Pensamento Estratégico Organizacional – Origens, Evolução e Principais Influências.
Autoria: Luis Carlos Schneider
Resumo
O presente trabalho descreve a estratégia sob a perspectiva histórica e aplicada nas
organizações empresariais, partindo das origens do termo e apresentando a evolução do seu
uso no meio acadêmico e empresarial ao longo das últimas décadas. O tema estratégia tem
sido alvo de polêmicas no meio acadêmico, principalmente nas pesquisas no campo da
administração. A administração estratégica é uma área cada vez mais pesquisada e estudada.
Para apresentar as origens e a evolução do pensamento estratégico no campo da
administração, descreve-se um histórico a partir de uma pesquisa bibliográfica nas
publicações da área da administração. Conclui-se que, além da importância do tema estratégia
para as organizações, não há uma única definição que melhor apresente esse tema, e que os
conceitos que explicam a estratégia organizacional estão em constante evolução e adaptação,
acompanhando as mudanças organizacionais e do ambiente externo ao longo do tempo.
Palavras-Chave: Administração, Estratégia, Organizações.
1 – Introdução
O presente trabalho descreve a estratégia sob a perspectiva histórica e aplicada nas
organizações empresariais, partindo das origens do termo e apresentando a evolução do seu
uso no meio acadêmico e empresarial ao longo das últimas décadas do século XX e na
primeira década do século XXI. O tema estratégia tem sido alvo de polêmicas no meio
acadêmico, principalmente nas pesquisas no campo da administração, onde diversos autores
apresentaram suas contribuições para a definição e aplicação de modelos. A administração
estratégica é uma área que vem sendo estudada e cada vez mais pesquisada pela importância
acadêmica e empresarial, onde as publicações mais importantes e influentes têm início na
década de 1960, com as transformações ocorridas na economia e nas organizações
empresariais. A questão de pesquisa do artigo é: Como a estratégia desenvolveu-se no campo
de estudos da administração?
A escolha do tema estratégia justifica-se pelo fato de que o desempenho das organizações
normalmente está associado à capacidade de seus gestores de definirem e implantarem
estratégias que as levem a apresentar um desempenho superior diante de seus concorrentes
nos mercados em que atuam.
O objetivo desse artigo é apresentar as origens e a evolução do pensamento estratégico no
campo de estudos da administração nas últimas décadas do século XX e na primeira década
do século XXI a partir de seus principais autores.
Esse artigo está baseado no trabalho de Balestrin (2004), intitulado A evolução histórica do
pensamento estratégico e seus principais debates, e pretende complementar as abordagens
apresentadas naquele trabalho, atualizando o estudo com a apresentação de novos modelos e
paradigmas em discussão. A metodologia usada no desenvolvimento desse artigo foi a
pesquisa bibliográfica, que abrangeu a leitura e análise de livros e artigos científicos
publicados em periódicos da área de administração até o ano de 2012. O artigo está dividido
em 9 seções, e a partir da introdução e da seção 2, aborda o tema estratégia no campo
organizacional dividindo-o historicamente em décadas, dos anos de 1960 até a primeira
década do ano 2000.
1 2 – Antecedentes históricos sobre estratégia
Os primeiros registros sobre estratégia são encontrados nas organizações militares, onde a
palavra strategos, derivada do grego, significa “a arte do general”. Os registros escritos de
SunTzu, sobre a Arte da Guerra, foram publicados em torno de 400 a. C., e atualmente vêm
sendo resgatados pelos executivos em novas publicações. Trata-se de um conjunto de
princípios práticos, elementares, que consideram o contexto, a geografia e as características
do exército inimigo a ser combatido. Um importante tratado sobre estratégia militar,
publicado no século XIX, intitulado Da Guerra, foi escrito pelo general prussiano Carl Von
Clausewitz, que é considerado um dos grandes mestres na arte da guerra, e para quem a
estratégia militar é o emprego de batalhas para obter o fim da guerra. Em seu tratado, Von
Clausewitz faz clara distinção entre o nível estratégico e o nível tático, no qual o nível
estratégico é amplo e abrange o nível tático, sendo a tática uma etapa para a concretização da
vitória total.
Para Quinn apud Mintzberg (2000) a utilização da experiência militar nos negócios indica que
as estratégias eficazes desenvolvem-se em torno de alguns poucos conceitos e golpes-chave,
os quais lhe dão coesão, equilíbrio e foco, e também um “senso de posicionamento contra um
oponente inteligente”. Estratégias empresariais como sondar o concorrente para identificar as
suas forças e fraquezas e, a seguir, concentrar todos os recursos no ataque de uma posição
claramente exposta, indica o uso das boas estratégias militares.
Como lembra Balestrin (2004), o mundo dos negócios é, muitas vezes, mais complexo do que
os campos de batalha, e que as máximas militares tornam-se inadequadas e devem ser vistas
com cuidado. O autor comenta também que, gastar muita energia e tempo na preocupação em
encontrar estratégias e truques para “iludir” o concorrente, pode desviar o foco de uma
organização empresarial, que é atender melhor as necessidades de seus clientes.
No campo da administração, o tema estratégia está ligado à competição entre as organizações
empresariais. Para Rumelt, Schendel e Teece (1994), a concepção da estratégia é considerada
tema de maior preocupação dos altos executivos ou daqueles que procuram razões para o
sucesso ou fracasso das organizações.
3 - A introdução do conceito de estratégia no campo organizacional
A utilização da palavra estratégia no mundo empresarial, antes de meados do século XX era
rara, estando presente, normalmente, em situações de confronto e competição, fazendo
analogia ao contexto militar e político.
Para Vizeu e Gonçalves (2010), a incorporação da palavra estratégia ao universo da gestão
empresarial ocorreu como força de metáfora, compreendendo-se a prática gerencial como
algo similar à prática militar. Além disso, o contexto econômico norte-americano, do final do
séc. XIX, caracterizado pela expansão acelerada das grandes empresas ferroviárias e empresas
de manufatura, foi o cenário que fez surgir a necessidade do pensamento estratégico de forma
explícita e articulada pelos gerentes de alto nível dessas organizações empresariais. Um
exemplo clássico, segundo Balestrin (2004), relacionado à introdução da visão estratégica no
cenário mundial é o do executivo da General Motors (GM), Alfred Sloan Jr., que, entre 1923
e 1946, desenvolveu uma estratégia baseada em forças e fraquezas de sua maior rival, a Ford.
Pode-se dizer que a partir da análise e decisão estratégica de Sloan Jr, a GM criou dois
conceitos inovadores, o de “carro do ano” e o de “portfólio de marcas”.
2 No campo acadêmico os economistas neoclássicos foram os responsáveis em produzir os
primeiros ensaios teóricos sobre estratégia. Ainda na década de 1930, Ronald Coase publicou
“The Nature of the Firm”, um artigo clássico, de 1937, questionando “por que as empresas
existem”, e que teve influência no pensamento econômico e administrativo. Avançando sobre
as ideias da microeconomia neoclássica, Joseph A. Schumpeter apresentou, em seu livro de
1942, uma discussão que defendia a ideia de que a estratégia de negócios abrangia muito mais
do que a fixação de preços.
Na década de 1950, no contexto norte-americano do pós-guerra, de uma economia em alto
crescimento, Kenneth Andrews e outros professores de Harvard, passaram a usar a técnica de
estudos de casos para analisarem as empresas e as estratégias adotadas pelos executivos,
adequando suas empresas ao ambiente externo. Essa análise de “cases” tornou-se por muitos
anos uma das técnicas favoritas para estudar e entender a temática de estratégia no campo da
administração. Andrews (1971) define a estratégia corporativa como o modelo de decisão da
empresa em que são definidos os objetivos, metas, normas e planos, e que delimita as
fronteiras do negócio e da atuação da organização.
No final dessa mesma década, em 1959, Edith Penrose, uma importante autora na área da
economia lança seu livro, A Teoria do Crescimento da Firma. Essa obra é considerada
seminal e influenciou vários autores da administração no pensamento sobre a firma e seu
papel na economia. A autora descreve, entre outras afirmações, que a firma não é uma caixapreta, e que pode ser considerada como um “feixe de recursos”, onde são tomadas decisões
que influenciam o ambiente externo.
Na década de 1960, as discussões nas escolas de administração, principalmente no grupo de
professores de Política de Negócios de Harvard, apontavam para a ideia de que a competência
distintiva de empresas em um cenário competitivo era produzida pelo ajuste entre fatores
internos e externos, e davam-se em torno do modelo iniciado, primeiramente, por Sloan, na
GM, e resgatado por Kenneth Andrews, que focalizava um modelo de formulação de
estratégia que buscava atingir uma adequação entre as capacidades internas e as
possibilidades externas. Esse modelo de análise é conhecido pelo acrônimo de SWOT: a
avaliação dos pontos fortes (Strenghts) e dos pontos fracos da organização (Weaknesses), à
luz das oportunidades (Opportunities) e das ameaças (Threats) em seu ambiente. A estratégia
econômica passou a ser vista como a melhor adequação da empresa em função de seu
ambiente.
Também na década de 1960 surgiu uma grande empresa de consultoria empresarial, a Boston
Consulting Group (BCG), fundada em 1963 por Bruce D. Henderson. Essa década foi
marcada pelas contribuições de duas grandes empresas de consultoria empresarial, a Boston
Consulting Group e a McKinsey & Company na concepção e desenvolvimento da estratégia
empresarial. Apesar das contribuições para o tema no âmbito empresarial, os modelos de
análise e prescrição de estratégias desenvolvidos por essas empresas sofreram várias críticas
por serem extremamente deterministas.
4 – A ascensão dos consultores empresariais na década de 1960
Os anos de 1960 e início dos anos de 1970 foram marcados pelo auge das empresas de
consultoria no campo da estratégia. Um campo fértil para a ascensão dessas empresas foi a
falta de padrões para o pensamento estratégico nas organizações e a diversificação das
grandes corporações em negócios e produtos. Duas dessas empresas de consultoria, a Boston
Consulting Group (BCG) e a McKinsey & Company deram importante contribuição na
concepção de diversos modelos de análise estratégica. A Boston Consulting Group ficou mais
3 conhecida em função de dois modelos amplamente difundidos: a matriz de crescimento e
participação e a curva de experiência.A matriz de crescimento e participação, popularmente
conhecida com a Matriz BCG, era utilizada pela consultoria para analisar o portfólio de
produtos das empresas, e decidir sobre a aplicação de recursos e nos produtos que
apresentassem alta taxa de crescimento ou fossem promessas de retornos em mercados que
permitissem boa participação para a empresa e retornos sobre os investimentos.
Balestrin (2004) relata que, segundo a BCG, para uma empresa ter sucesso ela precisaria ter
um portfólio de produtos com diferentes taxas de crescimento e diferentes participações de
mercado, ou seja, um conjunto equilibrado entre os produtos e o fluxo de caixa da empresa.
Ao analisar uma empresa, a aplicação dessa matriz determinava uma classificação dos
produtos que podiam ser considerados “estrelas”, com alta participação de mercado e alto
potencial de crescimento, garantindo assim o futuro da empresa mediante investimentos;
outros poderiam ser considerados “geradores de caixa”, ou seja, produtos, cujo ciclo de vida
já esteja no estágio de maturação, devendo proporcionar uma alta sobra de caixa, garantindo
assim, fundos para o crescimento futuro. Além dessas duas posições, havia outras duas que
classificavam os produtos que apresentavam possibilidade de sucesso e necessidade de alto
investimento, como “dúvidas”, para tornarem-se “estrelas” e os produtos considerados
“abacaxis”, que deveriam ser abandonados por terem baixa participação de mercado em
mercados com baixo potencial de crescimento.
O modelo conceitual da “curva de experiência”, também utilizada pela Boston Consulting
Group, procurava demonstrar o efeito da experiência em nível de custo dos produtos da
empresa. A promessa da “curva de experiência” era a de que quando aumentava a produção
de um bem qualquer, seu custo caia em uma percentagem constante, apresentando ganhos
pela experiência de produção da empresa em determinado bem. Esse modelo tinha como
premissa que se tudo o mais permanecesse igual, a empresa diminuiria seus custos
constantemente. Conforme comenta Balestrin (2004), em consequência da popularidade dessa
técnica, a obsessão da maioria das empresas norte-americanas nessa década, era tornar-se
grande e lucrar com os efeitos da experiência na produção de bens.
Nessa mesma década a McKinsey & Company desenvolveu também um conceito bastante
conhecido no ambiente acadêmico e empresarial, que é a Matriz Multifatorial. Em 1968, a
General Electric solicitou um estudo para analisar sua estrutura corporativa. Após a análise, a
McKinsey sugeriu que a General Electric deveria adotar o planejamento estratégico e dividir a
corporação em unidades de negócios, um formato diferente do que se apresentava até então. A
partir desse estudo, o modelo de Unidades Estratégicas de Negócio passou a ser adotado em
diversas companhias em todo o mundo. Além disso, a Matriz de Análise Multifatorial, que a
McKinsey concebeu e utilizou para analisar as unidades de negócio da General Electric,
também foi amplamente divulgada e utilizada posteriormente no mundo empresarial e
acadêmico.
O uso do planejamento de portfólio foi muito difundido entre as grandes companhias e
“atingiu” as mentes de muitos executivos. Essa é uma das críticas de Haspeslag (1982), que
observou que o planejamento de portfólio afetou profundamente a forma como os executivos
pensavam sobre a gestão de suas empresas. Posteriormente, em 1979, esse autor realizou uma
pesquisa com empresas da “Fortune 1000” para investigar o impacto do planejamento de
portfólio e suas implicações na administração das corporações, e a partir do qual confirmou
que o modelo de análise de portfólio é bastante comum entre as grandes empresas industriais.
4 Apesar das grandes contribuições para o pensamento estratégico, as empresas de consultoria
sofreram fortes críticas de um dos mais importantes autores no campo da administração,
Mintzberg, que as denominou “butiques de estratégias”. Para esse autor, as empresas de
consultoria simplificaram demasiadamente o pensamento estratégico, resumindo a realidade
de uma organização em uma matriz de dupla entrada, buscando assim as melhores decisões
estratégicas a partir de uma definição, “um melhor caminho”. De forma irônica, a crítica dos
autores sobre o que eles denominam como escola do posicionamento, é que ela foi feita para
os consultores, e que “... eles podem chegar frios, sem nenhum conhecimento em particular de
um negócio, analisar os dados, brincar com um conjunto de estratégias genéricas (os blocos
básicos) sobre um mapa, redigir um relatório, enviar uma fatura e sair.” (MINTZBERG;
AHLSTRAND; LAMPEL, 2000).
Na década de 1960 as grandes corporações passaram a realizar o planejamento estratégico de
maneira formal, quando, influenciadas pelas mudanças externas, incorporaram à sua gestão
essa função administrativa.
5 – O auge do Planejamento Estratégico na década de 1970
No início da década de 1970, o foco dos principais modelos de análise da estratégia
organizacional era nos custos, e havia muito que mudar nessa área. Com o sucesso das
consultorias e a aplicação das matrizes no diagnóstico organizacional criou-se uma forma de
pensar estrategicamente nas organizações empresariais, que de algum modo foi útil para a
evolução dessa forma de pensar nas organizações, principalmente as empresas.
Com a ascensão das consultorias empresariais e das grandes empresas com estruturas
verticalizadas e multidivisionais, as “M-forms”, a aplicação do modelo da curva de custos e
experiência fazia muito sentido. Um dos mais importantes autores a descrever as
características e a influência das grandes corporações, de estrutura verticalizada foi Alfred
Chandler, com a publicação de seu livro “Strategy and Structure”, em 1976. Chandler
continua sendo citado atualmente nos debates sobre estratégia, principalmente pela
importância de seus estudos, em que evidencia que, na maioria dos casos, a estrutura de uma
organização se adapta ou segue a estratégia por ela definida.
De acordo com Balestrin (2004), a década de 1970 foi representada pelo ápice do
planejamento estratégico empresarial. Uma das principais obras que influenciou as
organizações empresariais foi o livro “Corporate Strategy”, de H. Igor Ansoff, publicado em
1965. Para esse autor, a estratégia seria resultado de um processo racional e analítico, formal e
consciente de planejamento desenvolvido na empresa, onde usando-se uma série de técnicas
analíticas, primeiramente deveriam ser fixadas as metas e desenvolvidas as alternativas. Após
o uso de técnicas analíticas deveria ser feita uma escolha entre as alternativas. Dois conceitos
importantes, usados por Ansoff (1965) podem ser destacados: a “análise da disparidade”, que
segue as técnicas analíticas de elementos internos e externos à organização, e o conceito de
sinergia, que “deve ocorrer quando a empresa busca uma postura de produto-mercado com
um desempenho combinado que seja maior que a soma de suas partes” (MINTZBERG,
2007). Esse conceito de sinergia posteriormente tornou-se amplamente difundido em
administração. Nas escolas da estratégia, descritas por Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000),
essa obra poderia ser classificada dentro da escola do planejamento, como um modelo
prescritivo.
Para criticar a forma como o planejamento estratégico estava sendo usado pelas empresas,
Mintzberg, em seu artigo “The Fall and Rise of Strategic Planning”, publicado em 1994 na
5 Harvard Business Review, apontou as falácias do planejamento estratégico e alguns
problemas que vinham acontecendo, como: a alta sofisticação do planejamento estratégico, o
excesso de formalização, a estática, o confronto entre a direção das empresas e os
planejadores, e a falta de ligação entre planejamento e execução, pensamento e ação,
planejadores e executores. É importante destacar que essa crítica de Mintzberg não era contra
o planejamento estratégico em si, como um processo de administração, mas como esse
processo estava sendo conduzido nas organizações, afastando-se do seu verdadeiro propósito.
O planejamento é uma função administrativa, e o planejamento estratégico tem seu valor
reconhecido pelo meio acadêmico e pelas organizações, de todos os tipos e estruturas. As
condições que podem tornar o processo de planejamento estratégico importante para a
organização que o realiza é a participação de todos, a flexibilidade durante o processo, a
reflexão e o aprendizado pela organização e por todos que participam desse processo.
6 – Década de 1980: Porter está no centro do debate
A década de 1980 foi marcada pela hipercompetição nos Estados Unidos, e os modelos de
decisão sobre estratégia organizacional pareciam estar ultrapassados, se comparados com as
mudanças que ocorreram nas duas décadas anteriores. A partir de seus estudos em economia
na década de 1970, Michael Porter lança, em 1980, o livro “Competitive Strategy”, que
passou a ser utilizado em larga escala nas universidades de negócios e pelas grandes
corporações, tornando-se o centro dos debates sobre estratégia empresarial. A proposta de
Porter nesse livro é deque, a partir de uma análise sistemática em uma indústria, expressão do
inglês “industry” para “setor econômico”, uma organização poderia escolher uma estratégia
para ser seguida. Diante desse raciocínio, Porter sugere que, para que uma empresa alcance
uma rentabilidade superior e sustentável ao longo do tempo, deverá escolher uma posição em
sua indústria, defendendo-se das forças que diminuem a capacidade competitiva da empresa e
consequentemente, sua rentabilidade. Para analisar a atratividade da indústria o autor
concebeu o “modelo de análise de indústria baseados em cinco forças competitivas”. Esse
modelo busca diagnosticar as ameaças e oportunidades de uma indústria, em termos de
lucratividade, a partir da análise dos seguintes fatores:
- Ameaça de Novos Entrantes – é a ameaça representada pela facilidade de novos
concorrentes entrarem em uma determinada indústria;
- Intensidade da Rivalidade entre Empresas Concorrentes – é representado pelo grau de
competição entre as empresas existentes, que conforme o tipo de indústria, essa competição
poderá ser uma guerra aberta ou uma diplomacia pacífica.
- Poder de Barganha dos Fornecedores – é representado pela capacidade de barganha de um
fornecedor em relação à empresa. Isso poderá deixar a empresa em desvantagem nos
processos de negociação com tal fornecedor;
- Poder de Barganha dos Clientes da Empresa – é representado pela capacidade dos clientes
imporem suas próprias condições num processo de compra;
- Ameaça de Produtos Substitutos – é a facilidade de substituição dos produtos de
determinada indústria por outros similares no mercado;
Para o autor essas cinco forças determinam a rivalidade e competitividade de uma indústria,
pelo fato de influenciarem os preços, os custos e os investimentos necessários das empresas.
Deve-se lembrar que, para Porter, a competitividade em uma indústria é uma questão central
6 para a escolha estratégica, pois quanto maior for a rivalidade, menor será a lucratividade das
empresas que dela fizerem parte.
Como citado anteriormente, o modelo de análise de indústria e da concorrência, sugerido por
Porter (1986), é a base para a escolha de uma estratégia competitiva, que para o autor é a
escolha de uma posição dentro da indústria em que a empresa compete ou irá competir. O
modelo das estratégicas genéricas de Porter oferece três estratégias genéricas para alcançar
um desempenho acima da média numa indústria:
- Liderança em custos – essa estratégia é realizada a partir do ganho de experiência, do
investimento em instalações para produção em grande escala e da monitoração cuidadosa dos
custos organizacionais.
- Diferenciação – desenvolvimento de produtos ou serviços únicos. Para Porter (1986) a
diferenciação poderá ser alcançada de duas formas: tornar-se singular num produto ou
atividade; ou na reconfiguração de sua cadeia de valores. O autor também argumenta que
somente existirá vantagem competitiva em diferenciação se essa for permanentemente
percebida pelo cliente e que o concorrente não possa imitá-la.
- Foco – essa estratégia procura atender segmentos de mercados específicos. O foco poderá
ser na diferenciação ou na liderança em custo.
Para Porter, a empresa necessitará fazer uma única opção dentre essas três estratégias
genéricas. A falta de escolha, ou a tentativa de ser “tudo para todos” é uma receita para a
mediocridade estratégica e desempenho abaixo da média do setor, de acordo com o autor.
Em meados de 1980, Michael Porter lança outra obra importante e de grande influência,
“Competitive Advantage”, ou Vantagem Competitiva, em 1985. Nessa obra, Porter avança
sobre a ideia de criação de valor na busca de vantagem competitiva pelas empresas, e
descreve o uso de uma ferramenta de análise do sistema de atividades de uma organização,
para identificar as fontes de vantagem competitiva e permitir à organização escolher uma
posição em sua indústria e alcançar a vantagem competitiva. Com a introdução da Cadeia de
Valor, foi possível decompor em atividades o que uma empresa realizava, da compra de
matéria-prima até a entrega do produto final e dos serviços prestados pela empresa, cada qual
com sua contribuição para a criação de valor e margem, tendo como objetivo o alcance da
vantagem competitiva.
O modelo da nova organização industrial (new industrial organization) é um dos modelos
conceituais mais difundidos para a análise da vantagem competitiva. Os pioneiros da análise
SCP (Structure-Conduct-Performance), ou Estrutura-Conduta-Desempenho, baseada na
estrutura da indústria foram Edward Mason e Joe Bain. Nessa forma de análise, o
desempenho das firmas em uma indústria depende do comportamento dos compradores e
vendedores no que se refere a fixação de preços, níveis de cooperação tácita e competição,
políticas de pesquisa e desenvolvimento, investimentos, etc. (VASCONCELOS; CYRINO,
2000). Assim, no modelo SCP, o comportamento das firmas é definido pela estrutura da
indústria, e o desempenho econômico dessas firmas é resultado direto de seu comportamento
concorrencial em termos de fixação de preços e custos. É importante destacar que os trabalhos
de Mason e Bain visavam explicar e analisar a lucratividades dos oligopólios com o objetivo
de implantar políticas de promoção da concorrência (anti-trust).
7 Considerando o papel determinante da estrutura industrial para essa corrente teórica, os
pesquisadores da economia industrial, como Porter, tendem a ignorar os aspectos
organizacionais da estratégia empresarial (VASCONCELOS; CYRINO, 2000).
A partir de uma corrente teórica oposta à SCP e os pesquisadores da economia industrial, em
1984 foi publicado o artigo de Birger Wernerfelt, “The Resource-Based View of the Firm”, A
Visão Baseada nos Recursos da Firma, e que teve uma segunda edição dez anos depois (em
1995). Trata-se de um artigo seminal, premiado na academia e que teve sua importância
reconhecida posteriormente, quando Hamel e Prahalad publicaram seus artigos sobre
capacidades dinâmicas, a partir de 1990.
Conforme já citado, para Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), a estratégia como posição é
uma das formas de se definir estratégia nas organizações e a escola do posicionamento, assim
definida por esses autores, abriu grandes caminhos para a pesquisa e forneceu um poderoso
conjunto de conceitos à prática.
7 – A década de 1990: o debate é ampliado
No início da década de 1990, várias publicações ampliaram o debate no campo da estratégia
organizacional. No final da década de 1980, Dierickx e Cool (1989) trazem de volta o tema
“recursos”, em seu artigo de 1989. Os autores afirmam que um conjunto de recursos devem
ser desenvolvidos pelas empresas para alcançar e sustentar uma posição competitiva favorável
no mercado. A estratégia organizacional baseada nos recursos distintivos tem como principais
autores, além de Wernerfelt, Hamel e Prahalad (1994) com o artigo “Competing for the
Future” e Barney (1991) com um dos seus mais importantes artigos, “Firm Resources and
Sustained Competitive Advantage”, publicado no Journal of Management. A discussão
também se dava em torno da criação de vantagem competitiva através da criação e exploração
de recursos e capacitações dinâmicas em ambientes de alta mudança tecnológica (TEECE;
PISANO; SHUEN, 1997).
Conforme já citado anteriormente, em 1998, Mintzberg, Ahlstrand e Lampel publicam a obra
Safári de Estratégia e trazem uma importante apreciação crítica das principais publicações no
campo de estudos em estratégia no século XX. Trata-se de uma ampla revisão da literatura
sobre administração estratégica e proposição de agrupamento de autores, correntes teóricas e
modelos de estratégias organizacionais em 10 escolas, que são dez pontos de vista distintos e
que tem ligação direta com a prática gerencial.
Mintzberg (1987, 2000) e Mintzberg et al (2006) definem grupos distintos de formação de
estratégias nas organizações, que são as estratégias deliberadas e as estratégias emergentes.
Essa definição deve partir, segundo os autores, de uma “intenção” estratégica, que faz parte de
um processo. Essa intenção pode produzir definições a priori sobre os rumos das
organizações, ligadas a um processo formal, prescritivo e controlado para que se alcance
aquilo que foi definido. A maior parte dos estudos acadêmicos sobre estratégia organizacional
estão dentro desse paradigma, podendo-se citar autores como Ansoff e Porter, e as empresas
de consultoria, Boston Consulting Group e McKinsey.
O outro grupo a que se refere Mintzberg, quando trata do processo de formação de estratégias
organizacionais, entende a intenção estratégica como um processo emergente, considerando
que a maioria das organizações formam suas estratégias ao longo do tempo, e que o que a
maioria das organizações realizam não é exatamente aquilo que elas pretendiam
antecipadamente. Dentro desse paradigma encontram-se autores como o próprio Mintzberg,
Quinn e Hamel e Prahalad.
8 Para Mintzberg (1994), é pertinente afirmar que nenhuma estratégia pode ser totalmente
deliberada ou totalmente emergente: a primeira, por não sugerir o aprendizado na
organização; e a segunda, por não sugerir o controle. Todas as estratégias necessitam seguir
um mesmo caminho, atentando para o controle sem bloquear o processo de aprendizado.
Nesse entendimento, estratégia pode ser considerada como o resultado do comportamento da
organização, através de suas ações ao longo do tempo.
De maneira geral, a década de 1990 caracterizou-se pela ampliação dos debates em torno do
tema estratégia, com um maior espaço para perspectivas bem menos racionais e prescritivas
de como as estratégias devem ser concebidas, as quais sinalizam outras formas de olhar para a
administração estratégica.
8 – Anos 2000 e a emergência de novas formas organizacionais
A década de 1990 caracterizou-se pela ampliação dos debates em torno do tema estratégia no
campo da administração, devido, principalmente às mudanças socioeconômicas, causadas
pela expansão de mercados com a abertura de fronteiras comerciais entre países, mudanças
tecnológicas e o aumento das trocas de informações. A competição entre empresas, no modo
tradicional passou a modificar-se, e permanece em transformação.
Essa transformação está fazendo emergir novas formas organizacionais, em que as relações
entre organizações, como um campo a ser desenvolvido na administração, fez reaparecer
temas como as redes de cooperação, que há décadas já eram exploradas por empresas
italianas, e a cooperação entre organizações, principalmente entre fornecedores e
compradores, como resposta necessária aos desafios impostos pela tecnologia além da
inovação, que já faz parte das funções organizacionais há algumas décadas e atualmente é
amplamente discutida no meio acadêmico e empresarial, face à busca de novas alternativas.
A emergência desses novos desafios e formatos de relação externa das organizações rompeu
definitivamente com o “velho” modelo de negócios, da empresa verticalizada, da ênfase nos
custos e alta escala como fonte de ganhos, trazendo também a necessidade de um pensar
estratégico amplo, com o olhar para fora da organização. As firmas estão diminuindo suas
fronteiras e participando de formas de colaboração que não lembram as subcontratações, nem
a forma integrada verticalmente (POWELL, 1990).
No campo da administração, a estratégia passa a ser analisada não somente no âmbito interno
da organização, mas nas relações interorganizacionais. Alguns autores, que já haviam feito
suas contribuições nas décadas anteriores, passaram a ser considerados novamente para os
estudos e análises das estratégias organizacionais frente aos desafios do século XXI.
Temas como coopetição, apresentado por Nalebuff e Brandenburger (1997), que nas
organizações coloca-se como o desafio de desenvolver estratégias competitivas e cooperativas
simultaneamente, e co-criação e colaboração citados por McAfee (2006) e Prahalad e
Ramaswamy (2004), são as novas formas de criação de valor, e que exigem também das
organizações novas formas de pensar suas estratégias.
Voltando aos desafios enfrentados pelos gestores das organizações, atualmente, pode-se
entender que há uma “constante adaptação do foco estratégico por meio das relações e
parcerias interorganizacionais e da forma com que essas relações são construídas econômica e
socialmente” (BULGACOV; BULGACOV, 2009).
9 Na busca de melhores resultados e na incerteza das mudanças no ambiente externo à
organização, com a complexidade e as mudanças constantes, poucas organizações conseguem
manter-se competitivas sem desenvolver inter-relações com outras organizações, assim, as
organizações não devem ser vistas de forma isolada, mas dependentes de relações
interorganizacionais.
9 – Considerações finais
Após analisar a evolução dos estudos e publicações sobre estratégia organizacional nas
últimas décadas do século XX e na primeira década do século XXI, identificou-se que esse
tema é amplo, está em constante evolução e tem gerado controvérsias entre autores, pois não
há uma definição para o tema e os múltiplos olhares e debates têm contribuído para enriquecer
os estudos nessa área.
Inicialmente, o processo de criação de estratégias organizacionais foi levado a uma
formalização que o transformou em prescritivo, e, a partir disso, novos paradigmas
emergiram, como o paradigma funcionalista, que domina até hoje a forma como a estratégia
organizacional é concebida.
A formação das estratégias organizacionais, vista como um processo formal e prescritivo, em
que seguir uma fórmula, passo-a-passo, deveria levar a organização e seus gestores a
“fabricar” uma estratégia, está muito presente nas organizações. Esse processo de
“fabricação” de estratégia ocorre de forma sistemática: o primeiro passo é a análise dos
ambientes, identificando a influência das variáveis que compõem esses ambientes, interno e
externo(s) e as oportunidades estratégicas. A partir dessa análise são feitas as escolhas das
estratégias que mais se adaptam a empresa e são definidos os controles que deverão garantir
que a(s) estratégia(s) escolhida(s) pela empresa sejam perseguidas e alcançadas.
Na opinião de Balestrin (2004), essa visão sobre o processo de estratégia esqueceu por um
longo período, que, tanto o ambiente externo, quanto à própria organização caracterizam-se
pela complexidade, pela incerteza e que as informações que os executivos dispõem são muito
mais ambíguas e limitadas do que precisas.
Não há consenso na literatura sobre qual é a essência da estratégia empresarial, mas sim,
várias definições ambíguas e tentativas de explicar estruturas organizacionais e formas de
pensar a administração. O termo estratégia, como campo de estudos, é amplo e o contexto
organizacional contemporâneo apresenta-se cada vez mais complexo, seguindo em constante
transformação, e apresentando, para quem dele participa como organização empresarial ou
como pesquisador, infinitas possibilidades de pesquisa.
Vizeu e Gonçalves (2010) entendem que uma das maiores contribuições que a área de
estratégia empresarial pode oferecer para a formação do gestor seja a de prover-lhe uma nova
forma de enxergar o mundo dos negócios, bem como a maneira como ele lida com as
diferentes práticas de gestão em diferentes contextos.
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