ENTREVISTAFRANCISCOGRAZIANONETO
Sustentabilidade
é inevitável
O
Fotos: Rafael
Motta
engenheiro agrônomo
Xico Graziano aconselha o produtor rural a
adotar de vez a sustentabilidade: produção econ o m i c a m e n te viáv el,
processo socialmente justo e ideias
ecológicas. E a não receber ordens de
ambientalistas que nada entendem
de agricultura. Ele esteve na FAEMG
para falar no Seminário Ambiental
sobre Meio Ambiente e Licenciamento de Atividades Agrissilv ipastoris
em São Paulo e recomendou a Minas
Gerais sim plificar a legislação ambiental, pois é complicada e ninguém
consegue cumpri-la.
Qual é a principal mudança no
novo Código Florestal?
A maior crítica que havia no Código Florestal anterior é que buscava
recompor com vegetação nativa áreas no território que já estavam ocupadas com a agropecuária. A lei anterior dizia que você não podia fazer
aquilo que os agricultores já estavam
fazendo. Por ex emplo, os morros das
Minas Gerais plantados com café. Pe-
XicoGraziano,naturaldeAraras(SP),
éengenheiroagrônomo,escritor,
consultoremorganização,marketingde
agronegócioesustentabilidade.ÉsóciodiretordaOrganizaçãoInternacional
Agropecuária(OIA)/Certificação
Socioambientalejáfoisecretáriode
agriculturaedomeioambientedo
governopaulista.GraduadopelaUSP
(1974),mestreemeconomiaagráriapela
USP(1977)edoutoremadministração
pelaFGV(1989).ÉdiretordoinstitutoFHC.
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lo Código antigo, isso não poderia ter
acontecido, não era para ter café, era
para ter mato, pois são encostas. Essa
foi a principal m udança do novo Código, que reconheceu que essas áreas
são de produção, ocupadas historicamente e consolidadas, sem precisar
tirar o café e colocar l oresta no lugar.
É o que o Código anterior exigia. E com o exigia e ninguém cum pria, o Ministério Público vinha e denunciava
os agricultores como criminosos ambientais. A outra novidade foi trazer o
Cadastro Ambiental Rural (CAR). Mas
o governo não o coloca em prática…
Quais são os prós e os contras do
Código Florestal?
Eu não gosto dessa coisa de prós e
contras. Eu trabalho com sustentabilidade e acho que temos de somar as
coisas e não opor. A nova legislação
e o CAR funcionando trazem a oportunidade de o agricultor se regularizar perante os órgãos públicos. É
como se você fizesse sua declaração
de Im posto de Renda. Vale como documento. Hoje, quando o agricultor
faz a coisa errada, é penalizado. E os
agricultores que fazem a coisa certa nunca são reconhecidos. Isso faz
com que a opinião pública pense que
todos os agricultores fazem as coisas
erradas. Mas a nova legislação estabelece os marcos melhores, de forma
a deixar o agricultor em dia com suas
obrigações.
Como o agricultor deve se adaptar
ao novo Código?
Ele tem que fazer o cadastro ambiental da sua propriedade. É lá que
ele vai declarar como utiliza as áreas
e o sistema desenvolvido vai calcular
qual é o espaço que precisa ser preservado. O preenchimento desse cadastro é muito sim ples. É como Im posto
de Renda. No começo, todo m u n do
tinha que contratar contador para
fazer. Mas os sindicatos e federações
precisam ser treinados para dar essas
orientações. A barreira do computador vai ter que ser vencida.
Como está a aplicação do Código?
Não está funcionando. Está capenga. A grande âncora dele, que é
o CAR, não foi regulamentada pelo
Olicenciamento
dasatividades
agropecuárias
mineiras émais
complicado e
burocratizado do que
em SãoPaulo.Láé
muito mais simples.
EmMinas alegislação
estabelece uma série
decategorias de
agricultor,sãomais
de30ou 40.Querem
saber seeleépequeno,
seémédio,seplanta
cana…”
poder E xecutivo. Infelizmente, a legislação ambiental brasileira virou
ninho de gato, coisa desarrumada.
Cadê o CAR? Em dois anos o governo
ainda não conseguiu regulamentá-lo,
sendo que poderia ser instrumento
fenomenal para puxar os agricultores a participarem dessa agenda da
sustentabilidade.
Quais as vantagens e desafios do
CAR?
É como se fosse um atestado de boa
conduta ambiental para o agricultor.
Antes ele não tinha esse documento
para mostrar. E muitas vezes não fazia porque não tinha como cumprir a
lei como era antes. Essa regularidade
ambiental vai facilitar o acesso aos i nanciamentos. Progressivamente os
créditos só vão ser dados a quem tiver
o cadastro.
Há diferença de legislação
ambiental entre os estados?
As legislações são muito diferentes
em cada estado. Estudei a legislação
de Minas. E duvido que alguém consiga cum prir aquilo ali. Você demora
u m ano só para se classificar, para
definir o que você é. Muito confuso.
Em São Paulo não tem nada disso. O
licenciamento das atividades agropecuárias mineiras é mais complicado e
burocratizado do que lá. Em Minas a
legislação estabelece uma série de categorias de agricultor, são mais de 30
FAEMG| SENAR
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ENTREVISTA FRANCISCOGRAZIANONETO
“Hoje osagricultores
i cam levando lição de
moral deambientalistas
quenuncapisaram na
roça, nuncapegaram
em uma enxada…e
acham queéfácil ser
produtor.Épreciso
parar dereceber
ordensdequemsediz
ambientalista,mas
quenão entendede
agricultura.”
ou 40. Querem saber se ele é pequeno,
se é médio, se planta cana…
Oque é mais burocrático em Minas?
Em São Paulo a legislação tem a declaração de conformidade, de que você a segue corretamente. Você recebe
a declaração e não precisa de licença.
Por que outros estados, como Minas
e o Espírito Santo, são burocratizados
demais? Parece que se parte do princípio de que todo agricultor é poluidor.
Contra isso temos que nos rebelar. Não
é só burocracia. Exigir licenciamento
sobre atividades de menor potencial
poluidor é uma deformidade. É preciso ir em frente em qualquer esforço de
desburocratizar. A legislação paulista
pode servir de ex emplo.
Quais são os caminhos futuros do
campo?
A susten tabilidade, n o caso do
campo, tem que ser agenda dos agricultores, levados por suas instituições
de classe. É como a FAEMG vem fazendo nos últimos tempos, ela assumiu
isso. O meu raciocínio é o seguinte: já
que é preciso fazer, é melhor nós fazermos do que os outros nos obrigarem a fazer. Hoje os agricultores i cam
levando lição de moral de ambientalistas que nunca pisaram na roça,
nunca pegaram em uma enxada... e
acham que é fácil ser produtor. É preciso parar de receber ordens de quem
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se diz ambientalista, mas que não entende de agricultura. Só o agricultor
poderá propor uma agenda boa, mas
terá que fazer. Não adianta ser contra
a preservação ambiental.
A sociedade atual é mais consciente
da preservação ambiental?
Há quarenta anos, quando me formei, ninguém falava de ecologia. Mas
o mundo m udou muito de lá para cá.
Hoje as primeiras aulas para os alunos são de ecologia. E as crianças têm
conceitos ecológicos que nós não tínhamos. A agenda da sustentabilidade está aí e deve ser cumprida. Há coisas que não somos capazes de fazer,
mas nossos filhos serão. Essa causa
do meio ambiente não é nossa, é dos
nossos i lhos, dessa nova geração que
tem cabeça completamente diferente. Se não adotarmos a sustentabilidade como princípio da agricultura, vão
nos e n i ar goela abaixo. Como a globalização, não é uma questão de ser
contra ou a favor. Não dá pra brigar
contra o assunto, mas debater, nos capacitarmos e fazer muito mais do que
já estamos fazendo.
Oque é ser sustentável?
É produzir e viver sem comprometer a capacidade dos que vão te suceder. A agricultura sustentável se configura em três pilares. Você tem que
ter uma produção que seja economi-
camente viável, processo socialmente
justo e respeitar as ideias ecológicas.
Quem deve ser responsável pela
agenda da sustentabilidade?
Ela precisa ser assumida pela agricultura. Percebo que, quando falo,
as pessoas aceitam essa mensagem.
Mas os governos não estão ajudando
muito. É preciso auxiliar o agricultor
para que ele seja susten tável. E não
apenas cobrar que ele seja. É preciso
dar os instrumentos e as ferramentas,
o apoio para o agricultor caminhar na
sustentabilidade.
É preciso unificar a agenda da
produção com a da preservação?
Sim. Temos que tirar o sinal de X e
colocar o sinal de + no processo. Não
é produção versus preservação: é
produção mais preservação. É essa a
equação. É d i í cil, mas precisa ser feita. O plantio direto é isso.
As inovações tecnológicas ajudam
na sustentabilidade? De que forma?
Ajudam. O único caminho para ser
sustentável é através da tecnologia.
Ou você i ca atrasado tirando três litros de leite por vaquinha, não sei se
tem futuro. O caminho é pela tecnologia e conhecimento. Ou seja, produtiva, que reparta as riquezas. Hoje os
empregos na agricultura remuneram
m u i to bem. Até pouco tem po não
acontecia. Isso m udou em função do
desenvolvimento tecnológico; é preciso qual iicação. Os tratores hoje têm
até ar condicionado. É preciso saber
apertar os botões. São novos processos de agricultura, novos trabalhadores e melhor remunerados.
Como o senhor avalia o potencial
agrícola do Brasil?
O Brasi l já é u m dos países agrícolas m ais im por tantes do m u ndo.
E cam i n h a para ser o m ais i m portante. Há m u itas áreas dispon ív eis,
m u ita produtiv idade para elevar n a
pecuária e n a agricultura. H á nov as
ativ idades que v ão surgin do. Em 20
an os, o Brasi l v ai ser o gran de líder
da agropecuária, não tenho a menor
dúv ida disso.
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