JURISPRUDÊNCIA COMENTADA
PROCESSO TC 16867/2013
RELATOR: Conselheiro Waldir Neves Barbosa
ASSUNTO: POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE MEDIDA CAUTELAR PELO
TRIBUNAL DE CONTAS.
Por Eduardo dos Santos Dionizio. Diretor de Controle Externo do TCE/MS.
I – DO CONTROLE EXTERNO MEDIANTE REPRESENTAÇÃO
No âmbito do controle externo exercido pelos Tribunais de Contas, a Lei
Orgânica do TCE/MS (Lei Complementar nº 160/2012) prevê em seu artigo 39, dentre os
procedimentos especiais, a Representação.
Trata-se de instrumento por meio do qual qualquer cidadão, associação,, partido
político ou sindicato é legitimado a denunciar ao Tribunal a ocorrência de irregularidades
ou ilegalidades.
Portanto, pode-se considerar a representação, ao lado da denúncia, do pedido de
informações, do pedido de averiguação prévia e das consultas, como opção democrática
para ampliar a participação da sociedade na fiscalização da Administração Pública.
E foi por meio de uma representação que a AEPAF/MS – Associação das
Empresas de Pax e Funerárias no Estado de Mato Grosso do Sul levou ao conhecimento do
TCE/MS irregularidades e ilegalidades presentes no procedimento licitatório relativo à
Concorrência Pública nº 07/2013 (Processo Administrativo nº 64427/2013-70, do
Município de Campo Grande).
No bojo da referida representação, foram apontados vícios no processo licitatório,
sob a alegação de que as regras do Edital afrontavam os princípios da legalidade e da
razoabilidade.
O ponto fundamental em destaque foi o pedido formulado: concessão de medida
cautelar para suspender o procedimento licitatório até que se decida o mérito da questão.
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II – DA MEDIDA CAUTELAR NO TRIBUNAL DE CONTAS
Neste passo exsurge o tema do poder geral de cautela, pelos Tribunais de Contas,
e, mais especificamente, a questão da concessão de medida cautelar pelas Cortes de Contas
objetivando prevenir lesão ao erário e garantir a efetividade de suas decisões.
A matéria já havia sido objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal,
quando julgou o Mandado de Segurança nº 24510, de relatoria da Ministra Ellen Gracie,
ementado nos seguintes termos:
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. IMPUGNAÇÃO. COMPETÊNCIA DO
TCU. CAUTELARES. CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE INSTRUÇÃO.
1- Os participantes de licitação têm direito à fiel observância do procedimento
estabelecido na lei e podem impugná-lo administrativa ou judicialmente.
Preliminar de ilegitimidade ativa rejeitada.
2- Inexistência de direito líquido e certo. O Tribunal de Contas da União tem
competência para fiscalizar procedimentos de licitação, determinar
suspensão cautelar (artigos 4º e 113, § 1º e 2º da Lei nº 8.666/93), examinar
editais de licitação publicados e, nos termos do art. 276 do seu Regimento
Interno, possui legitimidade para a expedição de medidas cautelares para
prevenir lesão ao erário e garantir a efetividade de suas decisões.
3- A decisão encontra-se fundamentada nos documentos acostados aos autos da
Representação e na legislação aplicável.
4- Violação ao contraditório e falta de instrução não caracterizadas. Denegada a
ordem. (DJe de 19/3/2004)
O entendimento manifestado naquele julgado, segundo o qual o TCU possui
legitimidade para conceder medidas cautelares para prevenir lesão ao erário e garantir a
efetividade de suas decisões, foi reiterado em decisões posteriores, como no caso do MS
26.547, Relator Ministro Celso de Mello; Suspensão de Segurança nº 3.789, Relator
Ministro Cezar Peluso e, mais recentemente, em 14.03.2013, o pedido de Suspensão de
Segurança nº 4.878, Relator Ministro Joaquim Barbosa, que confirmou a medida cautelar
de bloqueio de bens imposta pelo TCE/RN.
Naquela oportunidade, o Procurador-Geral da República, em seu parecer,
manifestou-se nos seguintes termos: “Com efeito, o que se pretende garantir com o
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reconhecimento do poder geral de cautelar às Cortes de Contas é o efetivo exercício de seu
dever constitucional de fiscalização.”
O Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul, acompanhando a
evolução doutrinária, jurisprudencial e legal do controle externo, fez constar em sua Lei
Orgânica (Lei Complementar nº 160, de 2 de janeiro de 2012), expressamente, a
possibilidade de 132 concessão de medidas cautelares, como se lê em seu artigo 56, verbis:
“Art. 56. O Tribunal pode determinar liminarmente a aplicação de medida
cautelar, sem a prévia manifestação do jurisdicionado, sempre que existirem provas
suficientes de que ele possa retardar ou dificultar o controle externo, causar dano ao erário
ou tornar difícil a sua reparação.”
III – DOS PRESSUPOSTOS PARA CONCESSÃO DE MEDIDA CAUTELAR
No caso específico da Representação feita pela AEPAF/MS - Processo TC/MS nº
16867/2013, o pedido formulado está previsto no inciso I, do art. 56, que prevê a
possibilidade do Tribunal determinar a suspensão de procedimento que ocasione ou possa
ocasionar dano a bens públicos.
Para a apreciação do referido pedido de concessão de medida cautelar, a análise
da presença dos pressupostos é requisito imprescindível, e foi exatamente o que fez o
Conselheiro Waldir Neves Barbosa, Relator da Representação nº 16867/2013, em sua
decisão, ao afirmar que: “...para a concessão de medida liminar se faz necessária a
concorrência imprescindível de dois pressupostos, quais sejam, a relevância do
fundamento (o fumus boni iuris-“a fumaça do bom direito”) e a possibilidade de ineficácia
da medida (o periculum in mora), caso seja esta deferida somente ao final, sendo
insuficiente, portanto, a ocorrência de apenas um desses requisitos.”
No caso concreto, o Relator identificou a presença da relevância do fundamento
jurídico do pedido, uma vez que, em cognição sumária, os vícios apontados foram
constatados no edital da licitação, em afronta aos princípios da legalidade, razoabilidade e
proporcionalidade.
Por outro lado, o Relator também constatou a presença do perigo da demora,
consistente na frustração da eficiência da decisão do Tribunal, caso não fosse suspenso o
processo licitatório liminarmente.
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Assim, havendo nos autos prova inequívoca que conduz à verossimilhança das
alegações feitas pela Representante, a medida cautelar foi concedida nos seguintes termos,
verbis:
A questão, ademais, necessita de proteção cautelar traduzida em medida
liminar, justificando-se, inclusive, inaudita altera pars, a fim de determinar a imediata
suspensão da abertura da Concorrência Pública nº 07/2013 (Processo Administrativo
nº 64427/2013-70), da respectiva municipalidade, marcado para 23 de outubro de 2013,
às 08h00min (oito) horas, impondo-se tal ato, neste momento, para que se impeça, de
pronto, a ocorrência de efeitos lesivos e de difícil reparação, ou ainda irreparáveis, à
representante e àqueles interessados em participar dessa competição licitatória; e
buscando-se, do mesmo, garantir a eficiência e a proteção do interesse público, em razão
de que, caso ocorra o natural início do certame e sejam, no seu decurso ou posteriormente,
confirmados os alegados vícios, isto acarretaria maiores custos e prejuízos ao interesse
público, diante de eventuais anulações e novos atos e procedimentos a serem refeitos.
Caracterizado, assim, o periculum in mora.”
Desta feita, como amplamente discutido acima, o poder de cautela dos Tribunais
de Contas é fundamental para o exercício do controle externo e, no caso concreto sob
comento, imprescindível para garantir o exercício constitucional do seu dever de
fiscalização.
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