PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO Prof.Gabriel Lopes Coutinho Filho Agosto/2009 SUMÁRIO • TRIPLICE FUNÇÃO DOS PRINCÍPIOS • PRINCÍPIOS E NORMAS • RELAÇÃO PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS. • PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO E DO TRABALHO • PRINCÍPIOS UNIVERSAIS DO DIREITO DO TRABALHO • PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS DO DIREITO DO TRABALHO • DESDOBRAMENTO DO PRINCÍPIO PROTETOR 2 Miguel Reale “princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento”, seja como verdades evidentes ou comprovadas, seja por questões práticas, como pressupostos exigidos pela pesquisa e pela práxis. (Lições Preliminares de Direito, São Paulo, Saraiva, p.299.) 3 → Princípios são padrões (“standards”) juridicamente vinculantes que possuem raiz na “idéia de justiça” (DWORKIN) ou na “idéia de direito” (LARENZ); → Os princípios são como verdades indiscutíveis que são usadas pelo direito tanto como pressuposto de sua teorização como pressuposto de sua aplicação. → Não se pode pensar o direito nem aplicar o direito sem pensar, antes, em princípios. 4 → A base dessa reflexão: divisão clássica entre o direito natural e o direito positivo. 5 Jusnaturalistas: o direito como um dado ditado pela razão humana. → princípios são metajurídicos, são direitos dos direitos, e estão inseridos no sistema jurídico, ou seja, na lógica que constrói um ordenamento jurídico e o interpreta. → portanto: princípios situam-se acima dos direitos positivados, acima do ordenamento jurídico. → função é prioritária e corretiva. As leis postas não podem contrariar princípios e, se assim o fizerem, os princípios agem corrigem sua aplicação. 6 Positivistas: o direito é dado pelo ordenamento jurídico positivado. → princípios estão contidos nas leis, no ordenamento jurídico → função integrativa de lacunas das normas, que revelam imperfeições ou feições típicas das normas escritas. 7 Os princípios Jusnaturalistas: são descobertos pela razão. → O método de sua descoberta é o dedutivo, partindo do universal (razão, lógica) para o particular (leis). Positivistas: são descobertos por contidos nas normas escritas. → O método de sua descoberta é o indutivo, partindo do particular (leis) para o universal (razão, lógica). 8 Amauri Mascaro Nascimento Os princípios podem ser ainda universalistas, válidos para todos os ordenamentos jurídicos, ou nacionalistas, restringindo-se a aplicação em um determinado ordenamento jurídico. (Curso de Direito do Trabalho, Saraiva, 2006, p.358) 9 TRIPLICE FUNÇÃO Amauri Mascaro Nascimento 1.Interpretativa: servindo de elemento de apoio à interpretação dada à lei. 2.Produtora ou elaborativa: auxiliando o legislador na tarefa de proposição das normas jurídicas. 3.Aplicativa ou operativa, para auxiliar na aplicação do direito como base para a elaboração da decisão judicial. 10 Amauri faz um desafio para reflexão: → Se a lei trabalhista mudar de forma relevante, legitimado pela escolha do legislador, os princípios também se alteram na ótica do doutrinador? Ou seja: se houver legislação nós, estudiosos do direito, temos que rever os princípios que aplicamos ou, por força dos princípios pode-se negar vigência à lei? Exemplo: a lei da arbitragem e sua aplicação no direito coletivo e individual do trabalho. 11 PRINCÍPIOS E NORMAS Idéia de partida: → Ordenamento Jurídico é um conjunto de normas jurídicas ou proposições. → Um sistema jurídico é a lógica de interpretação que estabelece as relações entre as normas dentro do ordenamento jurídico. 12 → Normas são mandamentos, comandos, imperativos, permissões, atribuições de poder e competência. → Norma é um gênero de comando, cujas espécies são as regras de direito, os princípios de direito e ainda as diretrizes políticas. Portanto, há normas que são regras e normas que são princípios. → Proposições jurídicas ou leis (lato sensu) são enunciados nos quais são descritos os comandos normativos. 13 → Os princípios são fundamento de regras jurídicas, normas que estão na base ou constituem a razão de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamental. → Princípios são fonte de criação de normas jurídicas. 14 → Os princípios constitucionais são normas de natureza estruturante de toda a ordem jurídica que legitimam o próprio sistema, pois consagram valores culturalmente fundantes da própria sociedade. 15 J. J. Gomes Canotilho →Ao distinguir norma e princípio, ensina que o princípio possui objetividade e presencialidade normativa independentemente da sua consagração específica em qualquer preceito particular. 16 → Norma jurídica implica a existência de uma sanção obrigatória para seu descumprimento, prevista na própria norma, e aplicada por uma autoridade constituída pela sociedade organizada. → Os princípios possuem compromissos com a ciência e sua não observância causam ruptura no sistema jurídico. → É questão mais grave que a não observância de uma regra jurídica posta. 17 RELAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E DIREITOS FUNDAMENTAIS. → Os conceitos se relacionam intimamente e sua diferença está no alcance ou abrangência: → Princípios são amplos, governam a lógica do ordenamento jurídico, estabelecem diretizes que regulam os ordenamentos. 18 RELAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E DIREITOS FUNDAMENTAIS. → Princípios fundamentais são fontes de direitos fundamentais. → Direitos fundamentais são direcionados para a pessoa e sua esfera subjetiva de proteção, da qual o conjunto de normas não pode se afastar. → Direitos fundamentais são as faculdades fundamentadas em princípios fundamentais. 19 → Princípios não são leis, embora possam ser enunciados como tal. → Princípios não são jurisprudências pois há aquelas que se aproximam e as que se afastam de suas predições ou mesmo que nenhum princípio indica. → Princípios não são idênticas a afirmações doutrinárias, ainda que a doutrina possa ter funções integrativas quanto a lacunas, retificadoras da legislação posta, e interpretativa para o juiz. Há doutrinas que assumem posições favoráveis e outras, contrárias a determinado tema. 20 → Princípios são valores ético-políticos que refletem a sociedade em que se situam. Ou seja, refletem os valores éticos que uma dadas sociedade escolhe, no âmbito político, aplicar aos seus cidadãos. → Por essa razão alguns países podem ter normas trabalhistas de emergência para enfrentamento de crises, flexibilizando direitos dos trabalhadores. Outros países optam por outras estratégias de enfrentamento desses problemas. 21 PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO E DE DIREITO DO TRABALHO → Os princípios gerais do direito são aplicados no direito do trabalho por ordem do artigo 8º, da CLT. Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. 22 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO APLICADOS AO DIREITO DO TRABALHO → Princípio da boa-fé. → Princípio da proibição do enriquecimento ilícito. → Princípio da função social do direito. 23 → Ainda que o direito do trabalho tenha uma carga mais normativa que contratual ou obrigacional, é possível aplicar certos princípios de direito civil ao direito do trabalho. → Exemplo: principio da autonomia da vontade, aplicado em certos âmbitos do contrato individual de trabalho e do direito coletivo do trabalho, sempre limitados aos parâmetros legais mínimos. 24 EXEMPLO → O artigo 444 da CLT admite essa faculdade. Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes. 25 Regra “pacta sunt servanda” → No direito do trabalho também é possível aplicar o princípio da força obrigatória dos contratos, ou “pacta sunt servanda”. → O contrato individual de trabalho se inicia sob a égide dessa premissa. 26 Regra “rebus sic stantibus” → Pode haver, ainda, a aplicação da regra “rebus sic stantibus” admitindo a revisão dos contratos em determinadas condições legais. 27 Exemplo: CLT, Art. 503 - É lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região. Ou Inciso VI, do artigo 7º da CF,1988: VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; 28 Regra “exceptio non adimpleti contractus” → O princípio do “exceptio non adimpleti contractus” também pode ser verificado pelas normas Art. 457 - Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber. Art. 459 - O pagamento do salário, qualquer que seja a modalidade do trabalho, não deve ser estipulado por período superior a 1 (um) mês, salvo no que concerne a comissões, percentagens e gratificações. § 1º Quando o pagamento houver sido estipulado por mês, deverá ser efetuado, o mais tardar, até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido. 29 PRINCÍPIOS UNIVERSAIS DO DIREITO DO TRABALHO → São aqueles válidos para todos os sistemas jurídicos ocidentais. Vejamos: 30 Princípio da liberdade do trabalho. → A prestação do trabalho deve ser uma liberdade. → Repudia-se o trabalho forçado análogo ao trabalho escravo. → Privilegia-se o trabalho como atendimento à dignidade humana. 31 Princípio do direito à organização sindical. → Admite-se variantes conforme o sistema político no qual se insere mas o direito à organização sindical é uma realidade em todos as sociedades. 32 Princípio das garantias mínimas do trabalhador. → Referendado pela posição do próprio trabalhador nas sociedades modernas. 33 Princípio da multinormatividade do direito do trabalho. → O direito do trabalho pode emanar da fonte estatal, mas também de fontes negociais coletiva e individual, desde que respeitados os demais princípios sistematicamente. 34 Princípio da norma mais favorável ao trabalhador. → Com função trípice de elaboração de norma jurídica, aplicação do direito e de interpretação do direito. 35 Princípio da igualdade salarial → Possui natureza equitativa, instituído inclusive pela Declaração de Direitos Universais do Homem. 36 Princípio da justa remuneração. → É função do direito do trabalho promover medidas de adequada retribuição pelo trabalho prestado. 37 Princípio do direito ao descanso. → Norma voltada para a higiene física, emocional e mental do trabalhador. 38 Princípio do direito em emprego ou do direito ao trabalho. → O Estado tem o dever de impedir o desemprego por meio de medidas de caráter econômico. 39 Princípio do direito à previdência social. → O Estado deve promover amparo aos trabalhadores na forma de ações solidárias. 40 Princípio da condição mais benéfica → Corresponde ao princípio do direito adquirido instituído pelo art.5º, inciso XXXXVI da CF,1988. 41 PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS DO DIREITO DO TRABALHO Formalizados por Américo Plá Rodriguez no livro “Los princípios del derecho del trabajo”, de 1975. 42 Princípio protetor. → Princípio fundante do direito do trabalho por sua característica natural de um direito de resistência, cuja finalidade é a proteção jurídica do trabalhador, compensando-se sua inferioridade econômica em face do contrato celebrado com o empregador. → É um princípio de equilíbrio do empregado em face de relações desiguais com seu empregador. 43 PROVA -XXI Concurso do TRT 15 Exame oral - 28/11/06 Questão feita pelo Juiz Lorival Ferreira dos Santos “O princípio da igualdade deve ser interpretado de forma absoluta?” 44 PROVA -XXI Concurso do TRT 15 Exame oral - 28/11/06 Proposta de resposta: No direito do trabalho o princípio que rege as relações de emprego é o princípio protetor, que equilibra as relações entre partes que são desiguais, como forma de fazer justiça. A aplicação absoluta do princípio da igualdade ou da isonomia acarretaria tratar as duas partes de maneiras iguais, ou seja, seria forma de não fazer justiça. 45 DESDOBRAMENTO DO PRINCÍPIO PROTETOR O princípio protetor se desdobra em outros três princípios: 1.”In dúbio pro operário”. 2. Prevalência da norma mais favorável ao trabalhador. 3.Princípio da condição mais benéfica ao empregado. 46 1. Princípio ”in dúbio pro operário” → Princípio de interpretação. → Diante de um texto que pode gerar dúvidas sobre seu sentido e alcance, o intérprete decidirá pela que for mais benéfica do empregado. 47 2. Prevalência da norma mais favorável ao trabalhador. → Princípio de hierarquia que soluciona a escolhe de aplicação entre normas que disciplinem uma mesma matéria. → Princípio implícito na CF,1988 CF,1988 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: CLT, Art. 620. As condições estabelecidas em Convenção quando mais favoráveis, prevalecerão sôbre as estipuladas em Acôrdo. 48 Súmula 51 TST NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro. 49 3.Princípio da condição mais benéfica ao empregado. → É aplicação do princípio do direito adquirido, resguardando as condições contratuais no tempo. CLT,428 § 2o Ao menor aprendiz, salvo condição mais favorável, será garantido o salário mínimo hora 50 Princípio da realidade do contrato de trabalho. → Dá validade à verdade material em face de verdade formal nas relações de emprego, mais especialmente para a caracterização do contrato de trabalho. → Vale o que a realidade informar e não meramente as referencias documentais, que podem ser fraudadas. 51 Princípio da razoabilidade → Declara que a intepretação dos fatos e normas deve ser razoável. → Aplica-se o bom senso. → É medida de verificação da verdade das relações formalizadas e serve de instrumento para a constatação de fraude. 52 Princípio da irrenunciabilidade dos direitos pelo trabalhador. → Substitui a vontade do trabalhador perante o empregador, impedindo ou invalidando qualquer prejuízo dos direitos do trabalhador. CLT, Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação. Súmula 276 do TST. AVISO PRÉVIO. RENÚNCIA PELO EMPREGADO O direito ao aviso prévio é irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa de cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego. 53 Principio da continuidade da relação de emprego. → É regra de preservação do contrato. → Presume-se o contrato por tempo indeterminado, ante a natureza alimentar contínua do empregado. Súmula 212 do TST. DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado. 54 LEMBRETE CONHECER PRINCÍPIOS É CONHECER PROFUNDAMENTE OS FUNDAMENTOS DO ORDENAMENTO JURÍDICO E A LÓGICA CO QUE SE MOVE O SISTEMA. PERMITE RESPOSTAS INTELECTUALMENTE ELEGANTES E DEMONSTRAM CONHECIMENTO APURADO DA INTERPRETAÇÃO NORMATIVA. 55 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO Prof.Gabriel Lopes Coutinho Filho Agosto/2009 56