Seminário Internacional Atenção Primária à Saúde:
Acesso Universal e Proteção Social
ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE E DETERMINANTES SOCIAIS DE SAÚDE
Sónia Dias
Instituto de Higiene e MedicinaTropical,
Universidade Nova de Lisboa
24 e 25 de Abril de 2012
Brasília
SUMÁRIO
 Os determinantes sociais da saúde
 Contexto português: indicadores socioeconómicos e de saúde
 O sistema de saúde português e a reforma dos Cuidados de
Saúde Primários (= Atenção Primária à Saúde)
 Intervenções para a melhoria do estado de saúde da população
portuguesa (atuação nos determinantes socias)
 Limites e desafios à atuação dos Cuidados de Saúde Primários
Determinantes sociais da saúde
Enquadramento conceptual
da Comissão para os Determinantes Sociais da Saúde
 De entre os determinantes que influenciam a saúde das populações
salientam-se o contexto político e cultural, a posição social, a
educação, o trabalho, o rendimento, os comportamentos e os fatores
biológicos
Fonte: CDSS
O que já se sabe?
As iniquidades em saúde estão fortemente associadas às
desigualdades sociais entre populações, «provocadas pela
distribuição desigual de poder, rendimentos, bens, serviços e a
consequente injustiça nas circunstâncias visíveis e imediatas da
população – o seu acesso a cuidados de saúde, escolas e educação, as
suas condições laborais e recreativas, os seus lares, comunidades, vilas
e cidades – e as suas hipóteses de usufruir de uma vida próspera».
(CDSS, 2010; p.1)
Portugal registou uma evolução notória das condições
socioeconómicas, no entanto apresenta elevados níveis de
desigualdades em educação, emprego e rendimento, quando
comparado com outros países europeus e entre regiões e subgrupos
da população.
PORTUGAL: Indicadores socioeconómicos
Nível de ensino completo em Portugal (1991, 2001, 2011)
População (15-64 anos de idade) com baixa escolaridade (2010)
Fonte: INE e Eurostat
PORTUGAL: Indicadores socioeconómicos
Desigualdade de distribuição de rendimentos (Índice de Gini)
35,4%
30,4%
Fonte: Eurostat
PORTUGAL: Indicadores socioeconómicos
‰
Taxa de Risco de Pobreza (2010)
‰
25,3‰
23,5‰
Taxa de Risco de Pobreza por sexo
e grupo etário (2009)
Fonte: Eurostat
PORTUGAL: Indicadores de saúde
Esperança média de vida, UE dos 15 (1960-2007)
Fonte: WHO e OCDE
PORTUGAL: Indicadores de saúde
Taxa bruta de mortalidade e taxa de mortalidade infantil (1960-2010)
Taxa de mortalidade infantil, UE dos 15 (1970 e 2007)
Fonte: INE; WHO e OCDE
O que já se sabe?
As iniquidades em saúde estão fortemente associadas às
desigualdades sociais entre populações.
A evolução em saúde das populações tem sido desigual, com
consideráveis e crescentes desigualdades em saúde,
comparando com outros países europeus e entre regiões e
subgrupos da população (pobres, sem-abrigo, desempregados,
imigrantes, crianças, idosos, …).
PORTUGAL: Desigualdades em saúde
Esperança de vida à nascença
Taxa de mortalidade infantil
(2006)
(2009)
Fonte: INE
PORTUGAL: Desigualdades em saúde
→ Dados relativos à distribuição socioeconómica das doenças crónicas
na população em 1998/99 e 2005/06 revelam que a doença se
concentra nos grupos de rendimento inferior em ambos os
períodos.
Distribuição de doenças crónicas
em função do rendimento da população portuguesa
Fonte: Furtado & Pereira (2010). Equidade e Acesso aos Cuidados
de Saúde. Lisboa: ENSP/UNL. Com base em dados INS.
O que já se sabe?
A intervenção sobre os determinantes socias da saúde é crucial para
reduzir o gradiente social e combater as iniquidades em saúde
Os sistemas de saúde podem constituir um importante contributo.
Esta intervenção implica ações multidisciplinares e intersectoriais, de
outras instituições e da comunidade, a nível regional e local.
As desigualdades em saúde afetam o desenvolvimento
socioeconómico: a saúde está associada à riqueza de cada país,
sendo também geradora de desenvolvimento.
Avaliação de Desempenho do sistema de saúde português
Aspetos menos positivos:
• Grandes desigualdades no estado de saúde da
população
• Menor satisfação dos portugueses com a disponibilidade
e qualidade dos cuidados de saúde, em comparação com
outros países da União Europeia dos 15
(WHO, 2010)
Principais recomendações:
• Políticas de saúde orientadas para ganhos em saúde e
politicas para reduzir as desigualdades em todos os
sectores,
• Maior envolvimento dos utentes e do público em geral
na tomada de decisão do sistema de saúde
• Priorizar os gastos em saúde nos cuidados de saúde
primários e de saúde pública e melhorar a eficiência da
prestação dos serviços.
Sistema de Saúde português
Sistema Nacional de Saúde
• Cuidados de saúde primários e hospitalares universais e
abrangentes
• Financiado por impostos
Subsistemas de saúde
• Destinados a determinados grupos profissionais
• Abrangem cerca de 25% da população
• Financiados pública e privadamente
1
Seguros privados de saúde
• Esquemas privados de seguro voluntário
• Abrangem entre cerca de 10% e 20% da população
Sistema de Saúde português
Plano Nacional de Saúde 2004-2010
Orientação estratégica, política, técnica e financeira
do Serviço Nacional de Saúde
Avaliação do PNS 2004-2010
Principais recomendações
«[É importante reconhecer que tanto o nível global de
Maior investimento:
saúde como a equidade em saúde resultam da interação
de•outros
sistemas sociais
e determinantes
de saúde que
nos determinantes
sociais
da saúde
se encontram fora do sistema de saúde, tais como aqueles
• no envolvimento e a colaboração intersectorial
relacionados com as condições de vida e de trabalho]»
(p.21)
• no acesso mais equitativo aos serviços
(WHO, 2010)
Sistema de Saúde português
Ponto de partida: Reflexão sobre os ganhos e insuficiências decorrentes da
elaboração e implementação do plano anterior.
Visão: Maximizar os ganhos em saúde através da integração de esforços
sustentados de todos os sectores, com foco em
4 Eixos estratégicos:
• Cidadania em Saúde
• Equidade e Acesso adequado aos Cuidados de Saúde
• Qualidade em Saúde
• Políticas Saudáveis
Princípios
• Envolvimento e participação dos atores (com empoderamento)
• Redução das desigualdades em saúde e a promoção da equidade e justiça
social
• Integração e continuidade dos cuidados
• Sustentabilidade
Estratégia de Consulta, Envolvimento e Comunicação na construção do PNS
• Envolvimento dos atores com influência na saúde e de toda a sociedade
civil no desenvolvimento do PNS
• Instrumentos: reuniões com instituições e com grupos de peritos e site
com contributos online
3º Fórum Nacional de Saúde (2010)
• Lançamento e discussão pública do PNS com uma audiência
abrangente
Sistema de Saúde português
Avaliação do impacto do PNS na saúde que possibilite
obter um perfil das desigualdades em saúde com base nos
determinantes sociais.
Reconhecimento da importância dos Cuidados de Saúde
Primários (CSP)
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Políticas de saúde que reforçam os CSP têm maior potencial para
reduzir as iniquidades em saúde.
Como os sistemas de saúde são desviados dos valores dos CSP
Fonte: WHO
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários (CPS)
Valores sociais que orientam os CSP
e os correspondentes grupos de reformas
Equidade em
Saúde
Solidariedade
Inclusão Social
Reformas da
cobertura
universal
Autoridades de
Saúde em que se
pode confiar
Reformas na
liderança
Cuidados
orientados para as
pessoas
Reformas na
prestação de
serviços
Comunidades
onde a saúde é
promovida e
protegida
Reformas nas
políticas públicas
Fonte: WHO
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Os cuidados de saúde primários, enquanto cuidados mais
holísticos de proximidade, continuidade e transversais mostram:
• melhor desempenho,
• equidade,
• acessibilidade,
• relação custo-benefício
• e satisfação do cidadão
Reforma dos
Cuidados de
Saúde Primários
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Organograma do SNS antes da Reforma
Ministério da
Saúde
Administrações
Regionais
da
Administrações
Regionais
da Saúde
Saúde
Centros
Regionais de
Saúde Pública
Centros
Regionais de
Alcoologia
Centros de
Histocompatibilidade
Instituto de
Genética
Médica
Instituto de
Oftalmologia
Centros e Grupos
Hospitalares
• Verticalização do sector
Centros de Saúde
• Limitação à natureza
multidisciplinar e integradora
dos cuidados de saúde
Instituto Português
de Oncologia
Construído com base em informação do Ministério da Saúde
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Modernização e reconfiguração dos Centros de Saúde
Princípios básicos:
• orientação para a comunidade
• flexibilidade organizativa e de gestão
• desburocratização
• trabalho em equipa
• autonomia e responsabilização
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Atual organograma do SNS
Ministério
da Saúde
Administrações
Regionais da Saúde
Centros e Grupos
Hospitalares
Agrupamentos
Centros
de
Centros
de Saúde
Saúde
Instituto Português
de Oncologia
Conselhos:
- Executivo
- Clínico
- Comunidade
Serviços de Apoio
Unidade de
Unidade de
Cuidados de
Unidades
Saúde
FuncionaisSaúde
Familiar
Personalizados
Unidade de
Saúde Pública
Unidade de
Recursos
Assistenciais
Partilhados
Unidades
de
Centros
de Saúde
Cuidados da
Comunidade
Construído com base em informação do Ministério da Saúde
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
CSP como um núcleo de coordenação:
Redes na comunidade e parceiros exteriores
Hospital
Cuidados especializados
(Clínica da diabetes, Centro de
controlo da TB, Unidade de
saúde mental comunitária)
Serviços de
Diagnóstico
Serviços
especializados de
prevenção
CSP: cuidados de
continuidade,
compreensivos,
orientados para a
pessoa
Serviços
Sociais e
Comunidade
- Maternidade
- Urgência
- Cirurgia
Outros
serviços
ONGs
Sistemas de saúde pluralísticos num contexto globalizado
Participação institucionalizada da sociedade civil
Fonte: WHO
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
«A reforma dos cuidados de saúde primários continua a ser um
“acontecimento excecional”, … conjugando princípios de
descentralização, auto-organização e responsabilização face aos
resultados
alcançados.
Tem
desempenhado
um
papel
fundamental no aumento da acessibilidade aos cuidados de
saúde pelos cidadãos, na melhoria da qualidade e do
desempenho e na sustentabilidade financeira do SNS»
(Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2011; p.11)
Como otimizar o potencial dos cuidados de saúde
primários na resposta aos desafios colocados
pelos determinantes sociais da saúde?
Legislação e estratégias intersectoriais dirigidas a grupos vulneráveis
• Idosos: Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas 2004-2010
• Imigrantes: Acesso ao SNS e II Plano para a Integração dos Imigrantes 20102013 da responsabilidade do ACIDI (Resolução do Conselho de Ministros);
• Jovens:
Programa Nacional de Saúde dos Jovens 2006-2010; Acção de Saúde Para
Crianças e Jovens em Risco ; Programa CUIDA-TE
• Portadores de Deficiência: Estratégia Nacional para a Deficiência 20112013 (Resolução do Conselho de Ministros);
• Programa Nacional de Doenças Raras 2010-2015 (Resolução do Conselho de
Ministro);
• III Plano Nacional Para a Igualdade – Cidadania e Género (Ministério da
Administração Interna, 2004).
Contexto de Envelhecimento da População
Índice de Envelhecimento, UE-17 (2009)
Fonte: INE; Eurostat
Contexto de Envelhecimento da População
Estrutura da população residente em Portugal por
grupos etários (1981, 1991, 2001, 2011)
Fonte: INE; Eurostat
Contexto de Envelhecimento da População
Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas
Estratégias de intervenção:
• Promoção de um envelhecimento ativo
• Maior adequação dos cuidados de saúde às
necessidades específicas das pessoas idosas;
• Desenvolvimento intersectorial de ambientes
capacitadores da autonomia e independência das
pessoas idosas
Rede de Cuidados Continuados de Saúde
Contexto de Migração Internacional
População estrangeira em Portugal
8,6%
7,2%
População estrangeira por nacionalidade
6,2%
Brasil 27%
5,3%
4,4%
Outros 21%
São Tomé e
Príncipe 2%
Ucrânia 11%
Cabo Verde 10%
Roménia 8%
Angola 5%
Moldávia
Reino Guiné
China
4%
4% Unido Bissau 4%
4%
Fonte: SEF (2011)
Adaptado de United Nations (2009)
Contexto de Migração Internacional
→ A mobilidade das populações tem implicações na saúde das
comunidades.
→ O acesso e utilização dos serviços de saúde tem um efeito
positivo no estado de saúde e qualidade de vida, contribuindo
para uma vida potencialmente mais produtiva e satisfatória.
WHO (2010). Health of Migrants: The Way Forward - Report of a Global Consultation, Madrid, Spain, 3-5 March 2010. Geneva: WHO.
Contexto de Migração Internacional
→ A migração internacional coloca assim novos desafios ao
nível da saúde e da dinâmica do Serviço Nacional de Saúde.
→ Migração e Saúde como um ponto da agenda da Presidência
Portuguesa do Conselho da União Europeia, decorrida em
2007.
→ Investigação em Migração e Saúde em Portugal – dificuldades
na prestação de cuidados
culturalmente diversas.
de
saúde
a
populações
Utilizou o SNS pelo menos uma vez
100%
80%
60%
40%
20%
0%
22,8%
91,3
82,4
77,2
87,1
82,4
71,7
61,0
48,0
Serviços que utilizou na primeira vez que precisou de cuidados
60
50
40
(%) 30
49,5
29,4
20
10
0
3,1
6,2
1
5
5,8
Contexto de Migração Internacional
Plano para a Integração dos Imigrantes
Medidas na área da Saúde:
• Promover um maior acesso e utilização aos
cuidados de saúde
• Formação aos profissionais de saúde para a
interculturalidade,
• Promoção de mediadores socioculturais
Medidas relacionadas com a saúde em
outros sectores (como o trabalho, habitação
e educação).
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO
DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO DOS CSP
Cobertura universal e igualitária de cuidados de saúde
como um valor maior.
Desafios atuais:
Generalização do acesso das populações a cuidados de
saúde de qualidade
Diminuição das iniquidades em saúde
Garantia da eficiência e do controlo da despesa
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO DOS CSP
Necessidade de maior centralidade dos serviços nos
cidadãos
• Garantir que as suas perspetivas influenciam a forma como os
serviços operam
• Cidadãos devem ser parceiros na gestão da sua própria doença
e da saúde da sua comunidade)
Maior investimento na dimensão humana da prestação de
cuidados
Maior capacidade de resposta às necessidades específicas
das comunidades e indivíduos
Necessidade de maior centralidade dos serviços nos cidadãos
Exemplo dos doentes crónicos:
→ Número destes doentes tem vindo a aumentar e sendo muitos
portadores de uma multiplicidade de doenças
→ Plataforma de gestão integrada da doença
As mulheres imigrantes descrevem que enfrentam barreiras de ordem
estrutural, administrativa, social, económica e cultural no acesso aos
serviços de saúde:
• Falta de serviços de saúde orientados para as populações imigrantes:
Dificuldades em aceder aos serviços de saúde em situação irregular
• Formação insuficiente dos profissionais de saúde para lidar com a
diversidade cultural:
•Pouca sensibilidade à condição de imigrante
Serviços devem funcionar como intermediários, fazendo a ponte com os
sectores social, político, económico e ambiental e cooperar com
organizações e serviços comunitários
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO DOS CSP
Desafio atual do sector da saúde: Crise económico-financeira
Repercussões na saúde física e mental das populações
 taxas mais elevadas de doença e morte devido ao aumento da
pobreza, diminuição de coesão social, menor acesso às
necessidades básicas e um acesso mais limitado aos cuidados de
saúde
Obstáculos na resposta do Estado e das instituições aos
problemas do acesso, da prestação e do financiamento em
saúde
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO DOS CSP
PROMOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS SAUDÁVEIS
 Estratégia essencial para efetivar a obtenção de ganhos em
saúde e reduzir as disparidades - Otimização da relação entre
benefícios e recursos disponíveis
 Definição de prioridades e parâmetros para a ação na resposta
a necessidades de saúde, distribuição de recursos e
potencialização de impactos positivos
→ que contribuam para garantir bens, serviços e ambientes
saudáveis e que favoreçam a opção por parte dos
responsáveis políticos por estratégias saudáveis
LIMITES E DESAFIOS À ATUAÇÃO DOS CSP
PROMOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS SAUDÁVEIS
 Alinhamento com as metas propostas pelos Cuidados Saúde
Primários
 Ação multissectorial, coordenada e orientada para a equidade
em saúde e políticas sociais
→ noção de saúde enquanto prioridade política para todos
os sectores
→ consciencialização das consequências na saúde das
populações
 Construção e implementação de políticas saudáveis num
processo participado
Um maior reforço da reforma dos Cuidados de
Saúde Primários pode ser uma resposta pertinente
à situação atual de crise:
Representa a oportunidade de investir em
serviços menos dispendiosos, que evitam o
recurso a serviços especializados e com maiores
custos
Pode contribuir de forma determinante para a
redução das desigualdades e a melhoria da
saúde e bem-estar das populações
OBRIGADA PELA ATENÇÃO!
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Sónia Dias