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (...) § 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros. § 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas Também a Lei de Greve, Lei n. 7.783/89, em seus artigos 3º e 7º, e a Lei de Participação nos Lucros, Lei n. 10.101/00, em seu artigo 4º, preveem a utilização da arbitragem caso frustrada a tentativa de negociação coletiva. Com relação ao Direito Coletivo do Trabalho, Alice Monteiro de Barros ensina que: (...) no Direito Coletivo o sujeito é a categoria, o objeto é a satisfação dos interesses do trabalhador, não como pessoa, mas como integrante da categoria, e a relação jurídica estabelece condições mais vantajosas que se incorporam aos contratos celebrados.[16] A partir desta conceituação, podemos inferir, como também infere Maurício Godinho Delgado, o seguinte: São conflitos coletivos trabalhistas aqueles que atingem comunidades específicas de trabalhadores e empregadores ou tomadores de serviços, quer no âmbito restrito do estabelecimento ou empresa, quer em âmbito mais largo, envolvendo a categoria ou, até mesmo, comunidade obreira mais ampla.[17] Em seguida, ao tratar do dissídio coletivo, enquanto processo judicial que envolve conflitos coletivos, Delgado traça as seguintes considerações, observando que os meios alternativos - não judiciais - de solução de conflitos devem preponderar neste setor: Este instituto, regra geral, mostrou-se restrito a países cujas ordens justrabalhistas tiveram formação doutrinária e legal autoritárias, de inspiração organicista ou corporativista, como próprio às experiências autocráticas de natureza fascista de primeira metade do século XX, na Europa. Suplantadas aquelas experiências no continente europeu, a fórmula judicial de solução de conflitos coletivos trabalhistas tendeu a ser extirpada das respectivas ordens jurídicas. Indisponíveis relativamente? Pode-se, tecnicamente, distinguir os direitos imantados por indisponibilidade absoluta dos direitos imantados por uma indisponibilidade relativa. Absoluta será a indisponibilidade quando o direito enfocado merecer uma tutela de nível de interesse público, por traduzir um patamar civilizatório mínimo formado pela sociedade política em um dado momento histórico. É o que ocorre com o direito ao registro do contrato de trabalho na CTPS e à incidência das normas de proteção à saúde e segurança do trabalhador. Relativa será a indisponibilidade quando o direito enfocado traduzir interesse individual ou bilateral simples, que não caracterize um padrão civilizatório geral mínimo firmado pela sociedade política em um dado momento histórico. É o que passa com a modalidade de salário paga ao empregado ao longo da relação de emprego, que pode se alterar, licitamente, desde que a alteração não produza prejuízo efetivo ao trabalhador. Outro exemplo que pode ser citado é a faculdade que possui o empregado em converter, em abono pecuniário, um terço do período de férias a que tiver direito Defendendo o uso da arbitragem no setor trabalhista Com o devido respeito àqueles que entendem ser a arbitragem inaplicável para a solução de conflitos coletivos do trabalho, não se pode fechar os olhos para as negociações e as renúncias que são homologadas diuturnamente pela própria Justiça do Trabalho. E defender a indisponibilidade absoluta de todo e qualquer direito trabalhista juntamente com a possibilidade de transcioná-los, ainda que somente perante o Poder Judiciário, nos parece uma contradição nos próprios termos Assim é que, em face da inegável hipossuficiência do trabalhar frente ao seu empregador, é indispensável que o procedimento arbitral seja paritário, com representantes do sindicato ou, na falta deste, do Ministério Público do Trabalho, e do empregador. Além disso, é recomendável que se adote na legislação trabalhista brasileira a restrição de que a cláusula compromissória poderá ser inserida em contratos individuais e o compromisso arbitral poderá ser firmado em conflitos individuais somente quando houver, expressamente, esta previsão em acordo ou convenção coletiva, em face da autonomia e da força reconhecidas às normas oriundas dos sindicatos O uso da arbitragem no contrato de adesão A redação original do parágrafo 2º do art.4º da Lei 9307/96, aprovada pelo Senado, era a seguinte: “Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem, ou concordar, expressamente, com a sua instituição”. Nesse caso, o oblato (aderente) poderia, querendo, instituir a arbitragem, ou esta seria instituída se, previamente, fosse objeto de concordância expressa do aderente (oblato). Atualmente.... Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitrágem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato. § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitrágem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula E a cláusula compromissória? CDC (art.51, VII) preserva o hipossuficiente na relação de consumo (o consumidor, o contratante presumivelmente mais fraco economicamente), evitando que o fornecedor (presumidamente o contratante economicamente mais forte) lhe “imponha” a solução de litígios por via arbitral, nada impede que ambos, no surgimento do conflito ou litígio oriundo das relações de consumo, celebrem, de comum acordo, compromisso arbitral (espécie do gênero convenção de arbitragem), visando submetê-lo ao juízo arbitral. Inegavelmente, o conflito ou litígio emergente dessa relação guarda nítida característica de arbitrabilidade, posto dizer respeito à disponibilidade de direito ou a direito patrimonial disponível, objeto de transação. Duval Vianna bem lembra que “o CDC [L.8078/90] foi editado muito antes da vigência da Lei 9307/96, época em que a cláusula compromissória constituía mera promessa, que, não honrada, podia gerar o pagamento de perdas e danos, mas não obrigava qualquer dos contratantes à arbitragem, nem era fundamento hábil para a exceção de arbitragem. Por isso, a proibição do inciso VII do artigo 51 do CDC, até a vigência da Lei 9307/96 poderia ser considerada supérflua, na medida em que não se reconhecia na cláusula compromissória a eficácia de impor a arbitragem, torná-la obrigatória, o que ocorria não só em relação aos contratos entre fornecedor e consumidor, mas em relação a qualquer contrato, em razão de tradição doutrinária e jurisprudencial muito mais antiga.”