POESIA MARGINAL
Material: Estudo de textos
Autora Cláudia Regina
Silveira
ANTOLOGIA :
Ana Cristina César, Cacaso, Chacal,
Francisco Alvim, Paulo Leminski
POESIA MARGINAL
O Autores: Seleção de autores
O Escola Literária: Literatura Contemporânea
O Ano de Publicação: 2006
O Gênero: Poesia - Marginal
O Temas: Amor, sensualidade, poesia, política,
medo
O Divisão da Obra: Quatro Partes
OS AUTORES
O Ana Cristina César;
O Cacaso;
O Chacal;
O Francisco Alvim; e
O Paulo Leminski.
ALGUNS POEMAS
Primeira parte - Sentir é muito
lento
O “Os olhos da ingrata que nunca nos beija, a
luz de um corpo que apaga os caminhos, os
seios submersos da sereia. Todas as
velocidades e vacilos do coração que, de tão
lento, quase para; ou solta faísca e
incendeia o horizonte. De quantas maneiras
se diz o desejo?”
Fábio Weintraub
O Fogo-Fátuo
Ela é uma mina versátil
O seu mal é ser muito volúvel
Apesar de seu jeito volátil
Nosso caso anda meio insolúvel
Se ela veste seu manto diáfano
Sai de noite e só volta de dia
Eu escuto os cantores de ébano
E espero ela chegar da orgia
Ela pensa que eu sou fogo-fátuo
Que me esquenta em banho-maria
Se estouro sou pior que o átomo
Ainda afogo essa nega na pia.
(Chacal)
Fogo-fátuo
O É uma luz azulada que pode ser avistada em pântanos, brejos
etc. É a inflamação espontânea do gás dos pântanos
(metano), resultante da decomposição de seres vivos: plantas
e animais típicos do ambiente. Em outros locais, quando um
corpo orgânico começa a entrar em putrefação, ocorre a
emissão do gás fosfina (PH3).
O Os fogos-fátuos são produtos da combustão da fosfina
gerados pela decomposição de substâncias orgânicas, ou a
fosforescência natural dos sais de cálcio presentes nos ossos
enterrados.
O Muitos que avistam o fenômeno tendem a evacuar o local
rapidamente, o que, devido ao deslocamento do ar, faz com
que o fogo fátuo mova-se na mesma direção da pessoa. Tal
fato leva muitos a acreditar que o fenômeno se trata de um
evento sobrenatural, tais como espíritos, fantasmas, dentre
outros.
Comentário:Fogo-fátuo
O Podemos observar nessa poesia de três
estrofes a presença de metáfora ("Ela pensa
que eu sou fogo-fátuo”, "Que me esquenta
em banho- maria"), a antítese ("Sai de noite
e só volta de dia"); supressão de sílabas
("Ela é uma mina versátil"), ‘mina’, por
menina; uso coloquial da linguagem ("E
espero ela chegar da orgia"), em vez de ‘E a
espero chegar da orgia’.
Sara
Se sara sarar d• saramp•
sara será sereia
p•is sara nã• é feia
emb•ra nã• seja um anj•
merece um s•/• de banj•
(Chacal)
Comentário: Sara
O Nesse poema, de apenas uma estrofe, Chacal
trabalha a forma visual do poema;
O O poeta brinca com os pontos pretos, que
imitam os pontos do sarampo em todas as
letras "o" do texto.
O Além disso, podemos observar na sonoridade,
o uso de aliterações (repetição de uma mesma
consoante, a letra "s" — "Se sara sarar d•
saramp•") e o uso de assonâncias (repetição de
uma mesma vogal, as letras "e" e "a"— "sara
será sereia"); a ausência de pontuação também
e notável no poema.
Moda de viola
Os olhos daquela ingrata às vezes
me castigam às vezes me consolam.
Mas sua boca nunca me beija.
(Cacaso)
Comentário: Moda de viola
O Repare, nesse poema, a ausência de
pontuação nos adjuntos adverbiais.
O A temática gira em torno do amor, desamor,
como nas tradicionais modas de viola,
espelho de lamentações por um amor não
correspondido.
Cabocla Tereza(Moda de viola
tradicional) –Tonico e Tinoco
"Lá no alto da montanha
Numa casinha estranha
Toda feita de sapê
Parei numa noite à cavalo
Pra mór de dois estalos
Que ouvi lá dentro bate
Apeei com muito jeito
Ouvi um gemido perfeito
Uma voz cheia de dor:
"Vancê, Tereza, descansa
Jurei de fazer a vingança
Pra morte do meu amor"
Cabocla Tereza
Pela réstia da janela
Por uma luzinha amarela
De um lampião quase
[apagando
Vi uma cabocla no chão
E um cabra tinha na mão
Uma arma alumiando
Virei meu cavalo a galope
Risquei de espora e chicote
Sangrei a anca do tar
Desci a montanha abaixo
Galopando meu macho
O seu doutô fui chamar
Vortamo lá pra montanha
Naquela casinha estranha
Cabocla Tereza
Eu e mais seu doutô
Topemo o cabra assustado
Que chamou nóis prum
[lado
E a sua história contou"
“Há tempo eu fiz um
[ranchinho
Pra minha cabocla morá
Pois era ali nosso ninho
Bem longe deste lugar.
No arto lá da montanha
Perto da luz do luar
Vivi um ano feliz
Sem nunca isso esperá
E muito tempo passou
Pensando em ser tão feliz
Mas a Tereza, doutor,
Felicidade não quis.
O meu sonho nesse oiá
Paguei caro meu amor
Pra mór de outro caboclo
Meu rancho ela
abandonou.
Senti meu sangue fervê
Jurei a Tereza matá
O meu alazão arriei
E ela eu vô percurá.
Agora já me vinguei
É esse o fim de um amor
Esta cabocla eu matei
É a minha história, dotor.
(Tonico e Tinoco)
Happy end
O meu amor e eu
nascemos um para o outro
agora só falta quem nos apresente
(Cacaso)
Comentário: Happy end
O Poesia curta, com duas estrofes, uma
contendo dois versos e outra, apenas um.
Nesse poema é nítida a presença da ironia.
Parada cardíaca
Essa minha secura
essa falta de sentimento
não tem ninguém que segure
vem de dentro
Vem da zona escura
donde vem o que sinto
sinto muito
sentir é muito lento
(Paulo Leminski)
Comentário: Parada cardíaca
O Poesia com duas estrofes, em que
percebemos a presença da figura de
linguagem denominada metáfora
"Essa minha secura " = eu sou seco
" Vem da zona escura" = eu tenho um lado
obscuro
O Também encontramos aliterações ("Essa
minha secura/ essa falta de sentimento").
“Quando entre nós só havia”
Quando entre nós só havia
uma carta certa
a correspondência
completa
o trem os trilhos
a janela aberta
uma certa paisagem
sem pedras ou
sobressaltos
meu salto alto em equilíbrio
o copo d’agua
a espera do café
(Ana Cristina César)
Comentário: “Quando entre
nós só havia”
O Poema de apenas uma estrofe, sem
pontuação alguma.
O Há, na poesia, uma dose forte de
intimidade, característica da autora.
O Percebemos também metáforas na poesia,
a partir das palavras como: "trilho, trem,
janela aberta, paisagem", que podem
representar as fases de sua vida.
O Também encontramos aliterações: "o trem
os trilhos"
Água
Falar de ti
é falar de tudo o que passa
no alto dos ventos
na luz das acácias
é esquecer os caminhos
apagar o enredo
é pensar as formas do branco
como teu corpo numa praia
branda e azul
Tua pele não retém as horas
escorres, líquida
sonora
(Francisco Alvim)
Comentário: Água
O Esse poema, de apenas uma estrofe, traz
uma descrição da água, que se assemelha
muito a descrição de uma pessoa, a amada.
O poeta usa a prosopopeia em: "como teu
corpo numa praia"; "Tua pele não retém as
horas“.
O Também há a presença de hipérbole em: "é
falar de tudo o que passa/no alto dos
ventos na luz das acácias".
O Ausência completa de pontuação.
Segunda parte - Os olhinhos
do poeta
O “Nada mais esquisito do que o trabalho do
escritor pelo que implica de violência e
delicadeza. Delicadeza de quem, como criança,
empina palavras no céu do papel, e violência
dos que convertem o verso em “tiro no que
encarquilha a linguagem”.
O Os poemas desta seção falam das
ambiguidades e impasses diante da folha em
branco. Convite para uma luta que pode deixar
"um filete de sangue nas gengivas" ou acabar no
zero a zero.”
Fábio Weintraub
Vacilo da vocação
Precisaria trabalhar — afundar —
— como você — saudades loucas —
nesta arte — ininterrupta —
de pintar —
A poesia não — telegráfica — ocasional —
me deixa sola — solta —
a mercê do impossível —
— do real.
(Ana Cristina César)
Comentário: Vacilo da vocação
O Nesse poema curto, de apenas duas estrofes,
Ana Cristina trabalha, já no titulo com o recurso
da sonoridade, na figura da aliteração "Vacilo da
vocação".
O Além disso, percebemos que o poema é repleto
de hifens que sugerem ao mesmo tempo uma
parada, uma interrupção e explicações; a
escritora também usa a metalinguagem na
poesia: "A poesia não - telegráfica — ocasional—
/ me deixa sola — solta —".
Vento
Grafar uma música
é como querer
fotografar o vento
a música existe no tempo
a grafia existe no espaço
o vento no vento
(Chacal)
Comentário: Vento
O Poema curto, com duas estrofes, em que o
poeta traz como temática a impossibilidade
de colocar a música para o papel para isso,
utiliza-se de comparações: "Grafar uma
música/ é como querer/ fotografar o vento".
O Na segunda estrofe, aparece a explicação
dessa impossibilidade: "a música existe no
tempo a grafia existe no espaço/ O vento no
vento".
“O Bicho alfabeto ”
O Bicho alfabeto
tem vinte e três patas
ou quase
com frases
se fazem asas
palavras
o vento leve
por onde ele passa
nascem palavras
e frases
o bicho alfabeto
passa
fica o que não se escreve
(Paulo Leminski)
Comentário: “O Bicho
alfabeto”
O Poema com quatro estrofes, que possui como temática
a própria palavra, o alfabeto. Ou seja, temos aí a
presença da metalinguagem — o poeta usando a
palavra para explicar a palavra.
O Metáforas também são lançadas ao longo do poema:
"O Bicho alfabeto/ tem vinte e três patas" — vinte e três
letras; "por onde ele passa/ nascem palavras/ e
frases”. E indica que o "bicho alfabeto" constrói frases
que "se fazem asas", ou seja, pode ser uma alusão à
própria poesia ou, ainda, a magia da escrita.
O Por fim, ele conclui: "o bicho alfabeto/ passa/ fica o que
não se escreve", ou seja, fica o sentimento expresso
pela palavra, que não se consegue escrever.
Distâncias mínimas
Um texto morcego
se guia por ecos
um texto texto cego
um eco anti anti antigo
um grito na parede rede rede
volta verde verde verde
com mim com com consigo
ouvir e ver se se se se se
ou se se me lhe te sigo?
(Paulo Leminski)
Comentário: Distâncias
mínimas
O Poema curto, de apenas uma estrofe, com nove
versos.
O A grande alusão do poema é à questão do eco.
A partir daí, o poeta escreve palavras que
simbolizam esse eco para criar seu "texto
morcego".
O Notemos, também, que ele utiliza os pronomes
pessoais do caso oblíquo como ecos: "com mim
com com consigo/ ouvir é ver se se se se se/ ou
se se me lhe te sigo?".
Terceira parte — Se o mundo
não vai bem
O “Faz tempo que os escritores abandonaram
suas torres de marfim e desceram ate a rua.
A opressão política, o medo, a desigualdade
social, a solidão, a vontade de cair fora,
tudo isso aparece nos versos a seguir pela
visão crítica e irônica desses poetas.”
Fábio Weintraub
Jejum
Cuspiu no prato em que comia
Tiraram o prato
(Francisco Alvim)
Comentário: Jejum
O Poema muito curto, de apenas dois versos.
Nele o autor trabalha com a estratégia de
citar ditados, provérbios ou frases feitas, a
fim de ceder espaço em seu poema a uma
outra voz e ponto de vista.
O Ao final, a ironia: “ Tiraram o prato”
“Faz três semanas”
Faz três semanas
espero
depois da novela
sem falta
um telefonema
de algum ponto
perdido
do país
(Ana Cristina César)
Comentário: “Faz três
semanas”
O Poema curto, com apenas uma estrofe de
oito versos, sem marcas de pontuação.
O Nele, percebemos a temática do intimismo
do eu-lírico, da solidão.
E proibido pisar na grama
O jeito e deitar e rolar
(Chacal)
Comentário: E proibido pisar
na grama
O Poema muito curto de apenas um verso.
Com uma forte dose de ironia, o poeta
aproveita o título e completa o texto com
seu único verso.
O Certamente, o termo proibitivo refere-se a
época da ditadura, em que tudo era
proibido, e os escritores precisavam "deitar
e rolar" para driblar a censura.
As aparências revelam
Afirma uma Firma que o Brasil
confirma: “Vamos substituir o
Café pelo Aço. “
Vai ser duríssimo descondicionar
o paladar
Não há na violência
que a linguagem imita
algo da violência
propriamente dita?
(Cacaso)
Comentário: As aparências
revelam
O Poema composto por três estrofes, que traz
como temática a preocupação social, o
capitalismo e, consequentemente, o reflexo
que a troca do café (riqueza nacional) pelo
aço (empresa multinacional) vai incutir na
sociedade; e conclui que será um ato de
"violência".
O O poeta trabalha com a sonoridade e o jogo
de palavras: "Afirma uma Firma que o
Brasil/ confirma:... "
Relógio
Com Deus mi deito com deus mi levanto
comigo eu calo comigo eu canto
eu bato um papo eu bato um ponto
eu tomo um drink eu fico tonto.
(Chacal)
Comentário: Relógio
O Poema muito curto, composto por uma estrofe
de quatro versos.
O No primeiro verso, o poeta faz alusão a uma
reza popular da igreja católica e usa a
linguagem coloquial para representar essa
popularidade: "Com Deus mi deito com deus mi
levanto".
O O recurso da sonoridade, a partir da repetição
das letras "b", "p" e "t" também é marcante: "eu
bato um papo eu bato um ponto".
Cartilha da cura
As mulheres e as crianças são as primeiras que
desistem de afundar os navios.
(Ana Cristina César)
Comentário: Cartilha da cura
O Poema muito curto, composto por apenas uma
estrofe de dois versos.
O Nele se verifica a ironia e, ao mesmo tempo, a
profundidade sentimental do eu-lírico.
O Perceba que quando o navio afunda, as
primeiras pessoas a se salvar são “as mulheres
e crianças”, aqui, ocorre o contrário, nem uma
nem outra quer afundar o navio. Ou seja, não
querem se salvar portanto, devem se manter
como estão, a margem das decisões.
Quarta parte - A vida que para
O “Muitas vezes, a poesia nasce do espanto,
de uma espécie de interrupção no curso
natural das coisas, e se constitui como uma
forma de conhecimento. Basta um pequeno
desvio na direção do olhar para que o
mundo se apresente sob nova luz.”
Fábio Weintraub
Como abater uma nuvem a
tiros
Sirenes, bares em chamas,
carros se chocando,
a noite me chama,
a coisa escrita em sangue
nas paredes das danceterias
e dos hospitais,
os poemas incompletos
e o vermelho sempre verde dos sinais
(Paulo Leminski)
Comentário: Como abater uma
nuvem a tiros
O Nesse poema, de apenas uma estrofe com
oito versos, o poeta traz como temática a
violência urbana.
O O poema traz uma sequência de fatos e
ações que culminam na morte, no desastre
de um acidente de automóvel.
“ACORDEI BEMOL”
ACORDEI BEMOL1
tudo estava sustenido2
sol fazia
só não fazia sentido
(Paulo Leminski)
1- [Música] [Música] Sinal indicativo do meio-tom de
abaixamento/ O mesmo que indeciso.
2- [Música] [Música] Elevado meio-tom (nota musical)./ O mesmo
que suspenso.
Comentário: “ACORDEI
BEMOL”
O Neste curto poema de duas estrofes, com
dois versos cada, a temática gira em tomo
do jogo de palavras com as notas musicais:
"bemol sustenido, sol".
O Também pode remontar a inquietude pela
impossibilidade de saber como agir.
Meio fio
Tem um fio de queijo
entre eu e o misto quente
recém-mordido
tem um fio de goma
entre o chiclete e eu
recém-mascado
tem um fio de vida
entre eu e teu corpo
recém-amado
tem um fio de carne
entre teu corpo e teu filho
recém-nascido
tem um fio de luz
entre eu e mim
recém-passado
tem um fio de sangue
entre a razão e eu
recém-partido
tem um fio de luz
entre eu e mim
recém-chegado
(Chacal)
Comentário: Meio fio
O Esse é um dos maiores poemas que compõem a
antologia. Aqui, reparamos primeiramente na
forma em que foi escrito: linguagem coloquial —
uso do verbo "ter" no lugar de "haver" e o desvio
gramatical nos segundos versos de cada
estrofe: "entre eu e o misto quente" ; " entre o
chiclete e eu"; "entre eu e teu corpo"; "entre a
razão e eu"; "entre eu e mim" — a forma culta da
gramática indica que mediante preposição
"entre" devemos usar "mim", em vez de "eu".
Comentário: Meio fio
O Observamos, ainda, que esses primeiros
versos de cada estrofe iniciam sempre da
mesma forma, o que perfaz anáfora: "tem
um fio de...".
O Notemos também que todas as terceiras
estrofes são compostas de duas palavras:
recém + um verbo no infinitivo (mordido,
mascado, amado, partido, chegado).
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POESIA MARGINAL - Curso e Colégio Ideologia