inovação ©diego cervo/PhotoXpress Vamos construir pontes? Maria Carmen* C omo gestora educacional por mais de 20 anos, posso afirmar que a grande maioria dos alunos e professores com os quais interagi queixam-se da ineficiência da escola ou universidade em cumprir verdadeiramente o seu papel como agente de transformação social. Para o aluno, o conhecimento adquirido na escola ou universidade não possui nenhuma conexão com sua vida prática, haja vista que as matrizes curriculares são construídas tendo por base o conhecimento cumulativo. Fato é que o século XX produziu mais conhecimento do que 48 Revista Linha Direta toda a história da humanidade. Além de trabalhar com conhecimento defasado, soma-se o fato de que o saber compartimentado organizado em disciplinas não permite uma formação holística, em que o aluno tenha uma visão global de mundo, nem uma formação utilitarista, aplicada a um campo específico do conhecimento. No dia a dia da gestão escolar, é muito frequente a queixa, por parte dos alunos, de que as disciplinas são descontextualizadas, sem sentido prático e aplicação na vida cotidiana, sendo um dos fatores que mais colaboram com a evasão escolar. Por outro lado, o corpo docente se sente refém de uma matriz curricular em que a produção do conhecimento não reflete necessariamente a solução dos problemas globais, e se sente incapaz de ser um facilitador da construção do conhecimento diante dos avanços da ciência e da tecnologia, os quais tornam obsoleta a maior parte do conhecimento aprendido durante seu curso. As condições ofertadas a um professor da iniciativa privada não lhe permite avançar em sua formação, como deveria ocorrer através do processo da educação continuada. Na nova dinâmica do conhecimento, as metodologias e os modelos de avaliação até então existentes já não respondem mais ao contexto da escola do século XXI. Uma pesquisa realizada recentemente pelo Massachusetts Institute of Technology aponta a fragmentação do conhecimento e a ausência de uma metodologia interdisciplinar como o principal fator impeditivo para que escolas e universidades produzam contextos e ambientes prazerosos na formação do indivíduo, consonantes com o conhecimento produzido em tempo real e com uma visão global das soluções demandadas pelo mundo moderno. Numa perspectiva mais ampla, desenvolver uma sociedade significa transformá-la a partir de suas organizações, instituições, através de seus atores. Nessa acepção, podemos açular a reflexão sobre o papel que a escola ou universidade possa desempenhar na formação de profissionais com uma visão holística, comprometidos com a transformação das organizações e instituições, cujas ações e práticas institucionais poderão resultar na formação de uma sociedade mais sustentável e menos desigual, propondo um modelo interdisciplinar que consiga responder aos desafios dos problemas contemporâneos e às transformações sociais e econômicas de caráter global. Para a implementação de um modelo interdisciplinar, é necessário romper com a estrutura disciplinar clássica, porque o conhecimento tem outra estrutura na atualidade. Segundo Raquel Maria Bevilacqua, “a universidade deve ser um lugar prioritariamente em que se aprende e não se ensina. O aluno aprende porque estuda. Para uma formação mais eficaz não é necessária uma extensa carga horária, portanto, quanto menor a carga horária em sala de aula, melhor para o aluno aprender por experimentação em outros ambientes de aprendizagem. O máximo de quatro disciplinas no quadrimestre e nem todos os créditos cumpridos com aulas, mas com atividades e projetos complementares” (sic). O mesmo se aplica no ensino básico, pois o currículo é composto por disciplinas lineares, quando o mundo não é mais assim. É preciso mudar as linhas mestras que conduzem o currículo. No Brasil, os modelos interdisciplinares, tanto no ensino básico quanto no ensino superior, têm avançado intra-área do conhecimento, em que duas ou mais disciplinas dialogam em torno de projetos integradores. Mas iniciativas interárea do conhecimento ainda são pouco significativas. Para Bursztyn, “alguns cruzamentos disciplinares vão se tornando necessidades evidentes, diante da incapacidade de se responder a questões inquietantes da atua lidade.” Contudo, o aprimoramento das práticas interdisciplinares ainda é um desafio. Tornar nossas instituições mais inovadoras, capacitar o corpo docente para trabalhar de forma dialógica e fazer com que o conhecimento seja aprazível ao aluno é o que nos capacitará a enfrentar uma práxis falida, que vem se arrastando ao longo dos anos. ©iofoto/PhotoXpress A adoção de novos modelos dependerá dos gestores e docentes comprometidos com o desenvolvimento de novas competências, em lugar da exaustiva prática de transmissão de conhecimentos. É fundamental preparar alunos com uma visão crítica e criativa, com capacidade para resolver problemas de variadas ordens do mundo real, compreendendo não apenas o momento histórico no qual estão inseridos, mas também os impactos das futuras soluções que possam ser propostas. *Professora e mestre em Gestão da Inovação www.proinnovare.com.br 50 Revista Linha Direta