Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Paraná
1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO B
JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº200870500173231/PR
RELATOR
RECORRENTE
RECORRIDO
: Juíza Narendra Borges Morales
: UNIÃO FEDERAL
: JULIANA CRISTINA DA LUZ
VOTO
Trata-se de recurso da União contra sentença que julgou parcialmente
procedente o pedido de condenação ao pagamento de danos materiais e morais
decorrentes do cancelamento da prova de concurso público para provimento do cargo
de Agente da Polícia Rodoviária Federal.
A sentença condenou a União ao pagamento de danos materiais no valor
de R$321,95 (trezentos e vinte e um reais e noventa e cinco centavos) referente aos
gastos com passagens de ônibus de ida e volta no trecho entre Curitiba/PR e Campo
Grande/MS e inscrição do concurso e de danos morais no valor de R$3.500,00 (três
mil e quinhentos reais).
A União alega sua ilegitimidade passiva porque a realização do certame
foi atribuída, mediante contrato administrativo, à Fundação Universitária José
Bonifácio, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No mérito, alega que o
cancelamento do certamente teve por origem a Recomendação nº 07/12/2007, advinda
do douto Ministério Público Federal, haja vista a constatação inexorável de quebra
de sigilo do conteúdo das provas objetivas. Afirma a inexistência de responsabilidade
objetiva ou subjetiva. Sustenta não haver dano patrimonial, tampouco dano moral a ser
reparado.
Razões de voto.
Afasto a alegação de ilegitimidade passiva da União porque, como já
decidido pela sentença, ainda que terceiro tenha sido contratado para a realização do
certame, como o cargo em disputa era de Policial Rodoviário Federal, carreira de
Estado, afigura-se inegável a legitimidade passiva da União para responder por
eventuais danos causados a candidato.
No mérito, em processo relativo ao cancelamento do mesmo concurso
(autos nº 2009.70.66.001301-5, relator Juiz Federal José Antonio Savaris, sessão de
julgamento de 15/09/2010), esta 1ª Turma Recursal, por unanimidade, manteve a
sentença que decidiu pela procedência do pedido de indenização por danos materiais
referentes ao valor da inscrição e aos gastos de passagem para o deslocamento ao local
do concurso e pela improcedência do pedido de danos morais. Naquela oportunidade, a
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sentença afastou a condenação em danos morais sob os seguintes fundamentos:
Note-se, por outro lado, que não existe nos autos qualquer prova de que
realmente houve abalo a sua imagem, por qualquer meio que lhe seja
capaz de causar humilhação perante os demais.
Embora, tal acontecimento lhe causou aborrecimentos, este não é motivo
para que gere danos morais, já que alguns dissabores ocorrem
corriqueiramente com qualquer indivíduo, sendo estes normalmente
superados no nosso dia-a-dia.
Destarte, tenho entendido que os infortúnios, corriqueiros da
modernidade e ínsitos da falibilidade da atuação humana, de pronto, não
maculam o que se entende por requisitos necessários à afetação da
personalidade/dignidade/honra do demandante. Não houve, pelos fatos
extraídos dos autos, qualquer situação vexatória que tivesse o condão de
afligir a personalidade do requerente, ao ponto de lhe causar algum mal
somente corrigível através de indenização.
Com efeito, admitindo-se indenizações nesses termos, estaria o Poder
Judiciário privilegiando a banalização do dano moral ao extremo a ponto
de estimular o litígio no seio da sociedade, palco não comum de
arranhões recíprocos e constantes contratempos. Conforme ensina Sérgio
Cavalieri Filho:
só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor,
aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora
da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da
normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os
amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e
duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se
assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral,
ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais
aborrecimentos. (Programa de Responsabilidade Civil, 3ª edição, 2002,
p. 89)
Nesse sentido, o seguinte julgado:
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RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. NOTIFICAÇÃO FEITA
PELO ESTABELECIMENTO BANCÁRIO A CORRENTISTA,
COMUNICANDO-LHE O INTENTO DE NÃO MAIS RENOVAR O
CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. EXERCÍCIO REGULAR
DE UM DIREITO. MERO ABORRECIMENTO INSUSCETÍVEL DE
EMBASAR O PLEITO DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL. - Não há
conduta ilícita quando o agente age no exercício regular de um direito. Mero aborrecimento, dissabor, mágoa, irritação ou sensibilidade
exacerbada estão fora da órbita do dano moral. Recurso especial
conhecido e provido.
(STJ - RESP 303396/PB - DJ: 24/02/2003, p. 238, Relator Min. Barros
Monteiro - sem negritos no original)
É certo que a caracterização da existência ou não de dano moral é
deveras subjetiva, mas deve-se ter em conta a necessidade de tolerância
de algumas ocorrências. E situações como a que motivou a pretensão da
parte autora, não fazem com que a pessoa sinta-se desacreditada ou
envergonhada frente aos demais, atingida em sua honra.
Veja-se que os danos alegados na inicial decorrem única e
exclusivamente da decisão da administração pública que determinou o
cancelamento do concurso e, por conseguinte, a alteração da data para a
realização das provas.
Deste modo, tem-se que a conduta praticada pela União não constitui,
por si só, fato capaz de ensejar a lesão moral no autor, causando-lhe
alterações psíquicas, bem como prejuízos afetivos e sociais, os quais
abalem a sua imagem. O que se vislumbra no caso concreto é que houve
mero sentimento íntimo e natural de insatisfação do demandante, o qual
não possui relevância jurídica ao ponto de acarretar a obrigação do
Estado em indenizar.
Portanto, meros dissabores e aborrecimentos ou decepções não são
suficientes à caracterização do dano moral, razão pela qual o pedido de
reparação nesse aspecto é improcedente.
Por fim, certamente os fatos extraídos dos autos geraram aborrecimentos
e desconforto ao demandante, mas foram incapazes de serem alçados ao
patamar do dano moral indenizável, sob pena, repita-se, de banalização
do instituto. Para alcançar a indenização pretendida deveria o autor
comprovar que foi atingido em seu foro íntimo, tendo sofrido
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constrangimento e humilhação em decorrência dos fatos, o que não
ocorreu, sendo que a prova testemunhal de nada adiantaria para mudar o
convencimento deste magistrado sobre os fatos aventados no feito.
Embora no presente caso a parte autora alegue ter sofrido profundo
abalo, o que resultou inclusive na realização de sessões de psicoterapia, entendo que a
solução no que diz respeito aos danos morais é a mesma daquela já tomada por esta
Turma Recursal. E isso porque, como a própria autora argumenta em seu depoimento
pessoal em juízo, o tratamento psicológico ocorreu aproximadamente 10 meses após a
data de cancelamento da prova (foi apresentado recibo relativo à realização de sete
sessões de psicoterapia – evento 1, OUT11). Nesse sentido, a sentença assim registrou:
não restando comprovado através do depoimento pessoal da autora em audiência
(áudio mp32 e 3), que tenha sido o motivo principal que levou a autora a entrar em
depressão, mas sim, um dos motivos, aliado a livre escolha de vida tomada pela
autora, ao abrir mão de sua profissão, após retornar a residir no país e passar a se
dedicar aos concursos públicos, e demais questionamentos pessoais decorrentes de tal
opção.
Portanto, entendo deva ser afastada a condenação em danos morais,
mantendo a condenação em danos materiais nos termos dispostos pela sentença.
Sem condenação em honorários advocatícios.
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO AO
RECURSO.
Narendra Borges Morales
Juíza Federal Relatora
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