Teresa Gouveia Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas Prefácio O processo de integração europeia vive actualmente um momento único da sua história. Está em curso o processo de elaboração de um tratado constitucional que deverá ser o espelho de uma nova União assente na dupla legitimidade de Estados e povos, enriquecida nos seus valores e objectivos e reforçada nas suas coesão e solidariedade. Esta União estará mais apta a defender, com acrescidas visibilidade e eficácia, a sua agenda no mundo, contribuindo para que este seja socialmente mais equilibrado, mais pacífico, mais seguro e mais próspero. O projecto de tratado constitucional emanado da Convenção sobre o Futuro da Europa, que dá o tema ao presente número desta revista, foi considerado pelos chefes de Estado e de Governo uma boa base de trabalho para a conferência intergovernamental. Esta foi inaugurada em Roma, no dia 4 de Outubro de 2003, tendo-se, assim, iniciado um processo conducente a uma maior integração dos Estados da União. Nos conselhos europeus de Nice (2000) e Laeken (2001), a União definiu o quadro para fazer face aos desafios do alargamento que se avizinha: reforço da legitimidade democrática dos processos de decisão; mais transparência na sua actuação; e simplifi- cação de instrumentos e procedimentos para aumentar a eficácia. Pretendia-se, desta forma, criar as melhores condições de acolhimento para os novos países que em breve irão juntar-se ao projecto de integração europeia, reforçando a solidariedade, a coesão e a confiança mútua entre os Estados-membros, relembrando a importância de a União não se afastar dos valores que presidiram à sua criação e que têm tornado possível o desenvolvimento de um espaço de prosperidade e de paz. O Governo português acolheu positivamente o projecto de tratado constitucional, que trouxe maior simplificação de instrumentos e procedimentos, a incorporação da Carta dos Direitos Fundamentais no tratado e a extensão das matérias a serem decididas por maioria qualificada, consagrando-se o processo de co-decisão como o processo legislativo ordinário. Contudo, sempre foi considerado que o texto do projecto de tratado teria de ser aperfeiçoado por forma a incluir explicitamente, entre outros, o princípio da igualdade entre os Estados-membros, a preservação do equilíbrio interinstitucional e do método comunitário e o princípio da solidariedade e da coesão. Não posso deixar de referir, também, a importância de, no final de todo o processo, o tratado constitucional vir a ser julgado, quer 5 pelos parlamentos nacionais, quer, eventualmente, pelos cidadãos dos Estados-membros. É por isso fundamental que sejam ultrapassadas as diferenças de opinião e de interesses para se consolidar um texto final que represente o máximo denominador comum entre os Estados e os povos da União. Num mundo globalizado, onde a velocidade dos acontecimentos ultrapassa por vezes o rit- 6 mo a que eles podem ser percebidos e que constitui palco propício a fricções, a Europa pode dar um exemplo de abertura, tolerância e capacidade de ultrapassar as diferenças para prosseguir os desideratos dos seus pais fundadores. Como disse um dia Jean Monnet, “a Europa não se fará de um só golpe; ela far-se-á por realizações concretas criando, em primeiro lugar, uma solidariedade de facto”. Preface T he process of European integration is currently traversing a unique time in its history. A Constitutional Treaty is in the process of being prepared which should reflect a new Union based on the two-sided legitimacy of States and Peoples, with enhanced values and objectives and with greater cohesion and solidarity. This Union will be better prepared to defend its agenda in the World with greater visibility and efficacy, so that it will be a more socially balanced, more peaceful, safer and more prosperous place to live in. The Constitutional Treaty project, which arose from the Convention on the Future of Europe, which provides the theme for this issue of the magazine, was considered by the Heads of State and of Government as a good working basis for the Intergovernmental Conference. This was inaugurated in Rome on 4th October 2003, thereby commencing a process conducive to greater integration within the States of the Union. In the European Councils of Nice (2000) and Laeken (2001), the Union defined the framework to meet the upcoming challenges of enlargement: strengthening the democratic legitimacy of the decision-making processes; greater transparency in its actions; and simplification of instruments and procedures to increase efficacy. The idea was therefore to create the best conditions to welcome these new countries which would shortly be joining the project of European integration, strengthening solidarity, cohesion and mutual trust between Member States, recalling how important it is for the Union not to become too distanced from the values which presided over its creation and which have made the development of a space of peace and prosperity possible. The Portuguese Government positively welcomed the Constitutional Treaty Project which has greatly simplified instruments and procedures, the incorporation of the Chart of Fundamental Rights in the Treaty and the extension of issues to be decided by a qualified majority, formalising the process of co-decision as the ordinary legislative process. However, it was always felt that the text of the draft of the Treaty would have to be improved so as to explicitly include the principle of equality between Member States, the preservation of the inter-institutional balance and the community method and the principle of solidarity and cohesion, amongst other issues. 7 I should also mention the importance of the Constitutional Treaty being judged both by National Parliaments and possibly by the citizens of the Member States when the whole process is concluded. It is therefore fundamental that differences of opinion and of interests be overcome in order to draw up a final text which represents the common denominator between the States and the Peoples of the Union as much as possible. 8 In a globalized world, where the speed of events is sometimes greater than our capacity to grasp them, which can be fertile ground for friction, Europe can be an example of openness, tolerance and of the ability to overcome differences to pursue the desiderata of its founding countries. As Jean Monnet once said “Europe will not be forged by a single blow; she will be made by concrete realisations creating, in the first place, de facto solidarity”.