Ministério da Justiça CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE Gabinete do Conselheiro Luís Fernando Rigato Vasconcellos Ato de Concentração nº 08012.001336/2004-02 Requerentes: LauritzenCool AB NYK Reefers LTD. Advogados: Ricardo Madrona Saes, Danilo Mininel, Bárbara Nunes e outros. Conselheiro-Relator: Luís Fernando Rigato Vasconcellos. EMENTA: Ato de concentração. Subsunção do ato ao § 3° do artigo 54 da Lei 8.884/94, em função do faturamento das Requerentes. Apresentação tempestiva. Art. 16, Resolução do CADE nº 12/98. Mercado relevante de transporte marítimo refrigerado na rota Brasil/Europa. Convergência dos pareceres da SEAE, da SDE e da ProCADE. Operação incapaz de gerar efeitos anticoncorrenciais. Aprovação sem restrições. VOTO I. DA OPERAÇÃO Trata-se de aquisição de 50%, pela NYK Reefers LTD (“NYK”), de participação societária detida pela LautizenCool AB (“Lauritzen”) no capital social da LauritzenCool Logistics AB. A Lauritzen, de nacionalidade dinamarquesa, pertence integralmente ao grupo J. Lauritzen A/S, também de nacionalidade dinamarquesa. Atua em serviços de transporte de carga perecível e outros serviços para a indústria de transporte frigorífico. No Brasil, a Lauritzen atua por meio da LauritzenCool Logistics do Brasil Ltda, da qual é controladora, e da Brasreefer Services de Importação S.A., da qual é acionista minoritária. 1 A NYK pertence integralmente ao Grupo NYK Line de Tóquio, portanto, de nacionalidade japonesa. Atua no serviço de transporte de carga perecível e outros serviços para a indústria de transporte frigorífico. A submissão da operação ocorreu em função do critério de faturamento dos grupos envolvidos, segundo estabelecido no § 3º, do artigo 54 da Lei nº 8.884/94. II. DA TEMPESTIVIDADE A SDE considerou como primeiro documento vinculativo da operação o Contrato de Ações, fls. 64/74, firmado em 30/01/2204, considerando a apresentação ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) tempestiva, já que apresentada em 20/02/2004. A Procuradoria do CADE, por meio do seu Parecer ProCADE nº 515/2004, observou que não há como afirmar se a apresentação ocorreu dentro do prazo legal de 15 dias úteis, já que não foi informada a data da celebração do primeiro documento vinculativo, mas tão somente o mês de sua celebração. A Requerente LauritzenCool AB informa que o “Share Purchse Agreement” ou Contrato de Compra de Ações foi por ela firmado, juntamente com a Requerente NYK Reefers Ltd., em 31 de janeiro de 2004, como se aduz de análise do Consideranda do “Agreement” ou Contrato firmado pelas requerentes em 29 de março de 2004. Afirma a Requerente que tal documento assinado pelas partes com o intuito de prorrogar o “Completion Date” acordado no Contrato de Compra de Ações, firmado em 31 de janeiro de 2004, constitui documento inequívoco quanto à 2 data de assinatura do Contrato de Compra de Ações, a qual deve ser por este E. CADE assim considerada.1 Aduz, ademais, a Requerente, que da análise da presente operação e dos documentos e informações apresentadas ao SBDC, percebe-se que não há absolutamente qualquer elemento que indique que o Contrato não foi firmado pelas partes na data informada, nem mesmo qualquer razão para que este E. CADE considere a data do Contrato aposta no “Agreement” como sendo diversa da data na qual o Contrato foi assinado. Como já previamente informado a este E. CADE pela Requerente, tal “Agreement” constitui documento existente, válido e eficaz firmando pelas partes, vinculante e inequívoco quanto à data de assinatura do Contrato.2 A Procuradoria do CADE, por meio da Nota Técnica ProCADE nº 255/2004, fls. 205/206, manifestou-se pela tempestividade da apresentação da operação, tendo em vista que a Requerente apresentou petição esclarecendo a data de celebração do Contrato de Compra de Ações como sendo o dia 31 de janeiro de 2004. Ademais, da leitura do referido contrato não se verificou a existência de cláusulas que indiquem a realização do negócio antes desta data, nem tampouco verificou a existência de cláusulas que violem a Lei nº 8.884/94. Pelo exposto, em consonância com a Procuradoria do CADE, considero que o primeiro documento vinculativo da operação foi o instrumento denominado “Contrato de Compra de Ações”, firmado em 31 de janeiro de 2004. O ato foi notificado ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), em 20 de fevereiro de 2004, estando, portanto, dentro do prazo legal de 15 dias, prazo estabelecido no §4º do artigo 54 da Lei 8.884/94, o que caracteriza a tempestividade da apresentação, consoante entendeu a d. SDE e a d. Procuradoria do CADE. 1 2 Fl. 125 dos autos. Fl. 198 dos autos. 3 III. DO PAGAMENTO DA TAXA PROCESSUAL Verifica-se a partir dos comprovantes originais, juntado aos autos, que as Requerentes efetuaram devidamente o pagamento da taxa processual estatuída pela Lei 9.781/99 e regulamentada pela Resolução 25/02 do CADE. IV. DOS MERCADOS RELEVANTES As Requerentes atuam no setor de transporte marítimo refrigerado. A Lauritzen presta esse serviço, no Brasil, somente a partir do porto de Natal, tendo como único destino a Europa. O Grupo NYK, embora atue no mesmo setor, não presta esse serviço no Brasil. Sua atuação no Mercosul restringe-se a transporte dessa natureza com origem/destino na Argentina. Segundo informações das Requerentes1, a LauritzenCool Logistics AB não opera diretamente no Brasil, tendo apenas atuação indireta no mercado brasileiro de prestação de serviços integrados de logística para transporte marítimo refrigerado de produtos perecíveis por meio da LauritzenCool do Brasil Ltda, controlada por ela, e por meio da Brasreefer S.A. Entretanto, devido às peculiaridades do setor de transportes aquaviários e à sua estrutura, cabe esclarecer algumas das atividades desempenhadas pelas Requerentes para melhor definir o mercado relevante em questão. No caso em tela, para a efetiva prestação do serviço de transporte marítimo, além dos requisitos exigidos pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, as Requerentes atuam como armador e agência marítima. 1 Informações constantes na resposta ao Ofício nº 06333/2004/DF/COGSI/SEAE/MF. 4 Esses dois agentes marítimos desempenham atividades complementares e podem ser representados pela mesma empresa ou por empresas distintas.2 O armador é uma pessoa jurídica que realiza o transporte marítimo por meio da operação de navios. É o responsável pela carga que transporta, respondendo por qualquer problema que ocorra com a mercadoria durante o transporte. Para a efetiva prestação de tal serviço, o armador necessita de uma estrutura em terra, em cada porto, servindo como agente intermediário nas relações com seus clientes e representado-o perante as autoridades locais. Tal estrutura é chamada de Agência Marítima, que pode tanto pertencer ao armador quanto ser uma empresa contratada por ele.3 Sendo assim, a Agência é o contato do armador com as autoridades portuárias e órgãos governamentais, servindo de elo de ligação entre o armador e seus clientes, sejam eles importadores ou exportadores. Do ponto de vista do consumidor, a relevância se projeta sobre a atividade de transporte de carga refrigerada, atividade do armador, sendo o agenciamento apenas elo, necessário da cadeia de transporte marítimo como um todo. Neste segmento especializado, de transporte marítimo refrigerado, onde atuam as Requerentes, não há contestabilidade pelo transporte não refrigerado, visto que a carga perecível exige, necessariamente, refrigeração no transporte. Assim, adoto o parecer da SEAE no que diz respeito à delimitação do mercado relevante do produto como o de transporte marítimo refrigerado, 2 Uma discussão detalhada sobre o mercado de transporte marítimo pode ser encontrada em VELASCO, Luciano Otávio Marques de; LIMA, Eriksom Teixeira. As Novas Empresas Mundiais de Navegação Determinam a Evolução dos Portos. Revista BNDES nº 11. Junho de 1999. 3 Vide STEIN, Alex Sandro. Curso de Direito Portuário. Editora LTr. São Paulo; 2002 – pp 167-168. 5 incluídos os navios especializados, que detém câmaras frigoríficas, e os que, embora não possuam câmaras refrigeradas, transportam contêineres refrigerados. No que tange ao mercado relevante geográfico, há que se fazer algumas considerações também. A SEAE, em seu parecer, alega a relativa facilidade de entrada no referido mercado de transporte marítimo de cargas em rotas específicas. Isto porque, para operar ou aumentar sua participação em uma rota, basta ao entrante deslocar navios de outras rotas para as que desejar. Entretanto, para efeito da análise antitruste, o mercado mundial não se mostra adequado em razão da escolha do consumidor estar relativamente restrita, dados os custos de transação e a escala necessária para a atração de entrantes, às empresas que já oferecem espaços em seus navios. A análise também se limitou ao princípio da extraterritorialidade da Lei nº 8.884/94, incluindo as práticas ocorridas no exterior, mas adstrito aos efeitos que possam produzir no território nacional. Nesse sentido, é preciso analisar a parcela do mercado mundial que atende ao Brasil, sem, contudo, igualar a presente análise aos casos em que o mercado relevante geográfico adotado é o mundial porque o consumidor, no Brasil, pode adquirir o bem ou serviço em qualquer parte do globo. Ainda de acordo com a SEAE, se o mercado mundial se mostra amplo demais, mesmo com a possível entrada de novos operadores, deslocando navios de outras rotas, tampouco a análise com rotas de cidade a cidade seria adequada. Isto porque a mobilidade de navios entre portos do Brasil. Como dito anteriormente, somente há sobreposição de rotas cuja origem é no Brasil e tem como destino a Europa. Assim, o mercado relevante 6 geográfico adotado é o das linhas entre o Brasil e a Europa tomados, respectivamente, como origem e destino. V. DA PROBABILIDADE DE EXERCÍCIO DE PODER DE MERCADO Segundo informações fornecidas pelas Requerentes, tendo como fonte citada a Drewry Shipping Consultants, a participação de mercado, das duas empresas em conjunto, não foi superior a 6% (seis por cento) do total transportado. Assim, tendo em vista a baixa participação no referido mercado relevante adotado a operação não caracteriza instrumento suficiente ao exercício unilateral ou coordenado de poder de mercado. VI. CONCLUSÃO Por todo o exposto, voto pelo conhecimento da presente operação, visto que esta se enquadra nos critérios determinados no § 3º do artigo 54 da Lei 8.884/94 e considero-a tempestiva. Tendo em vista o previsto no artigo 16 da Resolução CADE nº 12, posto que os pareceres técnicos da SEAE, da SDE e da Procuradoria do CADE são unívocos no entendimento de que a operação em tela não acarreta efeitos anticompetitivos, nem possibilita o exercício do poder de mercado, voto pela sua aprovação sem restrições. É como voto. Brasília, 19 de janeiro de 2005. Luís Fernando Rigato Vasconcellos Conselheiro do CADE 7