IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil GÊNERO NA ESCOLA: UM DIÁLOGO COM DOCENTES NA REDE MUNICIPAL DE ITABAIANA Ana Lúcia de Oliveira Menezes Neres (UFS/ PIBID/PICVOL) Maria Batista Lima (UFS-GEPIADDE/EDUCON) RESUMO O artigo traz analises preliminares de uma pesquisa em andamento que aborda a Identidade de Gênero e Escola: Concepções e Práticas Docentes em Itabaiana-SE. Para este fim foram entrevistadas 10 (dez) professoras da rede pública de ensino da cidade. Com o objetivo de Analisar as concepções de identidade de gênero dos professores/as da 1ª (primeira) etapa do ensino fundamental de Itabaiana. As analises apontam que papel de dominação no qual se articulam aspectos biológicos, emocionais e psicológicos como forma de dominar os corpos e as mentes, reproduz um lugar social que estabelece uma relação de dominação. Portanto fazse necessário repensar o cotidiano a partir dos seus diversos aspectos, da intervenção educativa, efetiva, dos materiais didático-pedagógicos e da articulação crítica com outras dimensões sociais, tais como a mídia, movimentos sociais, entre outros. Palavras-chave: Relações de Gênero, Práticas Escolares, Identidades. 1. APRESENTAÇÃO Autores como Louro, bem como diversas outras pesquisas, apontam que a identidade de gênero é constituída a partir das relações sociais e culturais que são estabelecidas desde a infância. Gênero refere-se às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das diferenças sexuais. O papel do homem e da mulher é constituído culturalmente e muda conforme a sociedade e o tempo. Esse papel começa a ser construído desde que o/a bebê está na barriga da mãe, quando a família de acordo à expectativa começa a preparar o enxoval de acordo ao sexo. Dessa forma, cor de rosa para as meninas e azul para os meninos. Depois que nasce o/a ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 1 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil bebê, a primeira coisa que se identifica é o sexo: “menina ou menino” e a partir desse momento começará a receber mensagens sobre o que a sociedade espera desta menina ou menino. Ou seja, por ter genitais femininos ou masculinos, eles são ensinados pelo pai, mãe, família, escola, mídia, a sociedade em geral, diferentes modos de pensar, de sentir e de atuar. Então a família e a/o professor/a assumem um papel importante neste processo, já que é nos primeiros anos de vida que a criança começa a perceber a diferença entre o feminino e o masculino, que aprende nas relações sociais o que se estabelece sóciohistoricamente como comportamento e ações do homem e da mulher. E nesse processo de vida a escola tem um tempo-espaço importante tendo em vista seu papel socializador e formador de valores a partir das práticas e relações que acontecem no seu espaço. É na escola que o professor/a começa a desenvolver um trabalho com as crianças a partir de atividades lúdicas. Acredita-se que na medida em que a criança desenvolve o conceito de gênero, do ser masculino e do ser feminino, aprende o que acompanha ou deve acompanhar essas identidades. Nessa fase a criança costuma atribuir uma série de valores de “certo” ou “errado”, com a participação das pessoas com as quais convivem e de outros elementos socializadores de valores, como a mídia, a igreja, entre outros. Diante disso SILVA (2000) alega A afirmação da identidade e a marcação da diferença implicam, sempre, as operações de incluir e de excluir. (...) Afirmar a identidade significa demarcar fronteiras, significa fazer distinções entre o que fica dentro e o que fica fora. (SILVA 2000, p.82) Diante disso na escola, alem das relações, os materiais pedagógicos também lhe “ensinam” os comportamentos “apropriados” para homens e mulheres na cultura local. ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 2 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil Desse modo, na escola uma série de materiais faz parte dessa construção da identidade de gênero, como os livros, as gravuras, os brinquedos, os textos, entre outros. Mas principalmente a postura docente na escolha e na abordagem desses materiais. E essa postura vai sendo definida pela forma como esses profissionais pensam esses conceitos. MISKOLCI (2005) afirma que A escola é um dos locais privilegiados para que meninos aprendam a ser masculinos e meninas aprendam a ser femininas. Se aprendem é porque a masculinidade e a feminilidade são flexíveis e podem adquirir formas variadas em cada pessoa. O processo educativo tenta restringir essas possibilidades reforçando visões hegemônicas sobre o que é ser masculino ou feminino, portanto contribuindo para que todos acreditem que meninos são masculinos porque ‘naturalmente’ têm gestos brutos e são mais agressivos, enquanto meninas seriam femininas por serem ‘por natureza’ delicadas e quietas. (MISKOLCI 2005 p.15) Esse pensamento se concretiza nas ações que demandam um lugar social diferenciado para meninos e meninas, estabelecendo uma hierarquia de valores nos diversos âmbitos da sociedade; desde a escolha dos cursos de formação, a autonomia para suas escolhas até a oportunidade e valorização no mercado de trabalho e o respeito nas relações afetivas. A desigualdade de gênero, como outras formas de diferenciação social, trata-se de um fenômeno estrutural com raízes complexas e instituído social e culturalmente de tal forma, que se processa cotidianamente de maneira quase imperceptível e com isso é disseminada deliberadamente, ou não, por certas instituições. Então podemos perceber através da afirmativa de SILVA (2000) no seu texto A produção social da identidade e da diferença que (...) A questão da identidade, da diferença e do outro é um problema social ao mesmo tempo que é um problema pedagógico e curricular. É um ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 3 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil problema social porque, em um mundo heterogêneo, o encontro com o outro, com o estranho, com o diferente, é inevitável. É um problema pedagógico e curricular não apenas porque as crianças e os jovens, em uma sociedade atravessada pela diferença, forçosamente interagem com o outro no próprio espaço da escola, mas também porque a questão do outro e da diferença não pode deixar de ser matéria de preocupação pedagógica e curricular. (SILVA 2000, p.97) Questões como essas normalmente não são discutidas nem exploradas pela escola, as famílias são resistentes a este assunto e muitos professores não são preparados, nem foram formados para adotar tais questões, sendo elas vistas como um tabu no campo familiar a educacional. Em pesquisas realizadas no Brasil, observa-se que os professores, mesmo sem perceberem, acabavam reforçando comportamentos estereotipados, como por exemplo, quando uma professora solicita a presença da auxiliar junto aos meninos durante a rodinha, porque eles estão sempre agitados, diferente das meninas que são mais calmas. De acordo com especialistas da área, os estereótipos relacionados aos meninos são muito discriminatórios, pois já está impregnado na sociedade que meninos são mais agressivos e agitados, enquanto meninas são mais frágeis e sentimentais, e tais comportamentos são representados dentro da escola. Diante disso, realizamos a pesquisa Identidade de Gênero e Escola: Concepções e Práticas Docentes em Itabaiana-SE, que se encontra em andamento como parte da pesquisa “Pluralidade cultural, Identidades e Diferenças na Escola: Discursos e Práticas no Agreste Sergipano” e articulado ao Projeto de Extensão “Compartilhando as Diferenças no Espaço Escolar: Diversidade de Gênero, de Orientação sexual e Étnico/racial, coordenados pela professora Maria Batista Lima e desenvolvido no GEPPIADDE (Grupo de Estudos e Pesquisas Identidades e Alteridades: Desigualdades e Diferenças na Educação). ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 4 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil Esse trabalho tem como objetivo analisar as concepções de gênero dos professores/as da 1ª etapa do ensino fundamental de Itabaiana. E tem como objetivos específicos sensibilizar os participantes sobre a necessidade de refletir sobre questões relativas à diversidade de gênero; Contribuir para a reflexão dos/as docentes acerca de práticas discriminatórias; auxiliar os/as professores/as a encontrarem formas de inserção das temáticas no cotidiano escolar; e realizar levantamento/diagnóstico de repertórios, materiais e experiências desenvolvidas no processo educativo da rede pública do município de Itabaiana. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Trata-se de uma pesquisa qualitativa de caráter etnográfico, realizada em 2007-2008. A amostra analisada foi composta por dez professoras de escolas da rede pública de Itabaiana. Estas por vez participavam do curso de extensão “Compartilhando as diferenças no espaço escolar: diversidade de gênero, de orientação sexual e étnico/racial. Fizemos uso de leituras e seminários de fundamentação teórica, dentre os textos analisamos as teorias a respeito da Identidade: (Re) construídas socialmente; plurais e dinâmicas, pois podem ser modificadas de acordo com as relações e formações. Em alguns momentos alguma(s) se sobrepõe a outra dependendo do momento e da situação vivida. Analisamos a identidade de Gênero: O conceito de gênero se refere ao modo como as características sexuais são compreendidas, representadas e usadas nas práticas sociais, sendo que no contexto político da dominação do machismo e do sexismo, essas características tem sido usada para dominação dos corpos. E consideramos também a educação anti-machista e anti-sexista como sendo a educação que atua contra a dominação e a desigualdade de gênero, no que se refere as características, espaços e possibilidades do homem e da mulher, bem como quanto à sua ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 5 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil opção sexual, a partir de suas práticas, atividades, atitudes, reflexões e materiais pedagógicos usados. Desempenhamos a aplicação de questionários com 10 docentes; fizemos observação de atividades na sala de aula de algumas escolas das instituições envolvidas. E realizamos a sistematizamos e analisamos dos dados coletados. Algumas das questões trabalhadas foram: Quais as concepções de gênero - o que é ser homem? E o que é ser mulher? Se a mulher ou o homem tem uma inclinação para algumas áreas do conhecimento e para algumas profissões? Daí fizemos analise das opiniões apresentadas pelas professores/as da 1ª etapa do ensino fundamental de Itabaiana. 3. ANALISE DOS RESULTADOS Quanto a ser mulher vejamos algumas concepções apresentadas nas respostas das professoras. Apesar de terem atribuídas às mulheres características como determinação, independência e responsabilidade estas atribuições não são recorrentes, ou seja, não se repetem. Predominam como características femininas “ser mãe, ser esposa, ser carinhosa, seguir regras, ser compreensiva, ser delicada, temente a Deus”. Estas visões apontam como diz Louro (2007), o papel de dominação no qual se articulam aspectos biológicos, emocionais e psicológicos como forma de dominar os corpos e as mentes, reproduzindo um lugar social que estabelece uma relação de dominação. Quanto ao o que é ser homem as características predominantes na visão dos sujeitos da pesquisa foram: ser responsável, ser trabalhador, ser provedor e ser livre. Despontam como características complementares, ou seja, em segundo plano, justo com as anteriores e em menor escala, características como: gentil, respeitador, companheiro. ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 6 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil Com relação se a mulher ou o homem tem uma inclinação natural para algumas áreas do conhecimento e para algumas profissões percebemos que existe sim uma inclinação natural tanto para homens como para mulheres. As mulheres aparecem como administradoras como sendo mais humanas, tendo mais capacidade para dialogar e tem mais respeito. Quanto aos homens os ofícios que aparecem são atividades ligadas a força física, como por exemplo: mecânico, ferreiro, pedreiro, padeiro, militares, bombeiros, entre outros. A recorrência de características apontadas, em sua maioria por jovens mulheres, indica que a equidade de gênero ainda está andando a passos lentos, pois se por um lado apontam as conquistas da mulher, a luta por respeito e espaço, por outro também denotam predominância da ideologia de uma mulher frágil, dependente, limitada e “naturalmente” nascida para ser “mãe e esposa”, “ser especial por sua delicadeza”. “ser compreensiva”. Então surge a indagação. E a escola o que tem haver com isso? Como já foi mencionado é na escola que o docente tem o papel de socializar e formar valores nas crianças a partir das práticas e relações que acontecem no seu espaço. Para isso faz-se necessário um olhar crítico das pessoas da escola, especialmente professores/as. Para assim perceber a importância do discurso na escola como forma de transformação. As atividades propostas pelas professoras foram: conscientização dos/as discentes com palestras, reflexão sobre a mulher, exaltação da importância da mulher, orientação sobre o enfrentamento da violência contra a mulher. Portanto é necessário Problematizar o papel do material escolar e da televisão/mídia na desigualdade de gênero tanto em sala de aula como nos outros espaços das relações sociais; 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 7 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil Conforme disse um dos sujeitos da pesquisa a identidade de gênero é socialmente construída, portanto é uma categoria concretizada na dinâmica da vida, das relações sociais. E sendo a escola um espaço social de formação consideremos que é também nela que se reproduzem estereótipos que alimentam as desigualdades de gênero. Portanto, também é nela que suas práticas podem desconstruir essas desigualdades, ampliando as possibilidades de uma sociedade que de fato conviva com as diferenças de forma saudável. O estudo aponta que as relações de gênero continuam mediadas pelo machismo e pelo sexismo, como ideologias reproduzidas no imaginário e nas práticas sociais cotidianas, por homens e mulheres, muitas vezes de forma despercebida. A visão predominante sobre ser homem e ser mulher ainda tem forte componente determinista e naturalista, que contribui para a reprodução das desigualdades entre os gêneros. A escola precisa ser vista como espaço importante na redução da desigualdade de gênero. No entanto, sua ação efetiva ainda está muito no plano das idéias, da responsabilização do outrem indefinido. É preciso questionar, provocar reflexão na sala de aula e buscar alternativas de referencias para as crianças e familiares. No entanto, segundo os sujeitos, a maioria não teve isso na educação básica, tendo algum contato com estas questões agora na universidade. Faz-se necessário valorizar, elogiar as diversas crianças, independentemente de suas diferenças, para que todas se sintam fortalecidas, potencializadas, para acreditar em seu potencial. ANAIS DO IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 8 IV FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES: EDUCAÇÃO E RELAÇÕES ETNICORRACIAIS 10 a 12 de novembro de 2010 UFS – Itabaiana/SE, Brasil Para isso faz-se necessário repensar o cotidiano a partir dos seus diversos aspectos, da intervenção educativa, efetiva, dos materiais didático-pedagógicos e da articulação crítica com outras dimensões sociais, tais como a mídia, movimentos sociais, entre outros. REFERÊNCIAS LOURO, Guacira Lopes. A construção escolar das diferenças. In: Gênero, Sexualidade e Educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis, Rio de Janeiro, Vozes, 1997, p. 5787. LOURO, Guacira Lopes. O corpo educado: pedagogias da Sexualidade. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 9-34 LOURO, Guacira Lopes. Currículo, gênero e sexualidade, O “normal”, o “diferente”, e o “excêntrico” IN: Corpo Gênero e Sexualidade: Um debate contemporâneo na educação. Petrópolis RJ. Editora Vozes, 2003, p. 41-52. MEYER, Dragmar Estermann. Gênero e Educação: teoria e política. In: LOURO, Guacira Lopes, NECKEL, Jane. Felipe; GOELLNER, Silvana Vilodre. (Org) Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na educação. Petropolis: Vozes, 2003, p. 9-27. MISKOLCI, Richard. Um corpo estranho na sala de aula. In: ABRAMOWICZ, Anete. SILVÉRIO, Valter Roberto. (orgs). Afirmando diferenças: Montando o quebra-cabeça da diversidade na escola. 1ª ed. Campinas, SP: Papirus, 2005. p.13-26. SILVA, Tomaz Tadeu da. A produção social da identidade e da diferença. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. p. 73-102. 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