Carta ao Editor
Acerca de um critério para indicação
de paratireoidectomia em paciente com
hiperparatireoidismo primário assintomático.
Momento para mudança?
PREZADO EDITOR,
REFERÊNCIAS
O hiperparatireoidismo primário é uma doença freqüente nos
países desenvolvidos. Considerado raro nos países em
desenvolvimento, há evidência de que o aumento no diagnóstico tem implicado um incremento significativo de doentes
submetidos ao único tratamento definitivo, a abordagem
cirúrgica.
Nos países em desenvolvimento, o acompanhamento
periódico de indivíduos considerados assintomáticos é mais
custoso e nem sempre o mais seguro. Ainda assim, o consenso
desenvolvido nos Estados Unidos é bastante empregado para
definir quais pacientes assintomáticos devem ser
encaminhados à cirurgia1.
Um dos critérios nos parece impreciso e passível de crítica é
redução da depuração da creatinina de 30% em relação a
indivíduos normais da mesma faixa etária.
O primeiro problema nesse critério é determinar qual o valor
normal da depuração da creatinina normal para cada faixa
etária. De fato, é difícil encontrar uma referência que permita a
comparação. Sesso et al. mostraram que a depuração de
creatinina apresenta redução de cerca de 2mL/min a cada ano
de envelhecimento numa população de idosos brasileiros, mas
14,5% dos indivíduos não apresentaram declínio da função
renal2. Essa observação parece mostrar a dificuldade de
definir a depuração de creatinina normal para cada idade.
Não obstante esse problema prático na aplicação do critério, há
outro fato mais grave a ser pensado. O dano à função renal
pode estar subestimado nos doentes com hiperparatireoidismo
primário. Lins demonstrou que, para um mesmo valor de
calcemia, os portadores de hiperparatireoidismo primário
apresentavam taxa de filtração glomerular 100% maior do que
pacientes com hipercalcemia causada por intoxicação por
vitamina D, sarcoidose ou câncer. Entretanto, observou que,
enquanto o tratamento da hipercalcemia melhorou a taxa de
filtração glomerular nos últimos, não houve mudança na taxa
de filtração glomerular nos portadores de hiperparatireoidismo
primário submetidos à operação com sucesso3.
No nosso entender, o referido critério, em sua redação atual,
pode estar prejudicando alguns indivíduos que apresentarão
perda silenciosa de sua função renal, não mais recuperável
após a operação. Sua revisão parece necessária, ainda que
consensos e diretrizes devam ser sempre empregados como
bóias de navegação e jamais como antolhos.
1. Bilezikian JP, Potts JT Jr, Fuleihan Gel-H, Kleerekoper M, Neer R,
Peacock M, Rastad J, Silverberg SJ, Udelsman R, Wells AS. Summary
statement from a workshop on asymptomatic primary hyperparathyroidism: a perspective for the 21st century. J Clin Endocrinol Metab.
2002;87(12):5353-61.
2. Sesso R, Prado F, Vicioso B, Ramos LR. Prospective study of
progression of kidney dysfunction in community-dwelling older adults.
Nephrology (Carlton). 2008;13(2):99-103.
3. Lins LE. Renal function in hypercalcemia. A clinical and experimental
study. Acta Med Scand Suppl. 1979; 632:1-46.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 39, nº 1, janeiro / fevereiro / março 2009
Fábio Luiz de Menezes Montenegro
Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço (DCCP),
Departamento de Cirurgia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo
(FMUSP), Laboratório de Investigação Médica (LIM) 28 – Doutor pela FMUSP.
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255, Instituto Central – 8o andar Sala 8174
– 05403-000 São Paulo/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
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