01 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO - 2º SEMESTRE/2011 Profª Helisia Góes Disciplina: DIREITO CIVIL VI – SUCESSÕES Turmas: 8ºDIV e 8DIN-1 (03/08/11) e 8º DIN-2 (04/08/11) AULA 02 I - NOÇÕES INICIAIS • CONCEITO: “conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, ao herdeiro, em virtude de lei ou de testamento” DINIZ (2008, p. 3). • FUNDAMENTO: existem vários entendimentos doutrinários que buscam justificar a origem do Direito das Sucessões. Para alguns, a transmissão hereditária dos bens está pautada na continuação biológica e psicológica dos progenitores, sendo necessária para a continuidade da vida pelas várias gerações. Entretanto, entendo que a melhor justificativa é a necessidade de garantia da propriedade, existindo uma combinação de institutos (propriedade e família). Para o direito brasileiro, a propriedade necessita de um dono, não pode ficar vaga, abandonada, especialmente pela função social lhe é conferida pela Constituição Federal. • CONTEÚDO - CÓDIGO CIVIL DE 2002: 1ª Parte – SUCESSÃO EM GERAL: normas gerais do direito das sucessões, que serão aplicadas tanto à sucessão legítima quanto à testamentária (arts. 1.784 a 1.828, CC); 2ª Parte – SUCESSÃO LEGÍTIMA: regras específicas de transmissão da herança, por determinação da ordem de vocação hereditária fixada na lei (arts. 1829 a 1856, CC); 3ª Parte – SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA: regras específicas de transmissão da herança, em função de ato de última vontade, produzido em vida pelo falecido (arts. 1857 a 1990, CC); 4ª Parte – INVENTÁRIO E PARTILHA: normas sobre o processo judicial não-contencioso (arts. 1991 a 2027, CC). II - SUCESSÃO EM GERAL 1. Acepção Jurídica Etimologicamente a palavra sucessão vem da expressão sub cedere, que descreve a situação onde alguém toma o lugar de outrem (substitui). Juridicamente, o vocábulo sucessão se apresenta sob dois sentidos: a) Sentido Amplo: que se refere a todos os modos derivados de aquisição do domínio, representando, simplesmente, o modo pelo qual alguém sucede a outrem, investindo-se aquele nos direitos que pertenciam a este, no todo ou em parte (sucessão inter vivos). Ex: comprador e vendedor, donatário e doador. “Suceder é substituir, tomar o lugar de outrem no campo dos fenômenos jurídicos. Na sucessão, existe uma substituição do titular de um direito.” VENOSA (2004, p. 15) 02 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO - 2º SEMESTRE/2011 “Sucessão, em sentido geral e vulgar, é a seqüência de fenômenos ou fatos que aparecem uns após outros, ora vinculados por uma relação de causa, ora conjuntos por outras relações.” DIAS (2008, p. 28) b) Sentido Restrito: que designa a transferência de herança aos sucessores, em função da morte do titular do patrimônio. Pode ser total ou parcial. É a chamada sucessão mortis causa. Subjetivamente é o direito em virtude do qual alguém (herdeiro ou legatário) recebe os bens da herança. Objetivamente é a universalidade dos bens do de cujus (encargos e direitos). “É neste sentido estrito que se usa o vocábulo sucessão: a transferência, total ou parcial, de herança, por morte de alguém, a um ou mais herdeiros. É deste fenômeno que se encarrega o direito das sucessões.” DIAS (2008, p. 29) ATENÇÃO: A relação jurídica existente permanece, ocorrendo, apenas, a mudança dos respectivos titulares. Desse modo, a propriedade do morto será transmitida com os mesmos caracteres aos seus sucessores (1.206, CC). O Livro V – Do Direito das Sucessões, do Código de 2002, trata especificamente da sucessão em sentido restrito (mortis causa), ou seja, aquela que deriva da morte de alguém, que tem seus direitos e obrigações transferidos para seus sucessores (herdeiros e legatários). Trata-se aqui do direito hereditário. Na Constituição Federal de 1988 o direito à sucessão está resguardado no art. 5º, XXX: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXX - é garantido o direito de herança; Dias (2008, p. 30) destaca a importância da afetividade, nos dias atuais, para o direito sucessório brasileiro, e escreve que: A Constituição Federal elevou a afetividade à categoria de direito constitucional tutelado, ao afirmar que a família é a base da sociedade e merece especial proteção do Estado (CF 226). Ainda que a transmissão da herança se trate de direito individual, o que fundamenta o direito sucessório nos dias atuais é o afeto. Percebe-se aqui a importância social do Direito das Sucessões, pois segundo Venosa (2004, p. 18): A idéia da sucessão por causa da morte não aflora unicamente no interesse privado: o Estado também tem o maior interesse de que um patrimônio não reste sem titular, (...). E complementa: Se não houvesse direito à herança, estaria prejudicada a própria capacidade produtiva de cada indivíduo, que não tenha interesse em poupar e produzir, sabendo que sua família não seria alvo do esforço. 2. Conceitos Importantes Herança: “o conjunto de direitos e obrigações que se transmitem, em razão da morte, a uma pessoa, ou a um conjunto de pessoas, que sobreviveram ao falecido.” VENOSA (2004, p. 20). Patrimônio do de cujus. Também pode ser identificada como acervo hereditário, direito à sucessão aberta, direito sucessório, patrimônio hereditário. 03 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO - 2º SEMESTRE/2011 De Cujus: expressão que se refere ao morto, de quem se trata a sucessão. Também se diz falecido, autor da herança. Patrimônio: o conjunto de direitos reais e obrigacionais, ativos e passivos, pertencentes a uma pessoa. O patrimônio passível de transmissão é composto de bens materiais ou imateriais, mas sempre coisas avaliáveis economicamente. Com a morte de alguém desaparece o titular do patrimônio, mas o mesmo permanece íntegro, passando a ser chamado de herança ou espólio. Espólio: conjunto de direitos e deveres pertencentes ao de cujus. É uma simples massa patrimonial que permanece coesa até a atribuição dos quinhões hereditários aos sucessores. Termo usado no processo judicial, sendo representado em juízo pelo inventariante (art. 12, V, CPC). 3. Espécies de Sucessores 3.1. Herdeiros: são aqueles que recebem a herança a título universal, ou seja, coisa incerta e indeterminada. Podem ser: 3.1.1. Herdeiros Legítimos: são herdeiros por força da lei (art. 1.829 e 1.790, CC). Integram a Ordem de Vocação Hereditária (art. 1.829, CC). São os descendentes, os ascendentes, o cônjuge, os companheiros (1.790, CC) e os colaterais (estes somente até o quarto grau). Podem ser: 3.1.1.1. Necessários: são aqueles que têm direito a uma participação mínima na herança (legítima) e que só podem ser excluídos excepcionalmente: são os descendentes, ascendentes e o cônjuge sobrevivente (art. 1.845 do CC). Quando há herdeiros necessários, a pessoa só pode dispor de metade da herança (art. 1.789 e 1.846 do CC). 3.1.1.2. Facultativos: são aqueles que podem ser excluídos pela simples vontade do morto, sempre que este dispuser da totalidade de seu patrimônio sem os contemplar: são os colaterais até quarto grau (art. 1.850, CC) e o companheiro sobrevivente. 3.1.2. Herdeiros Testamentários ou Instituídos: recebem a título universal, mas por força de testamento, ou seja, da última vontade do testador. 3.2. Legatários: são aqueles que são contemplados em testamento com coisa certa e individualizada (determinada). São sucessores a título singular. ATENÇÃO: “Os direitos e deveres meramente pessoais, como a tutela, a curatela, os cargos públicos, extinguem-se com a morte, assim como os direitos personalíssimos.” VENOSA (2004, p. 21) Obs.1: Enquanto existir a herança, o patrimônio hereditário possui o caráter de indiviso, pois se trata de uma universalidade. Assim, cada herdeiro estará na condição de condômino da herança. Entretanto o caráter de unidade abstrata não remete à idéia de indivisibilidade, pois com a partilha haverá a divisão em partes ideais, fracionária (metade, um terço, um quarto, etc), ou seja, em quota-parte. Obs.2: Desde a abertura da sucessão até a partilha, os herdeiros assumem a condição de condôminos em relação à herança. “Cada um dos herdeiros é potencialmente proprietário do todo, embora seu direito seja limitado pela fração ideal.” VENOSA (2004, p. 22) 04 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO - 2º SEMESTRE/2011 4. Espécies de Sucessão 4.1. Quanto à fonte de que deriva a sucessão pode ser: 4.1.1. Sucessão Testamentária (art. 1.786, CC): que tem origem no testamento válido ou na disposição de última vontade. Limitada pela lei, pois se o testador tiver herdeiros necessários (cônjuge supérstite, descendentes e ascendentes sucessíveis – art. 1845 e 1.846, CC), só poderá dispor de metade de seus bens (art. 1.789, CC), vez que a outra metade é tida como legítima daqueles herdeiros. Legítima (herdeiros necessários) PATRIMÔNIO DO DE CUJUS = ⟨ Porção disponível (fixa=metade do patrimônio) Obs.3: Os herdeiros necessários não terão direito à legítima se renunciarem à herança ou, ainda, se estes forem excluídos da sucessão por indignidade ou deserdação (Parágrafo único, do art. 1.804, CC; 1.814 c/c 1.961, CC) Obs.4: Se o testador for casado, pelo regime da comunhão universal de bens (art. 1.667, CC), somente poderá contar, para cálculo da parte legítima e da porção disponível, com a sua meação. ATENÇÃO: No Direito Brasileiro, somente ocorre a absoluta liberdade de testar, ou seja, de dispor de todos os bens por meio de testamento, quando o testador não possuir herdeiros necessários, situação em que, poderá desprezar os colaterais, se for de sua vontade (art. 1.850, CC). 4.1.2. Sucessão Legítima ou ab intestato (art. 1.786, CC): que resulta da lei, no caso de ausência, nulidade, anulabilidade ou caducidade de testamento (art. 1.786 e 1.788, CC). Aqui deverá ser obedecida a ordem de vocação hereditária (art. 1829, CC). ATENÇÃO: A lei brasileira prevê a possibilidade de existência simultânea dessas duas espécies de sucessão (art. 1.788, 2ª parte, CC). O art. 1.966, do CC, informe que quando o testador só dispõe de parte de sua metade disponível, entende-se, por conseqüência, que institui os herdeiros legítimos no remanescente. No caso de inexistência de herdeiros legítimos, será tida como herança jacente a parte não disposta no testamento (art. 1.819, CC). 4.2. Quanto aos seus efeitos, a sucessão pode ser: 4.2.1. A título universal: transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança (ativo e passivo) para o herdeiro do de cujus. Então haverá a instituição de herdeiro, que será chamado a suceder no todo ou numa quota-parte do patrimônio do de cujus, sub-rogando-se, abstratamente, na posição do falecido como titular. 05 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO - 2º SEMESTRE/2011 4.2.2. A título singular: transferência de objetos certos e determinados. Ex.: uma jóia, um cavalo, uma determinada casa localizada na Rua X, n... Aqui aparece a figura do legatário, que sucede ao de cujus nos bens ou direitos determinados e individualizados, sem, contudo, representar o falecido, pois não responde pelas dívidas e encargos da herança, salvo disposição expressa do testador. Obs.5: A sucessão legítima será sempre a título universal, enquanto que a sucessão testamentária pode ser a título universal ou singular. Obs.6: No testamento podem coexistir herdeiros e legatário, entretanto, sem testamento válido e eficaz não há que se falar na figura do legatário. Observe-se que uma mesma pessoa pode ser herdeiro e legatário, no mesmo processo sucessório. 4.3. Quanto ao modo: 4.3.1. Por Direito Próprio: quando o sucessor está na vez da ordem vocacional. 4.3.2. Por Representação: quando a lei autoriza certos herdeiros a assumirem o lugar de seu antecessor na sucessão do de cujus (art. 1.851, CC). 4.3.3. Por Transmissão ou Cessão: quando uma pessoa recebe o patrimônio hereditário por cessão da herança ou por ordem legal, sem, entretanto, assumir a condição de herdeiro ou legatário (arts. 1.793 e 1.813, CC). Em Destaque: A. A abertura da sucessão somente ocorre no momento da morte do de cujus que, em regra, é provada pela Certidão de Óbito; Exceção: morte presumida do ausente (sentença judicial transitada em julgado). B. No momento exato da morte do antecessor (de cujus), os herdeiros adquirem a posse e a propriedade dos bens que compõem o acervo hereditário, sem depender da prática de qualquer ato posterior (art. 5º, XXX, da CF) _ PRINCÍPIO DE SAISINE; Exceção: morte presumida do ausente. C. Para que o herdeiro, legítimo ou testamentário, receba a herança, é necessário que o mesmo sobreviva ao de cujus, ainda que por um irrisório tempo. Importante é determinar a exata hora da morte. Entretanto, quando duas ou mais pessoas falecem em um mesmo evento e, não sendo possível esclarecer quem morreu primeiro, o direito pátrio considera a morte como simultânea (comoriência – art. 8º, do CC), não havendo transmissão de direitos hereditários entre os mesmos. D. Para que os sucessores recebam a herança será necessário realizar a apuração da capacidade sucessória. BIBLIOGRAFIA DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro: Direito das Sucessões. São Paulo: Saraiva, 2008. DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: RT, 2008. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito das Sucessões. São Paulo: Atlas, 2004.