TÓPICOS MAIS IMPORTANTES
DO
PROJECTO DE NOVA LAV
António Sampaio Caramelo
Requisitos de validade substancial e formal
da convenção de arbitragem e sua não caducidade
• O critério da arbitrabilidade dos litígios – que, na actual LAV, é o da
disponibilidade dos direitos – passa a ser o da patrimonialidade dos
interesses em oposição, combinado com o critério de transigibilidade da
pretensão (como na lei alemã).
• Conferiu-se mais flexibilidade ao requisito da forma escrita da convenção
de arbitragem, conforme o preconizado na Lei Modelo da UNCITRAL.
• Suprimiram-se as causas de caducidade da convenção de arbitragem
previstas na art. 4º da actual LAV, dado que nenhuma delas justifica tal
efeito.
Constituição do tribunal arbitral e estatuto
dos árbitros (I)
• A constituição do tribunal arbitral foi regulada de forma mais precisa do
que se encontra na actual LAV.
• Regulou-se o modo como se deve constituir o tribunal arbitral nas
arbitragens com pluralidade de demandantes ou de demandados, tendo em
conta as soluções adoptadas no direito comparado, na sequência do
Acórdão Dutco (1992) da Cour de cassation francesa.
• Explicitou-se que a independência e a imparcialidade são requisitos
indispensáveis para se exercer a função (jurisdicional) de árbitro, como é
imposto pela Constituição da República, segundo a jurisprudência do
Tribunal Constitucional.
• Para conferir plena efectividade aos requisitos de independência e
imparcialidade dos árbitros, regulou-se o processo que permite às partes
afastar os árbitros que não os preencham, mediante recurso aos tribunais
estaduais, se necessário.
Constituição do tribunal arbitral e estatuto
dos árbitros (II)
• Facultou-se também às partes recorrerem aos tribunais estaduais para fazer
destituir os árbitros que não revelem a diligência ou a capacidade exigidas
pelo satisfatório cumprimento das suas funções.
• Na falta de acordo das partes sobre o montante e o modo de pagamento
dos honorários e despesas dos árbitros, conferiu-se ao tribunal arbitral
poder de decisão sobre esta matéria, mas os montantes assim fixados
poderão ser reduzidos pelo tribunal estadual competente, a requerimento de
qualquer das partes.
• Esclareceu-se que os árbitros não podem ser responsabilizados pelo
conteúdo das suas decisões, salvo nos casos em que podem sê-lo os juízes
dos tribunais estaduais (i.e., quando actuem com dolo ou culpa grave).
Competência da competência
do tribunal arbitral (I)
Consagrou-se o efeito negativo do princípio da competência da competência
do tribunal arbitral, conferindo-se prioridade a este para decidir sobre a sua
própria jurisdição, em relação a um tribunal estadual perante o qual tenha sido
proposta uma acção sobre o mérito da mesma causa, o que implica:
• que, existindo uma convenção de arbitragem, um tribunal estadual deva
declarar-se incompetente se nele for proposta uma acção com partes,
pedido e causa de pedir idênticos aos de uma acção arbitral pendente ou,
caso não esteja ainda pendente uma tal acção, se o litígio submetido àquele
tribunal estiver abrangido pela convenção de arbitragem invocada pelo réu
na acção proposta perante o tribunal estadual;
• que a apreciação da validade e eficácia dessa convenção pelo tribunal
estadual seja meramente perfunctória (apreciação prima facie), devendo este
declarar-se incompetente, a menos que verifique que, “manifestamente”, a
convenção de arbitragem é nula, ineficaz ou inexequível;
Competência da competência
do tribunal arbitral (II)
• que não possa ser proposta num tribunal estadual, antes ou depois de
instaurado um processo arbitral, acção declarativa de simples apreciação
destinada a fazer declarar a nulidade, ineficácia ou inexequibilidade da
convenção de arbitragem em que aquele processo se baseia (ao contrário do
que se admite noutras ordens jurídicas); e
• que uma tal acção não possa ser acompanhada ou precedida do
requerimento de procedimento cautelar destinado a impedir a instauração
ou a continuação do processo arbitral.
No entanto, o processo arbitral cessa e a sentença nele proferida deixa de
produzir efeitos logo que um tribunal estadual considere, mediante decisão
transitada em julgado, que o tribunal arbitral é incompetente para julgar o
litígio (os árbitros são os primeiros juízes da sua competência, mas a última palavra nesta
matéria deve pertencer aos tribunais estaduais).
Providência cautelares
• Suprindo uma grave lacuna da actual LAV, regulou-se detalhadamente a
matéria respeitante às providências cautelares que seja necessário decretar
na dependência de um processo arbitral.
• As mais importantes questões que, em face desta lacuna, podem suscitar-se
ainda não obtiveram respostas incontroversas na doutrina e na
jurisprudência: pode um tribunal arbitral decretar providências cautelares,
quando a convenção de arbitragem seja omissa? que providências pode ele
ordenar? como assegurar o cumprimento das providências decretadas?
• O Projecto de nova LAV procurou responder a tais interrogações,
seguindo, muito de perto, o conjunto de disposições que a UNCITRAL
aprovou em 2006, para serem inseridas no artigo 17 da sua Lei Modelo.
Regulação dos aspectos essenciais do
processo arbitral (I)
• Na regulação dos aspectos essenciais do processo arbitral (e só destes deve
a LAV tratar), tiveram-se em conta não só as disposições da Lei Modelo da
UNCITRAL e de leis estrangeiras que mais fielmente a seguiram, mas
também os ensinamentos da melhor doutrina publicada neste domínio.
• Visando contrariar a prática ainda dominante entre nós ― que não valoriza a
arbitragem como método alternativo de resolução de litígios ― esclareceuse que a definição das regras reguladoras do processo arbitral deve fazer-se,
em princípio, sem sujeição às normas processuais aplicáveis nos tribunais
estaduais.
• Impôs-se aos árbitros, às partes e à instituição administrante (quando exista)
um dever de sigilo sobre a informação obtida e documentação apresentada
no processo arbitral.
Regulação dos aspectos essenciais do
processo arbitral (II)
• De acordo com a solução generalizadamente aceite na doutrina e no direito
comparado, consagrou-se o efeito não cominatório da revelia do
demandado, estabelecendo-se ainda que a falta de apresentação de
contestação ou de prova por aquele não implica uma confissão tácita ou
ficta das afirmações do demandante.
• Contemplou-se a possível intervenção de terceiros em arbitragens em curso,
mas, como solução legal supletiva (pois que se admite que a convenção de
arbitragem preveja essa intervenção, com maior latitude), não se admitiu a
intervenção de terceiros sem o consentimento de todas as partes na
arbitragem, do terceiro e do próprio tribunal arbitral.
O tempo e o modo de prolação da sentença
arbitral (I)
• Sendo patentes a exiguidade do prazo (supletivo) de 6 meses estabelecido
pela actual LAV (cuja prorrogação depende do acordo das partes) para o
tribunal proferir sentença final sobre o fundo da causa, bem como os
inconvenientes daí decorrentes (e.g., a possível inutilização do processo
arbitral), fixou-se para este efeito um prazo inicial de doze meses,
prorrogável pelo tribunal arbitral, por uma ou mais vezes, por sucessivos
períodos de doze meses, mediante justificação adequada.
• Tais prorrogações têm como possível travão a oposição das partes, de
comum acordo, ou, faltando esse acordo, a possível destituição dos árbitros
que não actuem com a diligência exigível, por decisão do tribunal estadual
competente, requerida por qualquer das partes.
• Críticas que podem ser dirigidas a esta solução.
O tempo e o modo de prolação da sentença
arbitral (II)
• Entre muitas outras inovações feitas pelo Projecto, neste capítulo, merecem
destaque as seguintes:
– Alargou-se às arbitragens nacionais o poder dos árbitros de decidirem o
litigio como “compositores amigáveis”, se as partes lhes conferirem esta
missão.
– Permitiu-se que, após a notificação da sentença final, os árbitros não só
rectifiquem erros materiais e esclareçam ambiguidades ou obscuridades
naquela detectadas mas também profiram sentença adicional sobre a parte
do pedido ou pedidos sobre a qual aquela sentença não se pronunciou .
– A irrecorribilidade da sentença final proferida no processo arbitral passa a
ser a regra legal (supletiva).
Impugnação da sentença arbitral (I)
• A impugnação da sentença arbitral (só admissível se se basear num dos
fundamentos elencados na lei) deixa de se fazer através de uma acção
declarativa, com processo ordinário, e passa a ser tramitada como se fosse
um recurso de apelação (embora não se destine à reapreciação do mérito da
decisão impugnada), sendo apresentada no Tribunal da Relação ou no
Tribunal Central Administrativo competentes.
• Na definição dos fundamentos de impugnação não se seguiu fielmente o
articulado da Lei Modelo da UNCITRAL, tendo-se mantido algumas
soluções adoptadas pela actual LAV (e também por algumas leis
estrangeiras) que foram positivamente testadas na sua aplicação pelos
tribunais judiciais portugueses.
Impugnação da sentença arbitral (II)
• Do elenco dos fundamentos de impugnação de uma sentença arbitral
proferida em arbitragem doméstica não consta ― embora devesse constar
― o facto de aquela contrariar a “ordem pública”.
• Fixou-se em 60 dias (tal como lei espanhola), o prazo para a apresentação
da impugnação da sentença – mais curto do que o estabelecido na Lei
Modelo da UNCITRAL e na lei alemã (90 dias) – visando reduzir-se ao
mínimo razoável o período de incerteza a que a sentença arbitral fica sujeita
após a sua notificação às partes.
• Acolhendo-se uma solução adoptada pela lei alemã, impede-se que a parte
que pudesse ter impugnado a sentença arbitral com um dos fundamentos
legais de conhecimento não oficioso, sem o haver feito no prazo legal,
venha invocar um desses fundamentos para se opor à execução dessa
sentença.
Arbitragem internacional (I)
• Manteve-se o conceito de “arbitragem internacional” adoptado na actual
LAV (originário do direito francês), por se considerar preferível aos critérios
acolhidos na L. M. da UNCITRAL (que se revelam deficientes na
identificação da “internacionalidade” das arbitragens).
• Adoptando-se uma disposição originária da lei suíça e também adoptada
pela lei espanhola, preceituou-se que um Estado ou uma organização ou
sociedade por ele controlada, não podem invocar o seu direito interno para,
de qualquer modo, se subtraírem às suas obrigações decorrentes da
convenção da arbitragem.
• Também à semelhança das leis suíça e espanhola, a validade substancial de
convenção de arbitragem passou a ser aferida em função do disposto num
de vários direitos aplicáveis em alternativa, de modo a salvar a validade da
convenção que seja conforme a qualquer um deles.
Arbitragem internacional (II)
• Permite-se às partes escolher e, na falta de designação por estas, ao tribunal
arbitral determinar que as regras de direito aplicáveis ao fundo da causa não
pertençam a um ordenamento jurídico estadual e que, em vez disso, tenham
uma fonte anacional ou transnacional (como, por ex.. os Princípios
UNIDROIT, os P.E.C.L. ou a denominada a lex mercatoria).
• A sentença proferida em arbitragem internacional pode ser anulada se
ofender os princípios da “ordem pública internacional do Estado
Português” (sem prejuízo dos fundamentos de anulação aplicáveis à
generalidade das arbitragens).
Reconhecimento e execução de sentenças
arbitrais proferidas no estrangeiro
Tendo-se incorporado no articulado do Projecto o regime de
reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras estabelecido
na Convenção de Nova Iorque de 1958, restituiu-se aos Tribunais da
Relação a competência para decidir sobre o reconhecimento e admissão à
execução de tais sentenças (afastando-se a desacertada e incongruente
jurisprudência prevalecente nos nossos tribunais superiores).
Interface entre as arbitragens e os tribunais
estaduais (I)
• A selecção dos tribunais estaduais que melhores condições reúnam para
prestarem as diversas formas de assistência à arbitragem bem como a
definição de uma tramitação simples e flexível para o processamento dessa
assistência são factores de importância decisiva para o bom funcionamento
do novo regime da arbitragem voluntária.
• Nesta conformidade, optou-se por concentrar nos Tribunais da Relação ou
nos Tribunais Centrais Administrativos a competência para a maioria das
decisões destinadas a assegurar o desenvolvimento correcto e fluente das
arbitragens e o controlo da validade das sentenças nela proferidas.
Interface entre as arbitragens e os tribunais
estaduais (II)
• São estes tribunais que, pela maior experiência dos juízes que os compõem
e pelo facto de estes estarem menos sobrecarregados com trabalho do que
os juízes da 1ª instância, têm as melhores condições para poderem ser os
promotores de uma jurisprudência esclarecida e coerente que favoreça o
desenvolvimento e aperfeiçoamento da arbitragem voluntária.
• Seria, contudo, vantajosa a criação de secções especializadas em matéria de
arbitragem, nos Tribunais da Relação nas Relações de Lisboa e do Porto,
que são, provavelmente, aqueles que mais frequentemente serão chamados a
pronunciar-se sobre problemas relacionados com arbitragens domésticas ou
internacionais.
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Apresentação em PowerPoint do Dr. Sampaio Caramelo