SEGUNDA TURMA RECURSAL JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ Processo nº 200870500127099 Recorrente: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos Recorrido: Jairiçon Mangoli Relatora: Juíza Federal Ivanise Corrêa Rodrigues Perotoni VOTO 1. Relatório Trata-se de recurso contra sentença que julgou procedente o pedido inicial para o fim de condenar a recorrente ao pagamento de indenização por danos materiais e morais experimentados pelo recorrido em razão da impossibilidade de participar das provas de concurso público em razão de ter recebido documento de convocação contendo indicação incorreta do local de realização. Em suas razões recursais a recorrente suscita preliminares de ilegitimidade passiva ad causam e litisconsórcio passivo necessário, argumentando que não teria sido responsável pela indicação dos locais de prova do concurso e sim a AESA – Assessoria de Estudos Avançados, contratada para a realização do certame. No mérito, defende, em síntese, o descabimento de indenização por danos materiais e morais, porquanto não preenchidos os requisitos legais a tanto. Foram apresentadas contrarrazões e os autos vieram a esta Turma Recursal. 2. Voto Conforme se observa nos autos, a recorrente celebrou contrato administrativo para realização de concurso público com a AESA – Assessoria de Estudos Avançados Ltda. (Evento 6, PROCADM1). Em razão de receber correspondência indicando local de prova incorreto, o recorrido não pode prestá-la, restando alijado do certame. Afirma o recorrido ter sofrido prejuízos em razão disso, relativos a despesas com inscrição e deslocamento para o local de prova, pleiteando indenização por danos materiais e morais. Observo inicialmente que, via de regra, a responsabilidade civil no âmbito da Administração Pública é objetiva, conforme se observa do teor do art. 37, § 6° da Constituição: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. Sendo assim, independentemente da apuração de culpa ou dolo, demonstrado o nexo causal entre o fato lesivo imputável à Administração e o dano, exsurge para o ente público o dever de indenizar o particular, mediante o restabelecimento do patrimônio lesado. Todavia, encontra-se subjacente à regra constitucional a teoria do risco administrativo. Nesse sentido, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, a SEGUNDA TURMA RECURSAL JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ noção de culpa faz-se relevante nas hipóteses de participação - exclusiva ou concorrente - do administrado ou de terceiro no evento danoso, situação em que a responsabilidade sofre mitigação ou de todo é afastada (RE 217.389. Rel. Min. Néri da Silveira, DJ: 24/05/2002; RE 178.806, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ: 30/06/1995). Para que ocorra a responsabilização civil, seja em relação a danos materiais, seja em relação a danos morais, conforme se observa no art. 186 do Código Civil, impõe-se a presença concomitante de três elementos indispensáveis: conduta ilícita atribuída ao agente, nexo de causalidade e existência de dano. No caso vertente estão presentes, a princípio, todos esses elementos, o que autorizaria o recorrido a pleitear a reparação de danos. Todavia, a conduta ilícita que teria dado origem ao dano não é imputável à recorrente, mas à a AESA – Assessoria de Estudos Avançados Ltda., responsável pela realização do concurso público. Conforme se observa na cláusula terceira, subitem 3.3, do pacto celebrado entre as partes (evento 6, PROCADM1), não constavam dentre as obrigações contratuais da recorrente a convocação dos candidatos inscritos e a informação do local de prestação das provas. Por outro lado, a própria AESA – Assessoria de Estudos Avançados Ltda., empresa contratada, em correspondência enviada à recorrente (evento 6, PROCAD2), reconhece sua responsabilidade ao informar que laborou em erro e que estaria tomando providências a respeito. In verbis: ”A AESA ASSESSORIA DE ESTUDOS AVANÇADOS, empresa que está realizando o concurso público dos correios, vem por meio desta comunicar que um lote com cerca de 4.500 correspondências que estão com locais de provas incorretos. Em decorrência deste acontecido a AESA está tomando as seguintes providências... (sic). A omissão de cuidado que caracteriza a culpa in vigilando foi da empresa contratada, inexistindo participação culposa da recorrente, a qual não pode ser inserida na relação de direito material discutida nos autos pois inexiste nexo causal entre o dano produzido e qualquer ação ou omissão praticada por ela. Tampouco se cogita de culpa in eligendo da recorrente, porquanto a contratação se deu sob os auspícios da Lei n° 8.666/1993, e subsidiariamente da Lei Complementar n° 123/2006, da Lei n° 11.488/2007 e da Lei n° 10.520/2002, conforme constou expressamente na cláusula décima primeira, subitem 11.2 do instrumento contratual (evento 6, PROCADM1). Ressalto que tratando-se de contrato administrativo, a relação jurídica dele decorrente é regida pela Lei n° 8.666/1993, a qual estabelece: SEGUNDA TURMA RECURSAL JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ “Art. 70 - O contratado é responsável pelos danos causados diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão interessado”. Por outro lado, constou expressamente na cláusula segunda, subitens 2.6 e 2.12 do instrumento contratual ser responsabilidade da empresa contratada: “Responder, diretamente, por quaisquer perdas, danos ou prejuízos que vier a causar à contratante ou a terceiros, decorrentes de sua ação ou omissão, dolosa ou culposa, na execução deste Contrato, independentemente de outras cominações contratuais ou legais a que estiver sujeita”. “Responsabilizar-se pela execução dos serviços contratados, obrigando-se a reparar, exclusivamente às suas custas e dentro dos prazos estabelecidos, todos os erros, falhas, omissões e quaisquer outras irregularidades verificadas na execução dos serviços, indenizando a ECT ou terceiros por qualquer dano ou prejuízo causado à mesma, a seus servidores ou a terceiros, decorrentes desses erros, falhas, omissões ou irregularidades”. Desse modo, entendo que não pode ser imputada à recorrente responsabilidade por eventuais danos experimentados pelo recorrido. Assiste-lhe, pois, razão no tocante à sua ilegitimidade passiva ad causam, a qual, segundo norma cogente do § 3° do art. 267 do CPC, deve ser declarada de ofício em qualquer tempo ou grau de jurisdição. Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO AO RECURSO, para, reformando a sentença, extinguir o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI do CPC. Sem honorários. IVANISE CORREA RODRIGUES PEROTONI Juíza Federal Relatora