Enquadramento geral das regras de concorrência Faculdade de Direito Universidade Nova 2008/20091 Concorrência e economia de mercado: os fundamentos epistemológicos e de filosofia moral • Thomas Hobbes, “Leviathan”, 1651 – “By Liberty, is understood, according to the proper signification of the word, the absence of external impediments: which impediments, may oft take away part of a man’s power to do what he would; but cannot hinder him from using the power left him, according as his judgment, and reason shall dictate to him” (Ch. XIV, 2). • John Locke, “On Government”, 1690 – “Everibody has the unalienable right to pursue hapiness and to define his or her interest”. 2 Concorrência e economia de mercado: os fundamentos epistemológicos e de filosofia moral • Adam Smith, “An Inquiry into the Nature and Causes of The Wealth of Nations”, 1776 – “[Every individual] generally […] neither intends to promote the public interest, nor knows how much he is promoting it. […] and by directing that industry in such a manner as its produce may be of the greatest value, he intends only his own gain, and he is in this, as in many other cases, led by an invisible hand to promote an end which was no part of its intention. […] By pursuing his own interest he frequently promotes that of the society more effectually than when he really intends to promote it” (Vol. IV, Ch. II). • John Stuart Mill, “On Liberty”, 1859 – “The only freedom which deserves the name is that of pursuing our own good in our own way, so long as we do not attempt to deprive others of theirs or impede their efforts to obtain it” (p. 19). 3 Concorrência e economia de mercado: os fundamentos epistemológicos e de filosofia moral • Kaysen & Turner, “Antitrust Policy: An Economic and Legal Analysis”, 1959 – “Competition […] is desirable because it substitutes an impersonal market for the personal control of powerful business executives, or for the personal control of government bureaucrats” (p. 14). • F. A. Hayek, “Law, Legislation and Liberty”, 1973 - “Since a spontaneous order results from the individual elements adapting themselves to circumstances which directly affect only some of them, and which in their totality need not be known to anyone, it may extend to circumstances so complex that no mind can comprehend them all” (Vol. 1, Ch. 2, p. 41). 4 Concorrência e economia de mercado: a razão de ser e os objectivos da política de concorrência • John Locke - “Two Treatises of Government”, 1690 - ”…where there is no Law, there is no Freedom. For Liberty is to be free from restraint and violence from others which cannot be, where there is no Law: But Freedom is not, as we were told, A Liberty for every man to do what he lists: (For who could be free, when every other Man’s Humour might domineer over him?), § 57. • Jean-Jacques Rousseau, “Du contrat social”, 1762 – “’Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja de toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado e em que cada um, ao unir-se a todos, só a si mesmo obedeça e continue tão livre como antes. Tal é o problema fundamental que encontra solução no contrato social” (Livre I, Chapitre VI). • Adam Smith, “An Inquiry into the Nature and Causes of The Wealth of Nations”, 1776 – “People of the same trade seldom meet together, even for merriment and diversion, but the conversation ends in a conspiracy against the public, or in some contrivance to raise prices” (Vol. 1, Ch. X, Part II). 5 Concorrência e economia de mercado: a razão de ser e os objectivos da política de concorrência • Ludwig von Mises, “Human Action: A Treatise on Economics”, 1949 - “The pure market economy assumes that government, the social apparatus of compulsion and coercion, is intent upon preserving the operation of the market system, abstains from hindering its functioning, and protects it against encroachment on the part of other people (p. 239). • Walter Eucken – “Grundsätze der Wirtschaftspolitik”, 1959 – “Tal como no Estado constitucional, a ordem concorrencial tem necessidade de um quadro no qual a liberdade de acção individual seja limitada pela preservação da esfera de liberdade dos outros de tal maneira que as esferas de liberdade individual alcancem um equilíbrio” (p. 156). • F. A. Hayek, “Law, Legislation and Liberty”, 1973 - “Every organization in which the members are not mere tools of the organizer will determine by commands only the function to be performed by each member, the purposes to be achieved, and certain general aspects of the method to be employed, and will leave the detail to be decided by the individuals on the basis of their respective knowlege and skills” (Vol. 1, Ch. 2, p. 49). 6 As Origens do Direito Comunitário da Concorrência A matriz norte-americana • O Registo de Nascimento do Direito Europeu da Concorrência. • Os textos legislativos no direito norte - americano: – Sherman Act (1890): proibição dos monopólios, acordos, concertações (“combinations”) e cartéis (“conspiracy”) restritivos do comércio – sanções: coimas e prisão; – Clayton Act (1914): à discussão à volta da “rule of reason” no Sherman Act – o caso Standard Oil de 1911 (apenas as restrições de concorrência “irrazoáveis” são proibidas); tentativa de reforço e clarificação; responsabilidade pelos prejuízos. § 7: controlo das concentrações – critério “substantially to lessen competition or to tend to create a monopoly”. 7 As Origens do Direito Comunitário da Concorrência A matriz norte-americana • Os textos legislativos no direito norte americano: – i. ii. – Alterações ao Clayton Act: Robinson-Patman Act, 1936 (“price discrimination”); Celler – Kefauver Amendment, 1950 – reforço das disposições sobre controlo das concentrações. Federal Trade Commission Act, 1914. 8 As Origens do Direito Comunitário da Concorrência A matriz norte-americana e os fundamentos epistemológicos • As diferentes Escolas: – A Escola de Chicago e a preferência pela análise comportamental - Friedman, Stigler, Demsetz ; Aaron Director, Posner, Easterbrook, Bork. O “new learning”: “alocative efficiency” e “consumer welfare”; as economias de escala e de gama e a concentração eficaz; o “reaganismo” (1980) e as orientações do DoJ; Sylvania e a rule of reason (cfr. Leegin); protecção da concorrência e não dos concorrentes. – Os “estruturalistas” da Escola de Harvard (Mason e Bain) e o “paradigma S-CP” (structure-conduct-performance); a “Earl Warren Supreme Court”, a aversão à concentração e o enforcement agressivo da política de concorrência; – A “corrente realista”; a “nouvelle vague” ou “new industrial economics”: os esquemas S-C-P abertos e os mecanismos de feed-back; a crítica do underenforcement; a concorrência como processo; a “new industrial economics” (Sherer, Fox, Pitofsky, Sullivan). 9 As Origens do Direito Comunitário da Concorrência A matriz norte-americana e os fundamentos epistemológicos • Política norte-americana e política europeia de concorrência em perspectiva – semelhanças e diferenças: Os objectivos: integração económica v. allocative efficiency; A incorporação de valores políticos e sociais; a moderna aproximação europeia às preocupações concorrenciais e de eficiência; a convergência de princípios; concorrência e intervenção: market failures v. government failures; Os textos legislativos e os mecanismos de enforcement: imposição administrativa v. private enforcement – a convergência. Sanções penais v. sanções administrativas. 10 O Paradigma da Concorrência Perfeita • Os pressupostos e os Resultados do Modelo de Concorrência Perfeita Os pressupostos: (i) atomicidade do mercado; (ii) transparência perfeita; (iii) homogeneidade dos produtos; (iv) mobilidade da procura e da oferta; (v) objectivo da maximização dos lucros. Resultados: maximização da eficiência estática – (i) os recursos da economia são distribuídos entre os diferentes usos (produção de diferentes bens e serviços) de tal maneira que não é possível que alguém fique melhor sem piorar a posição de outrem; maximização do bem-estar dos consumidores (“allocative efficiency” ou “óptimo de Pareto”); (ii) máxima produção de bens e serviços ao menor custo possível – preço igual ao custo marginal (“productive efficiency”); Concorrência e monopólio: a questão da eficiência dinâmica: o incentivo à inovação e o desenvolvimento de novos produtos; Joseph Schumpeter, e o “processo de destruição criadora” – “Capitalism, Socialism and Democracy”, 1942; os monopolistas ameaçados – Xerox, IBM, Microsoft. 11 A Questão do Monopólio • Os inconvenientes: O monopolista é um “price maker”; Ausência de incentivo a maximizar a produção (“allocative inefficiency”); Redução da pressão concorrencial para a baixa de custos (“Xinefficiency” ou “the golf effect”); Transferência de riqueza do consumidor para o monopolista. • As vantagens e limitações do monopólio: Maior capacidade financeira para inovar; O monopolista não controla ao mesmo tempo preços e quantidades; O monopolista e a concorrência potencial. 12 Concorrência, monopólio e realidade I • • • • • • • • Os pressupostos da concorrência perfeita não se verificam na realidade. Os mercados reais entre a concorrência e o monopólio: a concorrência imperfeita e o oligopólio. Diferenciação dos produtos: lealdade à marca. Informação insuficiente e assimétrica. Barreiras à entrada e à saída. As externalidades: custos para a sociedade – poluição, riscos para saúde e segurança. Economias de escala e de gama. Efeitos de rede - o valor de um bem aumenta com o número de consumidores (telecoms, software – benefícios v “tipping effects”; obrigações de acesso v obstáculo à inovação) – e “two-sided markets” – jornais, TV e publicidade; cartões de crédito. 13 Concorrência, monopólio e realidade II • • • • • • Monopólios naturais v monopólios legais: a questão da mínima dimensão eficiente – concorrência pelo mercado v concorrência no mercado. Sectores específicos: agricultura (PAC); mercado de trabalho (convenções colectivas fora do artigo 81.º); o caso das profissões liberais; concorrência e desporto. Restrições benéficas para a concorrência? – segurança (transporte aéreo); artigo 81.º, n.º 3. Os argumentos errados contra a concorrência: a “paz podre” do status quo; o declínio cíclico ou estrutural; os custos da concorrência (publicidade, entradas e saídas). Concorrência v política industrial (o caso dos campeões nacionais) v PI. Concorrência e racionalidade. 14 Os Objectivos da Política de Concorrência • A protecção da Concorrência como um processo. • Protecção da concorrência v. Protecção dos concorrentes – as falsas regras de concorrência. • Eficiência económica v outros objectivos. • A noção de poder de mercado como noção central na política de concorrência – capacidade para aumentar os preços de maneira proveitosa e consistente acima dos níveis de concorrência (ou vice-versa). 15 Enquadramento geral das regras de concorrência • Direito Comunitário e Nacional da Concorrência proíbem certas condutas dos agentes económicos no mercado: Entre outras... • Abusos de posição dominante; • Acordos restritivos da concorrência. 16 Enquadramento geral das regras de concorrência • Abusos de posição dominante: • Empresa em posição dominante – na sua actuação no mercado não sofre concorrência significativa ou assume uma preponderância relativamente aos concorrentes (poderio económico que permite uma actuação independente face aos concorrentes, cliente e consumidores). ESPECIAL DEVER DE CUIDADO NA RESPECTIVA ACTUAÇÃO » Identificação do mercado relevante – mercado dos carros de passageiros vs. mercado dos carros de passageiros de luxo; no EEE vs. Nacional? » Quotas de mercado – ≤40% risco de posição dominante no mercado diminuto; >50% risco de existência de posição dominante; >75% provável existência de posição dominante. Nec. ver outros factores ex. barreiras à entrada e poder de mercado do comprador. 17 Enquadramento geral das regras de concorrência • Acordos restritivos da concorrência: • Noção ampla de acordo – cobre praticamente todos os tipos de entendimento entre duas ou mais entidades; • Não abrange os acordos celebrados no âmbito do mesmo Grupo; Acordos Horizontais e Verticais: • Horizontais – entre concorrentes (ex. fixação de preços, restrição de capacidades, partilha de mercados e de informações); • Verticais – entre fornecedores e clientes (ex. preços fixos ou mínimos de revenda, fornecimento/ compra exclusivos – em alguns casos -, proibições de exportação / outras restrições territoriais, acordos de fornecimento de longa duração). 18 Enquadramento geral das regras de concorrência Nulidade dos Acordos • Acordos são nulos por conterem cláusulas restritivas da concorrência EXCEPTO se as partes contratantes conseguirem provar que cumulativamente se preenchem as seguintes condições: » Contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos bens ou serviços ou são aptos a promover o desenvolvimento técnico ou económico; » Reservem aos utilizadores uma parte equitativa do benefício; » Não imponham restrições indispensáveis; » Não dêem às empresas a possibilidade de eliminar a concorrência no mercado. OU Regulamentos de isenção por categoria (aplicam-se aos acordos com efeitos comunitários e nacionais por via do n.º 3 do artigo 5.º da Lei da Concorrência) 19 Consequências das violações ao Direito da Concorrência Consequências negativas para empresas • Coimas severas; • Nulidade de acordos; • Publicidade negativa. 20 Consequências das violações ao Direito da Concorrência Consequências negativas para empresas • Responsabilidade pessoal dos administradores sanção aplicável à empresa, especialmente atenuada; • Responsabilidade disciplinar dos colaboradores. 21 Muito obrigado Edifício Eurolex ▪ Av. da Liberdade n.º 224 ▪ 1250-148 Lisboa Tel. (351) 213 197 321 ▪ Fax. (351) 213 197 319 22