Resumo
O artigo apresenta a experiência do Programa em Rede de Pesquisa Desenvolvimento em
Sistemas de Produção com Atividade Leiteira no Noroeste Gaúcho, que desde 2004 reúne várias
instituições de pesquisa, ensino e extensão rural e cooperativas agropecuárias buscando contribuir
para o fortalecimento e viabilidade da agricultura familiar, a partir da geração de conhecimento em
um processo de integração entre pesquisadores, extensionistas e agricultores. O Programa associa a
assistência grupal com um processo de pesquisa desenvolvimento que possa discutir e construir
respostas às necessidades técnicas dos produtores, numa abordagem sistêmica, que compreende
as unidades de produção agropecuária como sistemas abertos, complexos e em (co) evolução
gerenciados pelo agricultor/família a partir de seus objetivos. Os resultados alcançados são vários,
destacando-se a constituição e funcionamento de uma rede com várias instituições, unidades de
observação e pessoas envolvidas, tipologia dos produtores e a caracterização agroecológica da
região, enfim, um processo de geração de conhecimento e diálogo de saberes entre pesquisadores,
técnicos e agricultores.
Palavras chaves: unidades de observação, desenvolvimento regional, assistência grupal
Abstract
The paper presents the experience of the Program in Development Research Network in
Production Systems with Activity Dairy in the Northwest Gaucho, which since 2004 brings together
various research institutions, education and rural extension and farming cooperatives seeking to
contribute to the strengthening and viability of family farming, from the generation of knowledge in an
integration process between researchers, extension workers and farmers. The program combines the
assistance group to develop a research process that can discuss and build answers to technical
needs of producers, a systemic approach, which includes the agricultural production units as open
systems, complexes and (co) evolution managed by the farmer / family from their goals. The results
achieved are many, especially the constitution and operation of a network with various institutions,
units of observation and persons involved, typology of farmers and agroecologic characterization of
the region, finally, a process of knowledge generation and dialogue among different knowledge
between researchers ,technical e farmers.
A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA EM REDE DE PESQUISA
DESENVOLVIMENTO EM SISTEMAS DE PRODUÇÃO COM ATIVIDADE
LEITEIRA NO NOROESTE GAÚCHO
Origem e antecedentes
A experiência do Programa em Rede de Pesquisa Desenvolvimento em Sistemas de
Produção com Atividade Leiteira no Noroeste Gaúcho, que desde 2004 reúne várias instituições de
pesquisa, ensino e extensão rural e cooperativas agropecuárias buscando contribuir para o
fortalecimento e viabilidade da agricultura familiar na sua região de abrangência e iniciou a partir da
análise e discussão de um grupo de extensionistas rurais, pesquisadores e agricultores interessados
em soluções tecnológicas para a produção de leite a base de pasto na região..
Como a questão tecnológica assumiu - e ainda assume, uma centralidade no início da
experiência convém deixar claro o entendimento sobre essa questão, tão controversa no
desenvolvimento rural. Além desse posicionamento facilitar o entendimento da experiência, explicitála melhor permite dirimir dúvidas ou diminuir críticas quanto a um pretenso caráter difusionista dessa
proposição.
A questão tecnológica na agricultura foi intensificada a partir do avanço científico da
Revolução Industrial, processo que permitiu a eliminação de uma série de restrições técnicas para a
exploração das culturas mais rentáveis, sob sistema de monocultivo. Se antes era necessária uma
maior diversidade de cultivos através da rotação de culturas para manutenção da fertilidade e da
estrutura do solo, novos produtos como máquinas, fertilizantes químicos e agrotóxicos, variedades
melhoradas com alta resposta aos fertilizantes permitiram que se cultivasse uma mesma espécie,
durante um longo tempo, sem prejuízo de sua rentabilidade. Paralelamente ao avanço tecnológico,
uma série de serviços estatais e paraestatais entram em cena para justificar o modelo e torná-lo mais
dinâmico e massivo. Surgem os centros de pesquisa agrícola e os serviços de Extensão Rural. O
primeiro promovendo adaptação e geração de tecnologia e o segundo popularizando essas técnicas
entre os agricultores e expandindo uma forma de “fazer agricultura” pelo mundo, num fenômeno
também conhecido como Revolução Verde.
Romeiro (1998) define esse processo como modelo euro-americano de modernização da
agricultura e o sintetizava como:
[...] um sistema de produção que tornou viável a difusão em larga
escala da prática da monocultura. Trata-se de um sistema de produção
baseado na utilização intensiva de fertilizantes químicos combinados com
sementes selecionadas de alta capacidade de resposta a esse tipo de
fertilização, no uso de processos mecânicos de reestruturação e
condicionamento de solos degradados pela monocultura e no emprego
sistemático de controle químico de pragas (ROMEIRO, 1998, p. 69).
Os efeitos dessa modernização são e serão sentidos durante muito tempo pela sociedade.
Analisando todas as críticas feitas a Revolução Verde no Brasil, Moreira (2000) classifica-as em três
grupos:
a) a crítica da técnica, que questiona a relação do ser humano com a natureza, reelabora a
teoria da renda da terra incorporando a biodiversidade, apresenta os problemas ambientais
como a poluição dos recursos naturais, a perda de biodiversidade e a erosão dos solos,
construindo o conceito de prudência ambiental;
b) a crítica social, devido ao caráter conservador da Revolução Verde, ao desemprego, ao
êxodo rural, à favelização dos trabalhadores rurais, à sobreexploração da força de trabalho
rural, em síntese, uma crítica da natureza do capitalismo na formação social brasileira e do
modelo concentrador e excludente dessa modernização da agricultura;
c) a crítica econômica, pelos custos crescentes de produção e financiamento do sistema.
Romeiro (1998) traz uma definição mais abstrata do processo de modernização e afirma
que até a Revolução Industrial o esforço tecnológico para aumentar a produtividade do trabalho
agrícola estava limitado ao arranjo dos recursos existentes dentro da unidade de produção e seu
entorno. A disponibilidade de fontes externas de nutrientes e energia proporcionada pela Revolução
Industrial permitiu ao agricultor a superação dos limites naturais. Entretanto, superada essas
restrições ambientais, a modernização vai produzir uma restrição comercial – produzir apenas
produtos mais rentáveis – e uma restrição de gestão do processo produtivo, através dos problemas
advindos do controle e organização do processo de trabalho agrícola. Mais recentemente, a restrição
ambiental se amplia tanto pela degradação do espaço agrícola, como pelo surgimento de limites
biológicos e a exigência de maior qualidade dos produtos agrícolas, criando-se ainda novas
restrições relativas aos interesses do setor agroindustrial.
Outro autor que se dedicou ao estudo da tecnologia na agricultura foi Graziano da Silva
(2003). Ele explica que o progresso técnico na agricultura é diferenciado daquele que ocorre na
atividade industrial porque a agricultura apresenta as seguintes particularidades:
a)
especificidade dos processos biológicos que não permitem que as partes se tornem
independentes do todo ( não dá para fazer uma parte de uma planta em Cingapura e outra na
Argentina ) e tampouco a especialização do trabalhador numa determinada tarefa ou operação, fato
crucial para a elevação da produtividade do mesmo;
b)
dissociação entre tempo de trabalho e tempo de produção o que implica numa
menor velocidade de rotação do capital;
c)
existência de condicionantes naturais na produção agrícola de difícil controle como
temperaturas, umidade do ar, etc.
d)
papel da terra como meio de produção.
Os dois autores supracitados, apesar de utilizarem abordagens teóricas distintas, mostram
que a mudança tecnológica não é algo tão simples na agricultura. Um dos pontos que chamam a
atenção é o papel do agricultor e sua família na escolha e adoção das técnicas em sua propriedade.
Graziano da Silva (2003), ao se referir à introdução do fumo Virgínia no Rio Grande do Sul,
lembra a estratégia de seleção e recrutamento dos inspetores encarregados da orientação técnica
entre os filhos dos fumicultores que melhor dominavam a técnica de cultivo, denotando a clara
apropriação do saber tácito e da experiência pessoal dos agricultores. Portanto, as tecnologias na
agricultura dependem muito dos agricultores e/ou trabalhadores que estejam executando as tarefas
de produção, pela complexidade da atividade e dificuldade da expansão do progresso técnico.
Romeiro (1998) em seus estudos sobre as motivações para inovar do agricultor brasileiro e
a adoção de práticas e técnicas agrícolas, testa a hipótese de que os agentes produtivos no setor
agrícola não foram induzidos, à sua revelia, a se modernizar. Para o autor, assim agiram
principalmente em função de seus próprios interesses na busca de soluções para os problemas
concretos de cada unidade produtiva. Os resultados de suas pesquisas apontam que os motivos de
ordem interna prevaleceram em relação aos de caráter externo à economia do estabelecimento e
naquelas condições os principais motivos para inovar foram: 1º) aspectos relacionados a
produtividade da terra;2º) aconselhamento técnico de agentes extensionistas ou de vendedores de
insumos e 3º) problemas relativos a mão-de-obra.
O autor supracitado entende que a mudança tecnológica não pode ser tratada como algo
que se ajusta passivamente às pressões e forças econômicas, mesmo que a determinem em última
instância, porque o processo produtivo no setor agrícola é complexo e interdependente. A introdução
de alguma técnica causa desdobramentos que vão exigir
novos estudos, numa quase
compulsividade de formulação de problemas. Em suma, as mudanças tecnológicas acabam se
tornando solução e criadora de novos problemas, fato que exige pesquisa e estudos constantes.
O avanço da produção leiteira no Noroeste do Rio Grande do Sul apresenta muitos
desafios para agricultura familiar. Dentre esses, destacam-se a possibilidade de exclusão de
unidades com menor volume de produção e os riscos de degradação do meio ambiente - já que a
elevada extração de nutrientes e a forma de manejo do solo na atividade podem levar a um rápido
empobrecimento e degradação das condições do solo. Em função disto, algumas entidades de
extensão, pesquisa, ensino e cooperativas de produtores, atentas às perspectivas que se
apresentam pela ampliação da demanda por esse produto, construíram um projeto de PesquisaDesenvolvimento em sistemas de produção com atividade leiteira que procura coordenar uma ação
conjunta entre agricultores, extensionistas e pesquisadores de diversas instituições regionais,
reforçar a integração entre essas instituições e potencializar a geração de conhecimentos e
inovações técnicas relacionadas às cadeias produtivas estruturadas ou que estão em vias de
estruturação na região.
Esta idéia transformou-se em Programa, que embora venha sendo discutido desde o ano de
2004, deu início a suas atividades formais no ano de 2008, nas regiões Noroeste Colonial e Alto
Jacuí do Rio Grande do Sul, abrangendo um total de 46 municípios, nos quais se estima a presença
de 18.000 produtores de leite. Parte das atividades desenvolvidas por este Programa foi financiada
pelo Convênio EMATER / MDA 152/07, meta 6.6 e incluía o acompanhamento de 50 unidades de
referência, 5 unidades de experimentação participativa e uma série de atividades como visitas,
reuniões técnicas, experimentação agrícola, dia-de-campo, etc. Os objetivos desse convênio se
associam ao fortalecimento e a viabilidade da agricultura familiar a partir da geração de
conhecimento através de um processo de integração entre pesquisadores, extensionistas e
agricultores, buscando a promoção do desenvolvimento sustentável dos sistemas de produção de
leite.
Características da experiência e análise do processo realizado
O Programa tem a participação das seguintes entidades: Associação Gaúcha de
Empreendimentos Lácteos – AGEL, Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência
Técnica e Extensão Rural – EMATER-RS, Coperfamiliar, Embrapa Clima Temperado, Embrapa
Pecuária Sul, Fund. Estadual de Pesquisa Agropecuária – FEPAGRO, Instituto Federal Farroupilha
Campus Santo Augusto, Universidade de Cruz Alta – UNICRUZ, Universidade Regional do Noroeste
do Estado do RS – UNIJUI, além de agricultores e lideranças locais.
Apresentando as principais razões que levaram as entidades a participar no Programa Rede
Leite, SILVA et alii (2010) apontou as seguintes:


as instituições podem ser colaboradoras da construção conjunta de um
desenvolvimento sustentável;
o desafio das instituições para uma convivência crítica e propositiva;
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
a possibilidade de debater diferentes idéias e proposições em um ambiente que não
só uniformize os procedimentos, mas que principalmente promova o enriquecimento
deles;
a organização de atividades conjuntas para potencializar os resultados obtidos;
a possibilidade de criar um fluxo de conhecimento sobre o meio rural da região;
cada instituição pode potencializar suas ações nas suas áreas de atuação, de acordo
com sua estrutura física, organizacional e de recursos humanos, gerando uma
complementaridade quando se somam no âmbito de uma rede.
Sua lógica de estruturação está alicerçada num processo de pesquisadesenvolvimento e na assistência grupal e pode ser representada a partir do seguinte esquema:
Figura 1. Fonte ASCAR-EMATER/RS
Em síntese, o Programa associa a assistência grupal com um processo de pesquisa desenvolvimento que possa discutir e construir respostas às necessidades técnicas dos produtores,
numa abordagem sistêmica, que compreende as unidades de produção agropecuária como sistemas
abertos, complexos e em (co) evolução gerenciados pelo agricultor/família a partir de seus objetivos,
confrontados com as condições socioeconômicas, o meio ambiente e o aparelho de produção que
dispõe e a imagem que o agricultor/família tem de sua situação. Diante disso, elaboraram as
seguintes premissas:
“1. As unidades de produção podem ser compreendidas e avaliadas a partir
das (inter)relações entre os componentes;
2. Os sistemas de produção agrícolas com atividade leiteira podem ser
agregados em tipos que possuem funcionamentos semelhantes e esses
correspondem a tipologia baseada na evolução, capacidade reprodutiva,
estrutura e combinações de atividades desenvolvidas;
3. Para as unidades de produção de um mesmo tipo os problemas de
produção e as alternativas são semelhantes e, por sua vez, entre os tipos
os problemas e as alternativas em geral diferem;
4. Os agricultores geram e experimentam soluções para seus problemas e
as que apresentam bom desempenho podem ser adequadas a sistemas de
produção semelhantes;
5. Soluções em direção ao aumento da sustentabilidade dos sistemas de
produção com leite podem ser desenhadas a partir da abordagem sistêmica
dos sistemas de produção;” ASCAR-EMATER/RS 2008
O Programa está inserido em um contexto regional em que ocorrem diversas “ofertas
tecnológicas” para a atividade leiteira e a importância do componente tecnológico na concepção do
Programa se dá pelo entendimento de que não basta criar espaços e tempos participativos que não
consigam se traduzir em mudanças sobre a realidade, numa ação mais discursiva e pouco prática.
Por fim, para evitar o entendimento que essa proposição de estudo pressupõe um resgate da
categoria que deu sustentação teórica ao difusionismo, especialmente o conceito de “capacidade
individual para inovar” que seria
“[...] um processo mental por onde passa o indivíduo desde a
primeira notícia de inovação até decidir adotá-la ou rejeitá-la, e confirmar
depois de sua resolução”. Temos conceituado quatro funções dentro desse
processo: 1) conhecer, 2) persuadir, 3) decidir e 4) confirmar. A adoção
consiste em decidir usar plenamente a idéia nova, como a melhor opção
para atuar (ROGERS, 1974 apud FONSECA, 1985, p. 44) [grifos nossos].
É pertinente lembrar que a concepção difusionista estava baseada numa idéia de
conhecimento exterior a comunidade e pretensamente desinteressado, numa idéia de ciência neutra
onde a difusão do conhecimento era baseada em técnicas de persuasão e não no diálogo. O
conhecimento que era apresentado ao agricultor não era passível de questionamento. Hoje, as
interações entre ciência e senso comum apontam para algumas mudanças
a)
encurtam-se as distâncias entre os avanços das ciências e a
penetração deles na vida cotidiana das populações, num processo de
articulação de senso comum com o saber científico e da unidade de ambos,
agora em sinergia transformada;
b)
ciências
se
requerem
sempre
mais
específicas,
interdependentes e complementares na interlocução de seus saberes e em
crescente complexidade;
c)
a incidência das ciências no cotidiano transforma
a
educação de transmissão de saberes acabados em movimento de
constituição das ciências; onde não se descolam a pedagogia do fazer
científico e a pedagogia dos usos dele na vida cotidiana. Enfim, trata-se de
ciências sempre em trânsito, em fluxo incessante de transformações e em
intergênese com a educação de contínuo exigida por desafios outros.”
MARQUES 2001
Para esse autor, que teve destacada atuação profissional na região Noroeste Colonial do Rio
Grande do Sul, essas mudanças transformam o conhecimento num processo intersubjetivo, onde o
senso comum se torna ciência pela argumentação de uma comunidade de interessados e a ciência
se faz senso comum, reconvertida pela discussão pública dos resultados a que ela chegou. O
conhecimento não é entendido como algo que só pode ser produzido nas academias ou instituições
de pesquisas, por especialistas, para posteriormente ser difundido pela sociedade. Portanto, executar
um programa que parta da idéia do conhecimento enquanto uma construção histórica, num diálogo
de saberes e que possa ser um instrumento na melhoria de vida dos agricultores e da sua relação
com a natureza passa a ser uma tarefa atual e meritória e está bem distante dos ideais difusionistas.
Elementos facilitadores
Como elementos facilitadores podemos citar a existência de um forte organização dos agricultores
familiares mais pobres em cooperativas para comercialização conjunta do leite; a Extensão Rural oficial
através da EMATER- ASCAR/RS presentes em todos os municípios da região e sua equipe regional que
protagonizou esse processo; a existência de Universidades e Institutos Federais na região com equipes,
laboratórios e cursos nas áreas das ciências agrárias, a existência de pesquisadores nos centros de
pesquisa do órgão oficial de pesquisa no Brasil ( EMBRAPA) com trabalho anterior e um forte vínculo com
a região Noroeste Colonial.
Do ponto de vista institucional, o apoio das políticas públicas existentes em nível federal e agora
em nível estadual que permitem ações com métodos alternativos de pesquisa e com a preocupação com o
desenvolvimento sustentável e regional.
Elementos obstaculizadores
A burocracia existente nas instituições impedem um dinamismo maior do processo e
representa um sério limite . Apesar da existência de Universidades, é o pouco número de
pesquisadores em cada área, fato que limita os estudos e pesquisas dos problemas. A região de
abrangência do Programa condiciona e dificulta a realização de experimentos e pesquisas, limita as
generalizações das respostas e implica em elevados custos para a participação, principalmente dos
agricultores, seja pelo custo direto da participação, como da necessidade de se ausentar da
propriedade muitas vezes um ou mais turnos de trabalho. Por fim, a condição vivida pelas
cooperativas, com muitas urgências e pouca estrutura material e humana limita uma maior
participação dessas organizações.
Análise do resultado do trabalho
Os conhecimentos construídos através desta rede são imediatamente socializados com as
demais famílias, além das pertencentes às unidades de observação (UOs). Através de dias de
campo, reuniões técnicas e visitas são beneficiadas 4150 famílias. Considera-se, também, que a
própria consolidação e fortalecimento da Rede Leite é um importante resultado do trabalho, já que
não é fácil comprometer diferentes instituições em torno de objetivos comuns. Elaborou-se um
zoneamento agroecológico da produção leiteira na região, uma tipologia dos sistemas de produção, e
uma discussão sobre os principais problemas/limitantes enfrentados pelos agricultores. Ademais,
tem-se um banco de dados com inúmeros indicadores da atividade e das unidades produtivas, o qual
pode servir de referência para projetos de desenvolvimento e políticas públicas para o setor.
O Programa tem apresentado significativos avanços em projetos de pesquisas para a região,
como o Pesquisa-desenvolvimento em sistemas de produção com pecuária de leite na região
noroeste do Rio Grande do Sul, com uma concepção de território financiado com recursos da
EMBRAPA Pecuária Sul, o projeto de Sistemas forrageiros irrigados para a produção de leite no
noroeste do Rio Grande do Sul aprovado pela UNIJUI e financiado pelo Governo do RS, e o de
Produção de forragem e qualidade do solo em pastagens perenes de verão, sobressemeadas com
forrageiras hibernais e sob formas de utilização realizado pela UNIJUI e parceiros e financiado pelo
Ministério da Ciência e tecnologia - MCT; Ministério do desenvolvimento Agrário - MDA,
Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural da Secretaria da Agricultura Familiar
(DATER/AS), Conselho Nacional do desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPQ.
Atualmente, o programa tem ampliado o número de participantes e para facilitar o trabalho
foram constituídos sete grupos temáticos: Qualidade do Leite e Sanidade Animal, Social, Ambiental,
Econômico, Fora da Porteira, Forrageiras e Comunicação. Estes grupos são responsáveis por
abordar os problemas que surgem nas UOS ou derivado de ações externas as propriedades, como
casos de regulamentação legal, que exigem conhecimento por parte dos técnicos e produtores para
solucionar ou mitigar os problemas. Recentemente foi realizado I Fórum Técnico da Rede Leite, na
cidade de Ijuí-RS, com a participação de mais de 170 técnicos entre extensionistas rurais,
professores e pesquisadores das instituições participantes.
Hoje, é possível apontar inúmeros casos de melhoria de processo produtivos, concorrendo
não somente para aumentar significativamente a renda, mas também trazer mais qualidade de vida e
satisfação à família. Outra questão que merece destaque é a rapidez com que se consegue
responder a determinados pontos levantados pelos agricultores, pois eles próprios estão participando
ativamente da rede, e, portanto, o processo de troca de informações acontece de forma ágil e rápida.
Vários resultados mais específicos podem ser citados, como por exemplo: consorciações forrageiras
para gado de leite, produção e persistência de espécies leguminosas, relativos ao manejo forrageiro,
fertilidade de solos, nutrição e sanidade animal, entre outros.
No ano de 2011, o programa foi um dos vencedores do Prêmio Fundação Banco do Brasil de
Tecnologia Social 2011, fazendo parte atualmente do banco de tecnologias sociais certificadas e
disponibilizada por essa entidade sob o título de Rede de Pesquisa-Desenvolvimento em Pecuária
Leiteira de Base Familiar. A partir deste ano de 2012 o programa possui um sítio na internet, que
reúne informações e troca de experiências. Portanto, maiores informações podem ser obtidas no
endereço eletrônico do programa: http://www.programaredeleite.com.br/novo/.
Desafios e questões importantes
Um dos maiores ensinamentos do Programa Rede Leite reside na necessária compreensão das
instituições participantes que o processo exige tempo e paciência para sua implementação. A reunião de
muitas instituições e de sujeitos com interesse bem diversos, mesmo que circunscritos a um tema, no caso
sistemas de produção com atividade leiteira em uma região também delimitada, exige um período
relativamente longo para discussão e entendimento mútuo entre os participantes de uma experiência
dessa magnitude. Utilizaremos um exemplo para facilitar o entendimento dessa questão.O interesse de
um agricultor que participa como experimentador e pesquisador, cedendo sua propriedade e seu tempo e
de um professor e pesquisador, especialista em física do solo pode ser o mesmo: encontrar soluções para
a compactação do solo nas pastagens perenes. O problema é que a busca de respostas e a necessidade
de soluções por parte do agricultores nem sempre ocorre na mesma sintonia, não é algo sincrônico. Além
de serem atividades que se realizavam tradicionalmente de forma estanques, o pesquisador em seu
laboratório e o agricultor aplicando ou experimentando soluções que ele mesmo poderia criar,
necessitando mudar a rotina de ambos, as expectativas com o trabalho também tem que ser ajustadas,
sob pena de não serem realizadas de forma satisfatória ou mesmo causar frustações e abandono da
participação por algum dos envolvidos, seja o pesquisador ou o agricultor. Nosso grande educador Paulo
Freire nos ensinou que a abertura do ser é condição básica para o diálogo, mas ter isso como princípio e
operar dessa forma exige muita maturidade profissional e vigilância nos objetivos.
Esse aspecto já mostra que é necessário uma coordenação que permita a realização das
atividades e essa vigilância na condução do processo, estimulando os debates, encontrando soluções
para as divergências e estabelecendo pontos comuns de ação. Essa fase inicial exige também
investimentos em atividades que muitas vezes não estão bem definidas ou sequer são passíveis de
financiamento ou custeio pelos órgãos oficiais de pesquisa.
Ocorreu uma melhoria na relação entre a as Universidades e órgãos de pesquisa com a
Extensão Rural, estimulando parcerias na formação de extensionistas e agricultores e também numa
abertura para uma realidade regional que, infelizmente , não chegava até a Universidade ou o
Centro de Pesquisa. Essa região conseguiu realizar essa aproximação a partir do Programa. Outras
regiões do Estado que a exemplo da nossa não possuem nenhum órgão oficial de pesquisa, estão a
vários anos buscando aproximações e/ou instalação de unidades sem nenhum sucesso. Também é
possível notar um aumento nas atividades de ensino, com uma série de ações sendo realizadas junto
ao Programa que envolvem alunos dos cursos de nível médio e superior das ciências agrárias,
permitindo ao estudante conhecer e refletir sobre a realidade da agricultura familiar. Ao mesmo
tempo, o acompanhamento e intervenção em situações reais em nível de propriedade/produtor rural,
legitimam a atividade e os resultados da pesquisa, aproxima “produtores”, “extensionistas” e
“pesquisadores”, subsidia as decisões do produtor e retro-alimenta os fundamentos a serem
pesquisados pelas academias.
Outros desafios que o Programa apresenta é a consolidação e aprofundamento dos
trabalhos nas UOs, fazendo avançar as propostas de melhoria e redesenho dos sistemas de
produção e o aprimoramento dos instrumentos de análise das unidades produtivas desenvolvendo e
monitorando indicadores de sustentabilidade para cada tipo de sistema. A análise detalhada do
manejo alimentar dos animais nas UOs, visando identificar e trabalhar aspectos positivos e
negativos, tendo como referência principal a produção animal com base em pastagens, e de forma a
estimular práticas sustentáveis que garantam maior autonomia de trabalho aos produtores e efetivar
a diversificação dos temas que estão sendo trabalhados com maior foco,incluindo outras áreas do
conhecimento a partir das demandas identificadas nas UOs, e buscando, para tanto, a participação
de outros profissionais ligados às instituições parceiras, ou seja, fazer com que os grupos temáticos
possam se consolidar e produzir resultados em suas especificidades.
Referências Bibliográficas
ASCAR-EMATER-RS. Projeto de Assistência Técnica e Extensão Rural da EMATER/RS para o
Fortalecimento da Agricultura Familiar e de Públicos Especiais e a Promoção do Desenvolvimento
Sustentável do Meio Rural, 2007.( documento interno)
ASCAR-EMATER-RS. Projeto de Assistência Técnica e Extensão Rural da EMATER/RS para o
Fortalecimento da Agricultura Familiar e de Públicos Especiais e a Promoção do Desenvolvimento
Sustentável do Meio Rural, 2008.( versão preliminar-documento interno)
FONSECA, Maria Teresa Lousa Da. A Extensão Rural no Brasil, um projeto para o capital. São Paulo:
Loyola, 1985.
GRAZIANO DA SILVA, J. tecnologia e agricultura familiar.2. ed., Porto Alegre:Editora da
UFRGS,2003, 238 p.
MARQUES, Mario Osório. Educação nas ciências: os novos desafios. Revista Educação nas
Ciências. Ijuí: Editora Unijuí, 2001
MOREIRA, R.J. Críticas ambientalistas à Revolução Verde. Revista Estudos Sociedade e Agricultura,
n. 15, Rio de Janeiro: Lidador, 2000, p. 39-52.
ROMEIRO, Ademar Ribeiro. Meio ambiente e dinâmicas de inovações na agricultura. São Paulo:
Annablume / FAPESP, 1998.
SILVA, Gustavo Martins da., MONTARDO, D. P., COSTA, P. U. N., BERTO,J. L., WUNSCH, J. A.,
MAIXNER, Adriano Rudi, SAMBORSKI, T., SCHOMMER,J., FERREIRA, O. G. L.Rede Leite:
Programa em rede de pesquisa-desenvolvimento em sistemas de produção com pecuária de leite no
noroeste do Rio Grande do Sul.. Série Documentos Embrapa Pecuária Sul. Bagé:Embrapa Pecuária
Sul, 2010.
Anexos
Dia de campo Bom Progresso - Fonte: Gustavo Martins da Silva
Reunião de trabalho pesquisadores e extensionistas - Fonte : Gustavo Martins da Silva.
Dia de campo IRDER – Unijuí Fonte: Gustavo Martins da Silva
I Fórum Técnico Rede Leite – 170 participantes- 15/8/2012 – Fonte : Cleusa Brutti
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