Passo a passo da implantação da estimativa da taxa de
filtração glomerular (eTFG):
1
Identificar o método para a análise de creatinina sérica usado no seu
laboratório.
Esta informação deve constar na bula dos kits utilizados. Os métodos mais
comuns são os colorimétricos, que usam a reação do picrato alcalino
(Jaffé modificada). Alguns laboratórios usam métodos enzimáticos, que
são mais específicos para a creatinina.
Caso o seu laboratório ainda não use duas casas decimais para expressar o
resultado de creatinina, aproveite para iniciar este uso, passando a
reportar valores, por exemplo, como 3,34mg/dL ou 1,25mg/dL ao invés de
3,3mg/dL ou 1,2mg/dL.
2
Identificar se o seu método foi estabelecido com o uso de um calibrador
rastreável a ID-MS (isothope dilution – mass spectometry - espectometria de
massas com diluição isotópica).
Alguns fabricantes não incluem esta informação na bula, porém as grandes
empresas multinacionais, em geral, a fornecem. Para qualquer método de
determinação da creatinina, a sua calibração pode ser classificada de duas
formas, de acordo com o método usado:
2.1-Métodos com calibradores não rastreáveis aos métodos de
referência ID-MS.
Métodos não calibrados desta maneira, isto é, não rastreáveis ao ID-MS,
em geral, produzem valores, pelo menos, 10% acima do valor real. Este é
o caso do método de Jaffé original ou Jaffé cinético modificado.
2.2-Métodos com calibradores rastreáveis aos métodos de referência
ID-MS.
Métodos assim calibrados produzem resultados de creatinina mais
próximos ao valor real. Vários fabricantes, tanto multinacionais, como
nacionais, já alteraram os seus métodos para calibrá-los contra um
método de referência. Recomendamos, sempre que possível, escolher um
método com calibração rastreável a ID-MS.
3
Estabelecer qual multiplicador inserir na fórmula para o cálculo da
estimativa da filtração glomerular (eTFG), de acordo com o seu método.
Existem várias fórmulas para estimar a TFG. A fórmula mais amplamente
validada é a MDRD 4v (de quatro variáveis), que se mostrou superior à de
Cockcroft-Gault e mesmo superior ao Clearance de creatinina em amostras
de 24 horas de urina, quando comparadas ao método de referência
(clearance da inulina). Portanto, no dia a dia do laboratório, o uso de
fórmulas para estimativa da Taxa de Filtração Glomerular produz um
resultado mais próximo ao verdadeiro que os métodos laboratoriais de
rotina. O clearance de creatinina só é superior quando a produção basal
de creatinina é anormal (alterações de massa muscular como amputados,
paraplégicos, malnutridos ou dieta vegetariana).
3.1-Para os laboratórios que usam métodos com calibradores não
rastreáveis aos ID-MS.
Fórmula MDRD 4v com um fator de correção “186”:
eTFG (mL/min/1,73 m2) = 186 x (creatinina sérica)-1,154 x (Idade)-0,203 x
(0,742 se mulher) x (1,212 se indivíduo dos EUA de origem africana,
considerado como raça negra em outras localidades)
3.2- Para os laboratórios que usam métodos colorimétricos com
calibradores rastreáveis ao ID-MS.
Fórmula MDRD 4v com fator de correção “175”:
eTFG (mL/min/1,73 m2) = 175 x (creatinina sérica)-1.154 x (idade)-0.203
x (0,742 se mulher) x (1,212 se indivíduo dos EUA de origem africana,
considerado como raça negra em outras localidades)
Estimativa da Taxa de Filtração Glomerular em
Crianças
Para os interessados em implantar a estimativa da TFG em crianças, o
recomendado é o uso da Fórmula de Schwartz simplificada, já atualizada
para os novos métodos calibrados contra ID-MS, de aplicação à beira do
leito (Pediatr Nephrol (2010) 25:2321–2326):
eTFG= 0,413*[Altura(centímetros)/Creatinina sérica(mg/dL)]
Para métodos não calibrados contra calibradores rastreáveis a método IDMS, pode-se usar a Formula de Counaham & Barratt (Arch Dis Child.
1976;51:875-878).
eTFG= 0,43*[Altura(centímetros)/Creatinina sérica(mg/dL)]
Observações/limitações:
1-Raça
A raça do paciente não se encontra disponível na grande maioria dos
laboratórios e, acrescentar esta informação poderia criar um
constrangimento, inclusive com implicações jurídicas. Além disso, a
definição de raça foi originalmente estabelecida nos EUA, com pacientes
classificados como caucasianos ou norte americanos africanos. Esses
padrões raciais não são característicos da população brasileira, mas podem
ser usados como uma referência.
Como relatar? Alguns laboratórios optam por relatar ambos os resultados.
Outros laboratórios não fazem correção para a raça negra, dadas as
características peculiares da população brasileira, que dispensam tal
correção. Alguns laboratórios usam uma ampla faixa de resultados,
incluindo desde o valor para negros a até o valor para caucasianos. Neste
momento, ainda não recomendamos uma maneira definida de relatar o
resultado, deixando a escolha ao laboratório.
2-Relato de valores de eTFG maiores que60mL/min/m2.
Há uma recomendação expressa da National Kidney Foundation para não
se relatar o valor numérico de um resultado de eTFG acima de 60
mL/min/1,73m2.
Por exemplo: ao invés de relatar 78 mL/min/1,73m2, relatar > 60
mL/min/1,73m2.
Acima destes valores, a incerteza do resultado (+/- 30%) aumenta muito,
já que estes valores são produzidos com dosagens de creatinina muito
baixas, onde o erro no valor analisado é ampliado no valor calculado da
eTFG.
3- Aproximar resultados
Os resultados do cálculo da eTFG devem ser arredondados para o numero
inteiro mais próximo. Por exemplo: Não relatar 32,5mL/min/1,73m2,
relatar 32mL/min//1,73m2.
4-Unidades
A unidade usada é mL/min/1.73m2. Exemplos: 32mL/min/1,73m2.
5-Altura
No caso de crianças, as fórmulas preconizam o uso da altura da criança.
Portanto esta informação deve ser coletada junto ao paciente ou
responsável. Alguns laboratórios optam por incluir uma observação no
laudo dizendo que este dado foi “informado pelo paciente ou seu
responsável”.
Artigo de referência
National Kidney Foundation. K/DOQI Clinical Practice Guidelines for
Chronic Kidney Disease: Evaluation, Classification and Stratification. Am J
Kidney Dis 39:S1-S266,
2002 (suppl 1). Acessível na internet em: www.kdoqi.org.
Valores de referência:
Adultos
Os valores de referencia para adultos saudáveis são: acima de 60 mL/min/
1.73m2.
Convém lembrar que há uma diminuição fisiológica da TFG com a idade.
Pacientes com mais de 40 anos perdem, em geral, perto de 1 mL/min da
TFG por ano, devido a perdas de néfrons como parte do processo de
envelhecimento. Portanto, não se pode assumir sempre que uma eTFG
menor de 60 mL/min/1,73 m2 seja indicativo de doença renal crônica para
pacientes com mais de 70 anos. Assim, de um idoso de 80 anos pode se
esperar uma eTFG de 45-50 mL/min/1,73 m2.
Crianças e adolescentes
Valores de referência de TFG para crianças (NKF-K/DOQI: Pediatrics
2003;111:1416 –1421):
Idade (sexo – gênero)
TFG média +/- DP (mL/min/1,73m2)
1semana
41+/- 15
2-8 semanas
66 +/- 25
8 semanas a 2 anos
96 +/- 22
2-12 anos
133 +/- 27
13-21 anos (sexo masculino)
140 +/- 30
13-21 anos (sexo feminino)
126 +/- 22
Até 12 anos de idade, os intervalos de referência são os mesmos,
independentemente do sexo da criança.
Como a partir dos 2 anos de idade os valores são próximos aos do adulto,
pode-se, a partir desta idade, empregar os mesmos intervalos dos adultos.
Sugestão relato
mL/min/1.73m2)
de
valores
de
referência
para
1semana
41 +/- 15
2-8 semanas
66 +/- 25
crianças
(em
8 semanas a 2 anos
> 2 anos
96 +/- 22
acima de 60
Quando não usar eTFG
1-Idade
Não usar as fórmulas de adultos (MDRD) para crianças ou adolescentes
(com menos de 18 anos).
Não usar a fórmula MDRD 4v em idosos com mais de 70 anos.
2-Hospitalizados
Indivíduos com concentrações de creatinina instáveis: pacientes
hospitalizados, com sérias condições mórbidas (em particular pacientes
com insuficiência renal aguda).
3-Produção de Creatinina Alterada
Extremos de massa muscular (amputados; paraplegia; fisiculturistas) ou
indivíduos com dietas vegetarianas.
OBS: impactos previstos
O uso destes cálculos deverá produzir um estreitamento do contato entre
os médicos (o Patologista Clínico e o colega que está assistindo ao
paciente). A classificação de doença renal crônica em estágios de
filtração glomerular é recente (2002) e a maioria dos médicos ainda não
está familiarizada com o seu uso. Portanto, há grande chance de que o
Patologista Clínico tenha que orientar este colega em relação às suas
duvidas, especialmente sobre quando referir o paciente para um
nefrologista.
A diminuição da eTFG só configura DRC se persistir por 3 meses. A
confirmação pode ser realizada por pesquisa de proteinuria, tanto com
testes qualitativos (fitas reagentes para proteína total ou albumina) ou
quantitativos
(relação
albuminúria/creatininura,
ou
relação
proteinuria/creatininuria), em amostra isolada, 12 horas noturnas ou 24
horas.
A Sociedade Brasileira de Nefrologia recomenda uma abordagem em
conjunto com o nefrologista a partir do estágio 3 tardio (estágio 3B = TFG
30-44 mL/min) e considera imprescindível o encaminhamento a um
nefrologista antes que a eTFG seja inferior a 30mL/min (estágio 4 ou 5 da
DRC), ou sempre que for identificada proteinúria persistente (confirmada
após 3 meses com método quantitativo), independente do estágio de DRC/
TFG. Vale salientar que o encaminhamento para o nefrologista de
pacientes com valores inferiores a 30mL/min/1,73m2 é indispensável.
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