A CLÍNICA NO HOSPITAL GERAL: A ESCUTA DO SUJEITO NA DOENÇA Jandyra Maria Kondera A psicologia é uma ciência que nasceu não apenas de um determinado contexto da história – século XX. Ela surge também devido a um vácuo deixado um pouco antes pela medicina. Esta, ao centrar sua pesquisa e intervenção amparada pelo desenvolvimento da tecnologia e pelo consentimento da igreja de estudar o corpo morto, “dispensou” o doente da qualidade de informante. Disto resultou um recalcamento da história do doente com sua doença. Logo, a subjetividade passa a ser ad latere ao interesse da medicina e isso abre caminho para que uma outra clínica venha debruçar-se novamente sobre o leito do paciente a escutá-lo no seu mal-estar. Esta é a via a que este curso pré-congresso visa resgatar, indo assim como alternativa às outras abordagens que visam orientar, instruir, adaptar ou acompanhar pacientes em hospital geral. Partindo do conceito de que sujeito é aquele que, considerando sua etimologia latina, tanto está sob como sobre a fala, escutá-lo requer trazer à tona tanto o que subjaz ao discurso de sua doençacomo à que discurso ele está submetido segundo os médicos sobre sua doença. Se no ambiente hospitalar obviamente o conhecimento e a intervenção médica são dominantes, como não poderia deixar de ser, é mesmo ali que se sustenta uma prática que consiste em mostrar um outro domínio. Explicando melhor: o que acontece quando um paciente não adere ao tratamento por mais bem orientado que seja?,o que acontece quando um paciente se recusa a submeter-se a uma cirurgia que poderia salvá-lo?, o que acontece quando um obeso vai ao ambulatório de obesidade mórbida comendo seus salgadinhos?, etc Então, por mais dominante que seja o afazer médico no ambiente hospitalar, algo simultaneamente insiste em dominar também, em fazer um outro domínio – aqui entendido como outro campo, outro território, extraterritorial ao conhecimento da medicina. Trata-se do saber que está, e sempre esteve, do lado do paciente. Saber que nem ele mesmo sabe que sabe, posto tratar-se de um saber inconsciente. É este saber que domina e faz oposição ao conhecimento médico. Muito embora este saber não se declare por linhas retas, a escuta do sujeito na doença oferece a possibilidade de ler as linhas tortas que fazem padecer o corpo. Retomando assim a importância da fala do sujeito – sua queixa, a origem e a história de seu padecimento, o lugar que isso tem em sua relação ao outro, o valor de sua dor, a relação que ela tem com sua rede de relações e de trabalho, etc – podemos oferecer a possibilidade de tratar o real da doença pelo simbólico da palavra. E oferecer a ocasião de dar palavras a isso, pode tornar o real mais suportável e até criar novas formas de lidar com isso.