Pensamento Estratégico Organizacional – Origens, Evolução e Principais Influências. Autoria: Luis Carlos Schneider Resumo O presente trabalho descreve a estratégia sob a perspectiva histórica e aplicada nas organizações empresariais, partindo das origens do termo e apresentando a evolução do seu uso no meio acadêmico e empresarial ao longo das últimas décadas. O tema estratégia tem sido alvo de polêmicas no meio acadêmico, principalmente nas pesquisas no campo da administração. A administração estratégica é uma área cada vez mais pesquisada e estudada. Para apresentar as origens e a evolução do pensamento estratégico no campo da administração, descreve-se um histórico a partir de uma pesquisa bibliográfica nas publicações da área da administração. Conclui-se que, além da importância do tema estratégia para as organizações, não há uma única definição que melhor apresente esse tema, e que os conceitos que explicam a estratégia organizacional estão em constante evolução e adaptação, acompanhando as mudanças organizacionais e do ambiente externo ao longo do tempo. Palavras-Chave: Administração, Estratégia, Organizações. 1 – Introdução O presente trabalho descreve a estratégia sob a perspectiva histórica e aplicada nas organizações empresariais, partindo das origens do termo e apresentando a evolução do seu uso no meio acadêmico e empresarial ao longo das últimas décadas do século XX e na primeira década do século XXI. O tema estratégia tem sido alvo de polêmicas no meio acadêmico, principalmente nas pesquisas no campo da administração, onde diversos autores apresentaram suas contribuições para a definição e aplicação de modelos. A administração estratégica é uma área que vem sendo estudada e cada vez mais pesquisada pela importância acadêmica e empresarial, onde as publicações mais importantes e influentes têm início na década de 1960, com as transformações ocorridas na economia e nas organizações empresariais. A questão de pesquisa do artigo é: Como a estratégia desenvolveu-se no campo de estudos da administração? A escolha do tema estratégia justifica-se pelo fato de que o desempenho das organizações normalmente está associado à capacidade de seus gestores de definirem e implantarem estratégias que as levem a apresentar um desempenho superior diante de seus concorrentes nos mercados em que atuam. O objetivo desse artigo é apresentar as origens e a evolução do pensamento estratégico no campo de estudos da administração nas últimas décadas do século XX e na primeira década do século XXI a partir de seus principais autores. Esse artigo está baseado no trabalho de Balestrin (2004), intitulado A evolução histórica do pensamento estratégico e seus principais debates, e pretende complementar as abordagens apresentadas naquele trabalho, atualizando o estudo com a apresentação de novos modelos e paradigmas em discussão. A metodologia usada no desenvolvimento desse artigo foi a pesquisa bibliográfica, que abrangeu a leitura e análise de livros e artigos científicos publicados em periódicos da área de administração até o ano de 2012. O artigo está dividido em 9 seções, e a partir da introdução e da seção 2, aborda o tema estratégia no campo organizacional dividindo-o historicamente em décadas, dos anos de 1960 até a primeira década do ano 2000. 1 2 – Antecedentes históricos sobre estratégia Os primeiros registros sobre estratégia são encontrados nas organizações militares, onde a palavra strategos, derivada do grego, significa “a arte do general”. Os registros escritos de SunTzu, sobre a Arte da Guerra, foram publicados em torno de 400 a. C., e atualmente vêm sendo resgatados pelos executivos em novas publicações. Trata-se de um conjunto de princípios práticos, elementares, que consideram o contexto, a geografia e as características do exército inimigo a ser combatido. Um importante tratado sobre estratégia militar, publicado no século XIX, intitulado Da Guerra, foi escrito pelo general prussiano Carl Von Clausewitz, que é considerado um dos grandes mestres na arte da guerra, e para quem a estratégia militar é o emprego de batalhas para obter o fim da guerra. Em seu tratado, Von Clausewitz faz clara distinção entre o nível estratégico e o nível tático, no qual o nível estratégico é amplo e abrange o nível tático, sendo a tática uma etapa para a concretização da vitória total. Para Quinn apud Mintzberg (2000) a utilização da experiência militar nos negócios indica que as estratégias eficazes desenvolvem-se em torno de alguns poucos conceitos e golpes-chave, os quais lhe dão coesão, equilíbrio e foco, e também um “senso de posicionamento contra um oponente inteligente”. Estratégias empresariais como sondar o concorrente para identificar as suas forças e fraquezas e, a seguir, concentrar todos os recursos no ataque de uma posição claramente exposta, indica o uso das boas estratégias militares. Como lembra Balestrin (2004), o mundo dos negócios é, muitas vezes, mais complexo do que os campos de batalha, e que as máximas militares tornam-se inadequadas e devem ser vistas com cuidado. O autor comenta também que, gastar muita energia e tempo na preocupação em encontrar estratégias e truques para “iludir” o concorrente, pode desviar o foco de uma organização empresarial, que é atender melhor as necessidades de seus clientes. No campo da administração, o tema estratégia está ligado à competição entre as organizações empresariais. Para Rumelt, Schendel e Teece (1994), a concepção da estratégia é considerada tema de maior preocupação dos altos executivos ou daqueles que procuram razões para o sucesso ou fracasso das organizações. 3 - A introdução do conceito de estratégia no campo organizacional A utilização da palavra estratégia no mundo empresarial, antes de meados do século XX era rara, estando presente, normalmente, em situações de confronto e competição, fazendo analogia ao contexto militar e político. Para Vizeu e Gonçalves (2010), a incorporação da palavra estratégia ao universo da gestão empresarial ocorreu como força de metáfora, compreendendo-se a prática gerencial como algo similar à prática militar. Além disso, o contexto econômico norte-americano, do final do séc. XIX, caracterizado pela expansão acelerada das grandes empresas ferroviárias e empresas de manufatura, foi o cenário que fez surgir a necessidade do pensamento estratégico de forma explícita e articulada pelos gerentes de alto nível dessas organizações empresariais. Um exemplo clássico, segundo Balestrin (2004), relacionado à introdução da visão estratégica no cenário mundial é o do executivo da General Motors (GM), Alfred Sloan Jr., que, entre 1923 e 1946, desenvolveu uma estratégia baseada em forças e fraquezas de sua maior rival, a Ford. Pode-se dizer que a partir da análise e decisão estratégica de Sloan Jr, a GM criou dois conceitos inovadores, o de “carro do ano” e o de “portfólio de marcas”. 2 No campo acadêmico os economistas neoclássicos foram os responsáveis em produzir os primeiros ensaios teóricos sobre estratégia. Ainda na década de 1930, Ronald Coase publicou “The Nature of the Firm”, um artigo clássico, de 1937, questionando “por que as empresas existem”, e que teve influência no pensamento econômico e administrativo. Avançando sobre as ideias da microeconomia neoclássica, Joseph A. Schumpeter apresentou, em seu livro de 1942, uma discussão que defendia a ideia de que a estratégia de negócios abrangia muito mais do que a fixação de preços. Na década de 1950, no contexto norte-americano do pós-guerra, de uma economia em alto crescimento, Kenneth Andrews e outros professores de Harvard, passaram a usar a técnica de estudos de casos para analisarem as empresas e as estratégias adotadas pelos executivos, adequando suas empresas ao ambiente externo. Essa análise de “cases” tornou-se por muitos anos uma das técnicas favoritas para estudar e entender a temática de estratégia no campo da administração. Andrews (1971) define a estratégia corporativa como o modelo de decisão da empresa em que são definidos os objetivos, metas, normas e planos, e que delimita as fronteiras do negócio e da atuação da organização. No final dessa mesma década, em 1959, Edith Penrose, uma importante autora na área da economia lança seu livro, A Teoria do Crescimento da Firma. Essa obra é considerada seminal e influenciou vários autores da administração no pensamento sobre a firma e seu papel na economia. A autora descreve, entre outras afirmações, que a firma não é uma caixapreta, e que pode ser considerada como um “feixe de recursos”, onde são tomadas decisões que influenciam o ambiente externo. Na década de 1960, as discussões nas escolas de administração, principalmente no grupo de professores de Política de Negócios de Harvard, apontavam para a ideia de que a competência distintiva de empresas em um cenário competitivo era produzida pelo ajuste entre fatores internos e externos, e davam-se em torno do modelo iniciado, primeiramente, por Sloan, na GM, e resgatado por Kenneth Andrews, que focalizava um modelo de formulação de estratégia que buscava atingir uma adequação entre as capacidades internas e as possibilidades externas. Esse modelo de análise é conhecido pelo acrônimo de SWOT: a avaliação dos pontos fortes (Strenghts) e dos pontos fracos da organização (Weaknesses), à luz das oportunidades (Opportunities) e das ameaças (Threats) em seu ambiente. A estratégia econômica passou a ser vista como a melhor adequação da empresa em função de seu ambiente. Também na década de 1960 surgiu uma grande empresa de consultoria empresarial, a Boston Consulting Group (BCG), fundada em 1963 por Bruce D. Henderson. Essa década foi marcada pelas contribuições de duas grandes empresas de consultoria empresarial, a Boston Consulting Group e a McKinsey & Company na concepção e desenvolvimento da estratégia empresarial. Apesar das contribuições para o tema no âmbito empresarial, os modelos de análise e prescrição de estratégias desenvolvidos por essas empresas sofreram várias críticas por serem extremamente deterministas. 4 – A ascensão dos consultores empresariais na década de 1960 Os anos de 1960 e início dos anos de 1970 foram marcados pelo auge das empresas de consultoria no campo da estratégia. Um campo fértil para a ascensão dessas empresas foi a falta de padrões para o pensamento estratégico nas organizações e a diversificação das grandes corporações em negócios e produtos. Duas dessas empresas de consultoria, a Boston Consulting Group (BCG) e a McKinsey & Company deram importante contribuição na concepção de diversos modelos de análise estratégica. A Boston Consulting Group ficou mais 3 conhecida em função de dois modelos amplamente difundidos: a matriz de crescimento e participação e a curva de experiência.A matriz de crescimento e participação, popularmente conhecida com a Matriz BCG, era utilizada pela consultoria para analisar o portfólio de produtos das empresas, e decidir sobre a aplicação de recursos e nos produtos que apresentassem alta taxa de crescimento ou fossem promessas de retornos em mercados que permitissem boa participação para a empresa e retornos sobre os investimentos. Balestrin (2004) relata que, segundo a BCG, para uma empresa ter sucesso ela precisaria ter um portfólio de produtos com diferentes taxas de crescimento e diferentes participações de mercado, ou seja, um conjunto equilibrado entre os produtos e o fluxo de caixa da empresa. Ao analisar uma empresa, a aplicação dessa matriz determinava uma classificação dos produtos que podiam ser considerados “estrelas”, com alta participação de mercado e alto potencial de crescimento, garantindo assim o futuro da empresa mediante investimentos; outros poderiam ser considerados “geradores de caixa”, ou seja, produtos, cujo ciclo de vida já esteja no estágio de maturação, devendo proporcionar uma alta sobra de caixa, garantindo assim, fundos para o crescimento futuro. Além dessas duas posições, havia outras duas que classificavam os produtos que apresentavam possibilidade de sucesso e necessidade de alto investimento, como “dúvidas”, para tornarem-se “estrelas” e os produtos considerados “abacaxis”, que deveriam ser abandonados por terem baixa participação de mercado em mercados com baixo potencial de crescimento. O modelo conceitual da “curva de experiência”, também utilizada pela Boston Consulting Group, procurava demonstrar o efeito da experiência em nível de custo dos produtos da empresa. A promessa da “curva de experiência” era a de que quando aumentava a produção de um bem qualquer, seu custo caia em uma percentagem constante, apresentando ganhos pela experiência de produção da empresa em determinado bem. Esse modelo tinha como premissa que se tudo o mais permanecesse igual, a empresa diminuiria seus custos constantemente. Conforme comenta Balestrin (2004), em consequência da popularidade dessa técnica, a obsessão da maioria das empresas norte-americanas nessa década, era tornar-se grande e lucrar com os efeitos da experiência na produção de bens. Nessa mesma década a McKinsey & Company desenvolveu também um conceito bastante conhecido no ambiente acadêmico e empresarial, que é a Matriz Multifatorial. Em 1968, a General Electric solicitou um estudo para analisar sua estrutura corporativa. Após a análise, a McKinsey sugeriu que a General Electric deveria adotar o planejamento estratégico e dividir a corporação em unidades de negócios, um formato diferente do que se apresentava até então. A partir desse estudo, o modelo de Unidades Estratégicas de Negócio passou a ser adotado em diversas companhias em todo o mundo. Além disso, a Matriz de Análise Multifatorial, que a McKinsey concebeu e utilizou para analisar as unidades de negócio da General Electric, também foi amplamente divulgada e utilizada posteriormente no mundo empresarial e acadêmico. O uso do planejamento de portfólio foi muito difundido entre as grandes companhias e “atingiu” as mentes de muitos executivos. Essa é uma das críticas de Haspeslag (1982), que observou que o planejamento de portfólio afetou profundamente a forma como os executivos pensavam sobre a gestão de suas empresas. Posteriormente, em 1979, esse autor realizou uma pesquisa com empresas da “Fortune 1000” para investigar o impacto do planejamento de portfólio e suas implicações na administração das corporações, e a partir do qual confirmou que o modelo de análise de portfólio é bastante comum entre as grandes empresas industriais. 4 Apesar das grandes contribuições para o pensamento estratégico, as empresas de consultoria sofreram fortes críticas de um dos mais importantes autores no campo da administração, Mintzberg, que as denominou “butiques de estratégias”. Para esse autor, as empresas de consultoria simplificaram demasiadamente o pensamento estratégico, resumindo a realidade de uma organização em uma matriz de dupla entrada, buscando assim as melhores decisões estratégicas a partir de uma definição, “um melhor caminho”. De forma irônica, a crítica dos autores sobre o que eles denominam como escola do posicionamento, é que ela foi feita para os consultores, e que “... eles podem chegar frios, sem nenhum conhecimento em particular de um negócio, analisar os dados, brincar com um conjunto de estratégias genéricas (os blocos básicos) sobre um mapa, redigir um relatório, enviar uma fatura e sair.” (MINTZBERG; AHLSTRAND; LAMPEL, 2000). Na década de 1960 as grandes corporações passaram a realizar o planejamento estratégico de maneira formal, quando, influenciadas pelas mudanças externas, incorporaram à sua gestão essa função administrativa. 5 – O auge do Planejamento Estratégico na década de 1970 No início da década de 1970, o foco dos principais modelos de análise da estratégia organizacional era nos custos, e havia muito que mudar nessa área. Com o sucesso das consultorias e a aplicação das matrizes no diagnóstico organizacional criou-se uma forma de pensar estrategicamente nas organizações empresariais, que de algum modo foi útil para a evolução dessa forma de pensar nas organizações, principalmente as empresas. Com a ascensão das consultorias empresariais e das grandes empresas com estruturas verticalizadas e multidivisionais, as “M-forms”, a aplicação do modelo da curva de custos e experiência fazia muito sentido. Um dos mais importantes autores a descrever as características e a influência das grandes corporações, de estrutura verticalizada foi Alfred Chandler, com a publicação de seu livro “Strategy and Structure”, em 1976. Chandler continua sendo citado atualmente nos debates sobre estratégia, principalmente pela importância de seus estudos, em que evidencia que, na maioria dos casos, a estrutura de uma organização se adapta ou segue a estratégia por ela definida. De acordo com Balestrin (2004), a década de 1970 foi representada pelo ápice do planejamento estratégico empresarial. Uma das principais obras que influenciou as organizações empresariais foi o livro “Corporate Strategy”, de H. Igor Ansoff, publicado em 1965. Para esse autor, a estratégia seria resultado de um processo racional e analítico, formal e consciente de planejamento desenvolvido na empresa, onde usando-se uma série de técnicas analíticas, primeiramente deveriam ser fixadas as metas e desenvolvidas as alternativas. Após o uso de técnicas analíticas deveria ser feita uma escolha entre as alternativas. Dois conceitos importantes, usados por Ansoff (1965) podem ser destacados: a “análise da disparidade”, que segue as técnicas analíticas de elementos internos e externos à organização, e o conceito de sinergia, que “deve ocorrer quando a empresa busca uma postura de produto-mercado com um desempenho combinado que seja maior que a soma de suas partes” (MINTZBERG, 2007). Esse conceito de sinergia posteriormente tornou-se amplamente difundido em administração. Nas escolas da estratégia, descritas por Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), essa obra poderia ser classificada dentro da escola do planejamento, como um modelo prescritivo. Para criticar a forma como o planejamento estratégico estava sendo usado pelas empresas, Mintzberg, em seu artigo “The Fall and Rise of Strategic Planning”, publicado em 1994 na 5 Harvard Business Review, apontou as falácias do planejamento estratégico e alguns problemas que vinham acontecendo, como: a alta sofisticação do planejamento estratégico, o excesso de formalização, a estática, o confronto entre a direção das empresas e os planejadores, e a falta de ligação entre planejamento e execução, pensamento e ação, planejadores e executores. É importante destacar que essa crítica de Mintzberg não era contra o planejamento estratégico em si, como um processo de administração, mas como esse processo estava sendo conduzido nas organizações, afastando-se do seu verdadeiro propósito. O planejamento é uma função administrativa, e o planejamento estratégico tem seu valor reconhecido pelo meio acadêmico e pelas organizações, de todos os tipos e estruturas. As condições que podem tornar o processo de planejamento estratégico importante para a organização que o realiza é a participação de todos, a flexibilidade durante o processo, a reflexão e o aprendizado pela organização e por todos que participam desse processo. 6 – Década de 1980: Porter está no centro do debate A década de 1980 foi marcada pela hipercompetição nos Estados Unidos, e os modelos de decisão sobre estratégia organizacional pareciam estar ultrapassados, se comparados com as mudanças que ocorreram nas duas décadas anteriores. A partir de seus estudos em economia na década de 1970, Michael Porter lança, em 1980, o livro “Competitive Strategy”, que passou a ser utilizado em larga escala nas universidades de negócios e pelas grandes corporações, tornando-se o centro dos debates sobre estratégia empresarial. A proposta de Porter nesse livro é deque, a partir de uma análise sistemática em uma indústria, expressão do inglês “industry” para “setor econômico”, uma organização poderia escolher uma estratégia para ser seguida. Diante desse raciocínio, Porter sugere que, para que uma empresa alcance uma rentabilidade superior e sustentável ao longo do tempo, deverá escolher uma posição em sua indústria, defendendo-se das forças que diminuem a capacidade competitiva da empresa e consequentemente, sua rentabilidade. Para analisar a atratividade da indústria o autor concebeu o “modelo de análise de indústria baseados em cinco forças competitivas”. Esse modelo busca diagnosticar as ameaças e oportunidades de uma indústria, em termos de lucratividade, a partir da análise dos seguintes fatores: - Ameaça de Novos Entrantes – é a ameaça representada pela facilidade de novos concorrentes entrarem em uma determinada indústria; - Intensidade da Rivalidade entre Empresas Concorrentes – é representado pelo grau de competição entre as empresas existentes, que conforme o tipo de indústria, essa competição poderá ser uma guerra aberta ou uma diplomacia pacífica. - Poder de Barganha dos Fornecedores – é representado pela capacidade de barganha de um fornecedor em relação à empresa. Isso poderá deixar a empresa em desvantagem nos processos de negociação com tal fornecedor; - Poder de Barganha dos Clientes da Empresa – é representado pela capacidade dos clientes imporem suas próprias condições num processo de compra; - Ameaça de Produtos Substitutos – é a facilidade de substituição dos produtos de determinada indústria por outros similares no mercado; Para o autor essas cinco forças determinam a rivalidade e competitividade de uma indústria, pelo fato de influenciarem os preços, os custos e os investimentos necessários das empresas. Deve-se lembrar que, para Porter, a competitividade em uma indústria é uma questão central 6 para a escolha estratégica, pois quanto maior for a rivalidade, menor será a lucratividade das empresas que dela fizerem parte. Como citado anteriormente, o modelo de análise de indústria e da concorrência, sugerido por Porter (1986), é a base para a escolha de uma estratégia competitiva, que para o autor é a escolha de uma posição dentro da indústria em que a empresa compete ou irá competir. O modelo das estratégicas genéricas de Porter oferece três estratégias genéricas para alcançar um desempenho acima da média numa indústria: - Liderança em custos – essa estratégia é realizada a partir do ganho de experiência, do investimento em instalações para produção em grande escala e da monitoração cuidadosa dos custos organizacionais. - Diferenciação – desenvolvimento de produtos ou serviços únicos. Para Porter (1986) a diferenciação poderá ser alcançada de duas formas: tornar-se singular num produto ou atividade; ou na reconfiguração de sua cadeia de valores. O autor também argumenta que somente existirá vantagem competitiva em diferenciação se essa for permanentemente percebida pelo cliente e que o concorrente não possa imitá-la. - Foco – essa estratégia procura atender segmentos de mercados específicos. O foco poderá ser na diferenciação ou na liderança em custo. Para Porter, a empresa necessitará fazer uma única opção dentre essas três estratégias genéricas. A falta de escolha, ou a tentativa de ser “tudo para todos” é uma receita para a mediocridade estratégica e desempenho abaixo da média do setor, de acordo com o autor. Em meados de 1980, Michael Porter lança outra obra importante e de grande influência, “Competitive Advantage”, ou Vantagem Competitiva, em 1985. Nessa obra, Porter avança sobre a ideia de criação de valor na busca de vantagem competitiva pelas empresas, e descreve o uso de uma ferramenta de análise do sistema de atividades de uma organização, para identificar as fontes de vantagem competitiva e permitir à organização escolher uma posição em sua indústria e alcançar a vantagem competitiva. Com a introdução da Cadeia de Valor, foi possível decompor em atividades o que uma empresa realizava, da compra de matéria-prima até a entrega do produto final e dos serviços prestados pela empresa, cada qual com sua contribuição para a criação de valor e margem, tendo como objetivo o alcance da vantagem competitiva. O modelo da nova organização industrial (new industrial organization) é um dos modelos conceituais mais difundidos para a análise da vantagem competitiva. Os pioneiros da análise SCP (Structure-Conduct-Performance), ou Estrutura-Conduta-Desempenho, baseada na estrutura da indústria foram Edward Mason e Joe Bain. Nessa forma de análise, o desempenho das firmas em uma indústria depende do comportamento dos compradores e vendedores no que se refere a fixação de preços, níveis de cooperação tácita e competição, políticas de pesquisa e desenvolvimento, investimentos, etc. (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Assim, no modelo SCP, o comportamento das firmas é definido pela estrutura da indústria, e o desempenho econômico dessas firmas é resultado direto de seu comportamento concorrencial em termos de fixação de preços e custos. É importante destacar que os trabalhos de Mason e Bain visavam explicar e analisar a lucratividades dos oligopólios com o objetivo de implantar políticas de promoção da concorrência (anti-trust). 7 Considerando o papel determinante da estrutura industrial para essa corrente teórica, os pesquisadores da economia industrial, como Porter, tendem a ignorar os aspectos organizacionais da estratégia empresarial (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). A partir de uma corrente teórica oposta à SCP e os pesquisadores da economia industrial, em 1984 foi publicado o artigo de Birger Wernerfelt, “The Resource-Based View of the Firm”, A Visão Baseada nos Recursos da Firma, e que teve uma segunda edição dez anos depois (em 1995). Trata-se de um artigo seminal, premiado na academia e que teve sua importância reconhecida posteriormente, quando Hamel e Prahalad publicaram seus artigos sobre capacidades dinâmicas, a partir de 1990. Conforme já citado, para Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), a estratégia como posição é uma das formas de se definir estratégia nas organizações e a escola do posicionamento, assim definida por esses autores, abriu grandes caminhos para a pesquisa e forneceu um poderoso conjunto de conceitos à prática. 7 – A década de 1990: o debate é ampliado No início da década de 1990, várias publicações ampliaram o debate no campo da estratégia organizacional. No final da década de 1980, Dierickx e Cool (1989) trazem de volta o tema “recursos”, em seu artigo de 1989. Os autores afirmam que um conjunto de recursos devem ser desenvolvidos pelas empresas para alcançar e sustentar uma posição competitiva favorável no mercado. A estratégia organizacional baseada nos recursos distintivos tem como principais autores, além de Wernerfelt, Hamel e Prahalad (1994) com o artigo “Competing for the Future” e Barney (1991) com um dos seus mais importantes artigos, “Firm Resources and Sustained Competitive Advantage”, publicado no Journal of Management. A discussão também se dava em torno da criação de vantagem competitiva através da criação e exploração de recursos e capacitações dinâmicas em ambientes de alta mudança tecnológica (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997). Conforme já citado anteriormente, em 1998, Mintzberg, Ahlstrand e Lampel publicam a obra Safári de Estratégia e trazem uma importante apreciação crítica das principais publicações no campo de estudos em estratégia no século XX. Trata-se de uma ampla revisão da literatura sobre administração estratégica e proposição de agrupamento de autores, correntes teóricas e modelos de estratégias organizacionais em 10 escolas, que são dez pontos de vista distintos e que tem ligação direta com a prática gerencial. Mintzberg (1987, 2000) e Mintzberg et al (2006) definem grupos distintos de formação de estratégias nas organizações, que são as estratégias deliberadas e as estratégias emergentes. Essa definição deve partir, segundo os autores, de uma “intenção” estratégica, que faz parte de um processo. Essa intenção pode produzir definições a priori sobre os rumos das organizações, ligadas a um processo formal, prescritivo e controlado para que se alcance aquilo que foi definido. A maior parte dos estudos acadêmicos sobre estratégia organizacional estão dentro desse paradigma, podendo-se citar autores como Ansoff e Porter, e as empresas de consultoria, Boston Consulting Group e McKinsey. O outro grupo a que se refere Mintzberg, quando trata do processo de formação de estratégias organizacionais, entende a intenção estratégica como um processo emergente, considerando que a maioria das organizações formam suas estratégias ao longo do tempo, e que o que a maioria das organizações realizam não é exatamente aquilo que elas pretendiam antecipadamente. Dentro desse paradigma encontram-se autores como o próprio Mintzberg, Quinn e Hamel e Prahalad. 8 Para Mintzberg (1994), é pertinente afirmar que nenhuma estratégia pode ser totalmente deliberada ou totalmente emergente: a primeira, por não sugerir o aprendizado na organização; e a segunda, por não sugerir o controle. Todas as estratégias necessitam seguir um mesmo caminho, atentando para o controle sem bloquear o processo de aprendizado. Nesse entendimento, estratégia pode ser considerada como o resultado do comportamento da organização, através de suas ações ao longo do tempo. De maneira geral, a década de 1990 caracterizou-se pela ampliação dos debates em torno do tema estratégia, com um maior espaço para perspectivas bem menos racionais e prescritivas de como as estratégias devem ser concebidas, as quais sinalizam outras formas de olhar para a administração estratégica. 8 – Anos 2000 e a emergência de novas formas organizacionais A década de 1990 caracterizou-se pela ampliação dos debates em torno do tema estratégia no campo da administração, devido, principalmente às mudanças socioeconômicas, causadas pela expansão de mercados com a abertura de fronteiras comerciais entre países, mudanças tecnológicas e o aumento das trocas de informações. A competição entre empresas, no modo tradicional passou a modificar-se, e permanece em transformação. Essa transformação está fazendo emergir novas formas organizacionais, em que as relações entre organizações, como um campo a ser desenvolvido na administração, fez reaparecer temas como as redes de cooperação, que há décadas já eram exploradas por empresas italianas, e a cooperação entre organizações, principalmente entre fornecedores e compradores, como resposta necessária aos desafios impostos pela tecnologia além da inovação, que já faz parte das funções organizacionais há algumas décadas e atualmente é amplamente discutida no meio acadêmico e empresarial, face à busca de novas alternativas. A emergência desses novos desafios e formatos de relação externa das organizações rompeu definitivamente com o “velho” modelo de negócios, da empresa verticalizada, da ênfase nos custos e alta escala como fonte de ganhos, trazendo também a necessidade de um pensar estratégico amplo, com o olhar para fora da organização. As firmas estão diminuindo suas fronteiras e participando de formas de colaboração que não lembram as subcontratações, nem a forma integrada verticalmente (POWELL, 1990). No campo da administração, a estratégia passa a ser analisada não somente no âmbito interno da organização, mas nas relações interorganizacionais. Alguns autores, que já haviam feito suas contribuições nas décadas anteriores, passaram a ser considerados novamente para os estudos e análises das estratégias organizacionais frente aos desafios do século XXI. Temas como coopetição, apresentado por Nalebuff e Brandenburger (1997), que nas organizações coloca-se como o desafio de desenvolver estratégias competitivas e cooperativas simultaneamente, e co-criação e colaboração citados por McAfee (2006) e Prahalad e Ramaswamy (2004), são as novas formas de criação de valor, e que exigem também das organizações novas formas de pensar suas estratégias. Voltando aos desafios enfrentados pelos gestores das organizações, atualmente, pode-se entender que há uma “constante adaptação do foco estratégico por meio das relações e parcerias interorganizacionais e da forma com que essas relações são construídas econômica e socialmente” (BULGACOV; BULGACOV, 2009). 9 Na busca de melhores resultados e na incerteza das mudanças no ambiente externo à organização, com a complexidade e as mudanças constantes, poucas organizações conseguem manter-se competitivas sem desenvolver inter-relações com outras organizações, assim, as organizações não devem ser vistas de forma isolada, mas dependentes de relações interorganizacionais. 9 – Considerações finais Após analisar a evolução dos estudos e publicações sobre estratégia organizacional nas últimas décadas do século XX e na primeira década do século XXI, identificou-se que esse tema é amplo, está em constante evolução e tem gerado controvérsias entre autores, pois não há uma definição para o tema e os múltiplos olhares e debates têm contribuído para enriquecer os estudos nessa área. Inicialmente, o processo de criação de estratégias organizacionais foi levado a uma formalização que o transformou em prescritivo, e, a partir disso, novos paradigmas emergiram, como o paradigma funcionalista, que domina até hoje a forma como a estratégia organizacional é concebida. A formação das estratégias organizacionais, vista como um processo formal e prescritivo, em que seguir uma fórmula, passo-a-passo, deveria levar a organização e seus gestores a “fabricar” uma estratégia, está muito presente nas organizações. Esse processo de “fabricação” de estratégia ocorre de forma sistemática: o primeiro passo é a análise dos ambientes, identificando a influência das variáveis que compõem esses ambientes, interno e externo(s) e as oportunidades estratégicas. A partir dessa análise são feitas as escolhas das estratégias que mais se adaptam a empresa e são definidos os controles que deverão garantir que a(s) estratégia(s) escolhida(s) pela empresa sejam perseguidas e alcançadas. Na opinião de Balestrin (2004), essa visão sobre o processo de estratégia esqueceu por um longo período, que, tanto o ambiente externo, quanto à própria organização caracterizam-se pela complexidade, pela incerteza e que as informações que os executivos dispõem são muito mais ambíguas e limitadas do que precisas. Não há consenso na literatura sobre qual é a essência da estratégia empresarial, mas sim, várias definições ambíguas e tentativas de explicar estruturas organizacionais e formas de pensar a administração. O termo estratégia, como campo de estudos, é amplo e o contexto organizacional contemporâneo apresenta-se cada vez mais complexo, seguindo em constante transformação, e apresentando, para quem dele participa como organização empresarial ou como pesquisador, infinitas possibilidades de pesquisa. Vizeu e Gonçalves (2010) entendem que uma das maiores contribuições que a área de estratégia empresarial pode oferecer para a formação do gestor seja a de prover-lhe uma nova forma de enxergar o mundo dos negócios, bem como a maneira como ele lida com as diferentes práticas de gestão em diferentes contextos. Referências ANDREWS, Kenneth. R. The Concept of Corporate Strategy. Homewood, IL: Richard D. Irwin, 1971. ANSOFF, H. Igor. Corporate Strategy. New York: McGraw-Hill, 1965. 10 BALESTRIN, Alsones. A evolução histórica do pensamento estratégico e seus principais debates. Revista da ANGRAD. v. 5, n. 3, 2004. BARNEY, Jay B. Firm Resources and Sustained Competitive Advantage. Journal of Management. Vol 17, n. 1, p. 99-120, 1991. BULGACOV, Sérgio; BULGACOV, Yára Lúcia M. Conteúdo e Processo Estratégico: Formação, Implementação, Mudança e Resultados. IV Encontro de Estudos em Estratégia – 3Es, 2009, Recife. Anais do IV Encontro de Estudos em Estratégia, 2009. CHANDLER Jr, Alfred. Strategy and Structure. Chapters in the History of the American Industrial Enterprise. Cambridge, Mass, The M.I.T. Press, 1976. DIERICKX, Ingemar; COOL, Karel. Asset Stock Accumulation and Sustainability of Competitive Advantage. Management Science, vol. 35, Issue 12, p. 1504-1511, 1989. GHEMAWAT, Pankaj. A estratégia e o cenário dos negócios: texto e casos. Porto Alegre: Bookman, 2000. HAMEL, Gary; PRAHALAD, C. K. Strategy as revolution. Harvard Business Review. Vol. 74, pp. 69-82, jul-aug.1996. HASPESLAGH, Philippe. Portfolio Planning: Uses and Limits. Harvard Business Review, vol. 60, Issue 1, jan - feb, p. 58-73, 1982. MINTZBERG, Henry. Ascensão e queda do Planejamento Estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2007. MINTZBERG, Henry. The fall and rise of strategic planning. Harvard Business Review, 1994. MINTZBERG, Henry. The five P’s for strategy. California Management Review. Vol 30, Issue 1, 1987. MINTZBERG, Henry; AHLSTRAND, Bruce; LAMPEL, Joseph. Safári de Estratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000. MINTZBERG, Henry; LAMPEL, Joseph; QUINN, James B.; GHOSHAL, Sumantra. O processo da estratégia: conceitos, contextos e casos selecionados. 4a. ed., Porto Alegre: Bookman, 2006. NALEBUFF, Barry J; BRANDENBURGER, Adam M. Co-opetition: Competitive and cooperative business strategies for the digital economy. Strategy & Leadership. Vol 25, Issue 6, nov-dec, 1997. PENROSE, Edith E. T. The Theory of the Growth of the Firm. Oxford University Press, U.K., 1959. PORTER, Michael E. Estratégia Competitiva. Campus: Rio de Janeiro, 1986. ___________. Vantagem Competitiva. Campus: Rio de Janeiro, 1989. ___________. What is Strategy? Harvard Business Review. v. 74, p. 61-78, nov-dec, 1996. 11 POWELL, Walter, W. Neither market nor hierarchy. Network forms of organization. Research in Organizational Behavior. Vol. 12, pp. 295 – 336, 1990. RUMELT, Richard P. SCHENDEL, Dan E. TEECE, David J. Fundamental Issues in Strategy. Harvard Business School Press, 1994. SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961. TEECE, David J.; PISANO, Gary; SHUEN, Amy. Dynamic Capabilities and Strategic Management. Strategic Management Journal. Vol 18, Issue7, p. 509-533, 1997. VASCONCELOS, Flávio C.; CYRINO, Álvaro B. Vantagem Competitiva: os modelos teóricos atuais e a convergência entre estratégia e teoria organizacional. Revista de Administração de Empresas. V. 40, n. 4, out./dez., 2000. VIZEU, Fábio; GONÇALVES, Sandro A. Pensamento Estratégico: origens, princípios e perspectivas. São Paulo: Atlas, 2010. 12