1. Legislação Tributária. Uma das acepções do vocábulo “fonte”, segundo os dicionários, é aquilo que origina, produz; é origem ou causa. A expressão “fonte do direito” retrata o ponto originário de onde provém a norma jurídica, isto é, as formas reveladoras do direito. Desse modo, “fonte do direito” é o lugar onde nasce uma regra jurídica ainda não existente. Para Ruy Barbosa Nogueira, existem fontes reais e fontes formais do direito tributário. De acordo com o eminente mestre, “as fontes reais se constituem dos suportes fáticos das imposições tributárias, sendo a subjacência sobre que incide a tributação, afinal, a própria riqueza ou complexo dos bens enquanto relacionados com as pessoas, que, depois de serem discriminadas na lei tributária (patrimônio, renda, transferências), passam a constituir os “fatos geradores dos tributos”. As fontes reais ou materiais são também denominadas em doutrina “pressupostos de fato da incidência”, fatos imponíveis, ou melhor, tributáveis”. Já as fontes formais, prossegue o preclaro doutrinador, “são também chamadas de formas de expressão do direito, sendo os modos de exteriorização do direito, os atos normativos pelos quais o direito cria corpo e nasce para o mundo jurídico”. Fontes Formais do direito Tributário As fontes formais correspondem ao conjunto das normas no direito tributário, estando inseridas no art. 96 do CTN, sob o rótulo de “legislação tributária”. Restringem-se à dogmática do direito. Podem ser “primárias” ou “secundárias”. Vejamos: a) fontes formais primárias (art. 96 do CTN): • Leis em sentido amplo: Constituição Federal, emendas, leis ordinárias, complementares, delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções do senado e convênios interestaduais do ICMS; • Tratados e Convenções internacionais; • Decretos. b) Fontes formais secundárias, subsidiárias ou normas complementares (art. 100 do CTN). 1 É imperioso destacar que, consoante o princípio da legalidade tributária (art. 150, I, da CF e art. 97 do CTN), que preside toda obrigação tributária principal (art. 113, § 1º, do CTN), os decretos e os convênios interestaduais do ICMS, embora sejam fontes principais, não podem instituir ou majorar tributos, definir a hipótese de incidência da obrigação tributária principal, estipular o sujeito passivo, fixar alíquota do tributo e a sua base de cálculo, cominar penalidades, estabelecer as hipóteses de exclusão e extinção do crédito tributário e, por fim, enumerar as circunstâncias da suspensão da sua exigibilidade. Tal mister compete à lei, em caráter exclusivo, à luz do princípio da estrita legalidade ou tipicidade fechada, que disciplina a taxatividade dos elementos componentes da reserva legal. Vale destacar que, quanto à exclusão do crédito tributário afeto ao ICMS, a Constituição da República estabelece no art. 155, § 2º, XII, “g”, que cabe à lei complementar regulamentar a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais em matéria de ICMS serão concedidos e revogados. Essa é a LC 24/75, que ainda vigora, dispondo, em seu art. 4º, caput, que ao Poder Executivo de cada unidade da Federação caberá, por decreto, ratificar ou não o convênio do ICM. Assim, quando ratificados, terão a natureza formal de decretos (fonte formal principal), e não de simples norma complementar. Veja que quem ratifica e celebra os convênios são os Estados e o Distrito Federal (e não os Municípios e a União), em 15 dias após a publicação, entrando em vigor 30 dias após a ratificação. Nesse passo, os Estados e o Distrito Federal, querendo conceder isenções de ICMS, devem, previamente, firmar entre si convênios, celebrados no Conselho nacional de Política Fazendária – CONFAZ – órgão com representantes de cada Estado e do Distrito Federal, indicados pelo respectivo Chefe do Executivo. Fontes formais primárias do direito tributário: 1.1. Constituição A Constituição é uma importante fonte do direito tributário, uma vez que nela estão fixados os princípios básicos e as normas nucleares pertinentes aos tributos. As normas constitucionais encontram-se no topo da pirâmide jurídica, não podendo ser contrariadas por nenhuma outra norma jurídica. É sabido que a Constituição Federal outorga competência tributária às pessoas jurídicas de direito público interno, cujo exercício deve ser efetivado por meio de lei. Ademais, em matéria tributária, a Constituição Federal estabelece as limitações constitucionais ao poder de tributar 2 (arts. 150 a 152 da CF) e delimita a repartição das receitas tributárias (arts. 157 a 162 da CF). 1.2. Emendas à Constituição A Constituição Federal, ao refletir a realidade social do país e acompanhar a sua evolução, deve prever, em seu próprio texto, a forma pela qual pode ser alterada, o que ocorre por meio de emenda. As emendas constitucionais, uma vez aprovadas, incorporam-se à Constituição, passando a ter a mesma força das normas constitucionais preexistentes. Não se deve esquecer que foi por intermédio de uma Emenda à Constituição de 1946 (EC 18/65) que ocorreu no Brasil a total reestruturação do sistema tributário nacional, constituindo-se em um marco na história do nosso direito tributário. Frise-se que, ad argumentandum, as emendas constitucionais disciplinadoras de matérias atinentes ao direito tributário têm-se apresentado inquinadas de inconstitucionalidades, por mais paradoxal que possa parecer a afirmação. A corroborar o exposto acima, impende destacar as inúmeras lides surgidas, em face da suscitação de vícios acerca da progressividade do IPTU (EC 29/2000), da CIDE– Combustível (EC 33/2001), da Contribuição da Iluminação Pública (EC 39/2002) e, por fim, de aspectos controvertidos trazidos à baila pela EC 42/2003. 1.3. Leis Complementares A lei complementar visa “complementar” uma norma constitucional não autoexecutável, ou seja, visa explicitar norma despida de eficácia própria, sujeitandose à aprovação por maioria absoluta (quorum especial de votantes, ou seja, voto favorável de mais da metade do número total de membros das duas Casas do Congresso nacional – Câmara dos Deputados e Senado Federal). Sua elaboração já vem indicada ou sugerida no próprio texto da Constituição, para complementação ou regulamentação de certos assuntos. Ressalte-se que o art. 146 da CF exige lei complementar para: a) dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; b) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; 3 c) estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: definição de tributos e de suas espécies, bem como em relação aos impostos discriminados na Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculos e contribuintes; obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas (vide dica abaixo); d) definir o tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do ICMS, da contribuição previdenciária (art. 195, I, da CF) e da Contribuição ao PIS (alínea d do inc. III do art. 146 da CF, inserida pela EC 42/2003). A lei a que se refere o artigo supramencionado é o próprio CTN – Código Tributário Nacional (Lei 5.172/66), que nasceu como lei ordinária, adquirindo, posteriormente, força de lei complementar. Vale dizer, o Código Tributário Nacional, embora aprovada como lei ordinária, foi elevada, ainda sob a égide da Carta de 1967, à categoria de lei complementar, em razão principalmente do seu objeto. Para chegar à conclusão quanto à natureza de lei complementar do CTN, deve-se interpretar o art. 146 da CF, à luz do art. 1º do CTN, detectando as matérias cabentes a esse tipo de ato legislativo e, por fim, comparando-as com a estrutura dogmática do próprio Código Tributário Nacional. Daí se inferir que ele deve ser modificado apenas por nova lei complementar ou pelas normas que lhe forem hierarquicamente superiores. Dica: Análise do art. 24 da CF: para fins de concursos públicos, é preciso assinalar que a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados, que poderão exercer sua competência legislativa plena, para atender às peculiaridades. A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (art. 24, §§ 2º a 4º, da CF). Todavia, tendo o Município competência apenas para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, da CF), não pode legislar sobre normas gerais na ausência de lei federal. Esse assunto é demasiadamente solicitado em provas de concursos. 1.4. Leis Ordinárias É a fonte formal básica do direito tributário. São as leis comuns de formulação cotidiana do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais. É oportuno mencionar que, quando a Constituição utiliza o termo “lei”, 4 pura e simplesmente, sem qualquer adjetivação, refere-se à lei ordinária, e não à lei complementar. Exige a lei ordinária, no processo de votação, a maioria simples, significando que abrange apenas os parlamentares presentes à votação, e não o número total de parlamentares. Em face do princípio da legalidade tributária (art. 150, I, da CF e art. 97 do CTN), a lei ordinária é o instrumento originário, por excelência, do fenômeno tributacional. Em regra, sabe-se que a lei apta a instituir tributo é a “ordinária”, nada impedindo, todavia, a reserva de matérias à lei complementar – imposto sobre grandes fortunas (art. 153, VII, da CF), empréstimos compulsórios (art. 148 da CF) e tributos criados pela união no exercício da sua competência residual – impostos residuais e contribuições previdenciárias residuais (art. 154, I, e art. 195, § 4º, ambos da CF). O art. 97 do CTN regula a “estrita legalidade”, evidenciando que há regramento imposto à tipologia tributária. Trata-se do fenômeno atinente à tipicidade fechada (cerrada ou regrada), que nos remete à fisiologia do princípio da estrita legalidade. Consoante o art. 97 do CTN, somente a lei pode estabelecer: a) a instituição de tributos, ou sua extinção; b) a majoração de tributos, ou sua redução; c) a definição do fato gerador da obrigação tributária principal e do sujeito passivo; d) a fixação da alíquota do tributo e de sua base de cálculo; e) a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos ou para outras infrações nela definidas; f) as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução da penalidade. Componentes numerus clausus (taxativos) da Reserva Legal (ou da Estrita Legalidade): Alíquota Base de Cálculo Sujeito Passivo Multa Fato gerador 5 1.5. Leis Delegadas A lei delegada é equiparada à lei ordinária, diferindo desta apenas na forma de elaboração. Ela representa o ato normativo de confecção adstrita ao Poder Executivo, por meio de delegação conferida pelo Poder Legislativo. Com efeito, o art. 68 da CF dispõe que as leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional. A delegação reveste-se da forma de resolução do Congresso Nacional que especifique seu conteúdo e os termos do seu exercício (art. 68, § 2º, da CF). Igualmente, as matérias reservadas à lei complementar não poderão ser objeto de delegação. Em face do exposto, poder-se-ia questionar: É possível legislar sobre tributo por meio de lei delegada? Como se notou, a lei delegada é elaborada pelo Presidente da República sob solicitação ao Congresso Nacional, cuja anuência congressual se dá por meio de “resolução”. Há matérias na Constituição Federal (art. 68 da CF), cujo disciplinamento é proibido por lei delegada, porém nada que se refira a tributo. Assim, em princípio, a resposta é afirmativa à indagação. Entretanto, é improvável porque pouco inteligente e nada pragmático, que o Presidente da República submeta ao Congresso Nacional pedido de delegação para legislar sobre matéria que pode sobre ela dispor amplamente por medida provisória e até por decreto. 1.6. Medidas Provisórias Disciplina o art. 62, caput, da CF, ad litteram: “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”. Embora a doutrina mostre-se contrária, a jurisprudência predominante do País, capitaneada pelo STF, vem admitindo o uso de medida provisória em matéria tributária, inclusive para a instituição de tributos (RE 138.284/STF). Em 2001, o art. 62 da CF foi “turbinado” com a EC 32/2001, que lhe trouxe inúmeros parágrafos, os quais representaram significativas mudanças no indigitado instrumento normativo. A principal mudança refere-se à possibilidade de medida provisória versar sobre impostos (excetuados aqueles cabentes à lei complementar), com pagamento do tributo delimitado para o ano seguinte ao ano da conversão da medida provisória em lei (art. 62, § 2º, da CF). Hodiernamente, as medidas provisórias devem ser convertidas em lei no prazo de 60 dias (e não mais “30 dias”, como no regime originário), a partir de sua publicação (art. 62, §§ 3º e 7º, da CF), podendo ser prorrogadas uma única vez (e não mais “inúmeras 6 vezes”). Portanto, aritmeticamente, são 60 + 60 dias = 120 dias de existência (art. 62, § 2º, da CF), findos os quais, caso não tenha havido a conversão da medida provisória em lei, não haverá que se falar em pagamento de tributo. Um exemplo disso é o ITR (imposto federal) aumentado por medida provisória. Se a medida provisória que modificou o ITR foi instituída em setembro de 2001 e convertida em lei em dezembro de 2001, o novo valor será cobrado a partir de 1º janeiro de 2002. Contudo, se houve prorrogação e ocorreu a conversão em janeiro de 2002, o imposto só poderá ser exigido a partir de 1º de janeiro de 2003. Ressalte-se que, após a EC 42/2003, com ampliação do princípio da anterioridade, deve-se considerar o prazo de 90 dias entre a lei de conversão e o pagamento do tributo. Dessa forma, caso tenhamos o próprio ITR, majorado por medida provisória em setembro de 2004, com conversão em lei em dezembro de 2004, o tributo não será cobrado a partir de 1º de janeiro de 2005, mas em meados de março de 2005, pois deve haver o respeito a 90 dias, que intermediarão a Lei de conversão e o pagamento do tributo. Esse entendimento, todavia, não desfruta de endosso generalizado, havendo quem entenda que a contagem de 90 dias deva se iniciar a partir da data da publicação da medida provisória. Caberá à jurisprudência uniformizar a matéria. 1.7. Tratados Internacionais Os tratados pretendem evitar a bitributação internacional, a fim de que o sujeito passivo não se subordine a várias imposições perante um só fator de avaliação de sua capacidade contributiva. A doutrina dominante não estabelece distinção entre os termos “tratado” e “convenção internacional”. O art. 84, VIII, da CF preconiza que compete privativamente ao Presidente da República celebrar tratados, sujeitos a referendo do Congresso Nacional. O tratado significa um acordo internacional concluído entre países signatários, em forma escrita, com o fito de que se promova um ajuste de vontades. Em Direito Tributário, os tratados são importantes nos campos dos impostos de importação, exportação e IR. Atualmente, o acordo internacional mais importante em matéria tributária, ao qual o Brasil aderiu, é o GATT (Acordo geral sobre Tarifas e Comércio), substituído pela OMC (Organização mundial de Comércio), que entrou em vigor em 01.01.1995, regulando a tributação de mercadorias exportadas ou importadas e a bitributação. O GATT – acordo Geral sobre tarifas e Comércio – é um acordo firmado em 1947, na Suíça, sendo 7 caracterizado como pacto que visa estabelecer e administrar regras para o procedimento em comércio internacional, ajudar os governos a reduzir tarifas alfandegárias ou aduaneiras e abolir as barreiras comerciais entre as partes contratantes. O referendo do Congresso Nacional (Poder Legislativo) é o decreto legislativo, ato que não vai mais depender da sanção do Poder Executivo. O processo de conclusão dos tratados no nosso direito compreende as seguintes fases: a) negociação e assinatura pelo Poder Executivo (art. 84, VIII, da CF); b) aprovação ou referendo pelo Poder Legislativo, mediante decreto legislativo, não mais dependendo da sanção do Poder Executivo (arts. 49, I, e 84, VIII, da CF). Após o referendo, comunica-se aos demais Estados contratantes a aprovação interna, trocando-se entre os chefes de Estado os instrumentos de ratificação; c) promulgação por meio da expedição de Decreto do Presidente da República. Nessa fase, o chefe do Executivo declara que o procedimento foi completado, dando conta ao povo-destinatário de que seu conteúdo passa a ser obrigatório internamente. Sabese que a partir do “decreto” de promulgação se inicia a vigência interna do que se contém no acordo; d) publicação do decreto, com o inteiro teor do acordo internacional. A sua vigência dar-se-á na data fixada no decreto e, sendo este silente, no prazo de 45 dias após a sua publicação oficial (art. 1º, caput, da LINDB). Segundo a dicção do art. 98 do CTN, os tratados revogam a legislação interna e serão observados pela legislação que lhes sobrevenha (legislação superveniente). Tal artigo deve ser entendido com parcimônia, uma vez que sua aplicabilidade é contida. Queremos afirmar que as alterações ocasionadas na legislação interna estão circunscritas apenas à matéria daquele tratado específico. Exemplo: “Tratado entre Brasil e EUA para que o primeiro não cobre IPI sobre as importações de produtos industrializados norte-americanos”. Se a lei interna brasileira preconiza a incidência do IPI sobre as importações de produtos estrangeiros quaisquer, somente aqueles oriundos dos EUA estarão abrangidos pela regra isencional contida no tratado. Assim, todos os artigos do RIPI (Regulamento do imposto sobre produtos industrializados) continuam vigorando, exceto para as relações comerciais entre Brasil e EUA. 8 Vislumbra-se, pois, o caráter específico do tratado em matéria tributária. Assim, o ato internacional valerá com primazia, em se tratando de casos específicos em seu texto. É o princípio da especialidade, segundo o qual o regramento mais específico afasta o mais genérico, naquele caso que foi regulado mais atentamente. Portanto, não se trata de revogação, mas de coexistência pacífica de normas, com planos eficaciais distintos. A corroborar o exposto anteriormente, urge mencionar parte da judiciosa ementa, comum aos julgados a seguir discriminados, proferida pelo Egrégio STJ, 1ª turma, nos REsp 27.728; 37.065; 45.759; 47.244; 196.560. Segundo o STJ, “o mandamento contido no art. 98 do CTN não atribui ascendência às normas de direito internacional em detrimento do direito positivo interno, mas, ao revés, posiciona-as em nível idêntico, conferindo-lhes efeitos semelhantes. O art. 98 do CTN, ao preceituar que tratado ou convenção não são revogados por lei tributária interna, refere-se aos acordos firmados pelo Brasil a propósito de assuntos específicos”. Conclui-se que não versa o art. 98 do CTN sobre supremacia hierárquica do tratado internacional, chancelando um desnivelamento hierárquico, mas a consagração do princípio da especialidade. Por fim, diga-se que a EC 45/2004, ao acrescentar o § 3º ao art. 5º da CF, disciplinou que “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. 1.8. Decretos O decreto é norma jurídica que integra a expressão “legislação tributária” (art. 96 do CTN), sendo ato normativo que emana da autoridade máxima do Poder Executivo (Presidente da República, governador ou Prefeito). Sua tarefa primordial é regulamentar o conteúdo das leis, conforme o art. 84, IV, da CF. É imperioso enaltecer que, sendo o decreto um ato normativo infralegal, “o conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos” (art. 99 do CTN), pelo que não podem ir contra nem extrapolar os balizamentos legais, que permearão o alcance de seus efeitos. Sua função é, precipuamente, a regulamentadora da lei, tendo grande importância em nossa disciplina, em face das inúmeras aplicações desse instrumento, tais como: a) veículo de regulamentos (RIR, RIPI, RICMS, RISS), consolidadores de leis tributárias, como nos casos do IR, IPI, ICMS e ISS. 9 À lei compete instituir o tributo e, quando o faz, define, por exemplo, a obrigatoriedade da emissão do documentário fiscal (notas fiscais, livros etc.). No entanto, a própria lei não definirá os modelos e formatos a serem empregados, ficando tais providências a cargo da regulamentação por decreto. Com efeito, o “fato gerador da obrigação tributária principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência” (art. 114 do CTN). Nesse passo, diga-se que “o fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal”. b) estabelecimento de regras sobre obrigações tributárias acessórias, uma vez que a causa da obrigação tributária acessória é a situação definida em legislação tributária (art. 115 c/c art. 113, § 2º, ambos do CTN). Diga-se, por derradeiro, que o decreto, para ser válido, precisa ser avalizado pelo representante do Executivo, detentor de conhecimento técnico de que não dispõe o “chefe” do Executivo que o assina. Queremos dizer que o decreto presidencial, por exemplo, requer a assinatura do ministro da Fazenda. O mesmo raciocínio vale em relação aos decretos estaduais e municipais (vide art. 87, I, parte final, da CF). 1.9. Resoluções A resolução é norma jurídica que resulta de deliberação do Congresso Nacional ou de uma de suas Casas. Seu procedimento de elaboração difere daquele conferido à lei ordinária, porém a resolução nasce com força de lei, ao integrar o processo legislativo (art. 59, VII, da CF). No direito tributário, as resoluções mais importantes são aquelas oriundas do Senado Federal. A Constituição, em seu art. 52, prevê a expedição de resolução pelo Senado Federal na estipulação, por proposta do Presidente da República, de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios (art. 52, VI, da CF); no estabelecimento de limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 52, IX, da CF) etc. Em matéria tributária, que nos parece ser relevante no presente manual, a Constituição Federal prevê a expedição de resolução do Senado nos seguintes casos: a) para estabelecer as alíquotas do ICMS aplicáveis às operações de circulação de mercadorias e prestações de serviços, interestaduais e de exportação, sendo de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros (art. 155, § 2º, IV, da CF); 10 b) para estabelecer, ainda, em matéria de ICMS: • alíquotas mínimas nas operações internas, desde que resulte da iniciativa de um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros (art. 155, § 2º, V, “a”, da CF); • alíquotas máximas nas operações referidas na alínea anterior, visando resolver conflito específico que envolva interesse de Estados, desde que resulte de iniciativa da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros (art. 155, § 2º, V, “b”, da CF); c) para fixar as alíquotas máximas do ITCMD – Imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos (art. 155, § 1º, IV, da CF). d) para fixar as alíquotas mínimas do IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos automotores (art. 155, § 6º, I, da CF – EC 42/2003). Nota: Observe que a constituição determina que as alíquotas de três impostos estaduais – o ICMS, o ITCMD e o IPVA – poderão ter a estipulação de limites máximos e mínimos por resoluções do senado Federal. 1.10. Decretos Legislativos O decreto legislativo (art. 59, VI, da CF) é ato emanado do Congresso Nacional, em decorrência do exercício da sua competência, não estando sujeito à sanção do Presidente da República. Existem decretos legislativos em todas as esferas políticas (União, Estados, Distrito Federal e municípios). Como atos de exclusiva competência do Legislativo, os decretos legislativos, do ponto de vista formal (rito de aprovação), aproximam-se bastante da lei ordinária, uma vez que não carecem de quorum qualificado de aprovação. O traço distintivo, no entanto, vem do fato de não passar o decreto legislativo pelo crivo do Poder Executivo, como ocorre com a lei. No direito tributário, os decretos legislativos mais importantes são os da União, como meios hábeis à aprovação de tratados, acordos ou atos internacionais (art. 49, I, da CF). 1.11. Convênios A União, os Estados e os municípios poderão celebrar convênios para execução de suas leis, serviços ou decisões, i.e., poderão prestar uns aos outros, assistência, quer seja para fiscalização dos tributos ou permuta de informações (art. 199 do CTN). 11 São estes “convênios fiscais” acordos administrativos subordinados à lei, não podendo revogá-la ou sequer desobedecer a ela, ainda que ratificados pelo Congresso, Assembleia Legislativa ou Câmaras dos Vereadores (ou mesmo pelo Poder Executivo – no caso do ICMS). São ajustes ou acordos entre duas ou mais pessoas de direito público para a prática ou omissão de determinados atos. Os convênios podem ser celebrados pela União, Estados e municípios para execução de suas leis, serviços ou decisões, bem como para fixar normas concernentes às obrigações acessórias. Dispõem sobre matéria da administração tributária (arrecadação, fiscalização). Entre os mais importantes convênios fiscais, destacam-se os Convênios do ICMS. Passemos a detalhá-los: Convênios do ICMS – a Constituição da República estabelece no art. 155, § 2º, XII, “g”, que cabe à lei complementar regulamentar a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais em matéria de ICMS serão concedidos e revogados. Essa é a LC 24/75, que ainda vigora, dispondo, em seu art. 4º, que ao Poder Executivo de cada unidade da Federação caberá, por decreto, ratificar ou não o convênio do ICM. Assim, quando ratificados, terão a natureza formal de decretos (fonte formal principal), e não de simples norma complementar. Veja que quem ratifica e celebra os convênios são os Estados e o DF (e não os municípios e a União), em 15 dias após a publicação, entrando em vigor 30 dias após a ratificação. Nesse passo, os Estados e o Distrito Federal, querendo conceder isenções de ICMS, devem, previamente, firmar entre si convênios, celebrados no Conselho nacional de Política Fazendária – CONFAZ – órgão com representantes de cada Estado e do Distrito Federal, indicados pelo respectivo Chefe do Executivo. Posto isso, fica evidente que o convênio não é lei, nem o CONFAZ, órgão legislativo. Assim, os funcionários do Poder Executivo que o integram não podem, a pretexto de dispor sobre isenções de ICMS, “legislar” a respeito, no lugar do Poder Legislativo de cada Estado e do Distrito Federal. Assim, os convênios apenas integram o processo legislativo necessário à concessão dessas desonerações tributárias, que surgem, sim, com o decreto legislativo ratificador do convênio interestadual. Este somente passa a valer como direito interno dos Estados e do Distrito Federal ao depois da ratificação, que é feita por meio de decreto legislativo. A ratificação, diga-se de passo, não pode ser feita por “decreto” do Governador – como infelizmente vem acontecendo, com base no art. 4º, da LC 24/75 -, mas por meio de decreto legislativo baixado pela respectiva Assembleia Legislativa ou, no caso do Distrito Federal, por sua Câmara Legislativa. 12 Nas palavras pontuais de Alcides Jorge Costa, “os convênios são uma fase peculiar do processo legislativo, em matéria de isenções de ICMS. Fase que limita a competência das Assembleias Legislativas, mas que não pode eliminá-la”. Geraldo Ataliba, com argúcia, ratifica: “(...) o convênio não dá nem tira direito a nenhuma Fazenda e a nenhum contribuinte. Não cria direito de natureza tributária nem em benefício, nem em detrimento de ninguém. É mero pressuposto de exercício eficaz da competência isentadora dos legisladores ordinários estaduais”. Pelo que se nota, os convênios são celebrados pelos representantes do Poder Executivo estadual, cabendo aos chefes deste poder, os governadores, ratificarem-nos. Ressalte-se a estranheza do procedimento, o que nos faz duvidar de sua constitucionalidade, quando permite a ratificação dos convênios pelo mesmo Poder que os celebra, ferindo inexoravelmente os princípios da legalidade tributária e da separação dos poderes. Fere o princípio da legalidade por ser o poder de isentar correlato ao poder de criar tributo, exigindo-se subserviência aos ditames legais (vide art. 150, I, da CF, e arts. 9º, 97, I e VI, e 178, do CTN). Assim sendo, como regra, somente uma norma jurídica emanada do Poder Legislativo pode isentar o sujeito passivo do pagamento do tributo. Por outro lado, a norma da LC 24/75 agride também o princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º da CF), porque a separação harmônica dos entes federados não permite que um mesmo poder (Executivo) possa criar direito e, ao mesmo tempo, homologar seu próprio ato. Daí o ilustre doutrinador Sacha Calmon Navarro Coêlho asseverar que os convênios efetivados por prepostos do Executivo, em geral, secretários de Estado, usualmente da Fazenda ou das Finanças, não passam, na realidade, de meras propostas de convênios, porque seu conteúdo só passa a valer depois que as Assembleias Legislativas ratificarem tais instrumentos normativos. Parágrafo único do art. 100 do CTN Torna-se obrigatório o recolhimento do tributo com a revogação da norma complementar (por exemplo: portaria, circular, resolução etc.). Todavia, excluem- se as penalidades, juros de mora e correção monetária, pois, se a própria Administração faz um ato (norma complementar), inadmissível punir o sujeito passivo que o atendeu. Assim, sem multa, juros e correção monetária. Com efeito, não seria justo que um contribuinte, ao deixar de pagar um imposto, obedecendo ao comando de uma instrução normativa de texto dúbio, por acreditar que estava isento, fosse punido por um erro da própria Administração. Pagar-se-á o tributo sem multa, sem juros e sem correção monetária e, por que não dizer, “com justiça”. 13 Exemplo: Devido a um erro cometido na elaboração de um parecer, a Receita Federal deixou de cobrar o IR de uma Pessoa Jurídica. Uma vez retificado o erro, mediante a publicação e elaboração de novo parecer, a receita Federal deverá cobrar o imposto devido sem a correção monetária e sem qualquer outro acréscimo (juros). O parecer é ato normativo (art. 100, I, do CTN). Cabe aqui um breve esclarecimento sobre o conceito de multa, juros e correção monetária: Multa: é punição ou sanção pecuniária, dotada de compulsoriedade, instituída por meio de lei, em face do descumprimento de obrigações tributárias, principais ou acessórias. Estamos que é possível defini-la, à luz do art. 3º do CTN, na medida em que se trata de prestação pecuniária, compulsória, diversa de tributo, instituída por meio de lei e cobrada mediante lançamento. Portanto, utiliza-se a forma conceitual de tributo, com pequena adaptação, para definir a multa. Juros: são um plus, exigível pelo credor, a fim de se ressarcir daquilo que está deixando de lucrar, em virtude do atraso do devedor no pagamento da quantia. É uma remuneração do capital. Se houve impontualidade no pagamento, o credor fica impedido de aplicar seus recursos em alguma atividade remuneratória de seu capital. Os juros significam uma “paga compensatória” daquilo que o credor deixou de ganhar em função do atraso. Não possuem os juros natureza punitiva, mas meramente compensatória. Correção monetária: é atualização de valor, como mecanismo de proteção a processo inflacionário. Não significa acréscimo. Vale dizer, a aplicação de um índice de correção monetária, baseado na inflação média, é um elemento neutro sobre o valor de uma dívida, não lhe proporcionando aumento real nem lhe diminuindo o valor. Dica: A doutrina e a jurisprudência não são fontes formais do direito tributário. a) doutrina: é assente que a doutrina tem um importante papel no âmbito do direito, como elemento para sua compreensão. A doutrina afeta ao direito tributário consiste na produção conceitual dos doutores, juristas e estudiosos da disciplina, constituída pela elaboração e sistematização de conceitos e explicação de institutos jurídicos de tributação. É o produto da interpretação da lei e resultado da pesquisa científica. 14 b) Jurisprudência: a jurisprudência é o conjunto das soluções dadas pelo poder Judiciário, de forma reiterada e harmônica (no mesmo sentido), a questões de direito. Sua importância para o direito tributário é inquestionável, por duas razões básicas: a primeira, porque tem função de aclarar e dirimir dúvidas quanto à aplicação do direito; a segunda, porque a jurisprudência brasileira antecipou-se muitas vezes ao legislador no trabalho de lapidação de princípios e conceitos do direito tributário, atinentes a fato gerador, base de cálculo, etc. 1.12. Normas Complementares Conhecidas também como fontes formais secundárias, passamos agora, ao seu estudo. Fontes formais secundárias do direito tributário ou normas complementares O art. 100 do CTN elenca as fontes formais secundárias ou complementares do direito tributário, que devem “complementar” os tratados e convenções particulares, os decretos e as leis em sentido amplo (Constituição Federal, emendas, leis ordinárias, complementares, delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções do senado e convênios do ICMS). As fontes secundárias são fontes de “menor porte”, de cunho instrumental e operacional. Visam operacionalizar as relações jurídico-tributárias, subordinando-se às fontes principais. As normas complementares distinguem-se das “leis complementares”, porque estas são normas jurídicas em sentido estrito, que visam conferir eficácia a dispositivos constitucionais não autoexecutáveis, enquanto aquelas representam mecanismos de complementação, servindo-se a clarificar os aspectos menos nítidos das fontes primárias complementadas. As normas complementares podem ser: a) atos normativos; b) decisões administrativas com eficácia normativa; c) práticas reiteradas das autoridades administrativas; d) convênios. 15 a) atos normativos: São comandos gerais dos órgãos do Poder Executivo, com o escopo de propiciar a correta aplicação da lei. Têm eles o objetivo de conferir orientação geral aos contribuintes e instruir os servidores públicos encarregados da efetivação dos atos e procedimentos administrativos referentes aos tributos. Devem estar, em abono à hierarquia das normas, em conformidade com o diploma legal a que se referem. Como são atos detentores de força normativa, seu descumprimento implica a imposição de sanções. Por exemplo, resoluções do ministro da Fazenda, portarias, avisos, circulares, ordens de serviço, pareceres normativos, despachos em geral, instruções normativas (INs), além do próprio “manual de Preenchimento da Declaração de Rendimentos”, distribuído, anualmente, pela SRF, aos contribuintes do IRPF. b) decisões administrativas com eficácia normativa: Há decisões para as quais a lei confere eficácia normativa, determinando que elas constituam precedente de observância obrigatória. O Poder Executivo, principalmente em relação à matéria tributária, detém, em sua organização, estruturas julgadoras, possibilitando o debate ao contribuinte insatisfeito. São estruturas que se assemelham às do Poder Judiciário, possuindo também instâncias de julgamento e possibilidade de interposição de recursos. O “processo administrativo tributário”, como corriqueiramente é chamado, possui instâncias singulares e colegiadas, sendo a última decisão administrativa aquela com timbre de irrecorribilidade na órbita do Poder Executivo. Todavia, tal decisão final não faz coisa julgada quanto ao tema discutido (coisa julgada material), podendo o contribuinte insatisfeito socorrer-se da esfera judicial (art. 5º, XXXV, da CF). Ressalte-se, à guisa de esclarecimento, que o sujeito passivo não está obrigado a recorrer à via administrativa, podendo, portanto, dirigir-se diretamente ao Poder Judiciário. Por outro lado, as decisões administrativas podem ser revistas pelo Poder Judiciário, salvo quando em favor do contribuinte, hipótese que são imodificáveis e extintivas do crédito tributário (art. 156, IX, do CTN). É importante destacar que o CTN versa sobre decisões “a que a lei atribua eficácia normativa”, ou seja, editada a lei que determina o efeito eficacial normativo das decisões do órgão administrativo julgador, a partir daí, as decisões deste, mesmo que proferidas para a solução de conflito determinado, aplicar-se-ão a todos os outros 16 casos idênticos. É o chamado sistema de decisões vinculantes, em que a solução adotada concretamente em um processo se estende a outros casos idênticos. A decisão, em virtude da aludida lei, deixaria de possuir apenas efeitos inter partes (entre as partes), para possuir efeitos erga omnes (contra todos). Exemplo: decisão do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), no Estado de São Paulo, quanto ao ICMS. Aplica-se esta decisão, a princípio, apenas ao caso concreto. Todavia, pode alcançar outros casos, se a decisão se revestir de eficácia, nos termos da legislação pertinente, sendo homologada e não contrariando a jurisprudência do Poder Judiciário. Se o contribuinte ganha na 2.ª instância administrativa por decisão “unânime” do Tribunal, poderá tal julgamento ser revestido de eficácia normativa, criando-se, assim, um “precedente” de observância obrigatória, passando a ser aplicado a todos os casos semelhantes. c) práticas reiteradas das autoridades administrativas (costumes); O presente inciso refere-se aos “usos e costumes adotados iterativamente pela Administração” (e não pelos contribuintes). Nos respeitáveis dizeres de Rubens Gomes de Souza, seriam “práticas, métodos, processos, usos e costumes de observância reiterada por parte das autoridades administrativas, desde que não sejam contrárias à legislação tributária ou à jurisprudência firmada do Poder Judiciário”. Os usos e costumes podem ser classificados como: a) introdutórios, quando introduzem uma norma de conduta na ausência de lei a respeito; b) ab-rogatórios, quando consideram revogada uma lei que tenha deixado de ser aplicada; c) interpretativos, quando visam apenas a explicitar o sentido de uma lei. Torna-se despiciendo ressaltar que, em matéria tributária (art. 100, III, do CTN), somente podem ser adotados os costumes interpretativos. Isso porque somente a lei, entendida em sentido estrito, tem aptidão para instituir tributo, não se permitindo ao costume a faculdade de revogar a lei, mesmo em face de um desuso, nos termos do art. 2º da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Ademais, o costume pressupõe dois elementos: a) uso (elemento externo, de observância constante, uniforme, pública e geral); 17 b) opinião de necessidade (convicção generalizada de que a observância da norma costumeira é uma necessidade jurídica). Dessa forma, aplica-se o costume em matéria tributária quando, por exemplo, as autoridades fiscais interpretam reiteradamente uma norma jurídica em determinado sentido, fazendo com que o sujeito passivo creia que, seguindo aquele entendimento, estará agindo corretamente. É por essa razão que qualquer modificação na interpretação daquela norma só poderá produzir efeitos para situações futuras, uma vez protegido o sujeito passivo pela prática iterativa da Administração. d) convênios: Já abordamos no item 1.11, acima. EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1. (OAB/RJ – 2007- CESPE) Com relação à competência para estabelecer normas gerais de direito tributário, julgue os seguintes itens. I - A lei complementar tributária pode fixar alíquotas específicas para tributos da competência estadual ou municipal. II - A lei complementar tributária deve versar apenas sobre normas gerais tributárias, consideradas estas como normas-quadro, versando sobre princípios, diretrizes e balizas normativas, dentro das quais o ente tributante deverá exercer sua competência tributária, definindo os elementos essenciais da hipótese de incidência, respeitando o princípio federativo e seu corolário: a autonomia financeira e tributária dos entes integrantes da República Federativa do Brasil. III - As obrigações acessórias em relação a tributos de competência de estados e municípios podem ser especificadas em lei complementar tributária federal. IV - Na hipótese de ser revogada a lista de serviços anexa à lei complementar tributária nacional do ISSQN (imposto sobre serviços de qualquer natureza), não poderão os municípios cobrar o referido imposto em seus territórios. Estão certos apenas os itens (A) I e II. (B) I e III. (C) II e III. 18 (D) II e IV. Julgue os itens abaixo como CERTO ou ERRADO: 2. (Procurador Federal - 2004) As alíquotas dos impostos de importação e exportação podem ser alteradas por decreto, de acordo com os limites previstos em lei, o que constitui atenuação ao princípio da legalidade. 3. (Procurador Federal– 2004) O prazo para o recolhimento do tributo, por se tratar de elemento que tem repercussão na definição do montante a ser recolhido, deve ser definido em lei, não podendo ser estabelecido tão-somente em regulamento. 4. (Técnico da Receita Federal – 2000 - ESAF) A lei não se aplica a ato ou a fato pretérito quando, expressamente interpretativa, determine a aplicação de penalidade por infração dos dispositivos interpretados. 5. (Técnico da Receita Federal – 2006) Por meio de Medida Provisória, pode a União majorar imposto de sua competência. 6. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998) O esclarecimento do significado de uma lei tributária por outra posterior configura a chamada interpretação autêntica. 7. (Auditor de Fortaleza – 1998) Em matéria de impostos, não é preciso lei para estabelecer as obrigações tributárias acessórias. 8. (Auditor de Fortaleza – 1998) No preenchimento de lacunas da legislação tributária, utiliza-se preferencialmente a analogia. 9. (Fiscal do ISS – Fortaleza – 2003) É vedado às leis tributárias atribuir capacidade tributária passiva à pessoa natural que o Código Civil considere absolutamente incapaz. 10. (Auditor-fiscal da Receita Estadual - MG – 2005) Lei ordinária pode prever a extinção do crédito tributário mediante dação em pagamento de bens móveis. 19 11. (Auditor-fiscal da Receita Estadual - MG – 2005) Lei ordinária pode criar modalidade de lançamento do crédito tributário. 12. (Auditor-fiscal da Receita Estadual - MG – 2005) Lei ordinária pode atribuir imunidade a determinado grupo ou conjunto de contribuintes. 13. (AFRFB/2005) Considerando os temas “vigência” e “aplicação” da legislação tributária, julgue os itens a seguir. Marque com (V) a assertiva verdadeira e com (F) a falsa, assinalando ao final a opção correspondente. ( ) É condição de vigência da lei tributária a sua eficácia. ( ) O CTN veda a extraterritorialidade da legislação tributária. ( ) Não é vedado aos decretos dispor sobre o termo inicial da vigência dos atos expedidos pelas autoridades administrativas tributárias. ( ) O Código Tributário Nacional adota como regra a irretroatividade da lei tributária. a) b) c) d) e) VFFV FFVF FFVV VFVV VFVF 14. (AFTN/1998) Segundo se depreende do Código Tributário Nacional, um ato infralegal (um decreto, por exemplo) pode estabelecer a(s) a) b) c) d) e) 15. Extinção de um tributo Definição do fato gerador da obrigação tributária acessória nos limites da lei Hipótese de anistia Redução do Imposto Territorial Rural Fixação da alíquota do imposto de renda (AFR-MS/2006) É incorreto afirmar que somente a lei poderá dispor sobre: a) b) c) d) e) A instituição de tributos; A extinção do crédito tributário; A majoração de tributos; Atualização monetária da base de cálculo dos tributos; Cominação de penalidades. 20 16. (AFR-SP/2006) Os tratados e convenções internacionais, relacionados com tributo, são fontes formais primárias do Direito Tributário e ingressam em nosso ordenamento jurídico através de: a) b) c) d) e) Decreto-lei; Lei delegada; Decreto legislativo; Resolução do Senado; Lei complementar. 17. (AFR-RJ/2008) No sistema tributário nacional, é correto afirmar que: a) Os tratados internacionais podem conter cláusula que enseje exoneração de imposto estadual; b) Os sócios-gerentes respondem pelas dívidas tributárias da sociedade, em qualquer situação; c) Os atos normativos entram em vigor sempre na data de sua publicação; d) As normas de isenção exigem interpretação literal, ou seja, podem ter aplicação analógica; e) As normas de isenção tributária se aplicam, de regra, a fatos ocorridos antes do início de sua vigência. GABARITO: 1. D 11. ERRADO 2. CERTO 12. ERRADO 3. ERRADO 13. C 4. CERTO 14. B 5. CERTO 15. D 6. CERTO 16. C 7. CERTO 17. A 8. CERTO 9. ERRADO 10. ERRADO 21 2. Vigência da Legislação Tributária 2.1. Vigência da Legislação tributária É importante ao estudioso de nossa disciplina discernir a questão da vigência (ou eficácia) de uma norma jurídica, aferindo se esta ainda tem ou não validade, ou se ainda é ou não aplicável. Perscrutar a duração da norma e seu campo de incidência é reconhecer que as normas jurídicas positivas existentes no mundo fenomênico não são universais nem perpétuas, mas particulares e temporais. De acordo com o ínclito jurista Celso Ribeiro Bastos, “vigência é aquele atributo da lei que lhe confere plena disponibilidade para sua aplicação” (Curso de direito financeiro e de direito tributário, 2. ed., Saraiva, p. 127). Não é de estranhar que existem leis de “idade avançada”, como o Código Comercial que, desde 1850, tem vigência. Não é diferente com o “velho” Código Penal (1942) e outras leis. 2.2. Vigência da Legislação tributária no tempo No concernente à vigência no tempo, prevalecerão as mesmas disposições legais que definem a vigência das normas jurídicas em geral. Sabe-se que é a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro o instrumento normativo que estabelece as regras de vigência das leis em geral. Ressalte-se que “salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada” (art. 1º, caput, da LINDB). Do artigo supracitado, infere-se, necessariamente, que: a) a própria lei pode trazer no seu texto a data do início da sua vigência (a expressão “salvo disposição em contrário” vale como “salvo se a lei estabelecer a sua própria vigência”); b) a lei entra em vigor 45 dias depois de publicada, quando não trouxer a data de vigência no seu bojo; c) pode ocorrer, entre a publicação da lei e sua vigência, um espaço em que a lei existe, tem validade, mas é ainda ineficaz: é a vacatio legis. O ilustre doutrinador Yoshiaki Ichihara explica: “Quando a vigência da lei não coincide com a da publicação, o período que se intercala entre a publicação e a vigência é chamado de vacatio legis, isto é, vacância da lei” (Direito Tributário, 3. ed., Atlas, p. 107). Ressalte-se que a maior parte das leis tributárias têm coincidentes a data da publicação e a da vigência, valendo dizer que entram em vigor, comumente, na data da própria publicação. No entanto, vigência, como é cediço, distingue-se de eficácia. Esta só ocorre no ano subsecutivo ao ano daquela, quanto aos tributos em geral (princípio da anterioridade tributária). 22 É importante assinalar que, segundo o art. 2º, § 3º, da LINDB, “salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”. Do dispositivo acima, infere-se que, na ordem jurídica do Brasil, não há repristinação ou restauração automática da lei velha, porquanto a lei nova (aquela que a revogara anteriormente) acabou sendo revogada. Só haverá repristinação ou revigoramento automático, se uma nova lei, expressamente, ressalvar que a lei velha, antes revogada, retomará eficácia. Exemplo: Se a lei “100” revoga a lei “200” e, mais tarde, a lei “300” revoga a lei “100” (que tinha revogado a lei “200”) isso não significa que a lei “200” (revogada pela lei “100”) voltou a ter validade, automaticamente, diante do fato de que a lei que a “matou” (lei “100”) acaba de ser “morta” (pela lei “300”). A lei “200” só voltará a ter eficácia se a novíssima lei “300” expressamente estabelecer seu revigoramento. Caso contrário, não. O renomado doutrinador Celso Ribeiro Bastos claramente nos ensina que “em regra, a revogação da lei nova não tem efeito repristinatório, isto é, sua revogação não restabelece a eficácia da lei anteriormente por ela revogada, a menos que haja disposição expressa nesse sentido” (Curso de direito financeiro e de direito tributário, 2. ed., Saraiva, p. 180). 2.2.1 a vigência e o princípio da anterioridade tributária Não descuidemos de que a Constituição impõe o “princípio da anterioridade”, que obriga a consideração de que não basta a publicação de uma lei tributária e sua vigência para que sua força cogente seja eficaz: toda lei que instituir ou aumentar tributos terá sua eficácia subordinada ao princípio da anterioridade ou princípio da “eficácia diferida”, ressalvadas as exceções constitucionalmente previstas (art. 150, § 1º, da CF). Vale dizer que os respectivos tributos só serão exigíveis a partir do 1º dia do ano seguinte àquele em que for publicada tal lei (art. 150, III, “b”, da CF), além de se respeitar o princípio da anterioridade qualificada ou nonagesimal (art. 150, III, “c”, da CF), fruto da ampliação trazida ao princípio ora estudado pela EC 42/2003. Dessa forma, ter-se-á publicação e vigência em um ano “x” e eficácia no ano “x + 1”, em um nítido diferimento ou adiamento (isto é, postergação) da eficácia do tributo. 2.3. Vigência da Legislação tributária no espaço É sabido que toda regra jurídica é editada para imperar em determinado espaço territorial: as leis de um país só valem dentro daquele país, as leis estaduais só têm aplicação no território daquele Estado, assim como as leis municipais só são aplicáveis dentro do território municipal. A legislação tributária, quanto ao espaço, submete-se ao princípio da territorialidade. Assim, a legislação tributária vale, em princípio, nos limites do território da pessoa jurídica que edita a 23 norma. Quer-se dizer que, por exemplo, no âmbito federal, a norma vale apenas dentro do território brasileiro; no âmbito municipal, dentro do município e, assim, sucessivamente. Todavia, a norma pode, por exceção, alcançar sujeitos passivos fora do Estado Federal, do município ou Estado, como prevê o art. 102 do CTN: “A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou de que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União”. Confira, pois, que o Código Tributário Nacional (art. 102) admite a extraterritorialidade da norma tributária, excepcionalmente, desde que haja convênio entre as pessoas jurídicas de direito público interno interessadas (Distrito Federal, Estados e Municípios), ou desde que existam tratados ou convenções firmados pela União. Para o eminente doutrinador Ruy Barbosa Nogueira: “O art. 102 trata da vigência das legislações estaduais do Distrito Federal e dos municípios fora de seus territórios no País, em razão do nosso sistema federativo, deixando claro que esta extraterritorialidade dentro da Federação depende de convênios e das normas gerais federais” (Curso de direito tributário, 11. ed., Saraiva, p. 80). Art. 103 do CTN: “Salvo disposição em contrário, entram em vigor: I – os atos administrativos a que se refere o inc. I do art. 100, na data da sua publicação; II – as decisões a que se refere o inc. II do art. 100 quanto a seus efeitos normativos, 30 (trinta) dias após a data da sua publicação; III – os convênios a que se refere o inc. IV do art. 100 na data neles prevista”. A vigência dos atos normativos anteriormente discriminados foi objeto do art. 103 do CTN, ao determinar que, salvo disposições em contrário, entram em vigor: a) os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas, tais como portarias, ordens de serviço, instruções normativas e circulares, na data da respectiva publicação; b) as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa, 30 dias após a data de sua publicação; c) os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios, na data neles prevista. Não estabeleceu o CTN uma regra especial aplicável na falta de previsão, quanto aos “convênios”, devendo-se, para tanto, buscar solução no direito comum. Vale dizer que se deve recorrer à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Dessa feita, estamos que o início de vigência do convênio ocorrerá no prazo de 45 dias depois de sua publicação oficial. 24 Art. 104 do CTN: “Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda: I – que instituem ou majoram tais impostos; II – que definem novas hipóteses de incidência; III – que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no art. 178.” (isenções por prazo indeterminado e incondicionado). Tal dispositivo inserto no CTN não significa propriamente o princípio constitucional da anterioridade, uma vez que tal postulado não cuida de vigência, mas de eficácia do tributo. Assim, infere-se que o art. 104 do CTN regula regra especial de vigência de algumas leis tributárias. Segundo o inc. I do mencionado artigo, a instituição ou majoração de impostos deve obedecer a uma regra especial de vigência, que coincide com o princípio da anterioridade tributária, havendo, portanto, harmonia entre a vigência e a eficácia da lei. O inc. II é destinatário do mesmo raciocínio expendido, quanto ao inciso anterior, por disciplinar a definição de novas hipóteses de incidência, isto é, definir novos fatos geradores, novas bases de cálculo, alíquotas, sujeitos passivos e converter situações de não incidência em incidência. Em essência, criar incidências significa instituir o tributo, ainda que parcialmente, o que nos leva a crer que os dizeres estabelecidos no inc. II estão implícitos no inc. I do art. 104. O inc. III, por seu turno, refere-se à extinção ou redução de isenção, que rompe, em face da lei revogatória, com a dispensa legal do pagamento do tributo. Pode-se afirmar que, a par dos incisos anteriores, o inc. III também determina uma regra especial de vigência, estabelecendo uma proteção em favor do contribuinte, ao lhe conferir maior estabilidade. Deve-se enfatizar que o STF entende que a revogação de isenção tem eficácia imediata, sem ofensa ao princípio da anterioridade (RE 204.062). Tal posição jurisprudencial não goza de chancela de doutrinadores de prol, como o ilustre Hugo de Brito machado (Curso de direito tributário, 30. ed., São Paulo: Malheiros, 2009, p. 232-233), que entende significar a revogação de isenção uma nítida “instituição de tributo”, passível de obediência ao postulado da anterioridade. Pelo que se nota, o STF esposa a regra geral da “revogabilidade” das isenções, excetuadas aquelas concedidas por prazo certo “e” sob determinadas condições (requisitos cumulativos), quando se impõe o respeito ao cumprimento dessas cláusulas, entendendo-as, dessarte, como irrevogáveis. Assim, nota-se que a isenção por prazo indeterminado e a isenção “não onerosa”, isto é, uma ou outra podem ser revogadas, não se arguindo obediência ao princípio da anterioridade, como quer o inc. III do art. 104 do CTN, em total harmonia com a jurisprudência predominante do STF, anteriormente expendida. 25 Posto isso, somos da opinião de que o art. 104, III, do CTN não se compatibiliza com a Constituição de 1988, pelas razões acima delineadas, em face de sua originária lapidação à luz da EC 18/65, segundo a qual se fez constar a limitação apenas aos “impostos sobre o patrimônio e a renda”, não se referindo aos “tributos em geral”, como preconiza o atual postulado da anterioridade no art. 150, III, “b”, da CF, ressalvadas as exceções no texto previstas. 3. Aplicação da Legislação Tributária 3.1. Aplicação da Legislação tributária O Código Tributário Nacional disciplinou, em seus arts. 101 a 104, a vigência da legislação tributária e, nos arts. 105 e 106, sua aplicação. A análise desses dispositivos é de suma importância, uma vez que a lei vigente nem sempre é aplicável aos fatos a ela contemporâneos, o que explica o distinto disciplinamento, no Código, da vigência e da aplicação da legislação tributária. Realmente, é “vigente” a norma que está pronta para incidir e, em princípio, é “aplicável” a lei que, por ser vigente à época do fato, incidiu. Mas o que é aplicar a lei? É fazê-la incidir sobre um fato, para que este se discipline por aqueles parâmetros legais, produzindo seus efeitos sob o manto da abrangência e limites definidos pela lei. De regra, uma lei só se aplica aos fatos que ocorrerão após sua vigência, em abono ao princípio da irretroatividade (art. 150, III, a, da CF). No entanto, essa regra não é absoluta, porque há leis que se aplicam a fatos pretéritos, portanto, leis de efeito retroativo (lei que veicula multa mais benéfica, por exemplo). Ademais, há fatos que se iniciam sob a égide de uma lei e se concluem quando já vigente uma nova lei. Nesses casos, como deverá agir a autoridade administrativa ou a autoridade judiciária? Aplicará a lei velha ou a lei nova? Iniciemos o estudo do intrincado fato gerador pendente: 3.2 a aplicação da nova lei tributária aos fatos pendentes Art. 105 do CTN: “A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início, mas não esteja completa nos termos do art. 116”. 26 Segundo a dicção do artigo supracitado, a legislação nova aplica-se aos fatos geradores pendentes, isto é, fatos que se iniciam na vigência de uma legislação e se completam na vigência de outra legislação. Confira que a regra do art. 105 ecoa preceito constitucional (art. 150, III, a, da CF), que impede tenha a lei tributária efeito retroativo, ou seja, proíbe que se volte no tempo para apanhar atos ou fatos já praticados. É o princípio da irretroatividade tributária. Como observa o eminente jurista Paulo de Barros Carvalho, “entrando a lei em vigor, deve ser aplicada, imediatamente, a todos os fatos geradores que vierem a acontecer no campo territorial sobre que incida, bem como àqueles cuja ocorrência teve início, mas não se completou na forma prevista pelo art. 116. E ficam delineados, para o legislador do Código Tributário Nacional, os perfis de duas figuras que ele distingue: a de fato gerador futuro e a de fato gerador pendente” (Curso de direito tributário, 6. ed., Saraiva, p. 69). O que são, enfim, fatos geradores pendentes? São aqueles cuja conclusão (consumação) pressupõe uma sequência de atos, sequência essa que já se iniciou, mas ainda não se completou, quando a lei entrou em vigor: uma primeira parte foi praticada sob a égide da lei velha, e uma segunda parte ocorrerá já sob a égide da lei nova. Tal ocorre, e.g., com impostos de fato gerador periódico, como o IPVA, cujo fato gerador se completa de ano em ano: durante o ano de sua ocorrência, o fato gerador desse imposto é pendente; havendo alguma modificação na legislação, aplica-se a norma mais recente. O arguto jurista Celso Ribeiro Bastos, entretanto, discorda desse entendimento e adverte que “a Constituição, no art. 150, III, a, proíbe a cobrança de tributos, em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado”. E prossegue: “No nosso modo de ver, o chamado ‘fato pendente’ é um fato que já teve início de ocorrência antes da vigência da lei. É, portanto, parcialmente ocorrido anteriormente à existência dessa. A Constituição não discrimina entre fatos parcial ou totalmente ocorridos. Se não diferencia é porque engloba a ambos” (Curso de direito financeiro e de direito tributário, 2. ed., Saraiva, p. 181). Assim, a lei nova não mais alcança os fatos geradores pendentes, em face da incompatibilidade da parte final do art. 105 do CTN com a redação do princípio da irretroatividade tributária, veiculado no inc. III, a, do art. 150 da CF. Frise-se, todavia, que tal entendimento da revogação tácita da regra do art. 105, quanto à aplicação a fatos geradores pendentes, é posição controvertida na doutrina. Ademais, “pendente” não é o fato gerador; todavia, o que, de fato, pode ocorrer é fato gerador consistente em negócio jurídico sujeito à condição suspensiva (art. 117, I, do CTN). Com efeito, pendente está o negócio jurídico, e não o fato gerador. Este ocorre ou não. E, portanto, a lei tributária só se aplica mesmo a fatos geradores futuros, pois o famigerado “fato gerador pendente” nada mais é do que uma possibilidade jurídica. Se a condição jamais ocorrer, inexistirá o fato gerador. Vejamos os arts. 116 e 117 do CTN: 27 Art. 116. “Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; “II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos do direito aplicável”. Art. 117 do CTN: “Para os efeitos do inc. II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: I – sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento; II – sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio”. 3.3 A análise do IR e o fato gerador complexivo, à luz do princípio da irretroatividade O STF, contrariando a expectativa de grande parte dos tributaristas e contribuintes, vê o princípio da irretroatividade pelo prisma da definição legal do aspecto temporal da hipótese de incidência (= momento legal de ocorrência do fato gerador da Obrigação Tributária), e não pela ótica do fato econômico tributado. É a retroatividade imprópria, de todo condenável, mas aceita por aquela Corte, na qual não prevaleceu a “teoria do fato gerador complexivo”, mas o entendimento de que o fato gerador do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) surge no último dia do exercício social, quando se dá o levantamento do balanço social das empresas (RE 194.612). O fato é que, na vigência do ordenamento constitucionalmente decaído, até o início dos anos oitenta, durante muito tempo, a doutrina pátria, em coro com a jurisprudência (Súmula 584 do STF: “Ao IR calculado sobre os rendimentos do ano-base aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deva ser apresentada a declaração”), sustentou que a lei aplicável para tributar a renda de determinado ano era a lei que estivesse em vigor até o final do ano (31 de dezembro), respeitando-se também o princípio da anterioridade, pois o tributo criado por lei editada até o final do ano “x” só seria cobrado no ano “x+1”, sobre a renda do ano “x”. Bastava, então, que tal lei, apta a viger no exercício financeiro, fosse editada até 31 de dezembro do ano-base – momento anterior ao início desse exercício financeiro. Assim, o irrealismo era total: a lei surpreendia o contribuinte, quando já não tinha ele como evitar a obrigação tributária. A garantia foi inovada com o postulado inserido na Constituição. O importante, agora, não é o fato de a lei ser anterior ao início do exercício financeiro, mas, sim, a lei não poder abranger fatos geradores pretéritos (a lei tem que ser anterior ao início do ano-base). 28 Logo, as datas limítrofes mudaram. Não interessa mais o marco final de 31 de dezembro do exercício financeiro, mas, sim, a “zero hora” do dia 1º de janeiro do ano-base, data antes da qual deve ser publicada a lei. Assim, na vigência do regime constitucional atual, a obrigação tributária, como dever de pagar o tributo, somente nasce quando anterior ao ciclo de fatos econômicos que lhe servem de índice de capacidade contributiva, não bastando que a lei (e sua obrigação tributária decorrente) seja anterior ao início do exercício financeiro. Ressalte-se que a Súmula 584, inobstante tida por superada pela doutrina, continua sendo aplicada pelo STF (RE 104.259; RE 194.612; RE 197.790; RE 199.352). Assim, a doutrina brasileira repudia a doutrina da “retroatividade imprópria” ou “doutrina da retrospectiva”. 3.4 a retroatividade da lei tributária A lei não se aplica ao passado, senão ao presente. Em regra, a lei serve para regular fatos ocorridos a partir do início de sua vigência e, excepcionalmente, para regular fatos ocorridos antes de sua edição. Existem duas exceções à regra geral de irretroatividade da aplicação da legislação tributária: a) para a lei interpretativa; b) para a lei mais benéfica. Art. 106 do CTN: “a lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados; (...)”. A lei expressamente interpretativa, a rigor, interpreta outra lei, vigente antes da ocorrência do fato gerador, porém com algumas obscuridades. Torna claro, portanto, o sentido da lei anterior, já vigente quando da edição da lei interpretativa. Portanto, é aquela que não inova, limitando-se a esclarecer dúvida surgida com o dispositivo anterior. Se dúvida havia, e tanto havia que o próprio legislador resolveu confeccionar outra lei para espancar as ambiguidades existentes no texto anterior, não é justo que se venha punir quem se comportou de uma ou de outra forma, entre aquelas que se podiam admitir como corretas, em face do texto antigo. Daí a exclusão de penalidades, prevista na parte final do inc. I do art. 106 do CTN. Tal exclusão – é importante insistir nesse ponto de grande relevância – não é absoluta, como se poderia inferir da leitura do art. 106 do CTN. Ela diz respeito à má interpretação da lei, não à sua total inobservância. Exemplo: admitindo-se que em face de algum dispositivo da legislação do IPI se tenha dúvida sobre o dever de emitir o documento “a” ou o documento “b” e que dispositivo novo, interpretativo, diga que no caso deve ser emitido o documento “b”, não se aplicará qualquer penalidade a quem tenha emitido o documento “a”. Todavia, quem não 29 emitiu documento nenhum, nem “a” nem “b”, estará sujeito à penalidade, não se lhe aplicando a exclusão de que trata o art. 106 do Código. Art. 106 do CTN: “a lei aplica-se a ato ou fato pretérito: (...) II – tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo como infração; b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática”. Confira que a retroatividade da lei tributária só tem um propósito: beneficiar o contribuinte, mesmo porque a retroação prejudicial (lex gravior) é constitucionalmente proibida (art. 5º, XXXVI, da CF). Noutras palavras, somente a lei tributária benigna é que pode retroagir para alcançar fatos do passado. Não conseguimos ver qualquer diferença entre as hipóteses da alínea a e da alínea b. Na verdade, tanto faz deixar de definir um ato como infração, como deixar de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão. Quanto à alínea c, tem-se o fenômeno da retroação benéfica da multa ou aplicação do princípio da benignidade, em que se permite aplicar retroativamente uma lei a um fato gerador anterior, se a multa prevista na lei nova for inferior àquela prevista na lei do momento do fato gerador. A aplicação “retroativa” da lei tributária atende aos mesmos princípios prevalecentes no direito penal, lembrando que, para todas as alíneas do inc. II, há que se tratar de ato não definitivamente julgado. Isso quer significar que, durante as lides judiciais ou administrativas, em que subsiste pendência de recursos, pode haver a possibilidade de aplicação retroativa da multa mais benéfica, em face de uma nova lei que reduza a multa a ser aplicada. Não é demasiado asseverar que, caso a multa já tenha sido recolhida, não haverá como retornar ao status quo ante (situação anterior), não sendo aplicável a retroação benéfica. A tal conclusão se pode chegar, analogicamente ao que preceitua o direito penal, em face de uma pena já cumprida e de lei posterior que descriminalize o ilícito ensejador da reprimenda. Não haverá como “retroceder”, fazendo-se “descumprir” sanção imposta e já cumprida. O postulado da irretroatividade tributária, com respaldo constitucional, encontra amparo no art. 144, caput, do CTN, cujo teor segue abaixo: Art. 144. “O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada”. 30 Entretanto, a lei nova que regula formalidades ou aspectos formais, isto é, inábil a alterar, criar ou extinguir direitos materiais (definição de sujeito passivo, de hipótese de incidência, do valor da dívida etc.), deverá ser aplicada retroativamente, afastando-se o teor do caput do art. 144 do CTN. Assim, os aspectos formais ou procedimentais que cercam o lançamento – competência ou poderes de investigação da autoridade fiscal, por exemplo – não influem, a ponto de afastarem a lei vigente na época do lançamento. Note o § 1º do art. 144 do CTN: Art. 144. “(...) § 1º Aplica-se ao lançamento a legislação que, posterior- mente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros”. Assim, o §1º menciona as seguintes hipóteses de retroação da norma, com utilização da lei vigente à época do lançamento: a) legislação que institua novos critérios de apuração ou processos de fiscalização; b) legislação que amplie os poderes de investigação das autoridades administrativas; c) legislação que outorgue ao crédito maiores privilégios ou garantias. Ademais, o § 2º do art. 144 anuncia disposição que, à semelhança do parágrafo anterior, afasta a aplicação do caput do comando em tela, isto é, o próprio princípio da irretroatividade tributária. Trata-se da situação adstrita aos tributos lançados por período certo de tempo ou com fatos geradores periódicos (IPTU, IPVA, ITR). Nesses tributos, a lei pode, valendo-se de ficção jurídica, definir um específico momento de acontecimento do fato gerador. Assim sendo, a legislação aplicável será aquela vigente na data predeterminada, e não conforme a regra inserta na máxima “a lei do momento do fato gerador”. Exemplo: lei municipal que define o fato gerador do IPTU para 1º de janeiro de cada ano (aplicar-se-á a lei vigente em 1º de janeiro). É o que preconiza o § 2º do art. 144 do CTN: Art. 144. “(...) § 2º O disposto neste artigo não se aplica aos impostos lança- dos por períodos certos de tempo, desde que a respectiva lei fixe expressamente a data em que o fato gerador se considera ocorrido”. EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998) O lançamento efetuado pela fiscalização reporta-se à data da autuação e rege-se pela legislação nesta data vigente. 31 2. (Auditor do Tribunal de Contas da União – 2006) Caso uma lei que eleve a alíquota do imposto de renda sobre determinada operação seja publicada em 26 de dezembro de 2007, com cláusula de vigência imediata, é constitucionalmente admissível que a cobrança do imposto com a nova alíquota ocorra a partir de 1º de janeiro de 2008. 3. (Auditor do Tribunal de Contas da União – 2006) Considere-se que uma lei que reduza isenções e, ao mesmo tempo, disponha de maneira mais favorável ao contribuinte tenha sido publicada em 27 de dezembro de 2006, com data de vigência a partir de sua publicação. Nesse caso, de acordo com o CTN, essa lei teria passado a vigorar apenas em 1.o de janeiro de 2007. 4. (AFPS/2002) Sobre o tema legislação tributária, é correto afirmar que, nos termos do Código Tributário Nacional: a) A aplicação da legislação tributária restringe-se a fatos geradores futuros, isto é, àqueles ocorridos a partir de sua vigência, em consonância com o princípio constitucional da irretroatividade das leis. b) A lei tributária aplica-se a ato ou fato pretérito, quando seja expressamente interpretativa, incluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. c) A lei tributária aplica-se a ato pretérito que não tenha sido definitivamente julgado, quando deixo de defini-lo como infração. d) A lei tributária aplica-se a ato ou fato pretérito, não definitivamente julgado, quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, inclusive no caso de envolver inadimplemento de obrigação principal, desde que o ato ou fato não se tenha realizado por meio de fraude. e) É permitido à autoridade administrativa empregar a equidade para dispensar o cumprimento de obrigação tributária principal, quando se depara com ausência de disposição legal expressa para decidir litígio tributário cujo julgamento é de sua competência. 5. (AFTM-SP/2007) A aplicação da lei a ato ou fato pretérito: a) Não ocorrerá em hipótese alguma. b) Ocorrerá sempre que houver previsão para sua retroatividade, em lei ordinária, e forem observados os princípios da anterioridade e da “noventena”. 32 c) Ocorrerá sempre que houver previsão para sua retroatividade, em lei complementar, e forem observados os princípios da anterioridade e da “noventena”. d) Ocorrerá, em qualquer caso, quando deixar de definir o ato como infração. e) Ocorrerá, tratando-se de ato não-definitivamente julgado, quando deixar de defini-lo como infração. 6. (TRF/2002) Assinale a opção correta: a) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando seja expressamente interpretativa, incluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. b) A lei tributária nova não pode ser aplicada a ato ou fato pretérito. c) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando comine penalidade mais severa que a prevista na lei vigente ao tempo de sua prática. d) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e tenha implicado falta de pagamento de tributo. e) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando deixe de defini-lo como infração. 7. (TRF/2000) A lei não se aplica a ato ou fato pretérito: a) Quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo de sua prática. b) Quando seja expressamente interpretativa. c) Tratando-se de ato não definitivamente julgado quando deixe de defini-lo como infração. d) Quando deixe de tratar ato não definitivamente julgado como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, não sendo fraudulento e não tendo implicado falta de pagamento de tributo. e) Quando expressamente interpretativa, determine a aplicação de penalidade por infração dos dispositivos interpretativos. 33 8. (AFMT-DIA/2000 – adaptada) Quanto à vigência de decisões proferidas por órgãos administrativos colegiados, assinale a alternativa correta: a) Nada dispondo em contrário à legislação da respectiva esfera administrativa, 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação. b) Em qualquer hipótese, nos termos da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, 45 (quarenta e cinco) dias após a sua publicação. c) Em qualquer hipótese, nos termos do CTN, na data de sua publicação. d) Em qualquer hipótese, nos termos do CTN, 30 (trinta) dias após a sua publicação. e) Nos termos do CTN, salvo disposição em contrário da legislação específica, 30 (trinta) dias após a sua publicação. 9. (AFRB/2005) Considerando os temas “vigência” e “aplicação” da legislação tributária, julgue os itens a seguir. Marque com (V) a assertiva verdadeira e com (F) a falsa, assinalando ao final a opção correspondente. ( ) É condição de vigência da lei tributária a sua eficácia. ( ) O CTN veda a extraterritorialidade da legislação tributária. ( ) Não é vedado aos decretos dispor sobre o termo inicial da vigência dos atos expedidos pelas autoridades administrativas tributárias. ( ) O Código Tributário Nacional adota como regra a irretroatividade da lei tributária. a) V F F V b) F F V F c) F F V V d) V F V V e) V F V F 10. (AFPS/2002) Sobre o tema legislação tributária, é correto afirmar que, nos termos do Código Tributário Nacional: a) A aplicação da legislação tributária restringe-se a fatos geradores futuros, isto é, àqueles ocorridos a partir de sua vigência, em consonância com o principio constitucional da irretroatividade tributária das leis. b) A lei tributária aplica-se a ato ou fato pretérito, quando seja expressamente interpretativa, incluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. c) A lei tributária aplica-se a ato pretérito que não tenha sido definitivamente julgado, quando deixe de defini-lo como infração. d) A lei tributária aplica-se a ato ou fato pretérito, não definitivamente julgado, quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, 34 inclusive no caso de envolver inadimplemento de obrigação principal, desde que o ato ou fato não se tenha realizado por meio de fraude. e) É permitido à autoridade administrativa empregar a equidade para dispensar o cumprimento de obrigação tributária principal, quando se depara com ausência de disposição legal expressa para decidir litígio tributário cujo julgamento é de sua competência. 11. (TRF/2002) Assinale a opção correta. a) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando seja expressamente interpretativa, incluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. b) A lei tributária nova não pode ser aplicada a ato ou fato pretérito. c) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando comine penalidade mais severa que a prevista na lei vigente ao tempo de sua prática. d) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e tenha implicado falta de pagamento de tributo. e) A lei tributária nova aplica-se a ato ou fato pretérito, quando deixe de defini-lo como infração. GABARITO: 1. ERRADO 7. E 2. CERTO 8. E 3. ERRADO 9. C 4. C 10. C 5. E 11. E 6. E 4. Interpretação e Integração da Legislação Tributária. 4.1 Interpretação da Legislação tributária 35 A interpretação da lei é o trabalho investigativo que procura traduzir seu pensamento, sua dicção e seu sentido. É o ato de decifrar o pensamento do legislador, perquirindo a razão que animou suas ideias quando confeccionou aquele instrumento normativo. É mecanismo de tradução da mens legislatoris (= a mente do legislador) em palavras conclusivas de um raciocínio querido e, agora, a decifrar. Assim, interpretar a lei é compreendê-la, determinando, com exatidão, seu verdadeiro desígnio, reconhecendo os casos todos a que se estende sua aplicação. Segundo o preclaro doutrinador Ruy Barbosa Nogueira, “para conhecer, cumprir ou bem aplicar a lei, é preciso captar seu verdadeiro significado e alcance: interpretá-la” (Curso de direito tributário, 11. ed., Saraiva, p. 86). Na interpretação da legislação tributária, deve o exegeta agir com parcimônia, sem desobedecer a postulados norteadores de um trabalho exegético, tais como: a) se a lei não tratar diferentemente, o intérprete deve evitar qualquer distinção; b) leis excepcionais e as especiais devem ser interpretadas restritivamente; c) não se há de descurar, no texto legal, do lugar (topografia) no qual está colocado o dispositivo, cuja compreensão é buscada. Diferença há entre “lei” e “legislação tributária”. Vejamos: • Lei: a palavra “lei” representa um vocábulo plurissignificativo, isto é, ora é empregado em sentido amplo, ora em sentido estrito. No primeiro caso, refere-se, comumente, a toda e qualquer norma jurídica; quando se lhe dá o sentido mais restrito, por sua vez, quer-se mencionar apenas a norma jurídica produzida pelo órgão ao qual a Constituição atribuiu a função legislativa. • Legislação tributária: a palavra “legislação” recebeu um tratamento específico do CTN, que lhe deu o significado de lei em sentido amplo. Nesse passo, segue o art. 96 do CTN: Art. 96 do CTN: “A expressão ‘legislação tributária’ compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes”. Em todo o texto do Código Tributário Nacional, enquanto a palavra “lei” é empregada em sentido restrito, a palavra “legislação” tem o significado abrangente. A interpretação é mecanismo que visa clarificar não apenas a “lei”, mas a “legislação”, como se verifica do art. 107, a seguir delineado, verbis: Art. 107 do CTN: “A legislação tributária será interpretada conforme o disposto neste capítulo”. 36 Tal comando normativo traz à baila o princípio da exclusividade dos critérios de interpretação, ao representar balizamentos ao trabalho hermenêutico, dispostos com exclusividade no próprio Código Tributário Nacional. Apesar disso, pode o intérprete socorrer-se de métodos ou processos de interpretação derivados da própria ciência da interpretação, isto é, da hermenêutica, valendo-se de quaisquer processos clarificadores dos institutos, desde que não colidam com o Código Tributário Nacional, ferindo o princípio ora em estudo. Assim, o conhecimento das normas jurídicas deve ser alvo de um sistema interpretativo integrado, capaz de permitir ao exegeta o verdadeiro alcance da norma, a partir de uma análise “heterodoxa”, que explore os sentidos literal, histórico, teleológico e sistemático do comando normativo. Modernamente, a doutrina entende que o melhor seria a aplicação integra- da dos métodos de interpretação, na busca da ratio legis, tendo em vista que “a gramática, sistema e história são apenas meios para alcançar a finalidade da lei” (Klaus Tipke). Portanto, o ideal é o pluralismo metodológico, sem prevalência de um único método: ora se recorre a um método; ora se recorre a outro. Dessa forma, há de se cultivar a visão pluralista, sem hierarquização. É a coexistência da pluralidade e da equivalência metodológicas, nos lúcidos dizeres do estimado Professor Ricardo Lobo Torres. A partir da adoção do pluralismo metodológico, afasta-se a aplicação apriorística de qualquer dos métodos de interpretação, com a utilização de todos eles, de acordo com os valores envolvidos no caso concreto e inerentes à norma. A interpretação de uma lei pode ser realizada de vários modos, conforme se priorize um aspecto em detrimento de outro, como ponto de referência. Com efeito, pode-se interpretar a lei, conforme: a) a fonte; b) os meios adequados para sua exegese; c) os resultados da exegese. Passemos a detalhar: • Quanto à fonte da lei, a interpretação pode ser: – autêntica: é o mecanismo de clarificação da lei por intermédio de outra lei. Portanto, quando uma nova lei é editada, esclarecendo o teor da lei anterior, dir-se-á que se trata de interpretação autêntica, uma vez que é fonte a própria “lei”. Compete ao Poder Legislativo. A interpretação autêntica é atividade anômala do Poder Legislativo, que assume papel exegético que não lhe convém. Bastante criticada pela doutrina, que a considera 37 inconstitucional, foi recentemente palco de discussões com o advento da LC 118/2005, à qual se pretendeu dar a vestimenta de “lei interpretativa”. “O ideal do direito, como de toda ciência, é a certeza, embora relativa; pois bem, a forma autêntica de exegese oferece um grave inconveniente – a sua constitucionalidade posta em dúvida por escritores de grande prestígio. Ela positivamente arranha o princípio de Montesquieu; ao Congresso incumbe fazer as leis; ao aplicador (Executivo e judiciário) – interpretá-las. a exegese autêntica transforma o legislador em juiz; aquele toma conhecimento de casos concretos e procura resolvê-los por meio de uma interpretação geral” (Maximiliano, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 18. ed., Forense, 2000, § 98, p. 93-94). Sabe-se que a LC 118/2005 trouxe nova interpretação ao prazo prescricional da ação de restituição do indébito, reduzindo-o, invariavelmente, para cinco anos a contar da data do pagamento antecipado, independentemente de sua homologação que resultaria na constituição do crédito tributário. – Jurisprudencial ou Judicial: é o processo de interpretação calcado no po- sicionamento reiterado dos Tribunais, isto é, na jurisprudência. Assim, a fonte, nesse caso, é a “jurisprudência”. Compete aos Tribunais. – Doutrinária: é o método que se baseia nas conclusões dos estudiosos da disciplina, sendo um produto da argúcia dos cientistas do direito ou “juristas”, que realizam o trabalho exegético, partindo-se dos princípios da ciência do direito. A fonte, nesse caso, é a própria “doutrina”. Compete aos doutrinadores e estudiosos da matéria em foco. • Quanto aos meios adequados para sua exegese, insta dizer: A interpretação poderá pautar-se em vários métodos adequados ao exercício de descoberta da norma, relevando-se aspectos de ordem gramatical, de ordem histórica ou mesmo de ordem teleológica, motivadores de sua confecção em um dado momento. O intérprete é totalmente livre para utilizá-los, de modo isolado ou global, sucessivo ou simultâneo, sem que possa conferir preeminência a quaisquer dos procedimentos aventados – o que ocorrerá nos métodos de integração, a serem estudados oportunamente. Interpretar a lei é revelar o pensamento que anima suas palavras; portanto não deve agir o hermeneuta por uma força “centrípeta” (para dentro, com limites) na busca do sentido. O trabalho exegético, isto é, de dissertação minuciosa do sentido do texto ou palavra, é corolário da “hermenêutica jurídica” (= arte de interpretar leis), que representa o corpo de princípios e regras que devem ser utilizados para a interpretação de um texto legal, por meio de métodos clássicos de interpretação. Da doutrina e da jurisprudência, extraem-se alguns preciosos critérios exegéticos, não havendo que se obedecer a uma ordem hierárquica para sua aplicação: – método gramatical, lógico-gramatical, filológico ou léxico: pauta-se na interpretação “conforme o texto” em estudo, analisando-se “apenas o que está escrito”. É um método 38 restritivo, i.e, mecanismo que se limita aos dizeres contidos na norma, para que não se alcancem situações esdrúxulas. Visa compatibilizar a letra com o espírito da lei, por meio de regras de linguística, pontuação, vírgulas ou etimologia, considerando o entendimento vernacular e a literalidade, a construção gramatical e o significado semântico do vocábulo. – método lógico: funda-se na interpretação “conforme o contexto”, analisando, de modo extrínseco, “o que se quis dizer”, e não o “o que está dito”. Procura-se o sentido lógico do texto, para se evitarem incoerências, contradições, tentando-se harmonizar entre si todas as disposições da lei. É o método que objetiva descobrir o pensamento e o sentido da lei, aplicando-se princípios científicos da lógica. – método histórico: é o mecanismo de detecção das circunstâncias eventuais e contingentes, que motivaram a edição da lei, sua razão de nascer e de ser. As- sim, por meio de um trabalho de reconstituição do conteúdo original da norma, garimpam-se os documentos atinentes à elaboração da lei. – método teleológico: prima pela busca da finalidade da norma, concentrando-se no resultado colimado pela lei. – método sistemático, lógico-sistemático ou sistêmico: por esse método, procede-se à comparação da lei guerreada com outras leis e com o ordenamento jurídico, como um todo, para que a eles se ajuste harmonicamente. Considera-se o sistema jurídico como um plexo harmônico de normas, cabendo ao hermeneuta o desempenho da atividade exegética nesse contexto vário de preceitos inseridos num conjunto orgânico. Segundo Karl Larenz, este método “teria a função de introduzir a norma no contexto significativo da lei”. • Quanto aos resultados da exegese, a interpretação pode ser: – Declarativa: por esse processo interpretativo, procura-se, tão somente, “revelar” o pensamento do legislador. – Extensivo ou ampliativo: pauta-se na interpretação, segundo a qual se busca ampliar o sentido do texto para abranger hipóteses semelhantes. Busca-se a ratio legis, o sentido veraz da norma, incluindo hipóteses no campo de incidência da norma. Pelo mecanismo ampliativo, deve o exegeta proceder a uma análise latitudinária da norma. Aliás, “a letra mata, e o Espírito é que dá a vida” (Apóstolo Paulo, em II Coríntios, 3, 6). – Restritivo ou literal: a interpretação literal se contrapõe à interpretação ampliativa, anteriormente estudada, colocando-se diametralmente oposta. Por esse método, a incidência da lei não poderá ir “além” da fórmula ou hipótese expressas em seu texto, ficando afastados os critérios de integração da norma. A interpretação literal tem respaldo no art. 111 do CTN. Esse artigo será detalhado um pouco adiante. 39 4.1.1 utilizações de princípios gerais do direito privado Art. 109 do CTN: “Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”. Na verdade, o direito é uno. Nenhuma disciplina do direito é inteiramente autônoma, desvinculada das demais. É corriqueira a utilização de conceitos do direito civil em nossa disciplina, tais como: obrigação (art. 113 do CTN); bem imóvel (art. 130 do CTN); pagamento (arts. 157 e ss. do CTN); compensação (art. 170 do CTN) etc. É igualmente comum a lei tributária utilizar tais conceitos sem explicá-los ou defini-los. É que o conceito, como se depreende da parte inicial do artigo em comento, deve ser buscado em seu nascedouro, isto é, no direito privado, valendo-se de uma interpretação “sistemática”, cuja definição apresenta-se supramencionada. Com efeito, os elementos do direito privado podem ocorrer na seara tributária; no entanto, o intérprete, no trabalho de entendê-los, há de ingressar no campo afeto ao direito privado e de lá extrair a concepção originária, uma vez que continuam sendo institutos, conceitos e formas de puro direito privado, perante a mera in- corporação no plexo de normas atinentes ao direito tributário. Exemplo: Se o direito privado adota o nome “compra e venda” para definir a transferência da propriedade de uma coisa, de uma pessoa para outra, mediante um certo preço em dinheiro (art. 481 do Código Civil – Lei 10.406/2002), a lei fiscal pode adotar a nomenclatura originária, sem, no entanto, alterar o instituto da “compra e venda” à luz do CTN. No entanto, o art. 109, em sua parte final, traz ressalva relevante, não obstante confusa, ao entendimento da questão. Passemos a elucidar: Art. 109 do CTN: “Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”. Em abono da clareza, poderíamos reescrever o artigo da seguinte forma: Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas do próprio direito privado, mas não para definição dos efeitos tributários com eles relacionados. Quer-se dizer que os atos jurídicos praticados pelo contribuinte e referentes a institutos do direito privado (por exemplo: doação de bens – alvo do ITCMD) serão conceituados pelo direito privado. No entanto, pode ocorrer que o contribuinte, em vez de doar, proceda a uma 40 compra e venda por valor irrisório, a fim de que se submeta ao pagamento do ITBI, e não do ITCMD, geralmente mais gravoso que o primeiro. Com efeito, no caso em tela, buscou o contribuinte utilizar-se de estratagema ardiloso para se furtar da tributação devida, não podendo passar ao largo dos “efeitos tributários”, costeandoos. Valendo-se da denominada “simulação”, dissimulou negócio, por meio do que se costuma chamar abuso de forma jurídica. Assim, preconiza o art. 109, “parte final”, do CTN, que os princípios relacionados com o instituto da doação serão oriundos do direito privado, porém os efeitos tributários relacionados com o próprio instituto serão decorrentes da lei tributária. Logo, a fiscalização não se submeterá ao rigor conceitual do postulado oriundo do direito civil, podendo exigir o ITCMD, caso logre provar que se tratou de negócio fraudulento. Portanto, o indigitado artigo traz a lume o perfeito relacionamento entre o direito tributário e o direito privado (civil e comercial), mostrando ser viável a comunicabilidade dos princípios, observadas as limitações dispostas em seu bojo. O “abuso de forma jurídica” liga-se ao conceito de evasão fiscal – mecanismo ilícito por meio do qual se esconde o fato gerador ou lhe confere uma aparência de fato não tributado ou tributado de forma mais amena. Assim, a evasão presume a ocorrência do fato gerador, que se apresenta “camuflado”. Portanto, processa-se, em geral, após a ocorrência do fato imponível. Na prática, dá-se quando o contribuinte se vale de forma jurídica atípica para ocultar a exata essência econômica do ato que pratica. Exemplo: A, pretendendo doar um bem para B, simula uma venda e compra, a fim de impor a recolha do ITBI, menos gravoso do que o ITCMD. Nessa toada, insta mencionar o parágrafo único do art. 116, inserido com a LC 104/2001, que retrata norma inibitória de evasão, não obstante o alarde geral de que se trata de dispositivo “antielisão”. Em outro giro, vale lembrar que a elisão fiscal é prática que objetiva evitar a ocorrência do fato gerador. Refere-se à economia do imposto ou ao planejamento tributário, como condutas lícitas que se processam, em geral, antes da ocorrência do fato gerador: Art. 116 do CTN: “Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”. Como se pode notar, é cabível ao Fisco aferir a forma jurídica utilizada – até porque não é vinculante –, contrapondo-a com a essência econômica do ato (art. 109, parte final, CTN). A eventual discrepância permite à autoridade administrativa desconsiderar o ato ou o negócio jurídico. Art. 110 do CTN: “A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou 41 implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”. O artigo reflete a obediência que deve ter o intérprete à hierarquia das leis. Não compete ao legislador ordinário modificar o conceito trazido pela Constituição. Se a Constituição menciona “mercadoria”, ao definir a competência dos Estados para instituir e cobrar o ICMS, o conceito de mercadoria há de ser o existente no direito comercial. Admitir-se que o legislador pudesse modificá-lo seria permitir-lhe alterar a própria Constituição Federal, alterando as competências tributárias ali definidas. Portanto, a atividade adaptadora do intérprete mostra-se demasiadamente reduzida, caso haja disciplinamento do instituto do direito privado. Não o pode a lei, nem muito menos o intérprete. A razão é simples. Se a Constituição referiu-se a um instituto, conceito ou forma de direito privado para definir ou limitar competências tributárias, obviamente esse elemento não pode ser alterado pela lei. Posto isso, o artigo em comento mostra o relacionamento entre três “entes”: Lei do direito privado (I) versus Constituição Federal (II) versus legislação tributária (III). Se a Constituição Federal (II) adota conceito do direito privado (I), pauta-se na crença de que o conceito originário deva ser utilizado com fidelidade à sua origem, não podendo a legislação tributária (III), ao exercer a competência, redefinir, a seu bel-prazer, aquele determinado instituto. Exemplos: a) se a legislação do IPTU (III) determinasse que “veículos” também são bens imóveis (I), estarse-ia invadindo a competência do IPVA (II), cuja delimitação vem expressa no art. 155, III, da CF. b) se a legislação do ICMS (III) determinasse que “bens imóveis” (I) também são “mercadorias” (I), estar-se-ia invadindo a competência do ITBI (II), por exemplo, cuja delimitação vem expressa no art. 156, II, da CF. 4.1.2 Interpretação econômica De acordo com a denominada interpretação econômica, admitida por alguns juristas no Brasil, influenciados por doutrinadores alemães, deve o intérprete considerar, acima de tudo, os efeitos econômicos dos fatos disciplinados pelas normas em exame. Não há dúvida de que o tributo é uma realidade econômica. A relação tributária é de conteúdo econômico inesgotável. Não se pode, entretanto, afastar os métodos de interpretação e os meios de integração, buscando o sentido da regra jurídica apenas por meio da aplicação do método exegético de interpretação econômica, tendo em vista, tão somente, os efeitos 42 econômicos dos fatos envolvidos na relação de tributação. Tal atitude implicaria negar o direito, afetando a segurança que este empresta às relações humanas na sociedade. A natureza econômica da relação de tributação é importante para o intérprete da lei tributária, porque faz parte do próprio conteúdo da norma, sendo elemento seguro de indicação do fim ou objetivo visado pela regra jurídica, porém não se lhe deve conferir exclusividade. Recorde-se que, entre os modos de interpretação, estudou-se o “teleológico”, que justifica o que se tem denominado interpretação econômica. Historicamente, esta deriva daquele, disseminando-se na Europa entre a Primeira guerra mundial (1919) e a queda do muro de Berlin (1989), no contexto da “jurisprudência dos interesses”. Hoje, a doutrina pluralista vem deixando claro que a interpretação teleológica ou da interpretação econômica (ou “consideração econômica”, para os alemães) não vive da só consideração da finalidade. O finalismo pressupõe o sistema, pois os valores jurídicos, os princípios, tudo se organiza em sistema. Essa depuração metodológica, em tema de interpretação do direito tributário, resultou em grande parte, da influência da obra do notável alemão Karl larenz – Methodenlehre der Rechtswissenschaft., berlin: Springer-Verlag, 1983 –, que preferiu não exagerar na “jurisprudência dos interesses”, lançando as bases de um processo hermenêutico calcado na “jurisprudência dos valores”, em que há o equilíbrio dos princípios do direito privado e do direito tributário, o combate à elisão fiscal com cláusulas antielisivas capazes de deter o abuso de forma e a busca da aproximação da ideia de direito e moral, a partir do resgate de princípios de justiça. Ressalte-se que esse movimento da ciência hermenêutica, conhecido como “jurisprudência dos valores”, difundido na Alemanha a partir da década de 80, tem sido reproduzido no Brasil pelas lições de Ricardo Lobo Torres, Ricardo Lodi Ribeiro e outros. Por derradeiro, conclui-se que se deve respeitar o postulado da interpretação econômica, sob pena de se negar o próprio conteúdo normativo da lei. No entanto, como afirma o ilustre doutrinador Sacha Calmon Navarro Coelho, “o legislador brasileiro aceitou as premissas da teoria da prevalência econômica consagrada no Código Alemão, mas opôs sérias restrições à admissibilidade de todas as consequências dela extraídas” (Interpretação econômica em direito tributário – Prevalência do conteúdo sobre a forma – Impossibilidade no direito brasileiro – Princípio da legalidade. Revista de direito tributário, n. 49, p. 38-40). 4.1.3 Interpretação literal Art. 111 do CTN: “Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I – suspensão ou exclusão do crédito tributário; II – outorga de isenção; III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias”. 43 A interpretação literal nos remete à aplicação do método “restritivo” de interpretação, estudado pouco antes. Repise-se que tal método exegético se contrapõe à interpretação ampliativa, não podendo a incidência da lei ir “além” da fórmula ou hipótese expressas em seu texto. Por essa razão, derrogam-se, na interpretação restritiva, os critérios de integração da norma, isto é, não se aplicam os meios integrativos às hipóteses previstas no art. 111 do CTN. Vale dizer que a interpretação literal corrobora o postulado da legalidade tributária, ao enfatizar a necessidade de obediência ao paradigma legal (vide os arts. 97, VI, 113, § 2º, 176, todos do CTN). Nesse sentido, segue o ilustre doutrinador Paulo de Barros Carvalho, in verbis: “Na análise literal prepondera a investigação sintática, ficando impedido o intérprete de aprofundar-se nos planos semânticos e pragmáticos” (Curso de direito tributário, 6. ed., Saraiva, p. 80). Na mesma toada, impende destacar o entendimento do ilustre jurista Celso Ribeiro Bastos, ad litteram: “(...) a interpretação literal tende a ser mais restritiva na medida em que exige do intérprete que se mantenha atrelado a expressões contidas nas palavras das leis. mas aqui há a observarse o seguinte: a interpretação jurídica não se detém na interpretação literal ou gramatical, embora deva por esta começar” (Curso de direito financeiro e de direito tributário, 2. ed., Saraiva, p. 183 e 184). Retomando a análise, de acordo com o art. 111 do CTN: Art. 111. “Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I – suspensão ou exclusão do crédito tributário; II – outorga de isenção; III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias”. O que se nota é que tal artigo disciplina hipóteses de “exceção”, devendo sua interpretação ser literal. Na verdade, o art. 111 do CTN consagra um postulado que emana efeitos em qualquer ramo jurídico, isto é, “o que é regra se presume; o que é exceção deve estar expresso em lei”. Com efeito, a regra não é o descumprimento de obrigações acessórias, nem a isenção concedida e, por fim, nem a exclusão ou suspensão do crédito tributário, mas, respectivamente, o cumprimento de obrigações, o pagamento do tributo e a extinção do crédito, mediante pagamento ou outra modalidade extintiva. Assim, o direito excepcional deve ser interpretado literalmente, razão pela qual se impõe o artigo ora em estudo. Aliás, em absoluta consonância com o art. 111, está a regra do parágrafo único do art. 175, pela qual “a exclusão do crédito tributário não dispensa o cumprimento das obrigações acessórias dependentes da obrigação principal cujo crédito seja excluído, ou dela consequente”. Quer-se dizer que, no caso de uma isenção, por exemplo, não fica o sujeito 44 passivo desobrigado de cumprir as obrigações acessórias, porquanto seu descumprimento depende de interpretação literal. Tanto nos casos de suspensão (por exemplo, moratória ou parcelamento) ou de exclusão (por exemplo, anistia ou isenção) do crédito tributário, é comum o emprego da interpretação literal. Exemplificativamente, a concessão de isenção tributária a taxistas é restrita a esses beneficiários da regra isentante, e não se poderia estender aos outros motoristas, uma vez que a lei só se referiu literalmente àqueles. A isenção nada mais é que uma forma de exclusão do crédito tributário (art. 175, I, do CTN), de sorte que o inc. II do mencionado art. 111 parece-nos redundante quando remete ao teor já consagrado no inc. I. É também recomendada a interpretação literal à lei que dispensa obrigações acessórias (art. 111, III, do CTN). Por exemplo, se a lei dispensa a escrituração dos “livros de entradas e de saídas de mercadorias”, não mencionando, expressamente, a dispensa de outro livro fiscal, tal desobrigação é literalmente restrita àquele livro, não se estendendo a qualquer outro, mesmo que a dispensa de um representasse dificuldade na escrituração do outro. 4.1.4 Interpretação benigna Art. 112 do CTN: “A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida quanto: I – à capitulação legal do fato; II – à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos; III – à autoria, imputabilidade, ou punibilidade; IV – à natureza da penalidade aplicável ou à sua graduação”. Este artigo preconiza a aplicação de um preceito, tipicamente penal – in dubio pro reo1 – na seara do direito tributário. O postulado ganha o nome de “retroatividade benigna”, referindose à “dúvida”, nunca “ignorância ou desconhecimento” quanto à lei, ao fato, ou ao seu autor, cabendo, dessarte, a interpretação mais favorável. Portanto, na eventualidade de os textos legais não serem claros e incontroversos sobre a interpretação da lei punitiva, o aplicador (fiscal ou juiz) deve preferir a posição mais favorável ao contribuinte. É postulado que se baseia nas raízes do direito penal, que se pauta pelo primado da “presunção de inocência”. Nesse sentido, urge mencionar os dizeres elucidativos do ilustre doutrinador Ruy Barbosa Nogueira, ao afirmar que “a equanimidade destas disposições está de acordo com princípios 1 Na dúvida, em favor do réu. 45 modernos de que a dúvida afasta o agravo. São princípios de respeito ao ser humano” (Curso de direito tributário, 11. ed., Saraiva, p. 105). Diante da mínima dúvida sobre as hipóteses citadas no artigo, não se deve aplicar a sanção, ou seria recomendável a coerção mais branda possível. Portanto, memorize o quadro abaixo: Interpretação Artigo Literal Benigna Art. 111 do CTN Art. 112 do CTN 4.2. Integração da Legislação tributária Art. 108 do CTN: “Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: I – a analogia; II – os princípios gerais do direito tributário; III – os princípios gerais de direito público; IV – a equidade. § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei. § 2º O emprego da equidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido”. É sabido que o intérprete não cria, não inova, restringindo-se a clarificar o mandamento normativo. Todavia, sói lhe ocorrerem casos concretos para os quais não existe regra jurídica cabente, obrigando-o a preencher o campo lacunoso. Para tal intento, deverá valer-se o exegeta dos meios de “integração” da norma. Integrar a norma no sistema jurídico significa inseri-la, ativamente, no ordenamento vigente, ou seja, torná-la parte do sistema normativo, para que suas regras tenham eficácia sistemática na incidência sobre os fatos. A integração se situa dentro da interpretação. É a segunda fase do processo interpretativo. O intérprete tratará, desde logo, de encontrar o significado do comando; porém, não podendo, de plano, encontrá-lo, pela existência de lacuna, exercitará, então, as formas previstas de integração. Na impossibilidade de ser interpretada a norma tributária, recorre-se à integração do direito. 46 Portanto, o CTN não admite que, diante da lei omissa, o juiz declare simplesmente que “o autor é carecedor do direito”. Mesmo diante da lacuna da lei, o CTN determina que o juiz julgue o pedido com base nos recursos de integração, admitidos pelo direito. Seja como for, o certo é que o nosso direito positivo acolheu a “teoria das lacunas”. O art. 4º da nossa LICC autoriza expressamente o recurso à integração, seguido, no mesmo diapasão, do art. 126 do CPC, consoante os dizeres elucidativos a seguir: Art. 4º da LINDB: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”. Art. 126 do CPC: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar, alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide, caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”. Sabe-se que a interpretação é tarefa de caráter declaratório, emanando do que já existe, enquanto a integração é mecanismo autointegrativo do direito, no sentido de que não parte de uma lei aplicável ao caso, porque essa não existe, mas procura norma que regule caso similar ao não contemplado, sem, contudo, criar direito. Nesse sentido, o ilustre Ruy Barbosa Nogueira preconiza, verbis, que “o sentido jurídicolinguístico de integrar é de completar o todo, de incorporar apenas o complemento que a tentativa de demonstração do todo revela estar faltando e que a “tensão” de todos os elementos gerais e especiais, lógica, teleológica e sistematicamente reunidos, exige a “construção” daquele complemento e o integra para completar a configuração. Por isso, a interpretação precede e possibilita ou não a integração. A ausência de disposição pode ser “expressa” ou “oculta”. Se oculta, especialmente a interpretação, não apenas do texto, mas do contexto, demonstra não existir omissão ou lacuna porque da sistemática decorre a disposição. O problema existe como refere o art. 108 do CTN, no caso de “ausência de disposição expressa”. Para a solução no campo tributário o CTN indica o recurso à analogia, aos princípios gerais de direito tributário e público e à equidade” (Curso de direito tributário, 11. Saraiva, p. 99). Importante, todavia, é distinguir a integração mediante processo analógico daquela feita com recurso aos princípios gerais de direito, como adiante tentaremos demonstrar. 4.3. Hierarquia do art. 108 do CTN: Impõe o art. 108 do CTN uma ordem na utilização dos meios ou instrumentos de integração, que devem ser utilizados, sucessivamente, conforme a ilustração abaixo: 4.3.1 analogia É a integração da lei por meio da comparação com casos similares ou análogos. Vale-se o método analógico da semelhança. 47 No campo do direito tributário, haverá tão somente a possibilidade da analogia in favorem ou “analogia no campo do direito tributário formal ou procedimental”, ou seja, jamais em relação aos elementos constitutivos da obrigação tributária, componentes taxativos da lei. A analogia busca suprir as lacunas da lei, tentando regular, de maneira semelhante, os fatos semelhantes. Ruy Barbosa Nogueira leciona com propriedade que “a aplicação por analogia implica a apreciação do estado de fato legal e a comparação ou analogia deste com outro estado de fato concreto” (Curso de direito tributário, 11. ed., Saraiva, p. 101). Com efeito, se inexiste regra jurídica expressa para o caso, mas se encontra, no ordenamento, regra também expressa, pertinente a casos análogos, o meio integrativo a ser usado é a analogia. • Analogia e o princípio da legalidade Art. 108 do CTN: “Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: (...) § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei”. O emprego da analogia não pode resultar na exigência de tributo não previsto em lei, em face da pujança do princípio da legalidade da tributação. Tem-se, portanto, como limite à integração analógica, a proibição de que, do seu emprego, resulte a exigência de tributo não previsto em lei. Cuidado! As penalidades poderiam ser impostas em virtude de analogia? Entendemos que não, uma vez que a multa é componente adstrito à reserva legal, conforme o art. 97, V, do CTN. Sabe-se que a multa é prestação pecuniária exigida pelo descumprimento de obrigação tributária. Nesse rumo, como se expendeu, em matéria tributária, a aplicação da analogia encontra-se no âmbito do denominado direito tributário formal ou procedimental, não se referindo a elementos componentes da obrigação tributária. É interessante observar também que o legislador, às vezes, autoriza, expressamente, o emprego da integração analógica, mesmo em se tratando de definir a hipótese de incidência. Veja-se, por exemplo, o item III do art. 1º do Decreto-lei 406/68, que considera fato gerador do ICMS: “O fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias em restaurantes, bares, cafés e estabelecimentos similares”. Ou mesmo alguns itens da lista de serviços anexa à recente LC 116/2003, designativos de fatos imponíveis do ISS, quais sejam: a) item 1: serviços de informática e congêneres; b) item 3: serviços prestados mediante locação, cessão de direito de uso e congêneres; c) item 4: serviços de saúde, assistência médica e congêneres. 48 Nesses casos, desde que exista similaridade, incidirá a regra de tributação. Há, porém, nítida diferença: permite-se extensão por vontade do legislador, não do “intérprete” da lei. 4.3.2 princípios gerais de direito tributário Caso se frustre o intérprete na utilização do recurso analógico, deve utilizar, imediata e sucessivamente, conforme o Código Tributário Nacional, os princípios gerais de direito tributário. No que se refere à matéria, nossa Constituição estabelece expressamente diversos princípios, estudados no Capítulo I deste livro, quais sejam: a) legalidade (art. 150, I, da CF); b) anterioridade tributária (art. 150, III, b e c, da CF); c) irretroatividade tributária (art. 150, III, a, da CF); d) isonomia tributária (art. 150, II, da CF); e) liberdade ao tráfego de pessoas e bens (art. 150, IV, da CF); f) proibição do confisco (art. 150, V, da CF); g) uniformidade dos tributos federais (art. 151, I, da CF); entre outros. 4.3.3 princípios gerais de direito público Na senda hermenêutica, não encontrando solução para o caso no âmbito do direito tributário, após a tentativa primária ao recurso analógico, o intérprete há de recorrer, então, aos princípios gerais do direito público. Alarga-se, pois, a área de busca, na tentativa de preenchimento do campo lacunoso. Assim, o intérprete recorre aos balizamentos principiológicos do direito constitucional, do direito administrativo, do direito penal e outros, a fim de que satisfaça seu intuito exegético, na procura do sentido exato da norma confrontada. São exemplos de princípios gerais do direito público: a) “a Constituição, quando quer os fins, concede igualmente os meios adequados”; b) “quem pode o mais, geralmente, pode o menos”; c) “o todo explica as partes”; d) “as exceções são restritas”; e) princípio da ampla defesa e do contraditório; f) princípio da moralidade administrativa; 49 g) princípio da presunção de inocência etc. 4.3.4 equidade É a mitigação do rigor da lei, isto é, o seu abrandamento, com o fito de adequá-la ao caso concreto. É o ato de humanizar a aplicação da norma, utilizando-se o critério de “justiça ao caso concreto”, por meio do qual se permite ao aplicador da lei pautar-se pelo “senso geral de justiça”. Representa, com efeito, o conjunto de princípios imutáveis de justiça que induzem o juiz a um critério de moderação e de igualdade, ainda que em detrimento do direito objetivo. O CTN, no § 2º do art. 108, usou o vocábulo “equidade”, no sentido de suavização, de humanização, de benevolência na aplicação do direito. Sendo a lei omissa e não se tendo encontrado solução para o caso na analogia, nem nos princípios gerais de direito tributário e, finalmente, nem nos princípios gerais de direito público, a solução deverá ser aquela que resultar mais benevolente, mais humana ou mais suave. A solução há de ser ditada pela equidade, no sentido de corrigir as distorções decorrentes da generalidade e da abstração das leis. De fato, as modalidades integrativas são mutuamente exclusivas: a utilização de uma via integrativa exclui outra, devendo aquela ser esgotada, para que a seguinte seja utilizada, em uma sequência a ser percorrida. Note-se que, enquanto às modalidades interpretativas não é cabente uma hierarquização, sendo, sim, vias complementares e não taxativas, as modalidades integrativas, por sua vez, são hierarquizadas, exclusivas e taxativas. Art. 108 do CTN: “Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: (...) § 2º O emprego da equidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido”. O emprego da equidade não pode jamais resultar na dispensa do tributo. A razão é a mesma do § 1º, quanto à analogia. Vejamos: “§ 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei”. Como é cediço, o tributo é criado por meio de lei, não o podendo ser por recurso analógico, sua dispensa deve igualmente atrelar-se à lei, em abono ao princípio da estrita legalidade. Aliás, quando se pensa em dispensa de tributo, vêm à baila os institutos da isenção (art. 175, I, do CTN) e o da remissão (art. 156, IV, do CTN), ambos representantes de dispensas legais, que obedecem, necessariamente, ao princípio da legalidade. Não se pode imaginar uma isenção que tenha respaldo tão somente em consideração de equidade, uma vez que o veículo difusor do favor legal em comento é a lei. O mesmo raciocínio se aplica a uma remissão, embora o art. 172, IV, do CTN preconize que é possível remitir um crédito tributário, levando- se em conta considerações de equidade. Na verdade, os artigos, aparentemente antagônicos, encerram 50 harmonia em seus teores, fazendo-se mister entendê-los em conjunto. A remissão, como um perdão legal para tributo (e juros) ou multa lançados, pode se pautar em equidade; o que se pretende coibir é a dispensa de tributo com respaldo em equidade, pura e simples, divorciando-se do veículo exclusivo do favor: a lei. Não se isenta Não se remite* Não se tributa por por por equidade. equidade. analogia. * (Remissão: verbo remitir, isto é, perdoar). EXERCÍCIOS PROPOSTOS: Julgue os itens abaixo como CERTO ou ERRADO: 1. (Procurador da Fazenda Nacional – 2004) Segundo o CTN, está sujeita à interpretação literal a norma tributária que verse sobre parcelamento. 2. (Auditor de Fortaleza – 1998) O emprego da equidade pode resultar na dispensa do pagamento de penalidade pecuniária. 3. (Fiscal do ISS – Fortaleza – 2003) Os efeitos dos fatos efetivamente ocorridos devem ser considerados na interpretação da definição legal do fato gerador. 4. (AFRF/2003) Relativamente à interpretação e integração da legislação tributária, avalie o acerto das afirmações adiante e marque com V as verdadeiras e com F as falsas; em seguida, marque a opção correta. ( ) Interpreta-se da maneira mais favorável ao sujeito passivo a legislação tributária que disponha sobre dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. ( ) Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, bem assim para definição dos respectivos efeitos tributários. ( ) Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na rigorosa ordem, a analogia, os princípios gerais de direito público, os princípios gerais de direito tributário e a equidade. a) F, V, F b) F, F, F 51 c) F, F, V d) V, V, F e) V, F, V 5. (AFRF/2003) Relativamente à interpretação e integração da legislação tributária, avalie o acerto das afirmações adiante e marque com V as verdadeiras e com F as falsas; em seguida, marque a opção correta. a) b) c) d) e) ( ) Interpreta-se da maneira mais favorável ao sujeito passivo a legislação tributária que disponha sobre dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. ( ) Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, bem assim para definição dos respectivos efeitos tributários. ( ) Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na rigorosa ordem, a analogia, os princípios gerais de direito público, os princípios gerais de direito tributário e a equidade. F, V, F F, F, F F, F, V V, V, F V, F, V 6. (AFTM-SP/2007) O art. 107 do CTN determina que a legislação tributária seja interpretada em conformidade com o disposto no Capítulo IV do Título I do Livro Segundo. Por sua vez, o art. 108 desse mesmo código estabelece que, na ausência de legislação tributária expressa, a integração da legislação tributária se fará com observância de uma determinada ordem, a saber: a) I – a analogia; II – os princípios gerais de direito tributário; III – os princípios gerais de direito público e IV – a equidade. b) I – a analogia; II – os princípios gerais de direito público; III – os princípios gerais de direito tributário e IV – equidade. c) I – a analogia; II – a equidade; III - os princípios gerais de direito tributário e IV - os princípios gerais de direito público. d) I – a equidade; II – os princípios gerais de direito público; III – os princípios gerais de direito tributário e IV - a analogia. e) I – a equidade; II – os princípios gerais de direito tributário; III – os princípios gerais de direito público e IV - a analogia. 7. (CLU/2002) Julgue os seguintes itens. 52 a) Em direito tributário, o emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não-previsto em lei. b) A equidade é um método que resulta na dispensa do tributo devido. c) Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para a pesquisa de definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, bem como para a definição dos respectivos efeitos tributários. d) Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha acerca da outorga de isenção e da dispensa do cumprimento das obrigações acessórias. e) A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida quanto à autoria e capitulação legal do fato. 8. (AFR-MT/2008) Nos termos do Código Tributário Nacional, fixado no artigo 111, interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: a) b) c) d) e) Remissão Compensação Prescrição Parcelamento do crédito tributário Dispensa do cumprimento da obrigação principal e acessória 9. (AFR-RJ/2008) Segundo o Código Tributário Nacional, impõe-se interpretação literal de norma tributária que disponha sobre: a) Moratória b) Compensação c) Transação d) Prescrição e) Remissão GABARITO: 1. CERTO 2. CERTO 6. A 7. a) Verdadeira; b) Falsa; c) Falsa; d) Verdadeira; e) Verdadeira. 3. ERRADO 8. E 4. B 9. A 5. B 53 5. Obrigação Tributária Principal e Acessória. 5.1. Definição de tributo Art. 3º do CTN: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Detalhando: O tributo... É... É... É... Não é... É... Prestação pecuniária; Compulsório; Instituído por meio de lei; Multa; Cobrado mediante lançamento. 5.1.1 a prestação pecuniária O tributo é prestação pecuniária, isto é, a obrigação de prestar dinheiro ao Estado. O art. 3º do CTN, em sua parte inicial, dispõe que “o tributo é prestação pecuniária, em moeda (...)”. Não obstante a redundância no dispositivo é possível asseverar que o dispositivo objetivou evitar o tributo in natura (em bens) ou o tributo in labore (em trabalho, em serviços). A pecúnia representa a prestação em dinheiro ou moeda corrente (Real, no Brasil) ou em cheque (ver art. 162, I, do CTN). Quanto ao pagamento de tributo por meio de cheque, a legislação tributária pode determinar as garantias necessárias, sem que tal exigência torne impossível o pagamento ou o deixe mais oneroso do que se fosse feito em moeda corrente (ver art. 162, § 1º, do CTN). Ademais, não perca de vista que o crédito pago por cheque somente se considera extinto com o resgate deste pelo sacado, em razão do caráter pro solvendo do título (ver art.162, § 2º, do CTN). O art. 162, I, do CTN dispõe que, além da moeda e do cheque, pode-se pagar o tributo por meio de vale postal (inciso I) e, havendo previsão em lei, por (a) estampilha; (b) papel selado ou (c) por processo mecânico (inciso II). Essas formas de pagamento destacadas no CTN são antiquadas. De há muito, pagamento por meio de vale postal deixou de ser utilizado. A estampilha, mencionada pelo legislador, é o selo. O pagamento por papel selado (papel em que o selo já se encontra presente) e por processo mecânico (impressão declarada mecanicamente no papel) praticamente não são mais utilizados, estando em franco desuso. O caráter pecuniário é requisito inafastável para a configuração do fenômeno tributário. Não há como estabelecer associação entre tributo e a obrigação que não seja pecuniária, v.g., a de prestar serviço militar obrigatório, ou a de trabalhar no Tribunal do Júri ou nas eleições. Assim, é defeso, em princípio, o pagamento de tributos em bens distintos de pecúnia. Diz-se “em 54 princípio”, haja vista o disposto no art. 156, XI, do CTN, inserido neste Código pela LC 104/2001, que delineia a dação em pagamento, como a mais recente causa extintiva do crédito tributário. Refere-se ela, todavia, apenas a bem imóvel. Tal comando veio abrandar a natureza do tributo como prestação exclusivamente pecuniária, devendo ser interpretado em concomitância com o art. 3º em análise. Por derradeiro, insta mencionar que a obrigação de pagar o tributo – ou a multa – é chamada de obrigação principal (art. 113, § 1º, do CTN). Além disso, o art. 114 do CTN reza que “o fato gerador da obrigação tributária principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.” Assim, é possível correlacionar o caráter pecuniário do tributo com o princípio da legalidade tributária. 5.1.2 a prestação compulsória O tributo é prestação compulsória, logo, não contratual, não voluntária ou não facultativa. Com efeito, o direito tributário pertence à seara do direito público, e a supremacia do interesse público dá guarida à imposição unilateral de obrigações, independentemente da anuência do obrigado. A prestação pecuniária é dotada de compulsoriedade, não dando azo à autonomia de vontade. Traduz-se o tributo em receita derivada, uma vez cobrada pelo Estado, no uso de seu poder de império, tendente a carrear recursos do patrimônio do particular para o do Estado. É importante assinalar que o traço da compulsoriedade deriva, à semelhança do caráter pecuniário, da legalidade, uma vez que, à luz do art. 5º, II, da CF, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei”. Ademais, o art. 150, I, da CF condiciona a majoração e a instituição do tributo à lei. Esta, como se nota, a todos obriga. Na seara tributária, se a lei prevê o fato gerador alfa para o tributo tal, havendo sua concretização, tornar-se-á devido o tributo, independentemente de fatores extrínsecos ao fato imponível, que porventura desbordem da questão tributária (ver arts. 118, 123 e 126, do CTN). Assim, não há que se optar pelo pagamento do tributo, mas a ele se submeter, uma vez ínsita sua natureza compulsória. Posto isso, valendo-se de expressão neológica, tributo é prestação a-contratual. 5.1.3 a prestação diversa de sanção O tributo não é multa, e a multa não é tributo. Entretanto, sabe-se que a multa deve estar prevista em lei, uma vez que é ela componente adstrito à reserva legal, consoante se depreende da dicção do art. 97, V, do CTN: “Somente a lei pode estabelecer: (...) V – a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas”. 55 A multa é a reação do direito ao comportamento devido que não tenha sido realizado. Trata-se de penalidade cobrada pelo descumprimento de uma obrigação tributária, possuindo nítido caráter punitivo ou de sanção. Em face do descumpri- mento de uma obrigação tributária, quer seja principal (art. 113, § 1º, do CTN) quer seja acessória (art. 113, § 2º, CTN), ensejar-seá a aplicação da penalidade (ver art. 113, § 3º, in fine, do CTN). O art. 157 do CTN preconiza que “a imposição de penalidade não ilide (sic; leia-se elide, isto é, elimina, suprime) o pagamento integral do crédito tributário”. Tal comando vem corroborar a distinção conceitual e estrutural entre tributo e multa, indicando que a multa não suprime a obrigação de pagar integralmente o crédito tributário. Paga-se o tributo porque se realiza um fato gerador; recolhe-se a multa porque se descumpriu uma obrigação tributária. O primeiro, id est, o tributo, funda-se no poder fiscal; a multa, por sua vez, no poder de punir. São, igualmente, prestações pecuniárias, porém independentes, podendo o sujeito passivo suportar as duas consequências patrimoniais. Noutra vertente, dir-se-ia que o pagamento do tributo, se realizado a destempo, não inibe a incidência de multa, exceto no contexto de denúncia espontânea (ver art. 138 do CTN). Noutra vertente, dir-se-ia que o pagamento do tributo, se realizado a destempo, não inibe a incidência de multa, exceto no contexto de denúncia espontânea (ver art. 138 do CTN), conforme se estudará em tópico oportuno nesta obra. Por fim, diga-se que o pagamento tanto do tributo, quanto da multa, são considerados obrigação principal (art. 113, § 1º, do CTN). 5.1.4 a prestação instituída por lei O tributo é prestação instituída por meio de lei, sendo, portanto, obrigação ex lege. Seu nascimento se dá pela simples realização do fato descrito na hipótese de incidência prevista em lei, sendo a vontade das partes de todo irrelevante (ver art. 123 do CTN). A legalidade avoca (a) o caráter pecuniário do tributo e (b) sua compulsoriedade, sendo, portanto, atributos dela decorrentes. Vale dizer que a legalidade e estes atributos se inter-relacionam, reflexamente. Em breve revisitação na temática do princípio da legalidade, depreende-se que o tributo depende de lei (ordinária ou complementar), consoante o art. 150, I, da CF c/c art. 97, I e II, do CTN. Trata-se de postulado com ressalvas adstritas a tributos, cujas alíquotas poderão ser alteradas por ato do Poder Executivo – II, IE, IPI, IOF, CIDE-Combustível e ICMS-Combustível (rever o art. 153, § 1º; o art. 155, § 4º, IV, c; e o art. 177, § 4º, I, b, todos da CF). Ademais, é mister enaltecer que a EC 32/2001 derrogou (modificação parcial) o art. 3º do CTN, pois previu a possibilidade de instituição e majoração de imposto por medida provisória, ressalvados os tributos instituídos por lei complementar, conforme já estudamos (rever art. 62, § 1º, III, da CF). 5.1.5 a prestação cobrada por lançamento 56 Definido conceitualmente no art. 142 do CTN, como atividade administrativa plenamente vinculada, o lançamento mostra-se como procedimento de exigibilidade do tributo. Consumase em ato documental de cobrança, por meio do qual se pode quantificar (quantum debeatur) e qualificar (an debeatur) a obrigação tributária que lhe é preexistente. Por ser ato vazado em documento escrito, não se admite lançamento verbal. Além disso, o lançamento é ato vinculado, logo, não discricionário. De fato, o lançamento é balizado ou regrado na lei, vedando-se ao administrador tributário, na ação estatal de exigir tributos, a utilização de critérios de oportunidade ou conveniência (discricionariedade). O tributo deve ser carreado aos cofres públicos, uma vez que a estes se mantém afetado, sob pena de responsabilização do agente público, caso tome caminho dessemelhante (ver art. 142, parágrafo único, do CTN). Frise-se, pois, que da lei emanam (a) o caráter pecuniário do tributo, (b) o timbre de compulsoriedade da exação e, finalmente, (c) a feição documental do lançamento tributário. O lançamento não é ato autoexecutório, isto é, não pode ser executado de plano. Assim, o contribuinte pode costear ou desviar-se do pagamento do tributo e discuti-lo administrativa ou judicialmente, não devendo ser alvo implacável de atos autoexecutáveis de coerção, que visem compeli-lo, coativamente, a efetuar o recolhimento do gravame. 6. Fato Gerador da Obrigação Tributária. 6.1. O Fato Gerador O fato gerador ou fato imponível, nas palavras de Geraldo Ataliba, é a materialização da hipótese de incidência, representando o momento concreto de realização da hipótese, que se opõe à abstração do paradigma legal que o antecede. Caracteriza-se pela concretização da hipótese que, na prática, traduz-se no conceito de “fato”. Dessa forma, com a realização da hipótese de incidência, teremos o fato gerador ou fato jurígeno. É importante enaltecer que, da perfeita adaptação do fato ao modelo ou paradigma (arquétipo) legal, tem-se o fenômeno da subsunção. A partir da subsunção tributária, nasce o liame jurídico obrigacional, que lastreará a relação intersubjetiva tributária. Ademais, o fato gerador é momento de significativa magnitude na “Linha do Tempo”, uma vez que define a natureza jurídica do tributo (taxas, impostos, contribuições de melhoria), consoante a dicção do art. 4º I, do CTN, valendo lembrar que o nome ou denominação do tributo são irrelevantes. Note bem! 57 Contribuições parafiscais e empréstimos compulsórios: são gravames finalísticos, não definidos pelo fato gerador, mas, sim, pela finalidade para a qual foram criados. Portanto, seus fatos geradores são irrelevantes, não sendo esses tributos concebidos como tais, em razão de seus fatos imponíveis. Cabe destacar que o fato gerador ganha significativa importância por definir a lei a ser aplicada no momento da cobrança do tributo, em abono ao princípio da irretroatividade tributária. Sabe-se que, em uma autuação fiscal, deverá a autoridade valer-se da lei que anteceda os fatos geradores aos quais ela se refere, sob pena de veicular uma retroatividade legal, o que se pretende coibir com o postulado constitucional da irretroatividade tributária (art. 150, III, a, da CF). Como se notou, “hipótese de incidência” é a situação descrita em lei, recortada pelo legislador entre inúmeros fatos do mundo fenomênico, a qual, uma vez concretizada no fato gerador, enseja o surgimento da obrigação principal. A fim de facilitar a verificação da incidência, ou não, dos tributos, isto é, verificar se no caso examinado o fato está subsumido na lei, a hipótese de incidência e o fato gerador podem ser decompostos em aspectos, a saber: Pessoal Pessoal Temporal Espacial Material Quantificativo Sujeitos ativo e passivo Sujeitos ativo e passivo momento da ocorrência do fato gerador Lugar da ocorrência do fato gerador Descrição do núcleo da hipótese de incidência Base de cálculo e alíquota De acordo com o art. 118 do CTN, são irrelevantes, para a ocorrência do fato gerador, a natureza do objeto dos atos praticados e os efeitos desses atos. Assim, podem ser tributados os atos nulos e os atos ilícitos, prevalecendo o princípio da interpretação objetiva do fato gerador (cláusula non olet). Quanto ao aspecto temporal, considera-se ocorrido o fato gerador, em se tratando de: a) situação de fato: desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que se produzam os efeitos que são delas decorrentes; b) situação jurídica: desde o momento em que tal situação jurídica esteja definitivamente constituída, nos termos do direito aplicável. Em se tratando de negócios jurídicos condicionais, considera-se ocorrido o fato gerador: • sendo a condição suspensiva (evento futuro e incerto, de cuja realização se faz depender os efeitos do ato), no momento de seu implemento, vale dizer, no momento em que se realiza a condição. Por exemplo: doação condicionada a um casamento. 58 • sendo a condição resolutória (evento futuro e incerto, de cuja realização se faz decorrer o desfazimento do ato), desde que o ato ou negócio jurídico foi celebrado, sendo, neste caso, inteiramente irrelevante a condição. Por exemplo: casamento desfazendo a doação, a qual foi feita sob a condição de o donatário não se casar. 7. Sujeição Ativa e Passiva. Solidariedade. Capacidade Tributária. 7.1 Sujeito ativo (arts. 119 e 120 do CTN) Art. 119 do CTN: “Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento”. A sujeição ativa é matéria afeta ao polo ativo da relação jurídico-tributária. Refere-se, pois, ao lado credor da relação intersubjetiva tributária, representado pelos entes que devem proceder à invasão patrimonial para a retirada compulsória de valores, a título de tributos. Sujeito ativo da obrigação tributária é pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir seu cumprimento (art. 119 do CTN). As pessoas jurídicas de direito público podem ser titulares, por delegação, das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos (parafiscalidade), ou executar leis, ser- viços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária (art. 7º do CTN). Posto isso, há dois tipos de sujeitos ativos: o direto e o indireto. a) Sujeito ativo direto: são os entes tributantes – união, Estados, município e Distrito Federal (art. 41, I, II, III do CC/2002) – detentores de competência tributária (poder legiferante de instituição de tributo). b) Sujeito ativo indireto: são os entes parafiscais – CREA, CRM, CRC etc., detentores de capacidade tributária ativa (poder de arrecadação e fiscalização de tributo). • Solidariedade (arts. 124 e 125 do CTN) No direito tributário, admite-se tão somente a solidariedade passiva, e não a solidariedade ativa, pois só se paga tributo a um único ente credor, sob pena de deparar o estudioso com o fenômeno da bitributação, não tolerada pela disciplina ora em comento, ressalvada a possibilidade constitucionalmente admitida, atinente ao imposto extraordinário de guerra (IEG), previsto no art. 154, II, da CF. • Há que se relevar a impropriedade contida no comando do art. 119 do CTN, quando restringiu a sujeição ativa apenas aos entes tributantes detentores de competência tributária, menosprezando os entes parafiscais. Trata-se de um “cochilo” do legislador, que se esqueceu de incluir os entes detentores da capacidade tributária ativa, isto é, aqueles que arrecadam e 59 fiscalizam as contribuições parafiscais, que também possuem o timbre de sujeitos ativos tributários. 7.1.2 Sujeito passivo (arts. 121 a 123 do CTN) A sujeição passiva é matéria adstrita ao polo passivo da relação jurídico-tributária. Refere-se, pois, ao lado devedor da relação intersubjetiva tributária, representado pelos entes destinatários da invasão patrimonial na retirada compulsória de valores, a título de tributos. Há dois tipos de sujeitos passivos: o Direto (contribuinte) e o Indireto (responsável). a) Sujeito passivo direto: (art. 121, parágrafo único, I, do CTN) É o “contribuinte”, aquele que tem uma relação pessoal e direta com o fato gerador. Exemplos: • proprietário do bem imóvel ou o possuidor com ânimo de domínio, quanto ao IPTU; • adquirente do bem imóvel transmitido a título oneroso, quanto ao ITBI. b) Sujeito passivo indireto: (art. 121, parágrafo único, II, do CTN) É o “responsável” – terceira pessoa escolhida por lei para pagar o tributo, sem que tenha realizado o fato gerador. Convém, nesta oportunidade, transcrever o art. 128 do CTN, que preconiza: “Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação”. Importante constatação é a de que a substituição tributária estará sempre subordinada ao basilar princípio da legalidade, “não podendo a lei cometê-la ao regulamento” (STJ, REsp 0101774-96/SP). Sendo assim, cabe-nos agora atentar para o que a doutrina convencionou considerar como espécies da responsabilidade tributária. Temos: Responsabilidade por transferência versus responsabilidade por substituição a) Responsabilidade por transferência – sua ocorrência se dá no momento em que existe legalmente o contribuinte e, mesmo assim, o legislador, sem ignorá-lo, atribui a outrem o dever de pagar o tributo, tendo em vista eventos posteriores ao surgimento da obrigação tributária. Ocorre, por exemplo, no caso em que o proprietário de determinado imóvel urbano falece sem pagar o IPTU, passando a responsabilidade para o espólio (art. 131, III, CTN). 60 b) Responsabilidade por substituição – sua ocorrência se dá no momento em que a lei coloca, como sujeito passivo da relação tributária, uma pessoa qual- quer, diversa daquela pessoa de cuja capacidade contributiva o fato tributável é indicador (contribuinte). Nesse caso, frise-se, é o próprio legislador, e não algum evento futuro, quem, previamente, afasta o contribuinte e o substitui pelo responsável. Ocorre, por exemplo, no recolhimento do IRRF pela fonte pagadora, em que o contribuinte é o empregado, mas o responsável pelo recolhimento é o empregador. Não obstante a matéria em apreço ser alvo de tratamento minucioso no próximo Capítulo, urge mencionar alguns exemplos de “responsáveis”: • Absolutamente incapaz: Art. 134, I, do CTN O filho menor é o contribuinte dos impostos, uma vez que a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil das pessoas (art. 126, I, do CTN). Tal entendimento decorre do princípio da interpretação objetiva do fato gerador – cláusula non olet, segundo o qual não se levam em conta as características subjetivas do contribuinte, mas apenas os aspectos intrínsecos ao fato gerador. Portanto, o filho é o “contribuinte”, e os pais serão os “responsáveis”. • Imóvel alienado com dívidas de IPTU: art. 130 do CTN O adquirente de imóvel, pela própria conveniência do Fisco, será o responsável pelos tributos referentes ao bem imóvel, enquanto o alienante, por ter relação direta com o fato gerador, permanece como contribuinte. • Bem móvel alienado com dívidas de IPVA: art. 131, I, do CTN O adquirente do veículo será o responsável pelos tributos em exame, enquanto o alienante, por ter relação direta com o fato gerador, permanece como contribuinte. • Sócio (administrador) de empresa, com relação à dívida tributária da sociedade: (art. 134, VII, c/c art. 135, III, do CTN) O Código Tributário Nacional permite a comunicabilidade entre o patrimônio da empresa e o patrimônio do sócio, mediante o instituto da despersonalização (desconsideração) da pessoa jurídica. Tal evento ocorrerá em virtude da identificação do sócio com a condição de “gerente”, ao executar atos inequívocos de condução da sociedade. Ademais, impende destacar que a aplicação da responsabilização pessoal ocorrerá em face de dolo ou má-fé, uma vez que tais predicados estão ínsitos na aplicação da teoria do disregard of legal entity. 61 Destarte, dois são os pressupostos autorizadores de um legítimo redirecionamento de cobrança tributária: o preenchimento da condição de “gerente” e/ou o comportamento fraudulento. À guisa de observação, urge mencionar que o art. 123 do CTN preconiza que as convenções particulares não podem ser opostas ao Fisco para modificar o sujeito passivo. Tal postulado é de fácil assimilação, se o associarmos ao princípio da estrita legalidade, segundo o qual o tipo tributário deve ser formatado com componentes taxativos, que tornam estrita a legalidade. Dessa forma, a lei tributária deve dispor, exaustivamente, sobre alíquota, base de cálculo, multa, fato gerador e sobre o sujeito passivo, ora discutido. Portanto, o contrato entre partes não opera efeitos perante a Fazenda Pública, mas tão somente perante aqueles que avençaram cumpri-lo. Tais convenções podem ser feitas, e são juridicamente válidas, entre as partes contratantes, na órbita do direito privado, mas não produzem nenhum efeito contra a Fazenda Pública. Por exemplo, no contrato de locação, a obrigação de pagar o IPTU pode ser atribuída ao locatário; no entanto, tal convenção é irrelevante para o Fisco, que exigirá o pagamento do imposto do sujeito passivo eleito pela lei, qual seja, como regra, o proprietário (o locador). Este, se quiser, pode acionar aquele, em ação regressiva, na tentativa de reaver o que antecipou ao Fisco. Repise-se, por derradeiro, que, no direito tributário, admite-se tão somente a solidariedade passiva, e não a solidariedade “ativa”, pois só se paga tributo a um único ente credor, sob pena de deparar o leitor com o fenômeno da bitributação, não tolerada pela disciplina em comento, ressalvada a possibilidade constitucionalmente admitida, atinente ao Imposto Extraordinário de guerra (IEG), previsto no art. 154, II, da CF. 7.1.3 Objeto (art. 113, §§ 1º e 2º, do CTN) O objeto da obrigação tributária se refere à prestação a que deve se submeter o contribuinte ou o responsável. Tal prestação pode ser de cunho pecuniário ou não pecuniário. Se pecuniária, a obrigação será principal; se não pecuniária, sê-lo-á acessória. a) Obrigação principal: prestação representante do ato de pagar (tributo ou multa), sendo, portanto, uma “obrigação de dar”, com cunho de patrimonialidade. b) Obrigação acessória: é a prestação positiva ou negativa, que denota atos “de fazer” ou “não fazer”, despidos do caráter de patrimonialidade. Assim, o agir ou o não agir, dissociados do ato de pagar, podem representar obrigações tributárias acessórias ou “deveres instrumentais do contribuinte”, como preferem dizer alguns doutrinadores modernos. Exemplo: Emitir notas fiscais, escriturar livros fiscais, entregar declarações, não trafegar com mercadoria desacompanhada de nota fiscal, não obstar o livre acesso da fiscalização à empresa (art. 200 62 do CTN) (observação: as últimas são exemplos de obrigações tributárias acessórias negativas ou obrigações de não fazer) etc. O legislador deverá sempre indicar as pessoas que serão responsáveis pelo cumprimento das obrigações acessórias, conforme os interesses da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. O importante é lembrar que, mesmo nos casos em que o contribuinte ou o responsável não estejam obrigados em relação à obrigação principal, a acessória subsiste. Isso acontece, por exemplo, com aqueles que se aposentam por força de alguma moléstia grave, tornando-se isentos de recolher o IR, mas nem por isso estarão dispensados de apresentar sua declaração anual de rendimentos (art. 175, parágrafo único, do CTN). É imperioso observar que o descumprimento de uma obrigação acessória faz nascer uma obrigação principal, com relação à multa. Tal entendimento pode ser extraído da dicção do art. 113, § 3º, do CTN, in verbis: “(...) § 3º. A obrigação acessória, pelo simples fato de sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente a penalidade pecuniária”. 7.1.4 Causa (arts. 114 e 115 do CTN) É o vínculo jurídico motivador do liame jurídico obrigacional entre o sujeito ativo e o sujeito passivo. A causa da obrigação pode residir na “lei tributária” ou na expressão designativa mais lata que a primeira, a saber, legislação tributária. Lei tributária (art. 97) Legislação tributária (art. 96) O fato gerador da obrigação tributária principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. O fato gerador da obrigação tributária acessória é qualquer situação fática, prevista na legislação tributária, que não configure pagamento de tributo ou multa. Lei Causa ou FG da Obrigação Principal (Art. 114 do CTN) Legislação tributária Causa ou FG da Obrigação Acessória (Art. 115 do CTN) 8. Domicílio Tributário. 8.1. Domicílio tributário (art. 127 do CTN) Domicílio é o lugar de exercício dos direitos e cumprimento das obrigações, no sentido da exigibilidade. Na seara tributária, é o local onde o sujeito passivo é chamado para cumprir seus deveres jurídicos de ordem tributária. 63 Art. 127. “Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal: I – quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconheci- da, o centro habitual de sua atividade; II – quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento; III – quanto às pessoas jurídicas de direito público, qualquer de suas repartições no território da entidade tributante. § 1º Quando não couber a aplicação das regras fixadas em qualquer dos incisos deste artigo, considerar-se-á como domicílio tributário do contribuinte ou responsável o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação. § 2º A autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, aplicando-se então a regra do parágrafo anterior”. Segundo o artigo transcrito, é possível assimilar as regras conforme o esquema abaixo: a) Regra geral: aplica-se o “domicílio de eleição”. b) Na ausência de eleição: aplica-se o art. 127, I, II e III, do CTN. c) Na impossibilidade de aplicação dos artigos citados ou na recusa fundada da Administração quanto ao domicílio de eleição, quando impossibilite ou dificulte a fiscalização: aplica-se o art. 127, § 1º, do CTN. Como se pode notar, a regra é que se proceda, voluntariamente, à escolha do domicílio. Se a eleição for feita, pode a Fazenda Pública recusá-la, em virtude de impossibilidade ou dificuldade na fiscalização (art. 127, § 2º, do CTN). Nesse caso, o domicílio será o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação. Por outro lado, se a eleição não for feita, aplicar-se-ão as regras previstas nos incisos I, II e III do art. 127. A dúvida poderia surgir em face da inadequação de tais incisos no caso concreto, hipótese resolvida pelo Código Tributário Nacional, consoante o § 1º do art. 127, segundo o qual se aplica a regra utilizável para a “recusa do domicílio”, isto é, o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação. EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 64 1- (AFRFB/2005) Leia cada um dos assertos abaixo e assinale (V) ou (F), conforme seja verdadeiro ou falso. Depois, marque a opção que contenha a exata sequência. ( ) A situação definida em lei, desde que necessária para o nascimento da obrigação tributária principal é o seu fato gerador. ( ) Qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática de um ato que não tenha por objeto o pagamento de tributo ou multa, é obrigação tributária acessória. ( ) Atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de encobrir a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, desde que legítimos perante a legislação civil, não podem ser desconsiderados pela autoridade tributária. a) V V V b) F V V c) F F F d) F F V e) V F V 2 – (AFTN/1988) I – A obrigação tributária que tenha por objeto uma sanção de natureza pecuniária, por descumprimento de uma obrigação tributária acessória é também ela acessória? II – O decurso do prazo fixado em lei para pessoas jurídicas apresentarem declaração de rendimentos constitui fato gerador de uma obrigação principal? III – Tendo havido a aquisição de um nem no exterior, trazido para o País, mas que, por não produzir o efeito desejado, acabou sendo devolvido, o imposto de impostação pago deve ser devolvido, por insubsistência de seu fato gerador? Analisadas estas três perguntas, escolha a opção que contenha, na respectiva sequência, as respostas corretas. a) b) c) d) e) Sim, não e sim. Sim, sim e sim. Não, não e sim. Não, não e não. Não, sim e sim. 3 – (AFTN/1988) – No caso de menor que possua bens próprios, respondem solidariamente com este nos atos praticados por terceiros os pais ou tutores respectivos. - Pela multa tributária resultante de atos praticados com excesso de poderes pelo mandatário, em benefício do mandante, responde perante o fisco, pessoalmente, o procurador. - Segundo o Código Tributário Nacional, a denúncia espontânea da infração, acompanhada do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, afasta a responsabilidade pela multa. Escolha a opção que considerar acertada. a) As três assertivas são corretas. 65 b) c) d) e) As três estão falsas. São corretas as duas últimas, não a primeira. São corretas as duas primeiras, não a última. Está correta apenas uma das três assertivas. 4 – (AFPS/2002) Relativamente ao tema obrigação tributária, o Código Tributário Nacional estabelece que, salvo disposição de lei em contrário, a solidariedade tributária passiva produz o seguinte efeito, entre outros: a) A suspensão da prescrição, em favor dou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica os demais. b) O pagamento efetuado por um dos obrigados não aproveita aos demais. c) A isenção ou anistia do crédito tributário exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo. d) A isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo. e) A interrupção da prescrição em favor de um dos obrigados não favorece os demais. 5 – (AFMT-SP/2007) Em relação à solidariedade tributária, o pagamento efetuado por um dos obrigados: a) Só aproveita aos demais, se houver expressa previsão legal. b) Só aproveita aos demais, se houver expressa previsão em decreto regulamentar. c) Sempre aproveita aos demais. d) Aproveita aos demais, salvo disposição de lei em contrário. e) Aproveita aos demais, salvo disposição da legislação tributária. 6 – (AFTM-SP/2007) É INCORRETO afirmar que a obrigação tributária acessória a) Decorre da legislação tributária. b) Converte-se em obrigação principal, relativamente ao tributo devido, ao deixar de ser observada. c) Tem por objeto prestações positivas ou negativas nela previstas. d) É instituída no interesse da fiscalização. e) É instituída no interesse da arrecadação. 7 – (TC-CE/2006) Herdeiros de um contribuinte que deixou patrimônio, tendo sido autuado pela prática de sonegação fiscal, sofrem processo de execução fiscal compreendendo o valor do tributo, acrescido da correção monetária, da multa e dos juros. Essa cobrança é a) Ilegal apenas quanto à multa. b) Legal quanto ao tributo e à multa e ilegal quanto aos juros e à correção monetária. c) Legal quanto ao tributo e todos os seus acréscimos. 66 d) Ilegal quanto ao tributo e à multa e legal quanto aos juros e à correção monetária. e) Ilegal quanto ao tributo e todos os seus acréscimos. 8 – (TRF/2006) Em relação ao domicílio tributário, é correto afirmar-se que a) Este pode ser livremente eleito pelo sujeito passivo da obrigação tributária, não tendo a autoridade administrativa o poder de recusá-lo. b) Relativamente às pessoas jurídicas de direito público, será considerado como seu domicílio tributário aquele situado no Município de maior relevância econômica da entidade tributante. c) Quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, aquela que a autoridade administrativa assim eleger. d) É definido pelo lugar dos bens ou ocorrência dos atos ou fatos que tenham dado origem à obrigação tributária, na impossibilidade de aplicação dos créditos de identificação indicados pelo Código Tributário Nacional. e) No caso de pessoa jurídica de direito privado que possua mais de um estabelecimento, seu domicílio será aquele cuja escrituração contábil demonstre maior faturamento. 9 – (TRF/2006) Sobre a obrigação tributária acessória, é incorreto afirmar-se que a) Tem por objeto prestações positivas previstas na legislação tributária. b) Tal como a obrigação principal, supõe, para o seu surgimento, a ocorrência de fato gerador. c) Objetiva dar meios à fiscalização tributária para a investigação e o controle do recolhimento de tributos. d) Sua inobservância converte-se em obrigação principal, relativamente a penalidade pecuniária. e) Realizar matrícula no cadastro de contribuintes, emitir nota fiscal e apresentar declarações ao Fisco constituem, entre outros, alguns exemplos. 10 – (TRF/2000) A capacidade tributária passiva depende a) Da capacidade civil das pessoas naturais. b) De achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais. c) De estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional. d) De encontrar-se a pessoa em situação que a lei preveja como própria de sujeito passivo da obrigação tributária. e) De achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação da administração direta de seus bens ou negócios. 67 11 – (AFR-MS/2006) A responsabilidade tributária da pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra, em relação aos tributos devidos até a data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas, é: a) b) c) d) e) Exclusiva. Solidária. Sujeita à inexistência de fraude ou simulação. Preferencial. Subsidiária. 12 – (AFR-SP/2006) Em relação à obrigação tributária, é correto afirmar: a) O fato gerador da obrigação principal tem natureza constitutiva, pois dá concretude à hipótese de incidência e faz surgir a obrigação principal. b) A obrigação acessória necessita estar expressa em Lei. c) A obrigação tributária principal decorre de lei, surge com a ocorrência do fato gerador e, como regra geral, torna-se exigível desde logo pelo sujeito ativo, independentemente de qualquer formalidade, pois se trata de dívida líquida e certa. d) As circunstâncias materiais ou jurídicas relativas ao lançamento do crédito afetam inexoravelmente a obrigação tributária. e) A validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, bem como a natureza do seu objeto ou dos seus efeitos é elemento essencial na definição legal do ato gerador e nascimento da obrigação tributária. 13 – (AFR-RJ/2008) Extinta a pessoa jurídica de direito privado, continuando a respectiva atividade a ser exercitada por sócio remanescente, sob uma outra razão social, é correto afirmar que: a) A nova empresa criada pelo sócio remanescente é responsável pela totalidade dos tributos devidos pela sociedade extinta, desde que já tenham sido lançados. b) A nova empresa criada pelo sócio remanescente apenas responde por metade dos tributos devidos pela sociedade extinta. c) Inexiste responsabilidade, pois a atividade é continuada pelo sócio sob outra razão social. d) A sociedade constituída pelo sócio remanescente é responsável pelos tributos devidos pela sociedade extinta, independentemente de sua razão social. e) Inexiste responsabilidade, salvo se a nova empresa iniciar as operações dentro de seis meses a contar da data da extinção da referida no enunciado. 68 14 – (AFR-RJ/2008) Assinale a afirmativa incorreta. a) Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. b) Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal. c) Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos, tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios. d) Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos, tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. e) A definição legal do fato gerador é interpretada considerando-se a validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos. GABARITO: 1. C 8. D 2. D 9. A 3. C 10. D 4. D 11. A 5. D 12. A 6. B 13. D 7. A 14. E 9. Responsabilidade Tributária. Conceito. 9.1 Responsabilidade Tributária Em princípio, o tributo deve ser cobrado da pessoa que pratica o fato gerador. Nessas condições, surge o sujeito passivo direto (“contribuinte”). Em certos casos, no entanto, o Estado pode ter necessidade de cobrar o tributo de uma terceira pessoa, que não o contribuinte. Essa terceira pessoa será o sujeito passivo indireto (“responsável tributário”). 69 Em sentido estrito, é a sujeição passiva indireta a submissão ao direito de crédito do Fisco, em virtude de expressa determinação legal, de pessoa que não é contribuinte, desde que tenha um vínculo indireto com a situação que corresponda ao fato gerador (art. 128 do CTN). Esta responsabilidade poderá ser por substituição, caso em que a lei determina que o responsável (substituto) ocupe o lugar do contribuinte (substituído), desde a ocorrência do fato gerador, de tal sorte que, desde o nascimento da obrigação tributária, aquele – o responsável – já é o sujeito passivo (art. 150, § 7º, da CF); ou por transferência de ônus, caso em que, por previsão legal expressa, a ocorrência de um fato, posterior ao surgimento da obrigação, transfere, a um terceiro, a condição de sujeito passivo da obrigação tributária, lugar que até então era ocupado pelo contribuinte. Essa transferência poderá excluir a responsabilidade do contribuinte ou atribuí-la em caráter supletivo. Contribuinte é a pessoa, física ou jurídica, que tenha relação de natureza econômica, pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador (art. 121, parágrafo único, I, do CTN). Assim, o contribuinte é sujeito passivo direto. Sua responsabilidade é originária, existindo uma relação de identidade entre a pessoa que deve pagar o tributo e a que participou diretamente do fato gerador, dele se beneficiando economicamente. Daí se evidencia a natureza econômica na relação entre o contribuinte e a situação que caracteriza o fato gerador, uma vez que o Código Tributário Nacional adotou um critério econômico de incidência: cobrar de quem auferiu vantagem econômica da ocorrência do fato imponível, desconsiderando os critérios territorial e de cidadania. Não se deve esquecer que o fato gerador é um fato econômico com relevo no mundo jurídico e serve de índice de medida da capacidade contributiva do cidadão. Assim, normalmente, a lei confere a obrigação de pagar o tributo à pessoa que tenha estado em relação econômica com a situação que constitua o fato gerador respectivo, ou seja, à pessoa que dela auferiu uma vantagem patrimonial, isto é, o contribuinte. Daí a lição de Amilcar de Araújo Falcão: “Assim, verificado tal pressuposto de fato, sobressai logo a sua atribuição à pessoa, cuja capacidade econômica ele traduz. A identificação do contribuinte, portanto, incumbe ao intérprete: independe de menção na lei”. Dessa forma, constituindo o fato gerador um índice ou medida da capacidade contributiva do cidadão, nada mais normal que seja o contribuinte a pessoa obrigada ao pagamento do tributo. Responsável, por outro lado, é a pessoa que, sem revestir a condição de contribuinte, tem sua obrigação decorrente de disposição expressa de lei. Assim, não tendo relação de natureza econômica, pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador, o responsável é sujeito passivo indireto, sendo sua responsabilidade derivada, por decorrer da lei, e não da referida relação (art. 121, parágrafo único, II, do CTN). A obrigação do pagamento do tributo lhe é cometida pelo legislador, visando facilitar a fiscalização e arrecadação dos tributos. Todavia, a lei não pode atribuir a responsabilidade tributária pelo pagamento de tributo a qualquer terceiro em razão do que dispõe o art. 128, que aclara e complementa o art. 121, parágrafo único, II, ambos do CTN. 70 Art. 128 do CTN: “(...) a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação”. Conforme vimos, segundo o art. 128 do CTN, o contribuinte é excluído: TOTALMENTE: Refere-se à responsabilidade pessoal (Art. 131 do CTN), isto é, o contribuinte não responde por mais nada. É caso, portanto, de responsabilidade pessoal do sujeito passivo, atribuída por lei, que é o único instrumento hábil a desviar o foco da exigibilidade para terceira pessoa, vinculada ao fato gerador, elegendo-a como responsável. Exemplo: dívida de imposto, relativo ao de cujus, com fato gerador localizado até a data da morte ou abertura da sucessão: a responsabilidade é pessoal do espólio, conforme o art. 131, III, do CTN, a ser explicado em momento ulterior. Assim, não se fala em transferência do encargo a outrem, sem que haja respaldo legal, sob pena de se imprimir robustez a instrumentos contratuais inoponíveis à Fazenda, conforme se depreende da inteligência do art. 123, abaixo transcrito: Art. 123 do CTN: “Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes”. Exemplificando: Se um inquilino de um apartamento assume o IPTU e não honra o contrato particular, por ele assinado, a Fazenda Municipal irá exigir o recolhimento do tributo do proprietário do imóvel. O contrato entre as duas partes só produzirá efeitos na esfera civil, devendo o proprietário do imóvel antecipar o valor correspondente ao Fisco, sem arguir força probante à convenção particular, pretendendo fazê-la oponível à Fazenda. Aliás, as convenções particulares não podem ser opostas ao Fisco para que se modifique o sujeito passivo. Cabe, no entanto, se aprouver ao proprietário, via ação regressiva, ação de indenização contra o inquilino, que deverá arcar com o ônus contratual. Outros exemplos: Acordo entre empregado e empregador para que este não retenha o IRRF; (ver exemplo 1, p. 221); Acordo entre comprador e vendedor de bens, a fim de que este efetue a venda àquele sem o ICMS. PARCIALMENTE: Responsabilidade subsidiária ou supletiva (Art. 134 do CTN), isto é, o contribuinte responde pela parte ou pelo todo da obrigação tributária, que o responsável designado em lei deixar de cumprir. Inicialmente, cobra-se do contribuinte; caso este não disponha de recursos suficientes, cobra-se do responsável. 71 Portanto, há nítido benefício de ordem, isto é, o terceiro somente responderá com o seu patrimônio se o contribuinte não tiver bens suficientes para arcar com o débito. Diga-se, pois, que não se trata de solidariedade (Arts. 124 e 125 do CTN), em que a lei, no próprio texto, elege terceiro, como devedor do tributo, na mesma posição do contribuinte. Posto isto, a Fazenda Pública deverá esgotar todos os caminhos para alcançar os bens do devedor principal, voltando suas atenções aos terceiros, após frustrada a tentativa de recepção de recursos do contribuinte. Exemplificando: Só é possível exigir o ITBI de um tabelião (Art. 134, VI, do CTN), se não houver como receber do contribuinte (vendedor ou comprador, na forma prevista em lei); Só é possível exigir o tributo do inventariante (Art. 134, IV, do CTN), relativo a negócios realizados, se o espólio não possuir valores suficientes para arcar com o respectivo encargo; Só é possível exigir o tributo do síndico (Art. 134, V, do CTN), relativo a negócios realizados, se os bens constantes da massa falida não forem suficientes à satisfação do crédito tributário; Só é possível exigir o tributo do tutor (Art. 134, II, do CTN), relativo a negócios realizados, se o tutelado não lograr satisfazer com recursos próprios o crédito exigido. Revisão: Em primeiro lugar, o responsável é um terceiro, mas o legislador não tem liberdade para designar qualquer terceiro como responsável tributário, porque o mencionado dispositivo legal determina que esse terceiro tenha uma vinculação de qualquer natureza com o fato gerador da respectiva obrigação. Assim, esse vínculo pode ser de qualquer espécie, menos de natureza pessoal e direta, porque quem o tem é o contribuinte. Em segundo lugar, a atribuição da responsabilidade tributária à terceira pessoa só pode ser por lei formal, porque o responsável é espécie de sujeito passivo, e esse só pode ser determinado por lei em sentido estrito (arts. 97, III e 128, ambos do CTN c/c art. 150, § 7º, da CF). Em terceiro lugar, a lei, ao designar o terceiro como responsável tributário, pode excluir a responsabilidade tributária do contribuinte, por meio da figura da “substituição tributária”, ou atribuí-la ao mesmo contribuinte em caráter supletivo do cumprimento da obrigação tributária, caso de “responsabilidade tributária propriamente dita” (vide quadro na página anterior). 72 Portanto, é mister memorizar o esquema a seguir, a fim de que se sepultem dúvidas atinentes à distinção entre responsabilidade por substituição ou originária e a responsabilidade por transferência ou derivada: Responsabilidade por substituição versus Responsabilidade por transferência Por substituição (originária): a sujeição passiva é anterior à ocorrência do fato gerador. A escolha do responsável ocorre antes da existência do FG.* (responsável por substituição = 3ª pessoa + lei + pagar = antes do FG) Por transferência (derivada): a sujeição passiva surge em momento posterior à ocorrência do fato gerador. A escolha do responsável ocorre após a existência do FG. (responsável por transferência = 3 pessoa + lei + pagar = após o FG) * Fato gerador 9.2. Tipos de responsabilidade tributária Conforme se assimilou nos tópicos supramencionados, existem duas espécies de responsabilidade tributária: responsabilidade por substituição e responsabilidade por transferência. Esta comporta três situações possíveis: a responsabilidade por solidariedade, a responsabilidade dos sucessores e a responsabilidade de terceiros. Além dessas, enumere-se a responsabilidade por infração à legislação. 9.2.1 responsabilidade por substituição (ou originária ou de 1º Grau) A pessoa que a lei ordena que substitua o contribuinte é chamada de “responsável por substituição” ou, ainda, “contribuinte substituto”, ou “substituto tributário”. Ela, como terceira pessoa escolhida, vem e ocupa o lugar do contribuinte, antes da ocorrência do fato gerador. Ocorre com maior frequência quanto ao ICMS e ao IR (vide parágrafo único, art. 45 do CTN). Exemplo 1: O empregador e empregado, com relação ao IRRF. Se o empregador, v.g., deixar de reter o IRRF, a ação do Fisco deve dirigir-se contra ele, e não contra o empregado, por este ficar excluído da relação jurídica tributária. Todavia, se a empresa proceder ao desconto do valor do imposto no salário do empregado e não o recolher aos cofres públicos, haverá crime de apropriação indébita, e seus administradores serão pessoalmente responsáveis pelos créditos tributários, como se verá oportunamente (art. 135, III, do CTN). Exemplo 2: A caixa econômica Federal e o ganhador de um prêmio da Loteria Federal, quanto ao IR incidente sobre tal prêmio. Registre-se que a doutrina distingue, 73 relativamente ao ICMS, duas espécies de substituição tributária: substituição “para trás” e substituição “para frente”. I – Substituição Regressiva ou Para Trás: O fato gerador ocorre “para trás”. É a postergação (adiamento) do recolhimento do tributo para momento posterior à ocorrência do fato gerador. Assim, adia-se o pagamento do ICMS por mera conveniência da administração fiscal, uma vez que o substituído não dispõe de aparato fiscal ou contábil para efetuá-lo, razão pela qual o ônus tributário recai sobre o substituto legal tributário. Exemplos: Leite cru – produtor rural versus laticínio (este recolhe para aquele); Cana em caule – produtor rural versus usina (esta recolhe para aquele); ainda sucata, animais etc. Por fim, a substituição regressiva representa o fenômeno tributário do diferimento (= adiamento, postergação). Adia-se, pois, o pagamento para momento posterior à ocorrência do fato gerador, não havendo contemporaneidade do pagamento com o próprio fato imponível. II – Substituição Progressiva ou Para Frente: o fato gerador ocorre “para frente”. É a antecipação do recolhimento do tributo cujo fato gerador ocorrerá (se correr) em um momento posterior (“para frente”). Assim, antecipa-se o paga- mento do tributo, sem que se disponha de bases de cálculo aptas a dimensionar o fato imponível, uma vez que ele ainda não ocorreu. Logo, a doutrina contesta tal mecanismo por se tratar de inequívoco fato gerador presumido ou fictício. Todavia, o sistema de substituição progressiva tem respaldo constitucional, uma vez inserido no art. 150, § 7º, in fine, da CF, por meio da EC 3/1993. Exemplo: veículos novos, ao deixarem a indústria em direção às concessionárias; cigarros e refrigerantes etc. (Observação: nos exemplos mencionados, o ICMS já é recolhido antes da ocorrência do fato gerador que, presumivelmente, nascerá em momento ulterior). Note bem: a) Substituição “Para Trás” ou Regressiva: o recolhimento do imposto se dá após a ocorrência do fato gerador. Recolhe-se o tributo na “entrada” do bem no estabelecimento adquirente (exemplos: usina, Laticínio etc.). b) Substituição “Para Frente” ou Progressiva: o recolhimento do imposto se dá antes da ocorrência do fato gerador. Recolhe-se o tributo na “saída” do bem do estabelecimento alienante (exemplos: indústria automobilística, de cigarros, de refrigerantes etc.). 9.2.2 responsabilidade por transferência (ou derivada ou de 2º Grau) 74 Na responsabilidade por transferência, a escolha do responsável ocorre após a existência do fato gerador, evento a partir do qual se desloca (se transfere) o ônus tributário para uma pessoa escolhida por lei. Após a ocorrência de um evento determinado (morte do contribuinte, aquisição de bens, aquisição de fundo de comércio e outros), transfere-se o ônus tributacional para o responsável tributário. A lei, levando em conta um evento posterior à ocorrência do fato gerador, desloca para terceira pessoa a obrigação tributária que até então estava a pesar sobre o contribuinte. Assim, depois de surgida a obrigação tributária contra uma pessoa certa e determinada, é a mesma transferida em consequência de um fato posterior. Observe que, nos exemplos supracitados, já havia ocorrido o fato gerador e, portanto, existia desde então um contribuinte. Atente-se para o fato de que o direito tributário sempre amarra a responsabilidade tributária àquele que fica com os bens. A lei tributária dissocia a sujeição passiva da obrigação tributária, atribuindo o debitum a um e a responsabilidade, a outro. Aliás, o “responsável” responde por débito alheio, enquanto o “substituto tributário” (responsabilidade por substituição) responde por débito próprio. Como se notou, o Código Tributário Nacional arrola três situações de responsabilidade por transferência: Responsabilidade por Transferência: Por Solidariedade Tributária Passiva (Arts. 124 e 125); Dos Sucessores (Arts. 130 a 133); De terceiros (Art. 134). 9.3. Solidariedade tributária passiva (arts. 124 e 125 do CTN) Art. 124 do CTN: “São solidariamente obrigadas: I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal; II – as pessoas expressamente designadas por lei. Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem”. 75 Art. 125 do CTN: “Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade: I – o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais; II – a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo; III – a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica aos demais”. Dá-se quando cada um dos devedores solidários responde in solidum (pelo todo) quanto à obrigação tributária. A solidariedade tributária pode ser natural ou legal: a) Solidariedade natural (art. 124, I, do CTN): entre pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação tributária principal. Exemplo: vários irmãos como coproprietários de um imóvel quanto ao IPTU; b) Solidariedade legal (art. 124, II, do CTN): ocorre sob determinação da lei, que designa expressamente as pessoas que deverão responder solidariamente pela obrigação tributária. Exemplo: na remessa de mercadoria vinda de outro Estado para venda sem destinatário certo, o transportador é solidário com o remetente da mercadoria; os sócios, no caso de encerramento de uma sociedade de pessoas, são solidariamente responsáveis, consoante o art. 134, VII, do CTN. Benefício de ordem: A solidariedade tributária passiva não comporta benefício de ordem, podendo o Estado escolher que um dos devedores responda pelo cumprimento total da obrigação tributária, não observando qualquer ordem de vocação. Assim, não fica o Fisco adstrito a uma ordem de preferência, devendo cobrar inicialmente do contribuinte para, depois, fazê-lo com relação ao devedor solidário. Portanto, nenhum dos coobrigados pode invocar “benefício de ordem”, a fim de que, eventualmente, sejam executados, em primeiro lugar, os bens de um suposto devedor principal, como ocorre em determinadas situações regidas pelo direito civil. Apenas para elucidar melhor o que viria a ser o supracitado “interesse comum”, pressuposto da solidariedade (art. 124 do CTN), convém mencionar o exemplo de um imóvel urbano pertencente a um casal, ambos proprietários do bem. Neste caso, ambos os cônjuges encontram-se solidariamente obrigados ao pagamento do IPTU, tendo o Fisco a faculdade de cobrar, de qualquer um deles, a dívida toda – o adimplemento da obrigação tributária. O art. 125 do CTN elenca, em seus três incisos, os efeitos comuns da solidariedade, que são os seguintes: a) o pagamento de um estende-se aos demais; b) a isenção ou remissão, se não outorgadas pessoalmente, estendem-se aos coobrigados; 76 c) a interrupção da prescrição também se estende a todos. 9.4 Responsabilidade dos sucessores (arts. 130 a 133 do CTN) A obrigação se transfere para outro devedor em virtude do “desaparecimento” do devedor original. Esse desaparecimento pode ser por morte do primeiro devedor (herdeiros) ou por venda do imóvel ou estabelecimento (a obrigação se transfere para o comprador). Assim: a) Transferência causa mortis: a transmissão é para herdeiros, havendo a responsabilidade pessoal, constante do art. 131 do CTN (incisos II e III); b) Transferência inter vivos: a obrigação se transfere para o comprador, em quatro hipóteses, previstas no Código Tributário Nacional: • Primeira hipótese (art. 130): transmissão de imóveis (sucessão imobiliária). • Segunda hipótese (art. 131, I): transmissão de bens móveis (sucessão mobiliária). • Terceira hipótese (art. 133): transmissão de estabelecimento comercial, industrial ou profissional (sucessão comercial). • Quarta hipótese (art. 132): transmissão decorrente de fusão, incorporação, transformação ou cisão. Antes de detalharmos as hipóteses acima destacadas, é indispensável que apreciemos o teor do art. 129 do CTN, à guisa de preâmbulo do tema ora proposto: “O disposto nesta Seção aplica-se por igual aos créditos tributários definitivamente constituídos ou em curso de constituição à data dos atos nela referidos, e aos constituídos posteriormente aos mesmos atos, desde que relativos a obrigações tributárias surgidas até a referida data”. A responsabilidade dos sucessores, tratada nos arts. 129 a 133 do CTN, atingirá: a) os créditos definitivamente constituídos (o lançamento já se realizou); b) os créditos em procedimento de constituição, na data da ocorrência dos atos ou fatos determinantes da sucessão (o lançamento está em fase de realização); c) os créditos ainda não constituídos, porém correspondentes a fatos gera- dores ocorridos antes da realização dos atos ou fatos determinantes da sucessão (o lançamento ainda não se realizou). Em síntese, pode-se afirmar que o sucessor assume todos os débitos tributários do sucedido, relativos a fatos geradores ocorridos antes da data do ato ou fato que demarcou a sucessão, sendo irrelevante o andamento da constituição definitiva do crédito. Assim, o que vai regular o conjunto de obrigações transferidas é o fato gerador. No indigitado artigo, fica explicitado que os débitos conhecidos à data da sucessão, ou seja, já lançados, bem como aqueles que estiverem em via de sê-los, ou mesmos desconhecidos, mas que serão posteriormente lançados, podem ser irrogados aos sucessores. 77 Passemos, agora, à análise das (quatro) hipóteses de Responsabilidade dos Sucessores: 1ª Hipótese: art. 130 do CTN Art. 130. “Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relati- vos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação. Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.” O comando se refere aos tributos incidentes sobre bem imóvel – impostos (IPTU ou ITR), taxas de serviço (taxas de lixo, d’Água, de Esgotos) e contribuições de melhoria (obras de asfaltamento, por exemplo) – que passam a ser exigíveis do adquirente. Não se fez menção a multas, a juros ou à correção monetária – é dispositivo adstrito a tributos. O sujeito passivo de tais tributos passa a ser o novo proprietário, posseiro ou foreiro, no lugar do alienante – é nítida sub-rogação pessoal. Note que não é caso de solidariedade, nem nos parece hipótese de responsabilidade subsidiária. Saliente-se que cabe ao Oficial de Registro fiscalizar o recolhimento de tributos, exigindo a apresentação de certidões negativas, o que torna um tanto improvável a hipótese prevista no dispositivo. Entretanto, a certidão tem presunção de legitimidade relativa, pois podem surgir dívidas que não constem dos registros do Fisco no momento de sua expedição. É importante assinalar que a regra comporta exceções em duas situações: a) quando constar na escritura de transmissão de propriedade a certidão negativa expedida pela Fazenda (art. 130 do CTN): com efeito, a certidão é documento que atesta a inexistência de débitos contra certa pessoa ou em relação a certo bem imóvel. É, dessarte, a única forma de o adquirente eximir-se da responsabilidade; b) quando o imóvel for adquirido em hasta pública (art. 130, parágrafo único, do CTN): tratase do leilão realizado pelo Poder Público, para a satisfação da dívida, principalmente em ações de execução (esfera judicial). Frise-se que o montante das dívidas existentes está incluído no montante pago pelo bem imóvel no público pregão, em nítida sub-rogação sobre o lanço ofertado, cabendo à autoridade judicial zelar pela imediata quitação das dívidas. O arrematante não é responsável tributário, nem quando o preço é insuficiente para cobrir o débito tributário. Portanto, “a arrematação tem o efeito de extinguir os ônus que incidem sobre o bem imóvel arrematado, passando este ao arrematante livre e desembaraçado dos encargos tributários” (STJ, REsp 166975/SP). Portanto, na arrematação em hasta pública, o arrematante não se torna responsável, uma vez recebendo o imóvel livre de ônus tributário. Caso remanesçam dívidas tributárias, não quitadas na época da arrematação, deverão ser exigidas do contribuinte (antigo proprietário/executado). 78 2ª Hipótese: art. 131, I, do CTN Art. 131. “São pessoalmente responsáveis: I – o adquirente ou remitente, pelos tributos relativos aos bens adquiridos ou remidos; II – o sucessor a qualquer título e o cônjuge meeiro, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da partilha ou adjudicação, limitada esta responsabilidade ao montante do quinhão do legado ou da meação; III – o espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão.” A doutrina tem concebido o art. 131 do CTN como designativo de responsabilidade exclusiva, isto é, afastando-se a responsabilidade dos devedores originais. Estes não responderão supletiva (ou subsidiária) ou solidariamente, já que o devedor sucedido (1) pode ter desaparecido (nos casos dos incisos II e III) ou (2) pode não ter relevância (inciso I). Inciso I: o comando menciona aquisição de bens, sem especificar a quais bens se refere. Estamos que o dispositivo em tela, devendo ser interpretado com cautela, fia-se aos bens móveis, pois coube ao artigo precedente o tratamento afeto aos bens imóveis. Quanto à regra de responsabilidade, não há surpresa: o adquirente assumirá a responsabilidade pelas dívidas anteriores à aquisição. Ademais, faz-se menção ao instituto da remição (com “ç”, indicando “resgate do bem penhorado, mediante pagamento da dívida”; verbo remir, redimir). O instituto está regulado no Código de Processo Civil (arts. 787 a 790). O interessado que remir o bem (remitente) será o responsável pessoal, consoante o dispositivo. O art. 131 não prevê hipóteses de exceção à responsabilização (certidão ou situação de hasta pública), como o fez o art. 130. Portanto, sempre haverá a responsabilidade do adquirente. Incisos II e III: os dispositivos versam sobre a sucessão mortis causa, isto é, a transmissão de bens em virtude de morte do proprietário. Como se verá adiante, há pouca didática na ordenação cronológica dos incisos, pois a responsabilidade pelos tributos devidos pelo falecido recai, em primeiro lugar, sobre o espólio (inciso III); após a partilha, por óbvio, sobre os herdeiros (inciso II). Portanto, recomenda-se interpretar aquele antes deste, invertendo-se a leitura. O de cujus, pode deixar dívidas tributárias para trás, àqueles que aqui permaneceram. É fato que os adquirentes por sucessão recebem não apenas o ativo, mas também o passivo do de cujus. Com o passamento, abre-se a sucessão, em cujo procedimento será feita a partilha dos bens, mediante a homologação por sentença judicial, a ser prolatada pelo magistrado. No momento do falecimento, concebe-se o chamado espólio – conjunto de bens, direitos, dívidas e responsabilidades da pessoa falecida, ou seja, a própria universalidade de bens e direitos que integravam o patrimônio do de cujus. O espólio não é “pessoa”, embora o Código Tributário Nacional o trate como tal, considerando-o “pessoalmente responsável”, ou seja, atribuindo-lhe a feição de sujeito passivo da relação jurídico-tributária. Assim, o referido diploma legal dispõe que o espólio será 79 responsável pelas dívidas tributárias do de cujus, isto é, aquelas realizadas em vida, com fatos gerados ocorridos até o evento sinistro (abertura da sucessão). Observe que o espólio, neste aspecto, reveste-se da condição de responsável tributário (inciso III), como sujeito passivo indireto. Até que se proceda à partilha de bens, isto é, durante a fase judicial do inventário (ou arrolamento), é possível que novas dívidas despontem (Exemplo: novos fatos geradores de IPVA, IPTU, IR). Em relação a tais fatos geradores – v.g., a propriedade de veículo automotor em 1º de janeiro subsequente ao ano do falecimento –, perguntar-se-á: quem será o contribuinte? Não será nem o de cujus (não existe mais), nem os herdeiros (não se definiram, ainda), mas o próprio espólio. Note que, neste contexto específico, o espólio é contribuinte e responsável, concomitantemente. É responsável, perante os débitos anteriores, e contribuinte, com relação às dívidas mais recentes. Aliás, nesta última hipótese, ad argumentandum, o espólio (contribuinte ou sujeito passivo direto) terá o inventariante como responsável (tema constante do art. 134, IV, do CTN, a ser estudado oportunamente). Note bem: O inventariante é responsável, enquanto o espólio se coloca como contribuinte. Não existe relação de “solidariedade” entre ambos, ou entre o inventariante e o de cujus. Com a prolação da sentença de partilha, definem-se os sucessores (herdeiros ou legatários) e o cônjuge meeiro. Após tal definição, é possível que ainda remanesçam dívidas – surgidas na época em que o de cujus era vivo ou durante o curso do inventário, e que permaneceram até então desconhecidas –, cuja exigência recairá sobre os sucessores, desde que não tenha havido, é claro, decadência. Estes se tornam responsáveis pelas dívidas do de cujus e seu espólio (estes, na condição de contribuintes), isto é, por todas as dívidas surgidas até a data da partilha, no limite dos quinhões, legados ou meações recebidas. Dica: A propósito, o quinhão é uma parcela ideal (fração) do patrimônio deixado pelo de cujus. O legado equivale ao bem deixado pelo de cujus, no testamento, a alguém identificado. A meação é a parcela (metade) do patrimônio do casal pertencente a cada cônjuge, assim denominado, ipso facto, “cônjuge meeiro”. É o que, corriqueiramente, intitula-se de “força da herança ou dos legados” (ver, como complemento, o art. 192 do CTN). 80 Quadro mnemônico – responsabilidade dos sucessores Por fim, frise-se que o art. 131 do CTN, ao tratar de responsabilidade pessoal, versa sobre o repasse exclusivo de responsabilidade de tributo (juros e correção monetária), não abarcando as penalidades. Os herdeiros e o espólio não serão alvos de multas impostas ao falecido. Seria irrazoável o apenamento dos responsáveis, infligindo sanção aos descendentes do de cujus, que responderiam por comportamento ilícito alheio. 3ª Hipótese: art. 132 do CTN Art. 132. “A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual.” O preceptivo em análise não versa sobre a sucessão por morte de pessoa física, como o anterior, mas, sim, de extinção de pessoa jurídica. A regra é a mesma: a pessoa jurídica que resultar da operação societária será responsável pelas dívidas anteriores. É nítido caso de responsabilidade exclusiva das empresas fusionadas, transformadas, incorporadas e cindidas. Quanto a estas últimas, vale ressaltar que não foram mencionadas no dispositivo, pois a cisão veio a ser regulada pela Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976), publicada após a edição do Código Tributário Nacional. Não obstante, a doutrina e a jurisprudência têm entendido válida a extensão da regra à cisão. Observe os conceitos abaixo delineados, extraídos da Lei 6.404/1976: Fusão (art. 228): operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar sociedade nova; 81 Incorporação (art. 227): operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra; Transformação (art. 220): a sociedade passa, independentemente de dissolução e liquidação, de um tipo para outro. Por exemplo, Ltda. se transforma em S.A.; Cisão (arts. 229 e 233): A cisão pode ser total ou parcial: será total (I) quando houver operação pela qual se extingue uma pessoa jurídica, transferindo-se todo seu patrimônio para outra pessoa jurídica já existente ou criada em decorrência da operação; será parcial (II) quando houver subtração de parte de patrimônio de uma pessoa jurídica, com o fito de compor o patrimônio de uma ou mais pessoas jurídicas já existentes ou criadas em decorrência da operação. Ademais, o parágrafo único do art. 132 preconiza que a responsabilidade por sucessão se estende aos casos de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual. Com efeito, caso não tenhamos a ocorrência de nenhuma das operações societárias anteriores, mas uma extinção propriamente dita, a regra de responsabilização será a mesma do caput, isto é, as dívidas serão exigíveis da unidade econômica que ressurgir após a extinção, quando continuada por sócio remanescente ou seu espólio. Portanto, responsabiliza-se a estrutura societária sucessora. Não perca de vista que, caso tenhamos tal situação, aplicar-se-á, além disso, o art. 135, III, do CTN (a ser estudado oportunamente), segundo o qual se permitirá a responsabilização pessoal dos sócios ou administradores que conduzem com poderes de gestão a sociedade (“gerência”), à luz da desconsideração da pessoa jurídica. A diferença entre um comando e outro está na abrangência da responsabilização: o art. 135, III, do CTN permite alcançar o administrador que exerce a “gerência” da sociedade, enquanto o art. 132, parágrafo único, do CTN visa atingir qualquer sócio remanescente que dê seguimento ao negócio antes explorado pela pessoa jurídica. A doutrina e a jurisprudência encontram-se divididas no concernente à transmissibilidade das multas à empresa sucedida, entretanto parece-nos que vem se firmando, hodiernamente, a tese mais moderna de que a responsabilidade dos sucessores deve abranger as multas, pois estas integrariam o passivo da empresa sucedida. A tendência é razoável, na medida em que é hábil a coibir as possíveis fraudes em operações societárias com o fito único de escapar das multas. Diga- se, ainda, que a regra abarca as multas já aplicadas no momento da sucessão, e não aquelas impostas após a sucessão, em virtude de infração cometida pela sucedida, pois já não integraria o passivo da empresa. Por fim, tem-se notado mais um campo de divergência nos debates afetos ao tema: se os sucessores devem responder pelas multas de caráter punitivo. Parece-nos que a jurisprudência tem se firmado pela negativa, adstringindo-se à transferência das multas moratórias (STF, RE 83514/SP e RE 90.834-0/MG). 82 4.ª Hipótese: art. 133, do CTN Art. 133. “A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato: I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade; II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão”. O artigo em análise menciona a aquisição de “fundo de comércio” ou de “estabelecimento”– expressões aparentemente utilizadas como sinônimas, porém não é o melhor posicionamento. Vamos, em apertada síntese, aos conceitos dos institutos, no bojo da sucessão empresarial: a) Fundo de Comércio (fonds de commerce, para os franceses, ou azienda, para os italianos): conjunto de bens, materiais ou imateriais, agregados pelo empresário para a consecução de suas atividades. Designa a universalidade harmônica de bens utilizada na realização da atividade comercial. Exemplo: uma loja tem, como fundo de comércio, prateleiras, balcões, máquinas, o ponto, a clientela, a marca etc. b) Estabelecimento: a ideia de estabelecimento, diferentemente da “universalidade de bens” que marca o fundo de comércio, passa pela identificação da unidade fisicamente autônoma, na qual uma pessoa física ou jurídica realiza as atividades. Significa a parte, a fração, e não a “totalidade de bens” (típica do fundo de comércio). Feitas as distinções, passemos à análise do comando: Com a aquisição do fundo de comércio ou do estabelecimento, se o adquirente “continuar a respectiva exploração do empreendimento” (conditio sine qua non, sendo irrelevante o rótulo sob o qual dita exploração será continuada), isto é, beneficiando-se da estrutura organizacional anterior com a absorção da unidade econômica e da clientela do alienante, será possível a responsabilização pelos tributos devidos pelo sucedido até a data do ato traslativo. Portanto, a responsabilidade dependerá do rumo a ser tomado pelo adquirente: se antes havia uma “loja de eletrodomésticos” e, após, com a aquisição, ter-se-á uma “oficina mecânica”, não se há de falar em responsabilidade do adquirente. Portanto, a empresa adquirente responde, nos casos de continuidade do empreendimento: Integralmente: a responsabilidade integral (pessoal ou exclusiva) indica que o sucessor (adquirente) responde integralmente, se o alienante cessar a exploração, não retomando qualquer atividade no período de 6 (seis) meses, a contar da alienação. O Código Tributário Nacional escolhe a pessoa sobre a qual o ônus tenha mais facilidade em recair – o adquirente. Tem-se sua exigibilidade total, pois o alienante terá encerrado suas atividades. O ilustre 83 doutrinador Hugo de Brito machado ressalta a possibilidade de tal responsabilidade ser “subsidiária”, caso o patrimônio do adquirente seja insuficiente para saldar a dívida tributária. Segundo o eminente autor, a responsabilidade integral não quer dizer “exclusiva”. Subsidiariamente: a responsabilidade subsidiária ou supletiva indica que, em primeiro lugar, cobra-se o tributo do alienante do fundo (devedor principal) e, se este não tiver com que pagar, exige-se a dívida do adquirente (devedor em caráter supletivo), sob a condição de o alienante não ter cessado a exploração comercial ou, interrompendo-a, ter retomado as atividades em 6 (seis) meses a contar da alienação. É nítido, pois, o benefício de ordem, só devendo a Fazenda investir contra o adquirente, depois de baldados os esforços empreendidos contra o alienante. Note que “a trilha” seguida pelo alienante, nesse caso, é de interesse da Fazenda, pois se torna factível a sua cobrança, pouco importando a atividade comercial que irá desempenhar. O relevante é que ele denota, com a continuidade do vigor comercial, uma capacidade patrimonial para suportar o ônus tributário. Interessante e óbvia situação é a hipótese (contrária ao caput do art. 133) não prevista neste artigo, em que o adquirente não continua com a respectiva exploração. Neste caso, não há responsabilidade do adquirente pelos tributos devidos. Por derradeiro, quanto às multas, há de se renovar o que já foi dito por ocasião dos comentários ao art. 132. Vamos, agora, analisar os reflexos provocados, no preceptivo em tela, em virtude da LC 118/2005: “Art. 133 (...) § 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial: I – em processo de falência; II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial. § 2º não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for: I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial; II – parente, em linha reta ou colateral até o 4º (quarto) grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária. § 3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de 1 (um) ano, contado da data de alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário”. 84 “Art. 133 (...) § 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial: I - em processo de falência; II - de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial. § 2º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for: I - sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial; II - parente, em linha reta ou colateral até o 4º (quarto) grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou III - identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária. § 3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de 1 (um) ano, contado da data de alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário.” O presente art. 133 do CTN foi alterado com a LC 118/2005, com o acréscimo de três parágrafos. Em breve análise das alterações, pode-se afirmar que o adquirente de uma empresa em processo de falência ou em recuperação judicial, não será responsável por tributos devidos anteriormente à aquisição. A alteração visa dar estímulo às alienações, incentivando a realização de negócios com a correlata garantia ofertada ao adquirente. É o que se depreende do § 1º do art. 133. É sabido que os débitos de natureza fiscal representam a grande parcela de débitos de uma empresa em dificuldades. Dessa forma, afastada a responsabilidade por sucessão, aumentam as possibilidades de aquisição de bens do devedor falido ou em processo de recuperação judicial, até porque o adquirente (comprador) não mais será responsável por esses débitos fiscais. É óbvio que o valor pago pela empresa em quebra será aproveitado para saldar as obrigações do devedor (antigo proprietário da empresa) em relação aos seus credores. Portanto, esta inovação, a nosso modesto pensar, é muito positiva, uma vez que a empresa tende a continuar em atividade (gerando riquezas e mantendo empregos), enquanto o produto da alienação passa a ser fundamental no processo de reabilitação do devedor. 85 Nesse passo, mencione-se que o § 2º, com o fito de evitar fraudes, traz ressalvas à aplicação do parágrafo anterior, caso o adquirente tenha certo grau de envolvimento com o devedor (parente, sócio etc.). Com efeito, pretende-se evitar que os institutos da recuperação tenham uso indevido, a fim de favorecer, v.g., o próprio alienante. Se isso ocorrer, esse adquirente responderá pelas dívidas, na forma prevista no caput e incisos. O parágrafo § 3º mostra procedimento afeto à guarda do produto da alienação judicial, referindo-se à conta de depósito, que ficará à disposição do juízo de falência, durante 1 (um) ano, sem possibilidade de saque. A ressalva existe para o pagamento de créditos extraconcursais e para aqueles que preferem ao crédito tributário. 9.5 Responsabilidade de terceiros (arts. 134 e 135 do CTN) Esta responsabilidade não se prende à transmissão patrimonial, como se pôde notar na responsabilidade dos sucessores, mas no dever de zelo, legal ou contratual, que certas pessoas devem ter com relação ao patrimônio de outrem, geralmente pessoas naturais incapazes (menor, tutelado, curatelado) ou entes despidos de personalidade jurídica (espólio e massa falida). Os terceiros são, em geral, administradores ou gestores da vida patrimonial de certos contribuintes. Esta é a razão pela qual o Código Tributário Nacional responsabiliza tais gestores, em relação aos atos praticados sob sua gerência ou supervisão. Exemplos: o pai, quanto aos bens de filhos menores; o síndico (administrador de uma falência), quanto à massa falida; entre outros exemplos. A responsabilidade de terceiros é tratada nos artigos 134 e 135 do CTN. O primeiro designa caso de responsabilidade por transferência, na medida em que o dever de responsabilidade não se apresenta concomitante ao fato gerador, mas, sim, posterior. Ademais, é hipótese de responsabilidade subsidiária. O art. 135, por seu turno, indica exemplo de responsabilidade por substituição, pois o dever de responsabilidade se apresenta concomitante ao fato gerador. Outrossim, é hipótese de responsabilidade pessoal. 9.5.1 Responsabilidade “solidária” (art. 134 do CTN) Art. 134 do CTN: “Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: I – os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; II – os tutores e curadores, pelos tributos devidos por seus tutelados ou curatelados; III – os administradores de bens de terceiros, pelos tributos devidos por estes; IV – o inventariante, pelos tributos devidos pelo espólio; 86 V – o síndico e o comissário, pelos tributos devidos pela massa falida ou pelo concordatário; VI – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre atos praticados por eles, ou perante eles, em razão de seu ofício; VII – os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidade, às de caráter moratório”. A responsabilidade “solidária”, prevista no artigo supramencionado, não é “solidária plena”, mas, sim, subsidiária, uma vez que não se pode cobrar tanto de um como de outro devedor, havendo uma ordem de preferência a ser seguida. Em primeiro lugar, cobra-se do contribuinte; após, exige-se o gravame do responsável. Aliás, frise-se que os contribuintes enumerados no artigo em estudo, não obstante serem ora incapazes, ora despidos de personalidade jurídica, possuem capacidade tributária passiva, conforme se depreende do art. 126 do CTN. Para que os terceiros venham a responder pela obrigação tributária “solidariamente” com o contribuinte, é necessário o cumprimento concomitante de duas condições, consoante se depreende do art. 134 do CTN: a) que seja impossível exigir o cumprimento da obrigação tributária principal do contribuinte (primeiro, o Fisco cobra deste); b) que o responsável indicado tenha colaborado para o não pagamento do tributo, mediante ato ou omissão a ele atribuíveis. Assim, a atuação do terceiro na administração do patrimônio do representado deverá ter relação direta com o nascimento da obrigação tributária não cumprida. É, portanto, responsabilidade subsidiária, pois só pode o Fisco acionar o terceiro se comprovada a ausência ou insuficiência dos bens penhoráveis, que possam ser excutidos do patrimônio do contribuinte. Posto isso, se a Fazenda executar diretamente os bens dos terceiros, estes poderão invocar a necessidade de ordem na persecução da dívida, para que sejam alcançados, em primeiro lugar, os bens do contribuinte. Quanto ao parágrafo único do dispositivo, é de se notar que houve tratamento explícito para a aplicação de multas, diferentemente do que ocorre nos comandos anteriores. Repare que somente a obrigação principal poderá ser exigida dos terceiros, excluindo-se, assim, o cumprimento dos deveres acessórios e a aplicação das penalidades, excetuadas as de caráter moratório. Portanto, não são transferíveis as chamadas “multas-castigo”. Assim, somente são transferíveis as multas que punem o descumprimento da obrigação tributária principal. As demais penalidades – aquelas que punem o desatendimento de deveres instrumentais (chamadas “punitivas”, “de ofício”, “formais”, “fiscais” ou “pessoais”) – não são transferíveis, recaindo sobre o contribuinte. Portanto, é a aplicação do brocardo “cada um responde pelos seus atos”. Vamos a uma breve análise dos incisos do art. 134: 87 INCISO I: Os pais são os representantes legais dos filhos menores, devendo zelar pelos seus bens e negócios. Em virtude disso, é que se revestem da condição de responsáveis. Exemplo: se um bem imóvel é adquirido por um menor de idade, representado por seus pais, e sobrevenha uma impossibilidade daquele arcar com o ITBI, por exemplo, estes (os pais ou genitores) serão chamados a adimplir a obrigação tributária. INCISO II: Os tutores e curadores são os representantes legais dos tutelados e curatelados, devendo zelar pelos seus bens e negócios. Esta é a razão da responsabilização em apreço. INCISO III: É possível a responsabilização do administrador (sanção administrativo- fiscal), quando este age ou se omite indevidamente. Exemplo: o administrador de bens de terceiros, com procuração plena, deixa de recolher, por negligência, o IPTU, relativo a bem imóvel de seu cliente. Poderá, assim, ser responsabilizado. INCISO IV: O inciso em tela torna responsável o inventariante, quanto às dívidas tributárias do espólio. O inventariante é a pessoa que tem a incumbência de gerir o patrimônio do espólio até a prolação da sentença (art. 991 do CPC). Como se estudou no art. 131, II e III, do CTN, até que se proceda à partilha de bens, ou seja, durante a fase judicial do inventário, é possível que apareçam novas dívidas (Exemplo: novos fatos geradores de IPVA, IPTU, IR). Em relação a tais fatos geradores – por exemplo, a propriedade de veículo automotor em 1º de janeiro subsequente ao ano do falecimento –, o contribuinte será o próprio espólio, enquanto o inventariante será o responsável tributário. INCISO V: O presente dispositivo responsabiliza o síndico ou o comissário pelos tributos devidos pela massa falida. Na nova terminologia, trazida pela Lei 11.101/2005, substituíram-se os vocábulos “síndico” e o “comissário” pelo termo administra- dor judicial. A nova Lei de Falências previu a figura do administrador judicial, substituindo o “comissário” e o “síndico” da massa falida, que, escolhido preferencialmente entre os maiores credores, era quem, afastando os próprios sócios e controladores da empresa (casos de fraude, negligência ou falta de competência), verificava a existência de direitos e de dívidas, levantando o quadro de credores e vendendo ou rateando bens. Desse modo, surgiram três institutos concursais: recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência, cuja administração ficou a cargo do administrador judicial. INCISO VI: Para evitar a responsabilização em análise, é comum que os serventuários de ofício exijam a comprovação do pagamento eventualmente incidente sobre os atos que devam praticar, antes até de praticá-los. Se não tomarem as cautelas, restando o tributo inadimplido, o tabelião ou registrador poderão ser subsidiariamente responsabilizados. Assim, só se pode exigir o pagamento do ITBI de um tabelião se a legislação qualificar sua responsabilidade pela falta de exigência das partes envolvidas do prévio recolhimento de seu valor, por ocasião da lavratura da escritura. Nesse passo, ademais, só se pode exigir o pagamento do ITCMD de um escrivão se não se puder realizar perante o espólio, por exemplo. INCISO VII: Os tributos devidos pelas “sociedade de pessoas”, quando liquidadas, serão de responsabilidade subsidiária dos sócios. Tais sociedades, especialmente mercantis, são aquelas nas quais subsiste responsabilidade subsidiária e ilimitada dos sócios pelas dívidas sociais. 88 Estão praticamente extintas, pois a praxe mercantil adstringe-se à formatação de sociedades em que a responsabilidade do sócio fica limitada ao capital subscrito, desaparecendo com a respectiva integralização (sociedades anônimas e sociedades por quotas de responsabilidade limitada). Nesse passo, estamos que a estas não se aplica a regra inserta neste inciso. Ademais, de há muito o STF já se posiciona, entendendo que as sociedades por quota de responsabilidade limitada não são sociedades de pessoas. Todavia, os dirigentes de tais sociedades podem ser responsabilizados com fulcro no art. 135, III, do CTN, a ser estudado no próximo item. 9.5.2 Responsabilidade pessoal de terceiros (art. 135 do CTN) Art. 135 do CTN: “São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”. Trata-se de comando afeto à responsabilidade pessoal e exclusiva (não solidária), das pessoas discriminadas nos incisos I, II e III – mandatários, prepostos, empregados, diretores ou gerentes, além daquelas constantes dos incisos do artigo antecedente. Em geral, o contribuinte aqui é vítima de atos abusivos, ilegais ou não autorizados, cometidos por pessoas que o representam, razão pela qual se procura responsabilizar pessoalmente tal representante. Assim, não se atinge o contribuinte, quando houver (a) excesso de poderes ou (b) infração da lei, contrato social ou estatutos – condições à aplicação do preceptivo. a) Excesso de Poderes: o terceiro age por conta própria, além dos poderes que a norma legal, contratual ou estatutária lhe conferem, isto é, subvertendo as atribuições que lhe foram outorgadas. Diferentemente das hipóteses de omissão do art. 134, neste artigo temos nítido comportamento comissivo. Exemplo: diretor de sociedade que adquire um bem imóvel, sabendo-se que, pelo estatuto social, estava impedido de fazê-lo, sem a anuência de todos os sócios. A dívida de ITBI recairá pessoalmente sobre ele. b) Infração de lei, contrato social ou estatutos: Segundo a melhor doutrina, o descumprimento da obrigação tributária principal, sem dolo ou fraude, apenas representa mora da empresa, e não “infração legal” deflagradora da responsabilidade pessoal. É imprescindível a atuação dolosa do gerente ou diretor, devendo ser cabalmente provada. O não pagamento, isoladamente analisado, é “mera presunção” de infração à lei pelo gestor da pessoa jurídica. Ademais, a infração a que se refere o art. 135 é subjetiva (e não objetiva), isto é, dolosa, e é sabido que o dolo não se presume. Diga-se que o caso mais comum a gerar a responsabilidade dos sócios-gerentes está na dissolução irregular de sociedade – forma inequívoca de infração à lei. 89 À guisa de elementos históricos, diga-se que, até o ano 2000, aproximadamente, a posição jurisprudencial dominante era diversa, ou seja, o mero inadimplemento era considerado uma “infração à lei”, configuradora bastante da possibilidade mansa da responsabilização pessoal. Hodiernamente, a tendência jurisprudencial é diversa. Analisando os incisos do art. 135, temos que podem ser pessoalmente responsáveis: as pessoas referidas no artigo anterior; os mandatários, prepostos e empregados; os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. Assim: a) pessoas constantes do art. 134 do CTN: o comando, conforme se estudou, versa sobre responsabilidade “solidária”, ou, em abono do rigor, subsidiária, uma vez que não se pode cobrar tanto de um como de outro, mas respeitando-se um benefício de ordem. Em primeiro lugar, cobra-se do contribuinte; após, exige-se do responsável. Entretanto, se o responsável agir com excesso de poderes ou in- fração à lei, estatutos ou contrato, a responsabilidade deixa de ser “subsidiária” e passa a ser “pessoal”. O curioso é perceber que os atos de infração de lei (estatuto ou contrato) ou excesso de poderes podem ser praticados em benefício dos contribuintes discriminados no art. 134 – filho menor, espólio, etc. – o que nos parece ensejar uma solidariedade entre terceiros atuantes e contribuintes beneficiados. b) os mandatários, prepostos e empregados: É comum a responsabilização pessoal de mandatários, prepostos e empregados da empresa que tenham se valido de excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. “(...) Esta responsabilidade pessoal, caso existente, deverá ser oportunamente apurada e comprovada pelo Fisco e debatida, ainda, em sede de Embargos do Devedor, caso venha a ser promovida a Execução Fiscal do débito(...)” (STJ, REsp. 245489/MG) c) os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado: o dispositivo permite atingir a pessoa do diretor, gerente ou representante da pessoa jurídica. A regra, no entanto, é a personificação jurídica da sociedade e, por isso, ela é quem responde pelas obrigações sociais. Assim, a aplicação da “Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica”, prevista no art. 50, do CC/2002 deve ser feita em caráter excepcional, quando o administrador se vale do véu da personalidade jurídica para, agindo com má-fé, prejudicar credores da sociedade. Nesse passo, são nítidas violações à lei os casos de (I) empregador que desconta o IRRF ou contribuição previdenciária e não os recolhe ao Erário e (II) dissolução irregular da sociedade, deixando débitos tributários pendentes e nenhum patrimônio para garantir seu pagamento. Com efeito, a responsabilização exige que as pessoas indicadas no referido inciso tenham praticado diretamente ou tolerado a prática do ato abusivo e ilegal, quando em posição de influir para sua não ocorrência. A mera condição de “sócio” é insuficiente, até porque o dispositivo não menciona tal termo. Se o sócio existe, mas não é diretor, nem gerente, não deve ser responsabilizado. Caso contrário, admitir-se-á, de forma indevida, o instituto do “redirecionamento” (comum em Execução Fiscal) contra os sócios. Entretanto, se existe um diretor ou gerente de uma pessoa jurídica da qual nunca foi sócio, presente está o pressuposto 90 ensejador da responsabilização. O relevante, dessarte, é a condução da sociedade, com a prática de atos de direção ou gerência, no exercício de funções diretivas da empresa. Note-se que o art. 135 retira a “solidariedade” do art. 134, dando-lhe um cunho de responsabilidade pessoal e imediata, plena e exclusiva do terceiro. Diríamos que, para os casos de descumprimento de obrigação tributária por mera culpa, basta a aplicação do art. 134, que, na verdade, é um comando que representa uma verdadeira “solidariedade com benefício de ordem”. Quanto ao art. 135, por sua vez, não há que se falar em “benefício de ordem”, tendo em vista o dolo ser-lhe elementar. Quanto às multas, é possível afirmar que as pessoas indicadas nos três incisos, nas condições do caput, têm responsabilidade maior que a prevista nos artigos anteriores (art. 130 a art. 134), porque aquele abrange, além dos tributos, todas as multas porventura devidas pelo passivo original. Diga-se, ademais, que a melhor jurisprudência tem sido no sentido de que os sócios responsáveis são os detentores de poderes de administração à época em que o fato gerador ocorreu (período contemporâneo à gestão). Assim, a responsabilidade prende-se ao período em que o administrador tenha efetivamente exercido essa função na pessoa jurídica. Se os tributos referirem-se a período anterior ao início de sua gestão ou a período posterior ao seu término, não gerarão sua responsabilidade pessoal. Por derradeiro, vale consignar que a doutrina em geral considera o art. 135 como designativo de responsabilidade por substituição, pois o dever recai sobre o responsável desde o momento do fato gerador. O interessante é que se trata de hipótese exclusiva de substituição regulada pelo próprio Código Tributário Nacional. Sabe-se que os casos de substituição são regidos, quase sempre, por lei ordinária, com fulcro no art. 128 do CTN. Quadro mnemônico: Ad argumentandum, insta expender mais uma hipótese de responsabilidade tributária, além daquelas elencadas nos arts. 134 e 135 do CTN: trata-se da responsabilização do funcionário emissor de certidão fraudulenta. Observe o art. 208 do CTN: “A certidão negativa expedida com dolo ou fraude, que contenha erro contra a Fazenda Pública, responsabiliza pessoalmente o funcionário que a expedir, pelo crédito tributário e juros de mora acrescidos. Parágrafo 91 único. O disposto neste artigo não exclui a responsabilidade criminal e funcional que no caso couber”. Tal comando disciplina uma responsabilidade pessoal, quanto ao pagamento da dívida tributária, contra o funcionário que emitir uma certidão negativa inquinada de falsidade ideológica. O funcionário fazendário, sabendo que está cometendo uma falsidade, responderá, consequentemente, caso se descubra a mencionada fraude, perante as instâncias administrativa, tributária e criminal. Logo, ficará responsável pelo crédito que deixou de constar na certidão, além de ser o destinatário das devidas sanções administrativas e penais. Com efeito, o funcionário desbriado poderá ser alvo de responsabilização penal, atribuindo-selhe, no mínimo, o crime de prevaricação, quando não o de corrupção passiva. Por outro lado, se o funcionário agir sem dolo, e.g., com culpa, não haverá que incidir a responsabilidade pelo crédito tributário, podendo exsurgir, no entanto, a responsabilização disciplinar e a penal. Estamos que tal responsabilização pessoal do servidor público fazendário é contraproducente, devendo-se assimilá-la como responsabilidade solidária. Isso porque o servidor público, como é sabido, recebe, como regra, parcos salários, não se podendo imaginá-lo hábil a satisfazer créditos tributários “robustos”. Ademais, proteger-se-ia o contribuinte desonesto, com um verdadeiro escudo, na pessoa do servidor. Assim, a responsabilidade mais consentânea com o ideal de justiça deve ser a solidária, a fim de se dar azo à eventual responsabilização do sujeito passivo originário. 9.6 Responsabilidade por infrações (art. 136 do CTN) Art. 136 do CTN: “Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”. É imperioso registrar, de início, que o tema adstrito aos ilícitos tributários foi aqui tratado, no bojo do tema “responsabilidade tributária”, o que denota certa inexatidão didática. O tema “responsabilidade por infrações” não tem nada a ver com sujeição passiva indireta, sendo responsabilidade em acepção peculiar e diversa: a sujeição de alguém às consequências dos seus atos praticados. Traduz-se, sim, na aplicação da máxima “se cometo uma infração, ‘respondo’ por ela”. A responsabilidade por infrações no direito tributário (descumprimento de obrigações tributárias principais e acessórias, traduzível, normalmente, em penas pecuniárias) é, em princípio, de consideração puramente objetiva – teoria da responsabilidade objetiva. Prescindindo da ideia de culpa, responsabiliza-se quem quer que tenha praticado o ato ilícito e, por fim, desconsideram-se circunstâncias que excluam ou atenuem a punibilidade. Com isso, facilita-se a aplicação de penalidades, pois a autoridade fiscal passa a prescindir de provas da 92 intenção do infrator. Interessam, destarte, a prática e a autoria da infração (a “conduta formal”, para Aliomar Baleeiro), sendo irrelevante o nexo psicológico entre o agente e o resultado. Exemplos: a) em uma circulação de mercadoria sem nota fiscal, se o contribuinte escriturou a saída e recolheu o imposto, a falha persistiu e, por ela, independentemente de sua intenção (se houve dolo ou culpa), o omisso responderá; b) em virtude de dificuldades financeiras momentâneas, se o contribuinte vê-se em estádio de inadimplência tributária, o descumprimento obrigacional será punível, ainda que exista eventual motivo para a sua prática. Portanto, a regra geral é considerar a infração fiscal de modo objetivo, e não “subjetivo”. Há, todavia, uma ressalva adstrita à possibilidade de edição de lei ordinária – constante da expressão inicial “salvo disposição de lei em contrário (...)” –, que permitirá disciplinamento diverso ao tema ora analisado. Assim, nada obsta a que uma lei ordinária defina infrações somente puníveis na modalidade “subjetiva”, isto é, exigindo-se a demonstração de dolo ou culpa, a fim de se aplicar a penalidade. Sendo a lei omissa, aplica-se a regra geral – a da responsabilidade objetiva. Diga-se, pois, que o Código Tributário Nacional, ao adotar o princípio da responsabilidade objetiva, afasta o que é tradicional no direito penal brasileiro – o princípio da responsabilidade subjetiva, em que a imputabilidade depende da subjetividade. Ademais, sabe-se que a penalidade não deve passar da pessoa do infrator (art. 5.º, XLV, da CF). Entretanto, é possível questionar: a multa fiscal é pena ou não? É assente que toda multa fiscal tem sempre caráter penal. No entanto, as ocorrências de uma infração tributária pressupõem, no mínimo, a culpabilidade do agente. Por isso, a legislação tributária alberga o princípio da verdade material em alguns dispositivos, em razão do qual os fatos favoráveis ao contribuinte devem ser considerados, como no caso dos arts. 112 (interpretação benigna) e 108, § 2.º, (utilização da equidade), ambos do CTN. Ademais, a responsabilidade objetiva não pode afastar a consideração do fator volitivo, na tipificação da infração, à evidência de provas nos autos. Dir-se-ia que o contribuinte não pode ser punido quando agiu com boa-fé, sem querer ludibriar o Fisco, mas em virtude de razões que escaparam a seu controle. Seria a possibilidade – já chancelada por Ruy Barbosa Nogueira – de aplicação do princípio da boa-fé, na tentativa de excluir a imposição de multa. Art. 137 do CTN: “A responsabilidade é pessoal ao agente: I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito; II – quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar; 93 III – quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico: a) das pessoas referidas no art. 134, contra aquelas por quem respondem; b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores; c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas”. No direito tributário, como regra, as punições não são aplicadas pessoalmente sobre o agente da infração, mas sobre o sujeito passivo da obrigação tributária, principal ou acessória, que não foi adimplida. Todavia, o artigo ora analisado traz importantes exceções a esta regra, determinando punição pessoal e afastando o sujeito passivo da infração. Mais do que simples exceções, o dispositivo, outrossim, indica uma ressalva à responsabilidade objetiva – responsabilidade pessoal do agente infrator, deslocando para este, o executor material, o polo da responsabilidade por infração. Aqui, há a personalização das penas tributárias, prevalecendo a responsabilidade pessoal do agente, isto é, de quem comete a infração. Nesse passo, frise-se que a responsabilidade exclusiva do agente se liga aos efeitos das infrações (multas), permanecendo o sujeito passivo responsável pelo tributo devido quanto à obrigação realizada. Vamos ao aprofundamento do artigo supramencionado: Análise do Inciso I – Infrações tributárias conceituadas por lei como crimes ou contravenções O dispositivo é lógico, à luz do que ensina a doutrina do direito penal: se a infração é tão grave a ponto de ser tipificada como crime ou contravenção, afasta-se a responsabilização da pessoa jurídica, atingindo-se as pessoas físicas dos dirigentes, até mesmo com a aplicação de pena privativa de liberdade (Lei 8.137/1990). Não raras vezes, os fatos que são crimes tributários são também infrações fiscais, implicando sanções penais (pelo juiz, no processo judicial) e sanções fiscais (pela autoridade administrativa, no processo administrativo). Com efeito, a responsabilização criminal da pessoa jurídica – uma realidade nos sistemas penais alemão e português – não está prevista no Brasil, não obstante a possibilidade em legislação esparsa (Exemplo: Lei 9.605/1998, para crimes ambientais). Note, portanto, o exemplo da regra: se uma empresa importadora comete infração à legislação aduaneira tipificada como crime ou contravenção (infração penal cometida por intermédio ou em benefício da pessoa jurídica), a responsabilidade é exclusiva da pessoa natural que tiver cometido a infração aduaneira que constitua crime. A regra, entretanto, pode ser excepcionada, em duas situações: a) caso o agente prove ter agido no “regular exercício da administração”. Embora pareça estranho alguém estar no regular exercício de gestão e cometer crime ou contravenção, a melhor exegese do instituto parece estar adstrita à ideia de que o agente, sendo mero portador da vontade da empresa (e de seus sócios) e vindo a agir de modo tal que provoque a tipificação penal, não pode ser responsabilizado, mas a própria empresa; b) caso o agente prove ter agido no cumprimento de “ordem expressa emitida por quem de direito”. Nesse caso, a responsabilidade incide sobre quem ordenou a ação ou omissão. 94 Análise do Inciso II – Infrações tributárias em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar Conforme se estudou há pouco, as infrações tributárias não possuem o “elemento subjetivo”. Todavia, nada obsta a que a lei tributária venha ostentar elemento subjetivo na figura infracional – dolo, culpa ou, até mesmo, dolo específico, isto é, o fim especial almejado pelo agente na prática da infração (“específico”, na acepção de elemento, parte ou componente). No dolo específico, o agente se manifesta deliberadamente na consecução do resultado (dolo genérico), porém com finalidade especial em mente (dolo específico). Um exemplo possível de tal situação seria o extravio de documento fiscal, com o fim de ocultar do Fisco uma situação tributável. Posto isso, sempre que a formatação da infração depender de um intuito especial do agente na prática do ilícito, ter-se-á como elementar o dolo específico, e a punição será pessoal no agente. Análise do Inciso III – Infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico dos representantes contra seus representados O dispositivo anuncia a possibilidade de infração cometida pelos gestores de interesses dos representados, na deliberada intenção de prejudicá-los e, com isso, colherem vantagem indevida. Nesse caso, a pessoa jurídica ou o representados, sendo vítimas do agente, deflagram a responsabilização pessoal deste, e não a do sujeito passivo. Abrange os “ilícitos civis contra terceiros”, segundo o ilustre doutrinador Luciano Amaro. São atos praticados por pessoas que agem em nome e por conta daqueles. 9.6.1 denúncia espontânea (art. 138 do CTN) Art. 138 do CTN: “A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração”. O instituto da denúncia espontânea ou confissão espontânea permite que o devedor compareça à repartição fiscal, opportuno tempore, a fim de noticiar a ocorrência da infração e pagar tributos em atraso, se existirem, em um voluntário saneamento da falta. Não se trata de ato solene, nem a lei exige que ela se faça desta ou daquela forma. Trata-se de possibilidade legal para que o infrator se redima, confessando a violação ao Fisco. Apresenta-se similitude com a desistência voluntária e com o arrependimento eficaz, ambos do direito penal. 95 O fim inspirador da denúncia espontânea é retirar o contribuinte da indesejada via da impontualidade, afastando a aplicação de multa. Assim, não se vedam os “juros” e a “correção monetária”, até porque esta integra o valor do tributo, enquanto aqueles, despidos de fins punitivos, compõem o traço remuneratório do capital. Uma instigante questão, entretanto, sempre vem à baila: a confissão excluiria qual multa? A moratória ou a punitiva? Repare que a exclusão da responsabilidade dar-se-á quando o contribuinte levar a conhecimento do Fisco, antes de qualquer procedimento fiscal iniciado, a ocorrência de infração e, se for o caso, o pagamento de eventual tributo devido. Trata-se do Termo de Início de Fiscalização, mencionado no art. 196 do CTN, formalizando o início do procedimento de verificação e, consequentemente, excluindo a espontaneidade do infrator. O referido Termo, geralmente lavrado com data e hora indicadas, afasta qualquer tentativa de confissão espontânea, ainda que a fiscalização perdure por razoável período. Entretanto, é importante enaltecer que a espontaneidade fica prejudicada com relação ao tributo objeto da fiscalização, podendo ser levada a efeito, por sua vez, com relação a dívidas tributárias diversas – tributos diversos ou, até mesmo, o próprio tributo fiscalizado, porém relativo a período de apuração distinto. Não perca de vista que o art. 138 do CTN comporta similitude com o instituto da consulta fiscal que, enquanto pendente, mantém o contribuinte-consulente a salvo de penalidades pecuniárias (art. 161, § 2.º, do CTN). Por fim, a doutrina tem entendido que, sendo o art. 138 incompatível com qualquer punição, a autodenúncia seria igualmente hábil a extinguir a punibilidade das infrações, na seara criminal. A contrario sensu, em linguagem figurada, dar o “perdão” administrativo com uma mão e efetuar a “prisão” do infrator com a outra seria, no mínimo, desleal, para não falar incompatível com a ideia de Estado de Direito. EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1. (Procurador da Fazenda Nacional – 2003 - ESAF) O espólio é pessoalmente responsável pelos tributos devidos pelo de cujus até a data da abertura da sucessão, ainda que os correspondentes créditos tributários da Fazenda Pública estejam em curso de constituição àquela data e se refiram a fatos geradores de obrigação tributária do de cujus, ocorridos nos últimos cinco anos anteriores à abertura da sucessão. 2. (JUIZ / PI - 2002) Na substituição tributária, a responsabilidade pelo pagamento do tributo é do substituto e exclui a do substituído. 3. (Procurador da Fazenda Nacional – 2003 - ESAF) A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato, subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar, dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão. 96 4. (Procurador da Fazenda Nacional – 2003 - ESAF) O adquirente responde solidariamente com o alienante pelos créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, salvo quando conste do título a prova de sua quitação. 5. (Procurador da Fazenda Nacional – 2003 - ESAF) O síndico de massa falida é solidariamente responsável com ela pelos créditos tributários correspondentes a obrigações tributárias que resultem de atos praticados por ele, no exercício de suas funções, com excesso de poderes ou infração de lei. 6. (ESAF/AFTN/98) Crédito referente à taxa de prestação de serviços, não quitada, relativa a imóvel transferido sub-roga-se no adquirente. 7. (ESAF/AFTN/98) Responsabilidade dos pais por obrigação tributária principal de filho menor por atos em que intervierem é caso de responsabilidade solidária. 8. (ESAF/AFTN/98) Responsabilidade tributária decorrente de ato do procurador, praticado extra vires, isto é, além dos poderes que lhe foram conferidos é caso de responsabilidade pessoal. 9. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998 - ESAF) A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável por sucessão pelos tributos cujos fatos geradores ocorrerem a partir da data do ato, e as pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas, são responsáveis exclusivas pelos tributos devidos até essa data. 10. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998 - ESAF) Na liquidação de uma sociedade em nome coletivo, há responsabilidade dos sócios-gerentes pelas dívidas relativas a seus atos, mas esta é limitada à proporção de sua participação no capital social. 11. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998 - ESAF) A responsabilidade do agente, por infrações, depende da existência do elemento subjetivo (dolo ou culpa), salvo disposição de lei em contrário. 12. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998 - ESAF) Segundo decorre do Código Tributário Nacional (CTN), a lei não pode atribuir de modo implícito a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, nem a quem seja desvinculado do fato gerador da respectiva obrigação. 13. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998 - ESAF) O disposto na Seção da Responsabilidade dos Sucessores, no CTN, restringe-se aos créditos tributários definitivamente constituídos ou em curso de constituição à data dos atos nela referidos, não se aplicando aos constituídos posteriormente aos mesmos atos, ainda que relativos a obrigações tributárias surgidas até a referida data. 97 14. Se a União é credora de determinado tributo e Joaquina, devedora dele, deixa de cumprir a prestação que lhe cabia, é a partir desse momento, em que há o descumprimento da obrigação tributária, que se podem aplicar as diferentes figuras da responsabilidade tributária, se couberem. 15. Configurando-se hipótese em que o responsável tributário é chamado a cumprir a obrigação não-satisfeita pelo devedor primitivo, ainda assim o crédito tributário e sua garantia serão os mesmos, pois não surge novo crédito tributário nessa situação. 16. Cabe exclusivamente à legislação tributária definir os casos de responsabilidade tributária. 17. Assim como para o devedor originário - o contribuinte -, o vínculo jurídico que impõe ao responsável o cumprimento da obrigação tributária surge para este com o fato gerador. 18. Se Júlio adquirir de Carina uma empresa com débitos junto ao Fisco cujos respectivos créditos tributários estão ainda em fase de constituição, não poderá vir a ser responsabilizado por eles, em razão justamente de os créditos não estarem definitivamente constituídos. 19. Uma empresa que industrializa cerveja, estabelecida no estado de Goiás, vendeu para uma distribuidora, estabelecida no Distrito Federal (DF), mil caixas de cerveja. Existindo convênio anterior, calcado em leis que atribuem a terceiros a responsabilidade tributária pelo pagamento do ICMS entre o estado de Goiás e o DF, é constitucional, na visão do STF, a cobrança antecipada do tributo do ICMS no estado de Goiás e caberia à distribuidora no DF o seu recolhimento, no momento em que realizasse a operação mercantil de venda. 20. O fenômeno da cobrança antecipada do ICMS pelo responsável tributário é conhecido como substituição tributária para trás. 21. A substituição tributária, para frente ou para trás, conforme diversas decisões do STF, não tem amparo constitucional, visto que se trata de fato gerador presumido. 22. A lei ordinária poderá atribuir responsabilidade a terceiros pelo pagamento de taxas e impostos, cujo fato gerador deva ocorrer a posteriori, conforme disciplinou a Constituição da República. 23. A substituição tributária para frente, prevista constitucionalmente, garante a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido. 24. (Auditor Fiscal – Bahia) A técnica de recolhimento do ICMS pelo contribuinte antes da ocorrência do fato gerador, constitucionalmente prevista, configura hipótese de substituição tributária com antecipação de receita. 98 25. (Procurador da Fazenda Nacional - ESAF) O remitente, quanto aos tributos relativos aos bens remidos, é pessoalmente responsável. 26. (Procurador da Fazenda Nacional – 2004 - ESAF) Segundo o entendimento atualmente dominante no STF, o fato gerador presumido não é provisório, mas sim definitivo, não dando ensejo à restituição ou complementação do imposto pago, senão, no primeiro caso, na hipótese de sua não-realização final. 27. (Procurador da Fazenda Nacional – 2004 - ESAF) Instituto que atende ao princípio da praticabilidade da tributação, a substituição tributária pode ser: regressiva, ou para trás, tendo por efeito o diferimento do tributo; e progressiva, ou para frente, pressupondo a antecipação do fato gerador, calculando-se o tributo devido de acordo com uma base de cálculo estimada. 28. (Procurador da Fazenda Nacional – 2004 - ESAF) A substituição tributária progressiva, ou para frente, é técnica de tributação introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 2003, e regulamentada pela Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. 29. (Fiscal INSS – 1988) Cabe exclusivamente à legislação tributária definir os casos de responsabilidade tributária. 30. (Fiscal INSS – 1988) Qualquer pessoa, independentemente de sua relação com o fato gerador da obrigação tributária, pode ser apontada pela lei como responsável tributário. 31. (Fiscal INSS – 1988) Assim como para o devedor originário – o contribuinte –, o vínculo jurídico que impõe ao responsável o cumprimento da obrigação tributária surge para este com o fato gerador. 32. (Fiscal INSS – 1988) A responsabilidade tributária por sucessão pode ocorrer ‘inter vivos’ ou ‘mortis causa’. 33. (Fiscal INSS – 1988) Se Carla adquirir de Constantino um estabelecimento comercial, pode tornar-se responsável pelos débitos tributários decorrentes da atividade desenvolvida pelo proprietário anterior, ainda que não tenha tido nenhuma participação nos fatos que deram causa à obrigação tributária. 34. (Fiscal INSS – 1988) Se Demóstenes adquire imóvel em hasta pública, pode, em tese, sujeitar-se a caso de responsabilidade tributária por sucessão imobiliária. 35. (Fiscal INSS – 1988) Considere a seguinte situação: Marcos é devedor de tributos. Por não pagá-los, é processado pelo fisco, que obtém a decretação da penhora de um imóvel de propriedade do executado. No curso do processo, Lídia, mãe do devedor, resolve resgatar a dívida, por meio de remição. Na situação apresentada, Lídia, a remitente, responsabilizar-se-á pelos tributos incidentes sobre o bem remido. 99 36. (Fiscal de Rendas – RJ – 2002) Em sede de responsabilidade de terceiros, pode-se identificar como pressupostos o não cumprimento da obrigação pelo contribuinte e ter o terceiro participado do ato que resultou no fato gerador do tributo, ou que em relação ao fato tenha se omitido. 37. (Fiscal de Rendas – RJ – 2002) A respeito da responsabilidade por infrações à legislação tributária, pode-se dizer que é objetiva, salvo disposição de lei em contrário. 38. (AFRF – 2000 – ESAF) O Código Tributário Nacional chama de “contribuinte” quem tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador da obrigação tributária principal, e de “responsável” quem, sem revestir aquela condição, tenha obrigação decorrente de disposição expressa de lei. Em ambos os casos, recebe o nome de “sujeito passivo” da obrigação tributária principal. 39. (AFRF – 2002 – ESAF) O imposto territorial rural incidente sobre um imóvel, em cujo título aquisitivo conste ter sido quitado, não se sub-roga na pessoa do respectivo adquirente. Aliás, nesse caso, o tabelião em cujas notas foi feita a escritura responde pelo imposto. 40. (AFRF – 2002 – ESAF) A incorporação de uma instituição financeira por outra, a bem da segurança do sistema financeiro, e mediante o assentimento da autoridade competente, extingue as obrigações da incorporada. 41. (Fiscal do INSS – 1997 – CESPE) De acordo com o CTN, há responsabilidade solidária dos tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofícios, pelos tributos devidos relativos aos atos praticados por eles, em razão do ofício, no caso de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte. 42. (Fiscal do INSS – 1997 – CESPE) De acordo com o CTN, há responsabilidade pessoal dos mandatários, prepostos, empregados, diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas de direito privado, pelos tributos por estas, quando aqueles agirem com excesso de poderes ou com infração de lei, do contrato social ou dos estatutos. GABARITO: 1. CERTO 22. CERTO 2. CERTO 23. CERTO 3. CERTO 24. CERTO 4. ERRADO 25. CERTO 5. ERRADO 26. CERTO 6. CERTO 27. CERTO 7. CERTO 28. ERRADO 100 8. CERTO 29. ERRADO 9. ERRADO 30. ERRADO 10. ERRADO 31. ERRADO 11. ERRADO 32. CERTO 12. CERTO 33. ERRADO 13. ERRADO 34. ERRADO 14. ERRADO 35. CERTO 15. CERTO 36. CERTO 16. ERRADO 37. CERTO 17. ERRADO 38. CERTO 18. ERRADO 39. CERTO 19. CERTO 40. ERRADO 20. ERRADO 41. CERTO 21. ERRADO 42. CERTO 10. Crédito Tributário. Conceito. 10.1. Crédito tributário (art. 139 do CTN) O crédito tributário representa o momento de exigibilidade da relação jurídico-tributária. Seu nascimento ocorre com o lançamento tributário (art. 142 do CTN), o que nos permite defini-lo como uma obrigação tributária lançada ou obrigação tributária em estado ativo. Com efeito, o lançamento é o instrumento que confere a exigibilidade à obrigação tributária, quantificando-a (aferição do quantum debeatur) e qualificando-a (identificação do an debeatur). Portanto, pode-se asseverar que a relação jurídico-tributária, vista pelas “lentes” do contribuinte, ganha o status de obrigação tributária. De outro lado, se vista pelas “lentes” do Fisco, passa a denominar-se crédito tributário. As- sim, o lançamento é o instrumento capaz de conferir ao Fisco a percepção do importe tributário a que tem direito, em face da ocorrência do fato gerador que o antecede. 101 11. Constituição do Crédito Tributário. 11.1 Lançamento. Modalidades de Lançamento O Lançamento (art. 142 c/c art. 3º, in fine, ambos do CTN) É ato documental de cobrança, por meio do qual se declara a obrigação tributária nascida do fato gerador. Deste conceito deflui a natureza declaratória do lançamento, que opera efeitos ex tunc, em abono ao princípio da irretroatividade, segundo o qual a lei deve anteceder os fatos geradores aos quais ela se refere. É mister destacar que o fato gerador, por sua vez, opera efeitos ex nunc, caracterizando-se como ato que cria direitos e deveres, portanto, ato constitutivo. Daí se falar, com tranquilidade, na natureza jurídica mista para o lançamento. Art. 3.º do CTN: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Sobre o lançamento, vale destacar que se trata de ato administrativo vinculado (não discricionário), uma vez que deve ser balizado pela lei, e não por critérios adstritos à oportunidade e à conveniência. Ademais, o lançamento é ato administrativo não autoexecutório, por não ser veiculado pela coerção humana, mas por trâmites administrativos de cobrança, despidos de coercibilidade. Caso não seja adimplida a obrigação tributária, não se poderá valer a Fazenda Pública de métodos forçosos de pagamento, mas de pretensão judicial lastreada na ação de Execução Fiscal. Por derradeiro, insta esclarecer que o lançamento é ato privativo do Fisco, sempre. O que pode ocorrer, em seu processamento, é um auxílio maior ou menor do contribuinte no ato de lançar, que, insistimos, é ato privativo do Fisco. Vejamos, assim, as espécies de lançamento, no CTN: a) lançamento direto, de ofício ou ex officio (art. 149, I). b) lançamento misto ou por declaração (art. 147). c) lançamento por homologação ou autolançamento (art. 150). É imperioso repisar que a espécie de lançamento é determinada conforme o auxílio do contribuinte no ato de lançar. Vamos detalhar as espécies de lança- mento: Lançamento direto ou de ofício É aquele em que o Fisco, dispondo de dados suficientes para efetuar a cobrança, realiza-o, dispensando o auxílio do contribuinte. 102 Exemplos: IPTU (lançamento de ofício, por excelência), IPVA, taxas e contribuição de melhoria. Lançamento misto ou “por declaração” É aquele representado pela ação conjugada entre o Fisco e o contribuinte, restando àquele o trabalho privativo de lançar. O Fisco, não dispondo de dados suficientes para realizar o lançamento, conta com o auxílio do contribuinte que supre a deficiência da informação por meio de declaração prestada. Exemplos: o imposto de importação e o imposto de exportação (maior frequência, em ambos). Lançamento por homologação ou “autolançamento” É aquele em que o contribuinte auxilia ostensivamente a Fazenda Pública na atividade do lançamento, cabendo ao Fisco, no entanto, realizá-lo de modo privativo, homologando-o, isto é, conferindo sua exatidão. Exemplos: ICMS, IR, IPI, PIS, COFINS, CSLL, entre tantos outros tributos, representando o maior volume de arrecadação. Crédito tributário e decadência 11.1.1 Introdução A decadência aplicada ao sistema tributário, à luz do CTN, tem sido motivo de grande polêmica e gerado incontáveis incompreensões, na doutrina e na jurisprudência, sobretudo do STJ. Em regra geral, a decadência (do latim cadeus, de cadere, na acepção de “perecer, cair ou cessar”) é uma forma extintiva de direito subjetivo (do sujeito ativo), constante numa relação jurídica de direito material (substantivo ou substancial). O direito subjetivo é a faculdade do sujeito de exercer uma conduta, diante da ocorrência de um fato. Enquanto o direito objetivo refere-se às normas jurídicas, o direito subjetivo, na ótica tributária, atrela-se à faculdade do sujeito ativo de agir em direção ao sujeito passivo, com o fito de proceder ao lançamento. O instituto em comento visa atacar, desse modo, o próprio direito, promovendo seu decaimento ou seu perecimento, o que obsta a constituição do crédito tributário pelo Fisco (art. 156, V, do CTN). Essa é a razão por que a Fazenda não está inibida de proceder ao lançamento, prevenindo a decadência do direito de lançar, mesmo que haja a suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Por- tanto, a simples suspensão do crédito tributário (art. 151, I a VI, do CTN) não impede a sua constituição e, desse modo, não influi no prazo decadencial. Há iterativa jurisprudência nesse sentido no STJ. 103 A decadência nasce em razão da omissão ou inanição do sujeito ativo no exercício da faculdade de proceder ao lançamento e, a partir desse momento, interrompe o processo de positivação do direito tributário. O prazo de decadência existe para que o sujeito ativo constitua o crédito tributário com presteza, não sendo atingido pela perda do direito de lançar. A constituição do crédito tributário ocorre por meio do lançamento, segundo o art. 142 do CTN, que deve se dar em um interregno de 5 anos. Por fim, é importante mencionar que está garantido o direito à restituição para tributo pago a maior ou indevidamente, já atingido pela decadência. De fato, quando se tem o decaimento do direito de lançar, perece a relação jurídica obrigacional, extinguindo-se o próprio direito material, não mais existindo a dívida. Sendo assim, havendo o pagamento de um tributo atingido pela decadência, desponta o direito à restituição, uma vez que se pagou o que não mais se devia. Tal entendimento pode ser corroborado no art. 156, V, do CTN, segundo o qual a decadência – e a prescrição – extingue o crédito tributário, o que dá franco direito à restituição. Daí se afirmar, nesse passo, que a prescrição, de igual modo, gera o direito à restituição, embora haja vozes no sentido de que, na prescrição, extinto estaria apenas o direito de ação, sobrevivendo o direito material de que era titular o sujeito pretensor. Parece-nos que a melhor solução está na garantia da restituição tanto para aquele que paga crédito decaído quanto para aquele que procede ao pagamento de crédito prescrito. No intuito de facilitar o estudo, que ora se inicia, quanto à decadência, faz-se mister estabelecermos algumas premissas, já apontadas: (a) a decadência atinge o direito subjetivo do sujeito ativo, constante numa relação jurídica de direito material, substantivo ou substancial; (b) a decadência decorre sempre de lei; (c) à decadência, aplicam-se os princípios da legalidade e da segurança jurídica; (d) antes do lançamento, somente ocorre a decadência; (e) ocorrendo a decadência, não se opera a prescrição; (f) é possível a restituição de tributo atingido pela decadência. 11.2 Hipóteses de alteração do lançamento. O artigo em apreço deverá ser aplicado nos casos em que houver a anulação do lançamento anteriormente realizado. Art. 173 do CTN: “O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: (...) II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.” Nessa situação, o Fisco procede ao lançamento, permitindo-se impugnação do sujeito passivo, quanto a vício formal. Assim, após a decisão definitiva que anular o lançamento originário, reabre-se o prazo de cinco anos para que se faça novo lançamento. 104 A doutrina, majoritariamente, tem entendido que tal decisão pode ser administrativa ou judicial (ver José Eduardo Soares de melo, Luciano Amaro, Hugo de Brito machado Segundo, entre outros). Ressalte-se que o comando se refere a vício formal – aquele inerente ao procedimento do lançamento, desde a atividade de fiscalização até a notificação do lançamento ao sujeito passivo –, e não a insubsistências do lançamento por vícios de índole “material”. Estes dizem com a substância da obrigação tributária, com a validade e com a incidência da lei, v.g., inexistência de fato gerador, atribuição de responsabilidade a quem legalmente não a tenha, situações de imunidade, de isenção etc. Portanto, há que se diferenciar o vício de natureza formal (adjetivo) daquele de natureza material (substantivo). São exemplos de vícios formais: insuficiência/ausência na fundamentação no lançamento; ausência de assinatura da autoridade fiscal etc. Caso Prático: uma empresa foi autuada em novembro de 1997, evidenciando-se que o lançamento se realizou com vícios formais (os auditores- fiscais, por um lapso, não intimaram o representante legal da contagem dos estoques da autuada e não concederam o prazo legal para a apresentação de documentos). Na ocasião, a empresa, inconformada, ajuizou uma ação anulatória de débito fiscal, cuja decisão transitou em julgado no dia 10 de junho de 2002, tendo o Juízo decidido pelo cancelamento da autuação em razão dos mencionados vícios formais. Sabendo-se que, em 20 de abril de 2007, a empresa recebeu nova autuação referente à mesma irregularidade cometida, pergunta-se: a Fazenda teria decaído do direito de efetuar o lançamento? Não, pois a contagem da decadência será feita a partir da data da decisão definitiva, isto é, 10 de junho de 2002, permitindo-se que o segundo lançamento ocorra até 10 de junho de 2007. Como se lançou em 20 de abril de 2007, não há que se falar em decadência. Todavia, não obstante a clareza do cálculo, tem subsistido infindável controvérsia acerca do preceptivo, quanto à seguinte dúvida: “Este artigo prevê hipótese de interrupção de prazo decadencial?” Há posicionamento, na doutrina e na jurisprudência, segundo o qual a decadência não se interrompe nem se suspende, correndo o prazo decadencial sem solução de continuidade (ver, na doutrina: Ives Gandra Martins, Vittorio Cassone, Fabio Fanucchi, Hugo de Brito machado, Kiyoshi Harada, entre outros. Na jurisprudência: STJ, REsp 332.366/02). De outra banda, defende-se a ideia de que a decadência, não se compaginando com as peculiaridades do instituto privatístico, admite, sim, interrupção. Nessa esteira, seguem: José Eduardo Soares de Melo, Alcides Jorge Costa, Ricardo Lobo Torres, Paulo de Barros Carvalho, Luciano Amaro, entre outros. O ilustre doutrinador Luciano Amaro, aliás, aponta até mesmo a coexistência, à luz do inciso ora analisado, de um prazo suspensivo (o prazo não flui na pendência do processo em que se discute a nulidade do lançamento) e de um prazo interruptivo (o prazo recomeça a correr do início, desprezando-se o espaço de tempo já atingido no momento em que ocorreu o lançamento nulo). 105 É certo, todavia, que a regra estudada – se norma interruptiva ou não –, conferindo excessiva elasticidade ao prazo, tende a beneficiar o erário no seu próprio erro, sendo de uma irracionalidade gritante. Mesmo que se leve em conta a supremacia do interesse público sobre o particular, não seria despiciendo asseverar que o dispositivo premia a desídia e imperícia governamentais e enaltece o administrador incompetente, prestigiando o desacerto. Não é à toa que se tem mantido tom severamente crítico, entre os estudiosos, quanto ao preceptivo ora estudado: Alcides Jorge Costa considera o dispositivo “infeliz”, enquanto, para Luciano Amaro, “o preceito legal é um dislate, que causa arrepios na doutrina e contém uma solução estapafúrdia.” (ver Costa, Alcides Jorge. Da extinção das obrigações tributárias. Tese de titularidade, São Paulo, FADUSP, 1991 e Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro. 10. ed. São Paulo: Saraiva. 2004, p. 395). 12. Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário. Modalidades. Quadro Sinóptico SUSPENSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – art. 151 do CTN III III - Moratória; Depósito do Montante Integral; Reclamações e Recursos Administrativos; IV - Concessão de Liminar em Mandado de Segurança; V- Concessão da Tutela Antecipada em outras Ações; VI - Parcelamento. OBSERVAÇÃO: “moderecopa” (palavra mnemônica) 12.1 Moratória A moratória está regulada de modo exaustivo nos arts. 152 a 155-A do CTN – o que é demasiado curioso, em razão da ausência de disciplinamento no CTN, com relação às demais causas suspensivas. Essa é a razão pela qual nos ateremos ao assunto com certa parcimônia. 106 Conquanto o CTN não conceitue o instituto, é possível afirmar que a mora- tória é uma dilatação legal de pagamento, submetendo-se, portanto, ao princípio da estrita legalidade (art. 97 VI, do CTN). Sua efetiva aplicação se deu antes da LC 104/2001 – instrumento normativo que introduziu o parcelamento no Código, conforme o art. 151 VI, do CTN – quando se via na moratória a forma mais comum de parcelamento. A moratória deve ser concedida por lei ordinária, permitindo-se ao sujeito passivo que pague o tributo em cota única, porém, de modo prorrogado. Todavia, diga-se que não se exige para a concessão do favor ora em estudo a “lei específica”, prevista no art. 150, § 6.º, da CF, em cujo rol constam dispensas, como subsídios, isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia e remissão. O interessante é que o parcelamento, a ser estudado adiante, exige lei específica, nos termos do art. 155-A, do CTN, embora não mencionado no rol constitucional supracitado. Art. 152: “a moratória somente pode ser concedida: I – em caráter geral: a) pela pessoa jurídica de direito público competente para instituir o tributo a que se refira; b) pela união, quanto a tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos municípios, quando simultaneamente concedida quanto aos tributos de competência federal e às obrigações de direito privado; II – em caráter individual, por despacho da autoridade administrativa, desde que autorizada por lei nas condições do inciso anterior. Parágrafo único. A lei concessiva de moratória pode circunscrever expressamente a sua aplicabilidade a determinada região do território da pessoa jurídica de direito público que a expedir, ou a determinada classe ou categoria de sujeitos passivos”. O artigo 152 classifica a moratória em caráter: a) geral: aquela concedida por lei, sem necessidade de despacho da autoridade administrativa; b) individual: benefício cujo direito ao favor será reconhecido por despacho da autoridade administrativa, desde que autorizada por lei. Entre as “moratórias em caráter geral”, temos dois tipos: • Moratória autonômica ou autônoma (art. 152, I, a) – aquela concedida pelo ente detentor da competência tributária respectiva (Exemplo: moratória de IPTU concedida por município). É a regra; • Moratória heterônoma (art. 152, I, b) – aquela concedida pela união, quanto a tributos de competência dos Estados, Distrito Federal e municípios. Trata-se de possibilidade excepcional, 107 inédita e condicional (a União deve conceder, simultaneamente, a moratória dos próprios tributos federais e das obrigações de direito privado, como condição à perpetração da moratória heterônoma). Não perca de vista que o legislador constituinte veda, como regra, as isenções heterônomas (art. 151, III, da CF) e que tal possibilidade no CTN – inoperante e esdrúxula – parece violar o princípio federativo na Constituição Federal. O art. 152, parágrafo único, indica a possibilidade de se conceder moratória de modo total (para toda a base territorial da entidade impositora) ou parcial (para parte do território, v.g., moratória “circunscrita” à determinada região atingida por calamidade). Para a concessão da moratória, devem-se cumprir os requisitos obrigatórios, conforme o art. 153, I e II, do CTN (prazo e condições do favor) e facultativos, segundo o art. 153, III, do CTN (indicação dos tributos a que se refere, do número de prestações e seus vencimentos e garantias a serem oferecidas). Os arts. 153 e 154 do CTN dispõem: “Art. 153. A lei que conceda moratória em caráter geral ou autorize sua concessão em caráter individual especificará, sem prejuízo de outros requisitos: I – o prazo de duração do favor; II – as condições da concessão do favor em caráter individual; III – sendo caso: a) os tributos a que se aplica; b) o número de prestações e seus vencimentos, dentro do prazo a que se refere o inciso I, podendo atribuir a fixação de uns e de outros à autoridade administrativa, para cada caso de concessão em caráter individual; c) as garantias que devem ser fornecidas pelo beneficiado no caso de concessão em caráter individual. Art. 154. Salvo disposição de lei em contrário, a moratória somente abrange os créditos definitivamente constituídos à data da lei ou do despacho que a conceder, ou cujo lançamento já tenha sido iniciado àquela data por ato regularmente notificado ao sujeito passivo. Parágrafo único. A moratória não aproveita aos casos de dolo, fraude ou simulação do sujeito passivo ou do terceiro em benefício daquele”. Diga-se que a moratória, conforme o art. 154, aplica-se a créditos já definitivamente constituídos ou, pelo menos, cujo lançamento já tenha sido iniciado. Esta regra admite ressalva (“salvo disposição em contrário”, constante do artigo), dando ensejo à possibilidade de concessão do favor aos tributos lançados por homologação. O art. 155 menciona a possibilidade de anulação da moratória individual – favor que não gera direito adquirido –, não obstante a criticável terminologia do CTN, que utilizou o termo “revogação”. Como é sabido, “revoga-se” ato discricionário, e a moratória é favor legal, passível de anulação ou cassação. Observe o artigo: 108 “A concessão da moratória em caráter individual não gera direito adquirido e será revogado de ofício, sempre que se apure que o beneficiado não satisfazia ou deixou de satisfazer as condições ou não cumprira ou deixou de cumprir os requisitos para a concessão do favor, cobrando-se o crédito acrescido de juros de mora: I – com imposição da penalidade cabível, nos casos de dolo ou simulação do beneficiado, ou de terceiro em benefício daquele; II – sem imposição de penalidade, nos demais casos. Parágrafo único. No caso do inciso I deste artigo, o tempo decorrido entre a concessão da moratória e sua revogação não se computa para efeito da prescrição do direito à cobrança do crédito; no caso do inciso II deste artigo, a revogação só pode ocorrer antes de prescrito o referido direito”. A análise do artigo nos mostra que o prazo prescricional ficará suspenso – caso o sujeito passivo aja com dolo, submetendo-se, portanto, ao pagamento de tributo, acrescido de juros e multa de ofício – ou não se suspenderá – caso o sujeito passivo não tenha agido com fraude, devendo pagar tão só o tributo e juros. Frise-se que as disposições do art. 155 aplicam-se, igualmente, aos institutos da isenção (art. 179, § 2.º, do CTN), da anistia (art. 182, parágrafo único, do CTN) e da remissão (art. 172, parágrafo único, do CTN). Por fim, urge relembrar que a LC 104/2001 procedeu a uma importante modificação no art. 198, § 3.º, III, do CTN, afeta à moratória e ao parcelamento, segundo a qual não será vedada a divulgação de informações relativas a parcelamento ou à moratória. Com efeito, trata-se de liberalidade conferida pelo legislador à Fazenda, traduzindo-se em prática vexatória e irrazoável do Fisco, ou, até mesmo, modalidade de “cobrança indireta de tributo”. 12.2 Depósito do montante Integral O depósito é modalidade suspensiva bastante comum na via judicial, não o sendo, no entanto, na via administrativa. Ressalte-se, todavia, que a medida Provisória 1.621-30/97 previu a necessidade de depositar 30%, no mínimo, do montante atualizado da dívida, para que se permitisse a protocolização do recurso à segunda instância administrativa federal – é o depósito recursal, aceito, hodiernamente, como constitucional pela jurisprudência majoritária do STJ. Vale lembrar que o legislador ao editar a Lei 10.522/2002, promoveu alterações no § 2º do art. 33 do Decreto 70.235/72, dispensando o contribuinte do depósito prévio em dinheiro para interposição de recurso administrativo, exigindo, porém, arrolamento de bens e direitos equivalentes a 30% do valor da exação fiscal questionada. A orientação, todavia, foi modificada no STF, quando se nota, na ADIN 1.976, que a exigência do depósito ou arrolamento de bens mostra-se como obstáculo sério e intransponível (para consideráveis parcelas da população) ao exercício do direito de petição, sem contar a possível supressão do direito de recorrer, que veicula latente violação ao princípio da proporcionalidade (o julgamento se deu em conjunto nos Recursos Extraordinários (RE) 388.359, 389.383 e 390.513). O STJ tem seguido idêntica direção, quando deixa claro, na 109 Súmula 373, que “é ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso administrativo”. O depósito do montante integral (tributo + juros + multas) é um direito do contribuinte (REsp 196.235/RJ, STJ), que dele se vale visando suspender o crédito tributário. Quanto à integralidade, frise-se que depósito integral não é aquele tido como correto pelo contribuinte depositante, mas o que contempla o montante desejado pelo Fisco. Apenas este será tido como “integral”. A propósito, deve ser veiculado em dinheiro. Assim, o depósito realmente suspensivo do crédito será integral e em dinheiro. (ver Súmula 112 do STJ). A opção do depósito pode se dar, até mesmo, nos casos em que já se tenha havido a suspensão do crédito tributário por outro meio, conforme as possibilidades legais, previstas no art. 151 do CTN. O intuito, neste caso, será o de obstar a fluência dos juros de mora, caso o crédito volte a ser exigível. Ao término da demanda, sobressaindo o depositante como vitorioso, procederá ao levantamento do depósito, mesmo que remanesçam outros débitos tributários a ele imputáveis (REsp 297.115/SP, STJ). De outra banda, vencido o contribuinte, haverá a conversão do depósito em renda do Estado credor, extinguindo-se o crédito tributário (art. 156, VI, do CTN). 12.3 Reclamações e recursos administrativos Representa a possibilidade de suspensão do crédito tributário pela via administrativa. Muito utilizada pelo advogado tributarista, a suspensão do crédito tributário por meio de impugnações e recursos administrativos se mostra bastante atraente por não exigir custas judiciais e, em muitos casos, por se mostrar como o primeiro passo, antes da via judicial, na discussão dos lançamentos tributários efetivados. Não é demasiado enfatizar que, enquanto perdurar a discussão administrativa, quer em grau de impugnação, quer em grau de recurso, o crédito tributário manter-se-á suspenso, permitindo ao contribuinte a obtenção de certidão positiva com efeitos de negativa, consoante o teor do art. 206 do CTN. 12.4 Concessão de Liminar em mandado de segurança O mandado de segurança é remédio constitucional que objetiva proteger direito líquido e certo (provado de plano, por prova documental), violado por ato abusivo de uma autoridade coatora. Trata-se de ação de rito mandamental, tendo como pressupostos, consoante a dicção do inciso III do art. 7º da Lei 12.016/09: a) relevante fundamento do pedido, também conhecido na expressão latina fumus boni juris; b) ineficácia da medida, caso não seja deferida de imediato, também chamada de periculum in mora. Liminar em ação cautelar 110 A propositura de ação cautelar, apesar de não constar expressamente do rol do art. 151 do CTN, representa outro meio judicial que a jurisprudência vem ultimamente aceitando como causa suspensiva do crédito tributário, cuja cobrança o contribuinte considere indevida. Para tanto, o contribuinte deverá pleitear a concessão de medida liminar, e, depois, no prazo legal, promover a competente ação principal, que poderá ser declaratória de inexistência de obrigação tributária ou anulatória de débito fiscal, conforme o caso. 12.5 Concessão de tutela antecipada em outras ações Judiciais À semelhança da liminar, a tutela antecipada é decisão interlocutória, devendo ser concedida initio litis nas ações ordinárias. Possui os seguintes pressupostos autorizadores, conforme o art. 273 do CPC: a) verossimilhança da alegação, em face de uma prova inequívoca; b) fundado receio de dano irreparável. Não há que prevalecer, diga-se de passo, a alegação por parte da Fazenda de que a obtenção de tutela antecipada contra a Fazenda Pública é inconstitucional, uma vez que essa discussão já se encontra superada, em razão da inserção do inciso V ao art. 151 do CTN, trazido pela LC 104/2001. 12.6 Parcelamento Procedimento suspensivo do crédito, caracterizado pelo comportamento comissivo do contribuinte, que se predispõe a carrear recursos para o Fisco, mas não de uma vez, o que conduz tão somente à suspensão do crédito tributário, e não à extinção. Como já se mencionou, caso se requeira certidão negativa, durante a fase em que o crédito estiver abrangido pelos efeitos da suspensão, deve ser ela expedida, em consonância com o art. 206 do CTN, isto é, Certidão Positiva com efeitos de Negativa. Como se nota, o parcelamento constitui forma de pagamento de débitos tributários, após o período de seus vencimentos, normalmente em prestações mensais durante alongado período de tempo, revestindo a natureza de uma moratória sendo distinto da denúncia espontânea (art. 138 do CTN), que impõe o recolhimento integral do tributo. Apresenta-se com características de ato discricionário da atividade administrativa, exsurgindo direito líquido e certo para o contribuinte após ser concedido pela autoridade administrativa (STJ, MS 4.435-DF, 1.ª Seção, rel. min. José Delgado, em 10.11.1997, DJU de 15.12.1997, p. 66.813). É importante conhecer os dispositivos oriundos da LC 104/2001, que se referem ao parcelamento, não obstante o seu alto teor de prolixidade, como se notará: 111 “Art. 155-A. “O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica. § 1º Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas. § 2.º Aplicam-se, subsidiariamente, ao parcelamento as disposições desta Lei, relativas à moratória” (com redação dada pela LC 104/2001). O caput do artigo, ao fazer menção à legalidade, parece-nos excessivo, na medida em que o art. 97, VI, do CTN, já anuncia a obediência à lei, nos casos de suspensão do crédito tributário. Nessa esteira, diga-se que o parágrafo primeiro insistiu no óbvio, ao mencionar que o parcelamento não exclui a incidência de juros e multas. Com efeito, desconhecemos situação em que o parcelamento tenha sido causa excludente de penalidade. Ademais, o termo “multas” ali inserto é demasiado estranho, pois não se multa quem age licitamente. O parcelamento, como se sabe, é ato lícito. Talvez – tentando imaginar o que o legislador quis dizer – a menção se refira à denúncia espontânea, uma vez que a jurisprudência mais recente vinha admitindo, de modo pacífico, que a denúncia espontânea, acompanhada do pagamento parcelado do tributo, excluía a incidência de multa. A norma em comento veio, talvez, opor-se a esse entendimento jurisprudencial consolidado. Portanto, concluindo: o pagamento parcelado, ainda que espontaneamente solicitado, não exclui a incidência da multa (relativa ao não pagamento, espontaneamente denunciado). Com relação ao parágrafo segundo, as normas gerais aplicáveis à moratória serão postas ao parcelamento. Em razão da perfeita simetria de ambos os institutos, poder-se-ia afirmar que a aplicação é antes integral que subsidiária. Com a aprovação da lei 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências”–, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que alterou o art. 155-A do CTN, acrescendo-lhe dois parágrafos. Antes de detalhá-los, observemos os comandos inseridos, à luz da LC 118/2005: “O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica. (...) § 3º Lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial. 4º A inexistência da lei específica a que se refere o § 3º deste artigo importa na aplicação das leis gerais de parcelamento do ente de Federação ao devedor em recuperação judicial, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela lei federal específica”. Com esta nova disposição, o legislador, com o intuito de facilitar a recuperação de empresas em dificuldades, estabelece que lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial. Na hipótese de não haver lei específica sobre o parcelamento, ao devedor em recuperação judicial deverá ser utilizada a lei geral de parcelamento do ente da Federação, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao que seria concedido pela lei federal específica. 112 13. Extinção do Crédito Tributário. Modalidades Extinção Do Crédito tributário – Art. 156 do CTN. I – Pagamento; II – Compensação; III – Transação; IV – Remissão; V – Prescrição e Decadência; VI – Conversão do Depósito em Renda; VII – Pagamento antecipado e a homologação do lançamento; VIII – Consignação em Pagamento, ao final dela; IX – Decisão administrativa Irreformável; X – Decisão judicial Passada em julgado; XI – Dação em Pagamento. Passemos, a partir de agora, a estudar cada uma em separado. 13.1 Pagamento O pagamento, como causa de extinção do crédito tributário, está disciplinado nos arts. 157 a 169 do CTN, sendo modalidade direta de extinção do crédito tributário, porquanto prescinde de autorização por lei. Em regra, o pagamento deve ser feito em pecúnia (cheque, dinheiro, ou algo que o exprima). A Lei Complementar 104/2001 trouxe novidade ao CTN quando previu nova causa extintiva do crédito tributário: a dação em pagamento, constante do inciso XI do art. 156 do CTN. A dação em pagamento é modalidade indireta de extinção do crédito tributário, pois há necessidade de lei que discipline os regramentos dessa modalidade extintiva de crédito tributário. Seu conceito deflui do direito privado, consoante os arts. 356 a 359 do Código Civil (Lei 10.406/2002), sendo instituto indicador da entrega, em pagamento, de algo que venha a substituir o que foi anteriormente acordado, no intuito de extinguir a obrigação. 113 Ademais, pode-se afirmar que a dação em pagamento encontra respaldo nos dizeres insertos no art. 3º do CTN, quando se traduz o tributo em prestação pecuniária ou “em cujo valor nela se possa exprimir”. Daí se nota a possibilidade de materialização do tributo em prestação diversa da estritamente pecuniária, dando azo à figura da dação em análise. Por derradeiro, é importante frisar que tal instituto se refere, tão somente, a bens imóveis. Assim, o tributo in natura – pagamento feito com bens móveis, distintos da pecúnia – não é admitido no direito tributário (tanto na dação, como no pagamento). O pagamento ocorre nos moldes dos artigos a seguir: “Art. 159 do CTN: Quando a legislação tributária não dispuser a respeito, o pagamento é efetuado na repartição competente do domicílio do sujeito passivo.” Art. 160 do CTN: “Quando a legislação tributária não fixar o tempo do pagamento, o vencimento do crédito ocorre 30 (trinta) dias depois da data em que se considera o sujeito passivo notificado do lançamento.” Art. 161 do CTN: “O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia. (...) § 2º O disposto neste artigo não se aplica na pendência de consulta formulada pelo devedor dentro do prazo legal para pagamento do crédito”. 13.1.1 Consulta tributária A consulta tributária, prevista no art. 161, § 2.º, do CTN, é procedimento administrativo de satisfação de dúvidas atinentes à legislação tributária, formuladas pelo contribuinte ao Fisco. No âmbito federal, a consulta está regida pelos arts. 46 a 58 do Dec. 70.235/72, bem como pelos arts. 48 a 50 da Lei 9.430/96. Quem faz a consulta pratica conduta comissiva, tradutora de boa-fé, respondendo, apenas, pelo tributo somado à correção monetária. Não se cobram juros e multa. Portanto, memorize: 13.1.2 a restituição de pagamento indevido ou a maior e o prazo prescricional O CTN, além dos prazos tradicionalmente oponíveis à Fazenda, cuida de lapsos temporais para o contribuinte pleitear a restituição de quantias pagas indevidamente. A doutrina e a jurisprudência divergem quanto à natureza jurídica desse prazo: se é de decadência ou é de prescrição. Aliomar Baleeiro rotulava-o de decadência; Alberto Xavier, por sua vez, considerava-o prescricional. No direito tributário, deve-se analisar o instituto da prescrição sob os dois sujeitos da relação: a prescrição do direito do Fisco é a perda de seu direito de propor ação executiva fiscal; para o 114 contribuinte, é a perda do direito de ação para pleitear a repetição do indébito, conforme consta do dispositivo a seguir: “Art. 165 do CTN. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo (...)”. Se for pago o tributo a maior, o contribuinte tem direito à restituição sem qualquer empecilho a ser imposto pelo Fisco. O pagamento indevido ou a maior será restituído (administrativa ou judicialmente), independentemente de provas sobejas, ou seja, é suficiente a apresentação da guia de recolhimento (autentica- da, conforme o entendimento do STJ, no REsp 267.007/SP2005) para que se formalize o pedido do valor. Ademais, o particular não está obrigado a primeiramente postular na órbita administrativa, para, após, recorrer à via judicial. Aliás, para o STJ, o prazo prescricional para a repetição de indébito não se interrompe e/ou suspende em face de pedido formulado na esfera administrativa (AgRgAg 629.184/MG-2005). Art. 168 do CTN: “O direito de pleitear a restituição extingue-se com o de- curso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I – nas hipóteses dos incisos I e II do art. 165, da data da extinção do crédito tributário; II – na hipótese do inciso III do art. 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória”. 13.1.2.1 Limitação temporal Segundo o CTN, para se repetir valor pago indevidamente ou a maior, deve-se obedecer ao prazo legal de 5 (cinco) anos, a contar da extinção do crédito tributário pelo pagamento.Assim, a contagem é bastante singela, seguindo-se a literalidade do CTN, como se pode notar no exemplo a seguir: Exemplo: paga-se o tributo a maior em janeiro de 1995, devendo, portanto, o contribuinte repetir o valor até o mês de janeiro de 2000, quando se dará o fim do lustro (= período de 5 anos ou quinquênio). Quanto ao tempo hábil a pleitear a restituição, diga-se que o inciso I do art. 168 do CTN passou a ter nova interpretação à luz do art. 3.º da LC 118/2005. É sabido que, segundo aquele comando, o prazo para pleitear a restituição de importância tributária é de 5 (cinco) anos contados da data da “extinção do crédito tributário”, isto é, a data do pagamento indevido. Nesse passo, conforme se depreende do 3.º da LC 118/05, a extinção do crédito tributário, nos lançamentos por homologação, deverá ocorrer num momento anterior à homologação, qual seja, na data do pagamento antecipado. O aprofundamento do tema será feito nos parágrafos seguintes. Vamos analisar o art. 3.º da LC 118/2005: 115 Art. 3º: “Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei.” Portanto, o art. 3º sepultou a teoria do prazo dos “cinco mais cinco”, que havia sido consagrada pela jurisprudência, para a restituição de pagamento indevido de tributos constituídos por lançamento por homologação. Essa teoria é aquela em que o prazo de cinco anos para se restituir um tributo (com lançamento por homologação) deveria começar a contar a partir da data da homologação (seja expressa ou tácita). Com base no art. 150, § 4º do CTN, o prazo para a homologação é de cinco anos, assim, a Fazenda Pública teria cinco anos para homologar o lançamento (a contar do fato gerador) e, findo este prazo, o sujeito passivo teria mais cinco anos para pleitear a restituição, ou seja, a consagração da tese dos “cinco mais cinco anos”. O STJ decidiu, curiosamente, há um tempo, que o termo inicial para a contagem do prazo (cinco anos) de restituição de tributo pendente de homologação tácita seria a data do pagamento indevido (ver REsp 258.161/DF-2001). Entretanto, desde 1994, o STJ vem mudando o entendimento, passando a considerar, no âmbito do lançamento por homologação, o início do prazo para restituição na data da homologação tácita, isto é, conta-se o prazo de cinco anos após o fato gerador e a este marco se acresce o prazo de 5 anos, a contar da homologação. Assim, o STJ concebeu no caso de retenção indevida de IOF na fonte (REsp 641.897/PE-2005) e retenção indevida de IRRF (EDivREsp 289.398/2002), considerando que se devia contar o prazo de 5 anos, a partir da retenção indevida na fonte, acrescidos de mais um quinquênio. Tal entendimento, dotado de adequado suporte normativo, conquanto não o fosse adotado por todos os Tribunais, consagrou-se na 1ª Seção do STJ, no julgamento do EREsp 435.835/SC-2004. Visando unicamente reduzir algumas poucas conquistas alcançadas pelo sujeito passivo, a LC 118 veio acabar com esta tese. Agora vale o singelo prazo de cinco anos, contado do dia do pagamento indevido, e não mais de sua homologação tácita, para os tributos lançados por homologação. Diversamente, Leandro Paulsen entende que a modificação é adequada, haja vista ocorrer excesso no prazo de 10 anos (5+5). Conforme verificamos no art. 3.º da LC 118/2005, com a expressão “para efeito de interpretação do inciso I (...)”, fica clara a intenção do legislador em interpretar um dispositivo em aplicação. Com isso, devemos observar o que dispõe o art. 106 do próprio CTN: “A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I – em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados (...)”. A lei tributária poderá atingir fatos passados quando esta for expressamente interpretativa, isto é, quando for criada meramente para esclarecer um ponto obscuro na legislação vigente, e tal esclarecimento não poderá acarretar aplicação de penalidades. 116 Parece-nos, portanto, que o legislador pretendeu imprimir na norma em comento o cunho de lei interpretativa, a fim de revesti-la de vigência retrospectiva. Questionamentos judiciais surgiram em relação à constitucionalidade desta aplicação pretérita, tendo em vista o direito adquirido em face dos inúmeros entendimentos jurisprudenciais advindas em nossa ordem jurídica, garantindo a tese dos “cinco mais cinco” anos. Entendemos que esta interpretação deverá ter eficácia apenas para o futuro, ou seja, da vigência desta Lei Complementar (120 dias após sua publicação) em diante, prevalecendo a segurança jurídica. Tudo leva a crer que este será o entendimento prevalecente, conforme se nota do julgado emanado do STJ: “(...) 1. A 1.ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, rel. p/ o acórdão min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o entendimento segundo o qual o prazo prescricional para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se for tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador – sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional, a causa do indébito. Adota-se o entendimento firmado pela Seção, com ressalva do ponto de vista pessoal, no sentido da subordinação do termo a quo do prazo ao universal princípio da actio nata (voto-vista proferido nos autos do ERESP 423.994/SC, 1.ª Seção, min. Peçanha Martins, sessão de 08.10.2003). 2. O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de interpretar os arts. 150, § 1º, 106, I, do CTN, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a “interpretação” dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Portanto, o art. 3.º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência. 3. O art. 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (CF, art. 2.º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (CF, art. 5.º, XXXVI). Ressalva, no particular, do ponto de vista pessoal do relator, no sentido de que cumpre ao órgão fracionário do STJ suscitar o incidente de inconstitucionalidade perante a Corte Especial, nos termos do art. 97 da CF. 4. agravo regimental a que se nega provimento.” (agRg no Ag 633462/SP; rel. min. teori albino Zavascki; 1.ª t., em 17.03.2005). A interpretação em tela – intitulada autêntica ou legal – é atividade anômala do Poder Legislativo, que assume papel exegético para modificar aquilo que, em tese, não lhe convém. Bastante criticada pela doutrina, que a considera inconstitucional, foi recentemente palco de discussões com o advento da LC 118/2005, à qual se pretendeu dar a vestimenta de “lei interpretativa”, conforme já se disse. 13.1.2.2 Arguição de inconstitucionalidade nos embargos de divergência em REsp 644.736/PE (trânsito em julgado 27.09.2007) O STJ, nesta data, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 4º, segunda parte, da LC 118/2005, entendendo que o prazo prescricional deve ser contado da seguinte forma: 117 a) Pagamento de tributo efetuado a partir da vigência (09.06.2005), com fato gerador ocorrido após esta data, o prazo é de 5 anos a contar da data de pagamento; b) Pagamento de tributo efetuado antes da vigência (09.06.2005), com fato gerador ocorrido antes desta data, vale a regra de prescrição do regime anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei; c) Pagamento de tributo efetuado após a vigência (09.06.2005), com fato gerador ocorrido antes desta data, vale a regra de prescrição do regime anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei. 13.1.2.3 Prazo para restituir com a declaração de inconstitucionalidade Até 2004, prevaleceu na 1.ª Seção do STJ o entendimento abaixo destacado, em total prestígio do princípio da actio nata. Originariamente, o STJ (ver REsp 43.502, 44.952 e 44.221), inspirado no posicionamento adotado no voto (AC 44.403-3, 1.ª T., abril de 1994) do então Desembargador Federal do TRF 5.ª R., Hugo de Brito machado, que, por sua vez, se inspirou nos dizeres de Ricardo Lobo Torres, entendeu que: a) Em sede de controle direto ou concentrado de inconstitucionalidade (eficácia erga omnes): o termo a quo é a data da publicação do acórdão do STF que declarou a inconstitucionalidade (data do trânsito em julgado da ADIn); b) Em sede de controle difuso de inconstitucionalidade (inter partes): o termo a quo é a data da publicação da resolução do senado que suspender, erga omnes, o dispositivo declarado inconstitucional incidenter tantum pelo STF. Exemplo (a): o STF declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do PIS, com eficácia erga omnes, com a publicação da Res. do Senado 49/95 (DO 10.10.1995), tornando sem efeitos os Dec.-leis 2.445/88 2.449/88. O prazo prescricional para repetir o PIS iniciou-se em 10.10.1995, extinguindo-se em 09.10.2000. Ocorre que, em março de 2004, o STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência 435.835/SC, reconsiderou o entendimento em epígrafe para firmar posição, agora, no sentido de que a declaração de inconstitucionalidade não influi na contagem de prazo para repetição (ver REsp 703.950/SC-2005, 2.ª T., e REsp 801.175/MG-2006, 1.ª T.). Efetivamente, o direito não pode se originar da decisão do STF. Cada contri- buinte, antes mesmo da decisão do STF, pode buscar o reconhecimento do direito no Judiciário no controle difuso. Este sempre foi o entendimento adotado no TRF 4ª Região e, agora, adotado no STJ. Com este entendimento, no citado REsp 435.835/SC, volta-se a aplicar o prazo de restituição constante do CTN. A Receita Federal, ad argumentandum, não atribui à decisão do STF, nos controles difuso e concentrado, nenhuma repercussão na contagem do prazo, que é feita a contar da extinção do crédito tributário, conforme Ato Declaratório SRF 096 (26.11.1999). 118 Entretanto, como a questão é de índole constitucional, embora se saiba que é do STJ a competência para interpretar a legislação federal, parece que a última palavra deve caber ao STF, que adota a data da inconstitucionalidade como termo a quo (ver RE 136.805/94, no âmbito dos Empréstimos Compulsórios incidentes sobre a aquisição de automóveis). Vamos, agora, à análise do art. 169 do CTN: “Prescreve em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição. Parágrafo único. O prazo de prescrição é interrompido pelo início da ação judicial, recomeçando o seu curso, por metade, a partir da data da intimação validamente feita ao representante judicial da Fazenda Pública interessada”. A ação a que faz menção o indigitado artigo é a ação de repetição de indébito, e não a ação anulatória de débito fiscal, como se faz parecer. Não obstante a atecnia no dispositivo, se houver denegação do pedido na órbita administrativa, poderá o contribuinte se socorrer do Poder Judiciário, provocando-o por meio da ação judicial hábil ao ressarcimento de tributos pagos a maior ou indevidamente – ação de repetição de indébito. Com efeito, a “função jurisdicional administrativa” é despida de poder de ditar a aplicação da lei, como reservado ao Judiciário. Portanto, a decisão administrativa do órgão julgador, embora definitiva (art. 42, do Dec. 70.235/72), traduz-se em “ato administrativo” ou, nos dizeres magistrais de Celso Antônio Bandeira de Mello, “ato de administração contenciosa”, podendo ser objeto de reapreciação na via judicial, em razão do princípio constitucional do livre e amplo acesso ao Poder Judiciário (art. 5.º, XXXV, da CF). O artigo trata de prazo prescricional especial (biênio prescricional – uma exceção à regra do lustro ou quinquênio do art. 174 do CTN), podendo estar sujeito a causas de suspensão ou interrupção. O parágrafo único versa sobre causa interruptiva, com dies a quo no “início da ação judicial” – expressão que deve ser compreendida como a data da distribuição da ação. O detalhe curioso é que, interrompido o prazo, a contagem não se reinicia de imediato e nem por inteiro, como costuma ocorrer. O recomeço se faz pela metade (um ano) e somente a partir da “intimação” (melhor seria citação) válida do representante da Fazenda. Trata-se de prazo afeto à prescrição intercorrente, devendo ser somente reconhecida se o autor for o responsável pela paralisação no processo. Assim, o direito do autor poderá ficar prejudicado se ele der efetiva causa a que o processo fique paralisado, isto é, somente tem curso havendo demora decorrente de fato imputável ao autor da ação. 13.2 Compensação A compensação tributária, prevista nos arts. 170 e 170-A do CTN, é modalidade indireta (por lei) de extinção do crédito tributário, por meio do confronto entre créditos e débitos. Sua definição pode ser extraída do direito privado, conforme os arts. 368 a 380 do Código Civil (Lei 119 10.406/2002), segundo o qual a compensação é modalidade extintiva de obrigação, quando se é devedor e credor, concomitantemente. Observe os dispositivos do CTN: Art. 170: “A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública. Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.” Art. 170-A: “É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial” (LC 104/2001). A compensação não pode ser feita por simples iniciativa do contribuinte, pois carece de lei autorizadora e, mais especificamente, de uma autorização do Poder Executivo (com respaldo naquela lei para efetuá-la). Cite-se, como exemplo, a Lei 8.383/91 (art. 66 c/c art. 39 da Lei 9.250/95) permite a compensação dos tributos federais com a mesma destinação constitucional ou quando arrecadados pelo mesmo sujeito ativo. Para o STJ, “a compensação tributária prevista no art. 66 [§ 1.º] da Lei 8.383/91 pressupõe que os tributos são da mesma espécie. Na hipótese, o contribuinte busca, por meio de mandado de segurança, o reconhecimento de seu direito de compensar o crédito relativo a créditos-prêmio do IPI com os débitos referentes ao IRRF. Contudo a Turma deu provimento ao recurso da Fazenda Nacional, entendendo que os referidos tributos são de espécie e fatos geradores diferentes, portanto não compensáveis os respectivos créditos e débitos” (REsp 214.422-SE, rel. min. Peçanha Martins, j. 27.11.2001). Ademais, o próprio STJ deixou evidente que tributos da mesma espécie seriam os “(...) instituídos e arrecadados pela mesma pessoa jurídica e com igual destinação. Na prática, os impostos de importação e exportação foram instituídos ambos pela União e por ela são arrecadados. Destinam-se também, um e outro, à formação de uma política extrafiscal, sem conotação arrecadatória, servindo ambos para regular o mercado. Sendo assim, são impostos da mesma espécie pelas semelhanças de origem, de finalidade e de operacionalização, podendo haver compensação entre eles” (REsp 252.241-RJ, rel. originário min. Peçanha Martins, rel. para acórdão min. Eliana Calmon, j. 03.12.2002). O contribuinte não pode apurar a certeza e liquidez sem contar com a chancela do Executivo ou do Judiciário. Assim, nos lançamentos por homologação, pode ele, se quiser, compensar seus créditos informando-os na DCTF – Declaração de Contribuições e Tributos Federais, porém deve aguardar a confirmação (homologação) do Fisco. 120 Ressalte-se que a Lei Complementar 104/2001 inovou ao trazer o art. 170-A, exigindo o trânsito em julgado da sentença autorizadora de compensação, na ação na qual se pleiteia o encontro de débitos e créditos, obstaculizando, com maior vigor, a obtenção do direito de compensar por meio de provimento judicial initio litis, isto é, por liminar em mandado de segurança ou por tutela antecipada em ações ordinárias, a par das Súmulas 212 e 213 do STJ (Súmula 212: “A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipada”; Súmula 213: “O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária”). Diga-se que o art. 170-A do CTN somente é aplicável aos casos em que o contribuinte já pagou determinado tributo, que entende indevido pela invalidade da lei que o instituiu. Portanto, veda-se a compensação neste caso. Estando a lei ainda em vigor, é necessário o ajuizamento da ação, além do trânsito em julgado de decisão que lhe seja favorável para que se opere a compensação. Por outro lado, se já houver declaração da inconstitucionalidade da lei pelo STF, Resolução do Senado a respeito ou se tratar de mero erro de cálculo, estamos que o dispositivo não há de ser aplicado, permitindo-se a compensação. Observe o quadro comparativo: Não depende de prévia autorização¹ da autoridade fazendária (de pedido à Receita Federal). Desnecessidade de verificação da certeza e liquidez dos créditos. 1. Dessa forma, o contribuinte, em vez de antecipar o pagamento do tributo, registra na escrita fiscal o crédito oponível à Fazenda Pública, recolhendo apenas o saldo devido. À Receita, a seu turno, cabe verificar a correção da compensação efetuada, homologando o pagamento ou constituindo o crédito remanescente, se houver. 2. Segundo previsão do art. 66, § 1º, da Lei 8.383/91, a compensação somente se dará entre tributos, contribuições e receitas da “mesma espécie” – expressão que pode ser compreendida como (a) “mesma destinação constitucional” (AC 3095535-1, 1995, tRF – 3.ª Região, rel. Des. Anna Maria Pimentel, DJU, Seção II, j. 15.10.1997, p. 85.584) e (b) administradas pelo “mesmo ente administrativo”. 121 13.3 Transação A transação tributária, prevista no art. 171 do CTN, designa o acordo ou as concessões recíprocas que põem fim ao litígio (Lei 10.406/2002, arts. 840 a 850), com reciprocidade de ônus e vantagens. Ademais, depende de lei autorizadora para sua instituição (modalidade indireta de extinção do crédito tributário). Observe o dispositivo: Art. 171 do CTN. “A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, me- diante concessões mútuas, importe em determinação [Vocábulo “determinação” empregado equivocadamente. O correto seria “terminação”.] de litígio e consequente extinção de crédito tributário. Parágrafo único. A lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso”. O CTN admite tão só a transação terminativa, e não a “preventiva”. Com efeito, é pressuposto de tal causa extintiva do crédito tributário a existência de um litígio entre o Fisco e o contribuinte. Ademais, o art. 171 anuncia o termo “determinação” (sic; leia-se terminação) do litígio, sem fazer menção a que tipo de litígio se refere, se judicial, se administrativo ou ambos. Entendemos que, no silêncio, é cabível a transação tanto em esfera judicial como na esfera administrativa. Exemplo: desconto na multa para pagamento à vista em autos de infração; parcela única do IPVA, IPTU, com desconto (a parte recolhida será extinta pelo pagamento, enquanto a parte descontada será extinta pela transação). 13.4 Remissão A remissão tributária, prevista no art. 172 do CTN, é o perdão da dívida pelo credor. É a liberação graciosa (unilateral) da dívida pelo Fisco. Observe o dispositivo: Art. 172 do CTN. “A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo: I – à situação econômica do sujeito passivo; II – ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo, quanto à matéria de fato; III – à diminuta importância do crédito tributário; IV – a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso; 122 V – a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante. Parágrafo único. O despacho referido neste artigo não gera direito adquirido, aplicando-se, quando cabível, o disposto no art. 155”. O verbo correto para o substantivo remissão é remitir (e não “remir” – resgatar o bem onerado por dívida). Depende de autorização legal para sua instituição. Exemplo: perdão (assimilação) de resíduos ínfimos quanto aos pagamentos de tributo (art. 172, III, do CTN). Por fim, temos quatro modalidades indiretas de extinção do crédito tributário, isto é, dependentes de lei autorizadora: compensação, transação, remissão e dação em pagamento. 13.5 Prescrição e Decadência A prescrição e a decadência são causas que extinguem o crédito tributário, conforme a literalidade do CTN. Com efeito, extinto estará o crédito tributário, se o Fisco deixar de realizar o lançamento dentro do prazo que lhe é ofertado pela lei, ou deixar de propor a execução fiscal em prazo que também lhe é oponível. 13.6 Conversão do depósito em renda Após decisão definitiva administrativa ou judicial favorável ao sujeito ativo, o depósito integral efetuado nos autos é convertido em renda a favor daquele, extinguindo-se o crédito tributário. Ressalte-se que, durante a demanda, resguardada pelo depósito garantidor, o crédito tributário mantém-se suspenso, em consonância com o art. 151, II, do CTN. No entanto, ao término da demanda, quando há situação desfavorável ao sujeito passivo, dá-se a extinção do crédito tributário, anteriormente suspenso, com a conversão devida (art. 156, VI, do CTN). 13.7 Pagamento antecipado e a Homologação do Lançamento Nos tributos cujos lançamentos sejam por homologação, o sujeito passivo faz o pagamento com base em apuração realizada por ele próprio. Por isso, diz-se pagamento antecipado, porque feito antes do lançamento (antes da participação da autoridade administrativa). A extinção do crédito tributário não se verifica com o pagamento, mas com a soma deste com a homologação do lançamento (art. 150, §§ 1º e 4º, do CTN). No lançamento por homologação há uma antecipação de pagamento, permitindo-se ao Fisco homologá-lo em um prazo decadencial de 5 anos, contados a partir do fato gerador. O transcurso in albis (em branco) do quinquênio decadencial, sem que se faça uma conferência 123 expressa, provocará o procedimento homologatório tácito, segundo o qual perde o Fisco o direito de cobrar eventual diferença. Nesse ponto, transborda o instituto da decadência nos lançamentos por homologação. Tal conclusão nos remete ao importante instituto da decadência no direito tributário. Após 5 anos, haverá a homologação tácita, vindo a reboque a perda do direito de lançar. Destarte, extingue-se o crédito tributário, conforme o art. 156, VII, do CTN. 13.8 Consignação em pagamento A ação consignatória irá, ao seu término, extinguir o crédito tributário. Sabe-se, no entanto, que a ação consignatória (arts. 890 a 900 do CPC), quando do depósito judicial autorizado em seu início, conforme o rito processual, não representará uma causa extintiva do CTN, mas causa de suspensão do crédito tributário. Portanto, a consignação em pagamento permite que o sujeito passivo exerça seu direito de pagar o tributo, conforme as hipóteses previstas no art. 164 do CTN, a saber: a) recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou penalidade, ou cumprimento de obrigação acessória; b) subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal; c) exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador. Trata-se de vício de bitributação, cujos efeitos a consignatória pretende coibir. Ao término da demanda, julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a importância consignada é convertida em renda. A conversão em renda ocorrerá em favor do sujeito ativo credor, entendido como tal, a partir do juízo de convencimento formado pelo juiz da respectiva demanda. Se julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis (art. 164, § 2º, do CTN). 13.9 Decisão administrativa Irreformável Esta causa extintiva se refere às decisões administrativas favoráveis ao contribuinte, uma vez que, se contrárias, não terão o condão de extinguir o crédito tributário, haja vista restar ao sujeito passivo a possibilidade de reforma na via judicial, na tentativa de impor sua arguição desconstitutiva da relação jurídico- tributária. 124 13.10 Decisão Judicial passada em Julgado A decisão judicial passada em julgado é extintiva do crédito tributário, uma vez representando o último pronunciamento a ser emitido por autoridades julgadoras, quanto às lides que se apresentam à sua apreciação. A coisa julgada é de efeito absoluto. Nem mesmo a lei poderá prejudicá-la, conforme se depreende do art. 5.º, XXXVI, in fine, da CF. 13.11 Dação em pagamento Prevista nos arts. 356 a 359 do Código Civil (Lei 10.406/2002), a dação em pagamento representa o ato de dar em pagamento algo em substituição à pecúnia. O CTN admite tal modalidade extintiva para bens imóveis, exclusivamente. A dação em pagamento foi noticiada normativamente com a edição da LC 104/2001, representando modalidade indireta de extinção do crédito tributário, por carecer de lei autorizadora que a discipline. Para o STF, o dispositivo no CTN avoca o disciplinamento por lei complementar, uma vez que o crédito tributário deve estar àquela adstrito, consoante o art. 146, III, b, da CF. Ademais, a Corte entendeu (ADInMC 1.917-DF, rel. min. marco Aurélio, 18.12.98, Informativo 136 do STF) que a dação em pagamento para bens móveis – procedimento encontradiço em algumas legislações estaduais, por exemplo, a lei 1.624/97-DF –, ofenderia a exigência constitucional de licitação para a aquisição de mercadorias pela Administração Direta e Indireta, na contratação de obras, serviços e compras (art. 37, XXI, da CF). Acompanhe a seguir um quadro sinóptico afeto ao crédito tributário, que traz um resumo da matéria: Quadro Sinóptico de Causas de Suspensão, Extinção e Exclusão do Credito Tributário. SUSPENSÃO EXTINÇÃO EXCLUSÃO Art. 151 do CTN Art. 156 do CTN Arts. 175 e ss. Do CTN I - Moratória I - Pagamentos II - Deposito do Montante Integral II - Compensação III - Reclamações e Recursos Administrativos III - Transação IV - Concessão de Liminar em Mandado de Segurança IV - Remissão 125 V - Concessão da Tutela Antecipada em outras Ações V - Prescrição e Decadência VI - Parcelamento VI - Conversão do Deposito em Renda Isenção e Anistia VII - Pagamento Antecipado e a Homologação do Lançamento "MODERECOPA'' (palavra mnemônica) VIII - Consignação em Pagamento (ao término) IX - Decisão Administrativa Irreformável X- Decisão Judicial passada em Julgado XI - Dação em Pagamento EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1 – (AFRF/2003) Avalie o acerto das afirmações adiante e marque com V as verdadeiras e com F as falsas; em seguida, marque a opção correta. ( ) A dação em pagamento em bens móveis, a remissão, a compensação e a decadência extinguem o crédito tributário. ( ) O parcelamento concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica, o depósito do montante integral do crédito tributário, a homologação do lançamento e a concessão de medida cautelar em mandado de segurança suspendem a exigibilidade do crédito tributário. ( ) As disposições do Código Tributário Nacional, relativas ao parcelamento, aplicam-se, subsidiariamente, à moratória. a) b) c) d) e) V, V, F V, F, V V, V, V F, F, V F, F, F 2 – (TCE-SP/2008) De acordo com o Código Tributário Nacional, é caso de exclusão do crédito tributário: a) Isenção. 126 b) c) d) e) Moratória. Transação. Remissão. Dação em pagamento em bens imóveis. 3 – (AFTN/1998) (1) Suspensão da exigibilidade do crédito tributário; (2) Modalidade de extinção do crédito tributário sem adimplemento; (3) Perdão da infração. Assinale a opção que corresponda, na sequência respectiva, aos termos acima referidos. a) b) c) d) e) Moratória, Imposição de Penalidade, Remissão. Isenção, Confusão, Anistia. Reclamação, Prescrição, Anistia. Liminar em mandado de segurança, Pagamento, Redenção. Pagamento no curso do processo, Remissão, Homologação. 4 – (AFR-SP/2002) Os institutos da prescrição e decadência tributárias encontram-se previstos no artigo 156 do Código Tributário Nacional. Quanto a tais institutos, é correto afirmar que: a) O direito a ação de cobrança do crédito tributário do Fisco prescreve em cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte ao de sua constituição definitiva. b) O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte aquele em que o lançamento for efetuado. c) Embora a decadência venha elencada no Código Tributário Nacional, como causa extintiva do crédito tributário sequer chega a constituir-se. d) A ação de cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos contados da data em que se tornou definitivo a decisão que houver anulado por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. e) O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos contados da data em que o lançamento for regularmente efetuado. 5 – (AFPS/2002) Não obstante o pagamento seja a forma mais comum de extinção do crédito tributário, o Código Tributário Nacional prevê outras causas extintivas. Assim, é correto afirmar que são causas ou formas extintivas do crédito tributário, entre outras, as seguintes: a) b) c) d) A compensação, a transação, a anistia e a dação em pagamento. A prescrição, a dação em pagamento e o depósito do montante integral. A decadência, a novação e a decisão administrativa irreformável. A consignação em pagamento, a dação em pagamento e a concessão de medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade. 127 e) A dação em pagamento em bens imóveis, a decisão judicial passada em julgado, a transação e a compensação. 6 – (AFMT-SP/2007) Um determinado contribuinte obteve a remissão do crédito tributário representado pelo valor do imposto devido no exercício de 2002, foi isentado do pagamento desse imposto em 2003 e obteve o parcelamento do montante desse imposto devido em 2004. Em relação à remissão, à isenção e ao parcelamento houve, respectivamente, a) Exclusão do crédito tributário, suspensão extinção do crédito tributário. b) Extinção do crédito tributário, suspensão exclusão do crédito tributário. c) Extinção do crédito tributário, extinção exigibilidade do crédito tributário. d) Exclusão do crédito tributário, exclusão exigibilidade do crédito tributário. e) Extinção do crédito tributário, exclusão exigibilidade do crédito tributário. da exigibilidade do crédito tributário e da exigibilidade do crédito tributário e do crédito tributário e suspensão da do crédito tributário e suspensão da do crédito tributário e suspensão da 7 – (CLU/2002) Acerca da extinção do crédito, julgue os itens a seguir. a) A decadência extingue o direito de a fazenda pública constituir o crédito tributário. b) A lei pode impor aos sujeitos da obrigação tributária a celebração de transação que, mediante concessões mútuas, importe em terminação de litígio e consequente extinção de crédito tributário. c) É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da decisão judicial. d) A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data do fato gerador da obrigação tributária. e) A prescrição interrompe-se com o ajuizamento da ação executiva que vise a cobrar o crédito tributário não-pago. 8 – (PMSA/2006) É causa de extinção do crédito tributário: a) b) c) d) e) A remissão. A anistia. A moratória. A isenção. O depósito de seu montante integral. 128 9 – (AFTM-PE/2006) De acordo com o Código Tributário Nacional, é causa de extinção do crédito tributário a) b) c) d) e) A transação. A anistia. O parcelamento. A isenção. O depósito de seu montante integral. GABARITO: 1. E 6. E 2. A 7. a) Verdadeira; b) Falsa; c) Verdadeira; d) Falsa; e) Falsa. 3. C 8. A 4. C 9. A 5. E 14. Exclusão do Crédito Tributário. Modalidades Causas de exclusão do Crédito tributário 14.1 Isenção e anistia Segundo se pode apreender do CTN, a par de posicionamentos tradicionais na doutrina, a isenção e a anistia são causas inibitórias de lançamento, excluindo o crédito tributário. Nesse passo, a isenção e a anistia ocorreriam antes do lançamento e após o surgimento da obrigação tributária. Sabe-se que ambas são dispensas legais, quer se refiram a tributos (isenção), quer se refiram a infrações (anistia). Dessa forma, o princípio da legalidade é imanente em tais institutos, podendo-se afirmar que o poder de isentar ou anistiar é correlato ao poder de criar tributos ou exigir penalidades. 129 14.2 Isenção A isenção, prevista nos arts. 176 a 179 do CTN, é instituto de conceituação polêmica: sua natureza jurídica oscila entre os parâmetros de não incidência e incidência da norma. Para José Souto maior Borges, seguindo a esteira de Alfredo Augusto Becker, a isenção, por exemplo, exclui a própria obrigação tributária, impedindo o surgi- mento do fato gerador dessa mesma obrigação. A regra de isenção incide para que a da tributação não possa incidir, invertendo, pois, a dinâmica da “jurisdicização” do evento (em vez de incidir primeiro a regra da tributação, incide antes a norma isentiva). Seriam hipóteses de não incidência legalmente qualificadas. Para Hugo de Brito machado, “a lei isentiva retira uma parcela da hipótese de incidência da lei da tributação”. Portanto, a doutrina mais moderna preconiza que a isenção obsta o nascimento da obrigação tributária como um todo, sendo “o próprio poder de tributar visto ao inverso”. Para o STF, entretanto, na vertente da teoria clássica, capitaneada por Rubens Gomes de Sousa, a isenção caracteriza-se como a dispensa legal do pagamento de determinado tributo devido, pelo que ocorre o fato gerador, mas a lei dispensa seu pagamento. Assim, admite como premissa que o fato jurídico ocorre, nascendo o vínculo obrigacional. Esta é a posição que nos parece mais recomendável para concursos públicos. A isenção é o instituto concedido de forma geral ou específica, mediante lei, afastando a tributação que seria exigida do sujeito passivo. É possível à lei isentiva estipular prazo e condições para sua concessão. As isenções podem ser revogadas a qualquer tempo, salvo as isenções onerosas (que têm prazo certo e condições determinadas) – art. 178 do CTN. 14.2.1 a isenção e a revogação da regra isencional A regra que prevalece na seara das isenções é a da revogabilidade plena. Como ressalva, destaca-se um tipo de isenção – aquela considerada onerosa (também intitulada bilateral ou contraprestacional), ou seja, sujeita a prazo certo e a determinadas condições (requisitos cumulativos). É fundamental procedermos ao confronto de tais isenções com o princípio da anterioridade tributária. A isenção dita onerosa é irrevogável, rechaçando o debate da anterioridade. Exsurge, em verdade, direito adquirido ao beneficiário da regra da isenção onerosa. A esse propósito, editou-se a Súmula 544 do STF, segundo a qual “isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa não, podem ser livremente suprimidas”. Com efeito, para o STF, “(...) porque concedida por prazo certo e mediante condições, corre em favor do contribuinte o instituto do direito adquirido (CTN, art. 178; CF, art. 5.º, XXXVI; ADCT, art. 41, § 2.º; Súmula 544-STF). Quer dizer, a revogação ocorrerá após o transcurso do prazo da isenção” (RE 169.880/SP – 1996). Por outro lado, as isenções não onerosas avocam tormentoso debate na doutrina e na jurisprudência, passando ao largo de posicionamento uníssono. O STF tem entendido que, 130 tirante o caso da isenção onerosa (submetida a lapso temporal e a certas condições), a revogabilidade dessas isenções não onerosas poderá ocorrer a qualquer tempo, sem a necessidade de respeitar o princípio da anterioridade tributária, voltando o tributo a ser imediatamente exigível. Vale dizer que tal raciocínio estende-se às isenções não condicionadas ou àquelas sem prazo definido. A explicação está no fato de que o STF (RE 204.062) dissocia o contexto da revogação de isenção do cenário da instituição ou majoração de tributo, ensejador da regra da anterioridade, situando-a, conforme já se disse, no campo da incidência tributária. Dica: a) O art. 177, II, do CTN preconiza a impossibilidade de conceder isenção aos tributos cuja competência tributária não tenha sido exercida. São as isenções em branco, instituto que o legislador pretende coibir. Assim, é vedada, v.g., a isenção de imposto sobre grandes fortunas (art. 153, VII, da CF/88), uma vez não tendo sido instituído tal gravame. b) A isenção é dispensa legal; portanto, deve ser concedida por meio de lei. Para aqueles tributos instituídos por meio de lei complementar, exigir-se-á isenção por idêntico diploma normativo. Assim, tributos criados por lei complementar serão isentos por Lei Complementar. É o que deve ocorrer com o imposto sobre grandes fortunas (após o exercício de sua competência tributária), com os empréstimos compulsórios e, por fim, com os impostos residuais da união. Não se perca de vista que as isenções de ICMS fogem, em princípio, à regra mencionada, à medida que os estados e o distrito Federal, querendo conceder isenções afetas ao gravame em comento, deverão, previamente, firmar entre si convênios, celebrados no conselho nacional de política Fazendária – CONFAZ – órgão com representantes de cada estado e do distrito Federal, indicados pelo respectivo chefe do executivo. (o assunto foi detalhado, em uma perspectiva crítica, no capítulo 5, item 1.2.4). c) A isenção, em regra, atingirá os tributos unilaterais: impostos. As taxas e as contribuições de melhoria são tributos contraprestacionais, não adaptáveis, em princípio, ao benefício isencional. É o que disciplina o art. 177, I, do CTN. A imunidade é dispensa constitucional de tributo, enquanto a isenção é dispensa legal. Aquela se encontra no campo da não incidência tributária, enquanto a isenção se encontra no campo da incidência tributária (STF). d) Em regra, a lei concessiva da isenção é a lei ordinária, devendo ser específica, conforme o art. 150, § 6 º, da CF. Logo, não se admite lei isentante geral, devendo ou tratar apenas de isenção ou versar sobre um imposto de maneira específica. Assim, lei geral que versar sobre qualquer outro assunto não poderá incluir a isenção (a mesma regra vale para a anistia, a ser estudada adiante). Exemplo: lei geral que verse sobre regime jurídico dos servidores públicos e, em um de seus artigos, trate de isenção de IPI, não é hábil a veicular tal favor legal. 131 e) É importante mencionar, segundo o art. 179, § 2.º c/c art. 155, ambos do CTN, que a isenção, quando concedida em caráter individual não gera direito adquirido, podendo ser “revogada” (ou, como maior rigor, anulada) nos casos de fruição do benefício sem a satisfação das condições. A propósito, será possível exigir, em face do ato revogatório, o tributo e os juros de mora. A estes será acrescida a multa, caso o beneficiário tenha obtido o favor legal com dolo ou simulação, fazendo com que não se compute, para efeitos de prescrição, o tempo decorrido entre a concessão da isenção e a sua revogação. As disposições do art. 155, aliás, aplicam-se, igualmente, aos institutos da moratória (arts. 152 a 155, CTN), da anistia (art. 182, parágrafo único, CTN) e da remissão (art. 172, parágrafo único, CTN). 14.3 Anistia A anistia, prevista nos arts. 180 a 182 do CTN, é causa de exclusão do crédito tributário, consistente no perdão legal das penalidades pecuniárias antes da constituição do crédito tributário. É, portanto, matéria subordinada ao princípio da reserva legal (art. 97, VI, do CTN). Abrange exclusivamente as infrações cometidas antes da vigência da lei que a concedeu, o que a torna de efeito retrospectivo, diferentemente da isenção, cuja lei deve conter vigência prospectiva. Conforme o art. 181 do CTN, a anistia pode ser geral ou limitada, sendo, neste último caso, concernente: a) às infrações relativas a determinado tributo; b) às infrações punidas com penalidades pecuniárias até determinado montante, conjugadas ou não com penalidades de outra natureza; c) à determinada região do território da entidade tributante, em função de condições a ela peculiares; d) sob condição do pagamento de tributo no prazo fixado pela lei concessiva do favor ou pela autoridade administrativa. É imperioso enaltecer que a exclusão do crédito tributário, quer quanto à anistia, quer quanto à isenção, não dispensa o cumprimento das obrigações tributárias acessórias, dependentes da obrigação principal cujo crédito seja excluído. Portanto, o sujeito passivo anistiado continua obrigado a cumprir as prestações positivas ou negativas não correspondentes ao pagamento de tributo (art. 113, § 2º, CTN), além de continuar obrigado a arcar com o valor principal do crédito exigido. Afinal, a dispensa é para multas, tão somente (art. 175, parágrafo único, do CTN). Outrossim, não alcança os atos qualificados como crime ou contravenção (art. 180 do CTN). Sabe-se, por fim, que o despacho concessivo do favor em comento não gera direito adquirido (art. 182, parágrafo único, do CTN). 132 Cuidado: Como a isenção e a anistia são causas excludentes do crédito tributário, surgindo após o nascimento da obrigação tributária e antes do lançamento (STF), não é possível imaginar um tributo ou multa, já lançados, sendo alvos de isenção ou anistia, respectivamente. Logo, não “se isenta” tributo formalizado por um lançamento (notificação de débito ou auto de infração). Nem mesmo “se anistia” uma multa já lançada. Todavia, questionar-se-ia: qual é o nome de tal favor, então? Doutrinariamente, somos da opinião de que se trataria de uma remissão (art. 156, IV, do CTN), causa extintiva do crédito tributário, passível de ocorrência após o lançamento, a ser estudada no próximo capítulo. EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1. (Auditor-fiscal do Tesouro Estadual - RN – 2005) É vedada a aplicação ao lançamento da legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas. 2. (Auditor-fiscal do Tesouro Estadual - RN – 2005) É vedado conceder, mediante lei, moratória que abranja obrigação tributária cujo lançamento do respectivo crédito não tenha sido iniciado até a data de início de vigência da lei concessiva. 3. (Auditor-fiscal do Tesouro Estadual - RN – 2005) A compensação, a dação em pagamento em bens móveis e a decadência extinguem o crédito tributário. 4. (Auditor-fiscal do Tesouro Estadual - RN – 2005) O prazo de prescrição (cinco anos) da ação para a cobrança do crédito tributário tem como termo inicial a data de inscrição na dívida ativa. 5. (Auditor-fiscal do Tesouro Estadual - RN – 2005) É permitido que a isenção e a anistia sejam concedidas restritamente à determinada região do território do ente tributante, em função de condições a ela peculiares. 6. (Procurador da Fazenda Nacional – 2004) A isenção objetiva não exonera todos os coobrigados. 7. (Auditor-fiscal da Receita Estadual - MG – 2005) Lei ordinária pode prever a extinção do crédito tributário mediante dação em pagamento de bens móveis. 8. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998) O lançamento efetuado pela fiscalização reportase à data da autuação e rege-se pela legislação nesta data vigente. 9. (Procurador da Fazenda Nacional – 1998) Salvo disposição de lei em contrário, quando o valor tributário esteja expresso em moeda estrangeira, far-se-á no lançamento sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia do pagamento. 133 10. (Auditor de Fortaleza – 1998) A constituição do crédito tributário relativo ao Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) é efetuada mediante lançamento ‘ex officio’. 11. (Técnico da Receita Federal) O lançamento por declaração é aquele feito em face da declaração prestada pelo próprio contribuinte ou por terceiro. 12. (Técnico da Receita Federal) De acordo com o art. 175 do Código Tributário Nacional, a isenção e a anistia excluem o crédito tributário. Por isso, podemos afirmar que a isenção podese estender às taxas e às contribuições de melhoria, caso haja previsão legal. 13. (Gestor Fazendário – 2005) A lei não pode facultar a transação entre o credor e o devedor de tributo, visto que o interesse público é indisponível. E (Gestor Fazendário – 2005) Com a lavratura de auto de infração, considera-se definitivamente constituído o crédito tributário. 14. (Gestor Fazendário – 2005) Com a lavratura de auto de infração, considera-se constituído o crédito tributário. 15. (TCE-SP/2008) De acordo com o Código Tributário Nacional, é caso de exclusão do crédito tributário a) Isenção. b) Moratória. c) Transação. d) Remissão. e) Dação em pagamento em bens imóveis. 16. (AFTN/1998) (i) A isenção e a anistia, segundo o Código Tributário Nacional, excluem o crédito tributário (ii) afora os casos legalmente excetuados, a anistia, quando se refere a infração sujeita a multa, impede a constituição do crédito tributário relativo à penalidade pecuniária (iii) a isenção pessoal, salvo disposição legal em contrário, não pode referir-se a tributo criado posteriormente à sua concessão. Assinale a opção correta: a) b) c) d) e) Está correta apenas uma das três assertivas. As três são falsas. São corretas as duas primeiras, não a última. São corretas as duas últimas, não a primeira. As três assertivas são corretas. 17. (AFTN/1998) Diz-se lançamento por homologação aquele que se efetua quando: 134 a) A lei determine que o lançamento seja efetivado e revisto pela autoridade administrativa por iniciativa própria. b) A legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa. c) A declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária. d) Se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido em lei como sendo de declaração obrigatória. e) Quando se comprove que terceiro, em benefício do contribuinte, agiu com simulação ou dolo. GABARITO: 1. ERRADO 10. CERTO 2. ERRADO 11. CERTO 3. ERRADO 12. CERTO 4. ERRADO 13. ERRADO 5. CERTO 14. CERTO 6. ERRADO 15. A 7. ERRADO 16. E 8. ERRADO 17. B 9. ERRADO 15. Garantias e Privilégios do Crédito Tributário. 15.1 Garantias do crédito tributário Art. 183 do CTN: “A enumeração das garantias atribuídas neste Capítulo ao crédito tributário não exclui outras que sejam expressamente previstas em lei, em função da natureza ou das características do tributo a que se refiram. Parágrafo único. A natureza das garantias atribuídas ao crédito tributário não altera a natureza deste nem a da obrigação tributária a que corresponda”. As garantias e privilégios do crédito tributário correspondem às prerrogativas de que dispõe o Poder Público quando pretende compelir o particular ao paga- mento do tributo, na busca da realização das finalidades públicas e consecução do bem comum. Tais privilégios encontram 135 guarida no princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado e são detalhados nos arts. 183 a 193 do CTN. Todavia, as garantias constantes dos artigos supracitados não perfazem um rol exaustivo, uma vez que a enumeração de tais privilégios não é taxativa, admitindo- se ampliação. Portanto, garantias de natureza civil, comercial e outras poderão somar-se àquelas previstas no CTN, sem, no entanto, desnaturar a natureza do crédito a que faz jus o Poder Público. Vale dizer: permanecerá ele como crédito tributário, mesmo que adote para si garantias estranhas à literalidade do CTN. Assim, se porventura o contribuinte oferecer uma hipoteca para garantir o crédito, isso não transforma o crédito tributário em “crédito hipotecário”. Art. 184 do CTN: “Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis”. Ressalte-se que respondem pelo crédito tributário todos os bens e rendas do sujeito passivo, ressalvados os bens e rendas declarados pela lei como absolutamente impenhoráveis. Tal ressalva prejudica parcialmente a diretriz constante do art. 184 do CTN, porém o sujeito passivo não estará resguardado com relação a todos os demais bens. Segundo o art. 649 do CPC (modificado pela Lei 11.382/2006), são absolutamente impenhoráveis os livros e utensílios utilizados no trabalho, o seguro de vida, além de outros. Outrossim, a Lei 8.009/90 tratou da impenhorabilidade do bem de família, considerando igualmente impenhorável o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar, incluindo a construção, as plantações, as benfeitorias, os equipamentos e os móveis da casa, salvo disposição constante da lei em comento. Portanto, a ressalva existe em caráter de exclusividade, não se estendendo a outros bens. Frise-se que até mesmo os bens gravados por ônus real (hipoteca, penhor, anticrese ou usufruto) ou mesmo aqueles que contêm cláusulas de inalienabilidade ou impenhorabilidade podem ser executados pelos entes tributantes. O artigo traz o termo “inclusive”. memorize! É oportuno gizar que a execução fiscal representa o momento de exequibilidade do crédito tributário, conferindo-lhe um grau de eficácia máximo, ao permitir à Fazenda Pública valer-se de uma ação judicial de cobrança para compelir o devedor a arcar com o ônus tributacional. Todavia, o devedor contumaz, detentor de estratagemas ardilosos hábeis à burla do Fisco, poderá valer-se de uma dilapidação de seu patrimônio, no intuito de se esquivar do pagamento do tributo. Caso tal manobra ocorra após a inscrição em dívida ativa, ter-se-á a chamada fraude à execução no direito tributário. 136 O problema para o devedor que pretende, afoitamente, furtar-se da tributação por estes métodos artificiosos está na presunção de anulabilidade e ineficácia de tais ações, uma vez que o art. 185 do CTN já os considera fraudulentos em sua essência (presunção absoluta ou juris et de jure), não se admitindo prova em contrário. A grande diferença entre a fraude contra credores do direito privado e a do direito tributário, prevista no art. 185 do CTN, é que, nesta última, desde que a dívida esteja inscrita em dívida ativa, haverá uma presunção absoluta, não se tendo necessidade de prova por parte da Fazenda Pública. Ocorre, portanto, uma inversão no ônus probante, que no direito privado recai sobre o credor e, no direito tributário, sobre o devedor. A ressalva existe, por sua vez, ao devedor de boa índole que, munido de boa-fé e pontualidade para com o Fisco credor, reserva outros bens ou rendas suficientes para o total pagamento da dívida fiscal em fase de execução (art. 185, parágrafo único, do CTN). Vejamos o artigo: Com a aprovação da lei 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências” –, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que promoveu uma modificação textual no caput e no parágrafo único do art. 185 do CTN, além da inserção do art. 185-A. Antes de detalhar as novidades, observemos o artigo, à luz da LC 118/2005: Art. 185. “Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita”. O texto anterior continha a expressão “(...) como dívida ativa em fase de execução”, o que gerava questionamentos em relação ao momento exato em que se caracterizava a fraude: se no momento da inscrição em dívida ativa ou no momento da ação judicial de cobrança. Todavia, com a nova redação dada pela LC 118/2005, espancaram-se as dúvidas, prevalecendo o entendimento de que a mera inscrição em dívida ativa (e não mais a propositura da ação de execução fiscal) representa o dies a quo para a etiquetagem da fraude na alienação ou oneração de bens. É certo que esta nova regra aumenta as garantias do crédito tributário. Saliente-se que a LC 118 introduziu, em seu art. 2.º, o art. 185-A. Vamos conhecê-lo: Art. 185-A. “Na hipótese do devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovam registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis, e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial. 137 § 1.º A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite. § 2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido”. O mencionado dispositivo veio, a par do art. 185, reforçar as garantias do crédito tributário. O texto legal é autoexplicativo: caso o devedor, devidamente citado, não pague nem “nomeie bens à penhora” (melhor seria: garanta o juízo) no prazo legal e ainda não se encontrem bens penhoráveis, permitir-se-á ao juiz que determine a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico (a chamada penhora on line), aos órgãos e às entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial. Todavia, o § 1º preconiza que tal indisponibilidade deverá ser limitada ao valor total do débito exigido, ficando o magistrado obrigado a liberar o excedente, devolvendo-se ao devedor a disponibilidade deste excesso. O § 2.º determina que os órgãos e as entidades aos quais se fizer a comunicação enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houver promovido. 15.2 Preferências do crédito tributário Uma vez conhecidas as garantias de que dispõe o crédito tributário, devemos conhecer o seu status, quando se emparelha com outros créditos a que faz jus a entidade impositora. Pergunta-se: até que ponto deve o Fisco preferir receber o crédito tributário a receber outros montantes? Vamos dissecar, respondendo à pergunta: o privilégio do crédito tributário é significativo, porém não é absoluto. Os créditos trabalhistas e aqueles decorrentes de acidente de trabalho devem ser satisfeitos com prioridade, em primeiro lugar, reservando-se valores à satisfação do pagamento de férias, décimo terceiro salário, aviso prévio etc. Após o direcionamento de recursos aos créditos trabalhistas e acidentários, ter-se-á a satisfação do crédito tributário. Com a aprovação da lei Ordinária 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências”–, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que promoveu uma modificação textual no caput e nos incisos do parágrafo único do art. 186 do CTN. Antes de detalhar as novidades, observemos o artigo, à luz da LC 118/2005, salientando-se que tais alterações têm provocado bastantes polêmicas na doutrina. 138 Art. 186. “O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo da constituição deste, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho. Parágrafo único. Na falência: I – o crédito tributário não prefere aos créditos extraconcursais ou às importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei falimentar, nem aos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado; II – a lei poderá estabelecer limites e condições para a preferência dos créditos decorrentes da legislação do trabalho; e III – a multa tributária prefere apenas aos créditos subordinados”. Como se nota, faz-se mister memorizar: os créditos tributários possuem preferência em relação aos demais, ressalvados, agora, os créditos trabalhistas e os créditos de acidente do trabalho. Portanto, com a previsão da preferência ao crédito acidentário, o crédito tributário acabou perdendo mais uma posição na “corrida arrecadatória” da Fazenda Pública. Não esqueça que o artigo, antes da alteração, só fazia menção aos créditos trabalhistas. A situação muda ainda mais na falência. Nesta fase, o crédito tributário também ficará atrás: 1º) dos créditos extraconcursais; 2º) das importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei falimentar (aquelas relativas a bens e direitos de terceiros e que se encontravam em poder do devedor na data da decretação de falência); 3º) dos créditos trabalhistas e acidentários (art. 83, I, da lei 11.101/2005); 4º) dos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado (art. 83, II, da Lei 11.101/2005 c/c art. 186, parágrafo único, I, do CTN). A propósito, créditos extraconcursais são aqueles que estão fora do concurso, isto é, aqueles que foram realizados pelo devedor no curso da recuperação judicial. Referem-se às despesas e obrigações contraídas no transcorrer da falência, tendo prioridade no pagamento, conforme o art. 84 da Lei 11.101/2005: Art. 84. “Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a: I – remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência; 139 II – quantias fornecidas à massa pelos credores; III – despesas com arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição do seu produto, bem como custas do processo de falência; IV – custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida; V – obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei”. Note bem! Neste particular, o aludido diploma legal foi adotado com o explícito objetivo, conforme facilmente apurado nos debates parlamentares, de “(...) assegurar maior probabilidade de recuperação do capital dos credores privados, assim como de dar maior agilidade ao processo falimentar”. Não esqueça: fora da falência, o crédito tributário continua preferencial em relação ao crédito com garantia real, por exemplo. É notório que o crédito tributário perdeu prerrogativas; igualmente visível é o fato de que algumas entidades foram beneficiadas com a nova legislação. Referimos aos créditos com garantia real que, em face da preferência surgida em relação ao crédito tributário, vieram privilegiar as instituições bancárias, uma vez que esses créditos com garantia real são, em regra, devidos a tais entidades financeiras. Não se trata de “implicância” com os bancos ou instituições financeiras, porém é de indagar se em nosso país tais entidades necessitam contar com alterações legislativas tradutoras de benevolência para manterem suas lucrativas atividades. Portanto, tentando estipular a ordem de preferência sugerida pela LC 118/2005, ter-se-ia: 140 Na seara do direito privado, é comum encontrar-se relação jurídica entre devedor insolvente, de um lado, e vários credores de outro. Como solução, é praxe habilitarem-se todos num processo judicial coletivo de cobrança (Exemplo: falência, recuperação judicial, liquidação judicial etc.). Nesse sentido, esclarece a Súmula 44 do extinto TFR: “ajuizada a execução fiscal anteriormente à falência, com penhora realizada antes desta, não ficam os bens penhorados sujeitos à arrecadação no juízo falimentar; proposta a execução fiscal [após a falência], a penhora far-se-á no rosto dos autos do processo de quebra, citando-se o síndico”. Portanto, memorize: I – Se a penhora é feita, e a decretação da falência é superveniente: continua o bem diretamente vinculado à administração do juízo das execuções, até liquidação final, não ficando sujeito à arrecadação do juízo falimentar; prossegue a execução até a transformação do bem penhorado em pecúnia e a remessa desta à massa falida, em que será observada a preferência do crédito tributário. Para o STJ, “(...) a decretação da falência não paralisa o processo de execução fiscal nem desconstitui a penhora. A execução continuará a se desenvolver até a alienação dos bens penhorados. Os créditos fiscais não estão sujeitos à habilitação no juízo falimentar, mas não se livram de classificação para disputa de preferência com créditos trabalhistas (art. 126 do Dec.-lei 7.661/45 [revogado pela nova lei de recuperação de empresas e falências]). Na execução fiscal contra o falido, o dinheiro resultante da alienação de bens penhorados deve ser entregue ao juízo de falência para que se incorpore ao monte e seja distribuído, observadas as preferências e as forças da massa” (REsp 188.148-RS, j. 19.12.2001, rel. min. Humberto Gomes de Barros). II – Se a decretação da falência é feita, e a penhora é superveniente: a penhora se faz no “rosto” dos autos da falência, citando-se o síndico, e não diretamente sobre determinado bem da massa, continuando normalmente seu curso o executivo fiscal, até julgamento final. Diga-se, todavia, que se tolerará um tipo de concurso de credores quando houver mais de uma Fazenda entre os entes credores, devendo ser respeitada uma ordem de preferência, conforme o art. 187, parágrafo único, do CTN, a seguir expendido: Com a aprovação da lei Ordinária 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências” –, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que promoveu uma modificação textual no caput do art. 187 do CTN. Antes de detalhá-lo, observemos o artigo, à luz da LC 118/2005: Art. 187. “A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, inventário ou arrolamento. 141 Parágrafo único. O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: I – União; II – Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pro rata; III – Municípios, conjuntamente e pro rata”. O referido artigo, a par do anterior, estabelece uma relação gradualística de preferência, segundo a qual o crédito tributário possui prevalência sobre qualquer outro, salvo os trabalhistas e os acidentários. Dessarte, é possível afirmar que há uma supremacia do executivo fiscal, impossibilitando ao credor civil que prossiga com sua pretensão executória contra devedor insolvente com a Fazenda Pública. Ao estabelecer que a cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concursos de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial (expressão acrescida com a LC 118/2005), inventário ou arrolamento, quer-se afirmar que o Fisco não tem a necessidade de habilitação de seus créditos nos concursos referidos. É que o novo regime falimentar extinguiu a figura da “concordata” e introduziu, tecnicamente, dois novos institutos: a recuperação extrajudicial e a recuperação judicial. A recuperação extrajudicial seria o período (devidamente reconhecido), em que o devedor tentaria liquidar suas obrigações com seus credores sem, contudo, sofrer uma literal constrição do Poder Judiciário. Havendo insucesso nessa empreitada, seria realizada a recuperação judicial, em que o devedor deveria relatar e arrolar todos os débitos existentes e, mediante proposta de quitação, levaria à discussão em assembleia previamente marcada. Há que se mencionar que tal dispositivo não se apresenta em consonância com o princípio federativo, constante no art. 60, § 4º, IV, da CF, haja vista não se admitir violação ao “federalismo de equilíbrio” vigente em nosso Estado Federal, entre as pessoas jurídicas de direito público interno (art. 41, I, II e III, do CC, Lei 10.406/2002). Ademais, é cristalina a violação ao princípio da isonomia, por estabelecer uma preferência da União em detrimento das outras pessoas políticas, bem como dos Estados em detrimento dos municípios. É evidente que não se pode tolerar quebra da isonomia federativa, tendo em vista tratar-se os entes tributantes de entes parificados, e não hierarquizados. No entanto, para efeito de concursos públicos, recomendamos que se obedeça à literalidade do CTN. Assim, estaremos em consonância com o Egrégio STF, que já foi instado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade do art. 187, parágrafo único, do CTN, editando a Súmula 563, cuja transcrição segue abaixo, ad litteram: Súmula 563 do STF: “O concurso de preferência a que se refere o parágrafo único do art. 187 do Código Tributário Nacional é compatível com o disposto no art. 9.º, I, da Constituição Federal” (tal artigo se referia, no regime constitucional anterior, à regra similar ao comando previsto, atualmente, no art. 19, III, in fine, da CF, que proíbe diferenças entre as pessoas políticas). 142 Nessa toada, é mister assinalar que o art. 29 da Lei 6.830/80 repetiu os dizeres insertos no artigo em tela, “turbinando-o” com a inclusão da expressão autarquias nos três incisos, como se nota a seguir: Art. 29 da Lei 6.830/80: “A cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento. Parágrafo único. O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: I – União e suas autarquias; II – Estados, Distrito Federal e território e suas autarquias, conjuntamente e pro rata; III – Municípios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata”. Outrossim, o art. 51 da Lei 8.212/91, determina a equiparação dos créditos do INSS aos créditos da União, de modo que, havendo concurso de ambos, deverá haver rateio entre esses créditos. Dessa forma, podemos inferir a inteligência do comando acima, com os acréscimos normativos mencionados, cuja dicção passaria a ser: Art. 29. (...) Parágrafo único. O concurso de preferência somente se verifica entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: I – Créditos da união e do INSS, conjuntamente e pro rata e suas autarquias; II – Créditos dos Estados, Distrito Federal e suas autarquias, conjuntamente e pro rata; III – Créditos dos municípios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata”. Portanto, memorize: Ordem de concurso de preferência: 1º lugar: União, INSS e autarquias federais; 2º lugar: Estados, Distrito Federal e autarquias estaduais; 3º lugar: Municípios e autarquias municipais. 143 15.3 Preferência na Falência, no Inventário e na Liquidação Com a aprovação da lei Ordinária 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências”–, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que promoveu uma modificação textual no caput do art. 188 do CTN. Antes de detalhá-lo, observemos o artigo, à luz da LC 118/2005: “São extraconcursais os créditos tributários decorrentes de fatos geradores ocorridos no curso do processo de falência. § 1º Contestado o crédito tributário, o juiz remeterá as partes ao processo competente, mandando reservar bens suficientes à extinção total do crédito e seus acrescidos, se a massa não puder efetuar a garantia da instância por outra forma, ouvido, quanto à natureza e valor dos bens reservados, o representante da Fazenda Pública interessada. § 2º O disposto neste artigo aplica-se aos processos de concordata”. Diferentemente do que previa anteriormente, o atual art. 188 preconiza que créditos extraconcursais são os créditos tributários que foram criados após a abertura do processo de falência e terão preferência para recebimento. Não perca de vista que o caput do art. 84 da Lei 11.101/2005 indica a prevalência dos créditos extraconcursais, em relação aos créditos indicados no art. 83 da mencionada Lei, cuja ordem pode ser assim demonstrada: 1º) Créditos trabalhistas e acidentários; 2º) Créditos com garantia real; 3º) Créditos tributários; 4º) Créditos com privilégio especial; 5º) Créditos com privilégio geral; 6º) Créditos quirografários; 7º) multas contratuais e pecuniárias; 8º) Créditos subordinados. Portanto, evidencia-se que os créditos extraconcursais terão preferência absoluta na falência, estando à frente até mesmo dos créditos trabalhistas e acidentários, bem como dos créditos com garantia real, sendo estes seguidos, logo atrás, pelos créditos tributários. No tocante às preferências do crédito tributário, a LC 118/2005 provocou significativas mudanças. É possível afirmar que, no geral, permaneceu incólume a preferência relativa do 144 crédito tributário — aquela exercida sobre quaisquer outros, ressalvados os trabalhistas e os acidentários. Todavia, nas situações de falência, o crédito tributário perdeu espaço na preferência: temos, conforme se estudou há pouco, a precedência dos créditos extraconcursais, dos créditos trabalhistas e acidentários, das importâncias passíveis de restituição e dos créditos com garantia real. Aliás, o crédito extraconcursal na falência goza de preferência absoluta, representando, em linha geral, todas as despesas e obrigações contraídas no curso da falência (art. 188 do CTN). Repise-se que ele será pago prioritariamente ao crédito trabalhista, acidentário e a todos os outros constantes do art. 83. Exemplos de créditos extraconcursais: créditos derivados da legislação trabalhista e acidentária relativos a serviços prestados após a decretação da falência; quantias fornecidas à massa pelos credores, custas do processo de falência; créditos relativos a despesas com fornecedores de bens ou serviços em contratos de mútuo; etc. Impende ressaltar que, de acordo com o art. 84, V, da Lei 11.101/2005, os créditos tributários também podem se revestir da condição de extraconcursais, desde que se refiram a tributos com fatos geradores ocorridos no curso do processo de falência. Neste caso, serão pagos prioritariamente em relação à ordem imposta pelo art. 83 da Lei de Falência. Note bem: Qualquer crédito tributário afeto a tributo com fato gerador ocorrido no curso do processo de falência deixa de ser um crédito tributário “simples” para ser extraconcursal. Nessa medida, segundo o caput do art. 84 da Lei 11.101/2005 terão precedência absoluta, isto é, sobre os créditos mencionados no art. 83. A mesma situação pode se dar sobre um crédito com garantia real: caso seja constituído após a decretação da falência, passa a ser um crédito extraconcursal, tendo preferência absoluta. Observe os quadros explicativos: Quadro 1: 1º 2º Crédito tributário “Extraconcursal” (FG ocorrido no curso da falência); Créditos trabalhistas e acidentários; 3º a) Importâncias passíveis de restituição (antes da decretação da falência); b) Créditos com garantia real (antes da decretação da falência); 4º Créditos tributários (FG ocorrido antes da decretação da falência). Quadro 2: 1º Crédito com garantia real “extraconcursal” (crédito constituído no curso da falência); 2º Créditos trabalhistas e créditos acidentários; 145 3º Importâncias passíveis de restituição (antes da decretação da falência); 4º Créditos tributários (FG ocorrido antes da decretação da falência). Por fim, diga-se que, segundo a nova Lei de Falência, o crédito tributário, no pro- cesso falimentar, tem preferência sobre os créditos com privilégio especial, privilégio geral, quirografários e os subordinados. Observe os artigos na ordem sugerida: Art. 84. “Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a: (...) V – obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei”. Art. 83. “a classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem: I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho; II – créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado; III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias; IV – créditos com privilégio especial, a saber: a) os previstos no art. 964 da lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002; b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta lei; c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia; V – créditos com privilégio geral, a saber: a) os previstos no art. 965 da Lei 10.406, de 10 de janeiro de2002; b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta lei; c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta lei; VI – créditos quirografários, a saber: a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo; 146 b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento; c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inc. I do caput deste artigo; VII – as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias; VIII – créditos subordinados, a saber: a) os assim previstos em lei ou em contrato; b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício”. Revisão: Quadro sinóptico de preferência na falência: 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º Créditos extraconcursais; Créditos trabalhistas e acidentários; Importâncias passíveis de restituição e créditos com garantia real; Créditos tributários; Créditos com privilégio especial; Créditos com privilégio geral; Créditos quirografários; Multas contratuais (penais ou tributárias); Créditos subordinados. Note bem: Caso os débitos trabalhistas tenham surgido após o processo de falência, revestir-se-ão da condição de créditos extraconcursais e terão preferência absoluta. Note que com isso os créditos tributários “ganham uma posição” (de 4º para 3º lugar). Observe a ordem alterada: 1.º Créditos extraconcursais* ; 2.º Importâncias passíveis de restituição e créditos com garantia real; 3.º Créditos tributários; 4.º Créditos com privilégio especial; 5.º Créditos com privilégio geral; 6.º Créditos quirografários; 7.º multas contratuais (penais ou tributárias); 8.º Créditos subordinados. 147 * Créditos trabalhistas e acidentários, após a decretação da falência e o crédito tributário, cujo fato gerador ocorreu após a decretação da falência (Art. 84, V, da Lei 11.101/2005) Cuidado: Questionar-se-ia: como ficou a multa tributária perante a nova Lei de Falência? Da conjugação do art. 83, III e VII, da nova Lei de Falência com o art. 186, parágrafo único, III, do CTN, deflui que as multas só têm preferência sobre os créditos subordinados – aqueles estabelecidos por lei ou contrato, ou ainda, os créditos de sócios ou administradores sem vínculo empregatício. Baseado neste estudo podemos concluir que os créditos tributários preferem a quaisquer outros, ressalvados os decorrentes da legislação trabalhista que surgiram antes dos processos de falência, arrolamento, inventário ou liquidação judicial ou voluntária, conforme representamos na tabela a seguir: Exemplo: a empresa abc dispõe de R$ 23 mil. Concluído o processo de falência, certa massa falida apresenta a situação a seguir: Dívida trabalhista decorrente de acidente de trabalho antes de decretada falência Dívida trabalhista surgida após a falência Dívida de INSS Dívida à União 2000 Dívida à Autarquia Federal Dívida à Autarquia Estadual Dívida à Autarquia municipal Dívida ao Estado Dívida ao município Total 1000 1000 200 9000 800 24 mil 1000 1000 8000 Comentário: Dívida trabalhista decorrente de acidente de trabalho antes da decretada falência Dívida trabalhista surgida após a falência Dívida de INSS Dívida à União Dívida à Autarquia Federal Dívida à Autarquia Estadual Dívida à Autarquia municipal Montante de dívida 2000 Ordem de preferência Valor a quitar 2º 2000 1000 1º 1000 1000 8000 1000 1000 200 4º 3º 5º 7º 9º 1000 8000 1000 1000 200 148 Dívida ao Estado Dívida ao Município Total 9000 800 6º 8º 9000 800 23 mil Montante de dívida 1000 Ordem de preferência Valor a quitar 1.º 1000 2000 2.º 8000 1000 1000 9000 1000 800 200 3.º 4.º 5.º 6.º 7.º 8.º 9.º Portanto, vamos ordenar: Dívida trabalhista surgida após a falência Dívida trabalhista decorrente de acidente de trabalho antes de decretada a falência Dívida à União Dívida de INSS Dívida à Autarquia Federal Dívida ao Estado Dívida à Autarquia Estadual Dívida ao Município Dívida à Autarquia municipal total 8000 1000 1000 9000 1000 Sem Sem 23 mil 15.4 Quitação de tributos Com a aprovação da lei 11.101, em 09 de fevereiro de 2005 – a nova “lei de Falências”–, algumas alterações no CTN se fizeram necessárias. Por essa razão, publicou-se na mesma data a Lei Complementar 118, que promoveu uma modificação textual no caput do art. 191 do CTN, além da inserção do art. 191-A. Antes de detalhar as novidades, observemos o artigo, à luz da LC 118/2005: Art. 191 do CTN: “A extinção das obrigações do falido requer prova de quitação de todos os tributos”. Diante da legislação anterior, bastava a apresentação da certidão negativa dos tributos relativos à sua atividade mercantil para que o falido obtivesse a declaração de extinção de suas obrigações; agora, com o novo texto, o falido deverá apresentar as certidões de quitação de todos os tributos, e não apenas aqueles afetos à atividade mercantil. Art. 191-A do CTN: “A concessão de recuperação judicial depende da apresentação da prova de quitação de todos os tributos, observado o disposto nos arts. 151, 205 e 206 desta Lei”. O art. 187 do CTN, modificado pela LC 118/2005, anuncia que a cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita à recuperação judicial. Dessa forma, não será possível a concessão da respectiva recuperação, sem que os referidos créditos sejam pagos. Portanto, a prova de quitação é condição essencial à extinção das obrigações. 149 Art. 192 do CTN. “Nenhuma sentença de julgamento de partilha ou adjudicação será proferida sem prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas”. Não é demasiado asseverar que os contratos administrativos e as propostas de concorrência que envolvam Poder Público e particular só ganharão eficácia, caso este último prove àquele a quitação de todos os tributos devidos à Fazenda Pública (art. 193 do CTN). Art. 193 do CTN. “Salvo quando expressamente autorizado por lei, nenhum departamento da administração pública da União, dos Estados, do Distrito Federal, ou dos municípios, ou sua autarquia, celebrará contrato ou aceitará proposta em concorrência pública sem que o contratante ou proponente faça prova da quitação de todos os tributos devidos à Fazenda Pública interessada, relativos à atividade em cujo exercício contrata ou concorre”. O texto limita a exigência à comprovação dos tributos devidos à Fazenda Pública interessada, ou seja, o titular do procedimento de licitação ou responsável pela celebração do contrato. Não está, portanto, a exigir a quitação de tributos da Fazenda dos outros entes federados. Além disso, limita também a exigência à quitação de tributos relativos à atividade do contrato ou concorrência. É importante salientar, outrossim, que o dispositivo permite a liberação de todas essas exigências por lei, o que o torna bastante liberal. Dessa forma, considerando-se que determinada concorrência pública realizada por um município seja relativa a uma prestação de serviço sujeita ao ISS, podemos afirmar que o contratante ou proponente pode estar em débito com relação a outras Fazendas Públicas; no entanto, deve estar quite com a Fazenda Pública interessada. A propósito, é imperioso enaltecer que os certificados de quitação, isto é, as certidões negativas de débito, a serem expedidas pelas Fazendas Públicas, não podem ser negadas, enquanto pendente decisão, na via administrativa, ou mesmo em face de adequada garantia do débito por penhora regular (vide Súmulas 29 e 38 do extinto tribunal Federal de Recursos – TFR c/c art. 206 do CTN). Para o STJ, “o fato de a agravante ter apresentado reclamação contra o pretenso débito tributário, o que levou à suspensão de sua exigibilidade (art. 151, III, do CTN), não é motivo para a recusa da emissão de certidão negativa de débito. O Estado de Santa Catarina fornecerá a certidão, podendo constar a existência dos créditos em discussão na esfera administrativa (art. 206 do CTN)” (REsp 191.414-SC, j.10.12.98, rel. min. Garcia Vieira) A questão decorre das dificuldades que, não raro, as empresas enfrentam na obtenção de certidões negativas de tributos requeridas, por exemplo, para liberação de financiamentos públicos e privados e habilitação em licitações. Em 1993, foi editado o Decreto 1.006, que instituiu o CaDIn – Cadastro Informativo dos Créditos não Quitados de Órgãos e Entidades Federais –, proporcionando à Fazenda um controle mais rígido sobre as dívidas dos contribuintes perante os Órgãos Federais. 150 Ocorre que não é incomum o cadastramento irregular de pendências do contribuinte, como, por exemplo, o registro de débitos, cujo montante se encontra devidamente garantido por penhora, o de débitos suspensos mediante ordem judicial ou, até mesmo, o de débitos em discussão administrativa. Nessas situações, em que o contribuinte é exposto a arbitrariedades relativas ao seu direito de obtenção de certidões negativas (art. 205 do CTN), ou mesmo positivas com efeito negativo (art. 206 do CTN), é possível pleitear-se medida judicial que determine a emissão das pretendidas certidões. Por isso, o contribuinte não pode ser considerado “devedor” enquanto o processo administrativo fiscal não se encontrar definitivamente encerrado; tanto assim que, como se estudou, a certidão de que constem créditos cuja exigibilidade esteja suspensa produz os mesmos efeitos da certidão negativa. O curioso é que, se a decisão do julgamento administrativo for contrária ao contribuinte, essas certidões não costumam ser expedidas, aguardando o Fisco, arbitrariamente, o ajuizamento de execução e a devida garantia do juízo com a penhora. Durante este período, que sói se estender por longos meses, o contribuinte deve ajuizar uma ação anulatória de débito tributário, mas, mesmo assim, não é comum convencer a Fazenda de que há direito à certidão, exceto se o contribuinte se dispuser a depositar em juízo o valor exigido, em dinheiro. O julgamento no STJ a seguir delineado, entretanto, corrigiu essa injustiça. De acordo com o entendimento do Tribunal, o contribuinte não precisa mais esperar a Fazenda Pública ajuizar uma execução fiscal para garantir o juízo com a penhora e obter as certidões: uma vez inscrito o débito em dívida ativa, pode ele, por meio de uma ação cautelar, antecipar a garantia do juízo e ter expedida certidão positiva de débito com efeitos de negativa. Leia, a propósito, a ementa da decisão, que unificou a jurisprudência do Tribunal e pôs fim a situações arbitrárias impostas pela Fazenda ao contribuinte: “Tributário. Certidão positiva com efeitos de negativa. Penhora de bens suficientes. A execução fiscal que, em princípio, agrava a situação do de- vedor pode, ao revés, beneficiá-lo com a possibilidade de obter a certidão positiva com efeitos de negativa (CTN, art. 206); trata-se de um efeito reflexo da penhora, cuja função primeira é a de garantir a execução – reflexo inevitável porque, suficiente a penhora, os interesses que a certidão negativa visa acautelar já estão preservados. mas daí não se segue que, enquanto a execução fiscal não for ajuizada, o devedor capaz de indicar bens suficientes à penhora tenha direito à certidão positiva com efeito de negativa, porque aí os interesses que a certidão negativa visa tutelar estão a descoberto. A solução pode ser outra se, como no caso, o contribuinte antecipar a prestação da garantia em Juízo, de forma cautelar. Recurso especial não conhecido” (STJ, REsp 99.653SP, 2.ª T., j. 15.10.98, rel. min. Ari Pargendler) 151 QUESTÕES PROPOSTAS: 1 – (TCE-SP/2008) A respeito das garantias e privilégios do crédito tributário, é correto afirmar: a) O crédito tributário prefere a qualquer outro, inclusive os créditos decorrentes da legislação do trabalho. b) A cobrança judicial do crédito tributário é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento. c) A multa tributária não prefere aos créditos subordinados, na falência. d) O crédito tributário prefere aos créditos extraconcursais, na falência. e) São extraconcursais os créditos tributários decorrentes de fatos geradores ocorridos no curso do processo de falência. 2 – (AFPS/2002) Em relação às garantias e privilégios do crédito tributário, é correto afirmar que: a) Presume-se fraudulenta a alienação de bens pelo sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito tributário constituído regularmente e inscrito como dívida ativa. b) Os bens do sujeito passivo, gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, respondem, em sua totalidade, pelo pagamento do crédito tributário da Fazenda Pública, excluídos os bens que a lei declare absolutamente impenhoráveis. c) A cobrança judicial do crédito tributário não se sujeita a habilitação em falência, concordata, inventário ou arrolamento, sendo admitida a execução fiscal antes da inscrição do débito do sujeito passivo como dívida ativa da Fazenda Pública, no caso de a autoridade judicial competente reconhecer a presença dos requisitos de urgência e relevância na questão submetida a julgamento, para evitar insucesso na realização do crédito tributário. d) O crédito tributário prefere aos demais, ressalvados os créditos decorrentes da legislação trabalhista e os protegidos por garantia real. e) A natureza do crédito tributário é alterada pelas garantias que a ele são atribuídas pelo Código Tributário Nacional. 3 – (CGU/2002) Quanto às garantias do crédito tributário, julgue os seguintes itens. a) A expressão garantia é empregada pelo Código Tributário Nacional (CTN) em sentido lato, ou seja, de modo a abarcar os modelos que visam resguardar o sujeito ativo da relação tributaria contra o não-cumprimento desta. 152 b) Privilégio é sempre prerrogativa, prevalência ou preeminência de um crédito sobre o outro. Se tal prevalência ocorre, em fase executiva, na ordem de pagamento em concurso de credores, denomina-se preferência. c) A competência para regulamentar a matéria relativa às garantias é exclusiva da União, sendo defesa a edição de legislação supletiva pelas demais entidades federativas. d) O CTN prevê que, além das garantias enumeradas em seu texto, outras poderão ser observadas, desde que sejam expressamente previstas em lei, em função das características do tributo a que se refiram. e) O fato de o crédito tributário dispor, às vezes, de privilégio especial sobre determinados bens não lhe retira a qualidade da garantia legal, estabelecida em função da condição do credor. 4 – (AFR-MT/2008) Com relação às Garantias e Privilégios do crédito tributário é correto afirmar. a) Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário a inscrito em dívida ativa. b) Na hipótese do devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens a penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens. c) A indisponibilidade de bens e direito do devedor que devidamente citado não oferecer bens para penhora será transmitida por carta com aviso de AR, exclusivamente, para os órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens. d) O concurso de preferência somente se verifica na ordem dos entes políticos observando a relação, inicialmente a União, Municípios, Estados e Distrito Federal. e) O crédito tributário prefere a qualquer outro, observando somente o concurso de preferência. 5 – (ARF-PA/2006) Seja qual for a natureza ou o tempo de sua constituição, o crédito tributário prefere: a) A qualquer outro, sem exceção. b) Apenas aos créditos decorrentes da legislação do trabalho, sem qualquer limite e condição. c) A qualquer outro, ressalvados apenas os créditos extraconcursais e os decorrentes da legislação do acidente de trabalho. d) A qualquer outro, ressalvados apenas os créditos extraconcursais ou as importâncias passíveis de restituição, bem como os créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado, desde que não seja decretada a falência do devedor. 153 e) A qualquer outro, ressalvados apenas os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho e, na falência, os créditos extraconcursais ou as importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei falimentar, e os créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado. GABARITO: 1. E 4. B 2. B 5. E 3. a) Verdadeira; b) Verdadeira; c) Falsa; d) Verdadeira; e) Verdadeira. 16. Administração Tributária. A administração tributária é fundamental para a consecução do fim a que visa o Poder Público em seu mister tributacional, de retirada compulsória de valores daqueles que ocupam o lado passivo da relação jurídico-tributária. Vale dizer que a garantia de uma salutar arrecadação passa pela eficácia na administração tributária, que se traduz em (I) procedimentos fiscalizatórios adequados, em (II) cobrança judicial dos importes tributários inscritos em dívida ativa e, finalmente, em (III) medidas de controle e verificação da regularidade fiscal do contribuinte. Tais medidas correspondem aos três tópicos norteadores do capítulo ora iniciado, isto é, fiscalização, dívida ativa e certidões negativas (arts. 194 a 208 do CTN). Abem da verdade, os artigos são demasiadamente esclarecedores, permitindo ao leitor uma assimilação tranquila dos dispositivos, que, em sua maior parte, são autoexplicativos. 16.1 Fiscalização A fiscalização se materializa em atos de verificação do cumprimento de obrigações tributárias, quer sejam principais, quer sejam acessórias. São atos decorrenciais da faculdade outorgada pela Constituição Federal às pessoas políticas, quanto à instituição de tributos. Assim, o procedimento fiscalizatório traduz-se em um poder-dever cometido às entidades impositoras. A competência e os poderes das autoridades administrativas, que laboram no mister fiscalizatório, estão adstritos a regramentos estipulados pela legislação tributária (art. 96 do CTN), em total obediência aos balizamentos impostos pelo CTN. É o que se depreende da dicção do art. 194, a seguir: 154 Art. 194 do CTN. “A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação. Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal”. Ademais, o parágrafo único do indigitado comando normativo preconiza a submissão generalizada das pessoas físicas e jurídicas, contribuintes ou não, aos efeitos da legislação regulamentadora do labor fiscalizatório. Tal submissão deve se estender às empresas imunes ou isentas, às quais não compete o afastamento da legislação em comento, uma vez que o fato de não arcarem com o pagamento do tributo não as exime de cumprirem suas obrigações acessórias, passíveis de controle por meio da fiscalização em comento. Saliente-se que eventuais disposições legais, limitativas ou obstativas do direito de examinar mercadorias ou documentos pertencentes ao sujeito passivo fiscalizado, não são pertinentes sobre ineficazes, uma vez que se apresenta assente a jurisprudência, no sentido de que “estão sujeitos à fiscalização tributária ou previdenciária quaisquer livros comerciais, limitado o exame aos pontos objeto da investigação” (Súmula 439 do STF). É importante observar que o CTN, com este artigo, tornou sem efeito os arts. 17 e 18 do Código Comercial (Lei 556/1850), que determinavam: “Nenhuma autoridade, juízo ou tribunal, debaixo de pretexto algum, por mais especioso que seja, pode praticar ou ordenar alguma diligência para examinar se o comerciante arruma ou não devidamente seus livros de escrituração mercantil, ou neles tem cometido algum vício. Art. 18. A exibição judicial dos livros de escrituração comercial por inteiro, ou de balanços gerais de qualquer casa de comércio, só pode ser ordenada a favor dos interessados em gestão de sucessão, comunhão ou sociedade, administração ou gestão mercantil por conta de outrem, e em caso de quebra”. Frise-se, todavia, que a fiscalização deve permear seu trabalho, adstrita aos campos de interesse da Fazenda, não podendo extravasar a competência administrativa. Art. 195 do CTN. “Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los. Parágrafo único. Os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados serão conservados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram”. No parágrafo único do art. 195, está prevista a obrigação de guardar livros e documentos fiscais utilizados na escrituração, até que ocorra a prescrição dos créditos. Note-se que o legislador não cita o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 174 do CTN – atitude 155 providencial e parcimoniosa –, uma vez que a prescrição pode sofrer tanto interrupção como suspensão. A atividade fiscalizatória é marcada por um iter procedimental, com início, meio e fim. Tais delineadores temporais são cruciais, pois delimitam o início do procedimento e demarcam o seu fim, haja vista não se admitir a eternização da atividade limitadora da Administração, projetando-se ad eternum e provocando constrangimentos ao sujeito passivo. Inicia-se a fiscalização por meio de um registro, a ser feito em livro fiscal do sujeito passivo ou em documento separado, dando conta do termo de início de fiscalização. Ademais, anota-se o prazo para a conclusão dos trabalhos. Essa demarcação, aparentemente singela, norteia dois importantes institutos do direito tributário, a saber: denúncia espontânea (art. 138, parágrafo único, do CTN) e a decadência (art. 173, parágrafo único, do CTN): Quanto à decadência, note: Art. 173 do CTN. “O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento”. O parágrafo único ora analisado indica uma antecipação do termo a quo do prazo decadencial, na medida em que o marco inicial de contagem é deslocado do 1.º dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado para a própria data da providência preparatória de constituição do crédito tributário. Exemplo: Se o contribuinte for notificado de uma medida preparatória de lançamento em 15 de maio de um exercício, relativo a um fato gerador ocorrido em fevereiro do mesmo exercício, o início da contagem do prazo decadencial não ocorrerá no 1.º dia do exercício seguinte, mas no dia 16 de maio – data antecipada a partir da qual se somará o prazo de 5 anos para a conclusão do lançamento. Frise-se que, caso já tenhamos iniciado o prazo decadencial por força do inc. I do art. 173 do CTN, a medida preparatória em análise não será hábil a interromper ou suspender o prazo decadencial já iniciado. 156 Quanto à denúncia espontânea, note: Art. 138. “A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração”. Assim, para configurar a espontaneidade é necessário que a denúncia seja oferecida anteriormente ao início de qualquer procedimento administrativo fiscal. Dessa forma, a simples notificação feita pela autoridade fiscal, solicitando que livros fiscais sejam exibidos dentro do prazo estabelecido em legislação, sepulta a espontaneidade do sujeito passivo. Art. 196 do CTN. “A autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização lavrará os termos necessários para que se documente o início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para a conclusão daquelas. Parágrafo único. Os termos a que se refere este artigo serão lavrados, sempre que possível, em um dos livros fiscais exibidos; quando lavrados em separado deles se entregará, à pessoa sujeita à fiscalização, cópia autenticada pela autoridade a que se refere este artigo”. É certo que, como se trata a ação fiscalizatória de ato público da Administração, esta não poderá agir divorciada dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade (art. 37 da CF), sob pena de resvalar em arbítrio e abuso de poder. Não é demasiado relembrar que o lançamento tributário, ato no qual se projeta a ação fiscal, é ato administrativo vinculado (art. 3.º, in fine, do CTN). Art. 197. “mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: I – os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício; II – os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras; III – as empresas de administração de bens; IV– os corretores, leiloeiros e despachantes oficiais; V – os inventariantes; VI – os síndicos, comissários e liquidatários; VII – quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão. 157 Parágrafo único. A obrigação prevista neste artigo não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão”. O comando supramencionado obriga as pessoas citadas a prestarem informações quando solicitadas, mediante intimação escrita, a respeito de terceiros por interesse da fiscalização. Insta mencionar que a intimação a que se refere este artigo é administrativa, uma vez que, mediante intimação judicial, todos, e não somente as pessoas citadas, têm de prestar informações. É bom que se entenda que a intimação escrita é cabente às pessoas enumera- das nos incs. I a VI, independentemente de lei ordinária que as obrigue, uma vez que o próprio CTN já o fez. No entanto, consoante o inc. VII, haverá a necessidade de lei para quaisquer outras pessoas ou entidades não previstas nos incisos anteriores. Por derradeiro, registre-se que, caso as pessoas citadas no dispositivo sub examine estiverem legalmente obrigadas ao sigilo, mesmo que intimadas administrativamente por escrito, não se verão compelidas a prestarem informações. É o caso atinente a advogados, médicos, psicólogos, sacerdotes e outros. Art. 198 do CTN. “Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades. § 1.º Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes: I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça; II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa. § 2.º O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo” (Redação dada pela LC 104/2001). É natural que, assim como cabe ao Fisco a capacidade de investigar o sujeito passivo, igualmente lhe compete a obrigação de manter sigilo sobre as informações obtidas durante os 158 processos de fiscalização, sob pena de imposição de sanções administrativas, sem prejuízo daquelas previstas na legislação criminal. Ressalte-se, todavia, que tal restrição do art. 198 comporta exceções, em três casos específicos (dois previstos nos incisos supracitados e um, no § 2.º): a) requisição do juiz, no interesse da justiça (processo de qualquer natureza, civil ou penal); b) solicitação de informações, por outro órgão da Administração Pública, para a apuração de prática de infração administrativa (exemplo: Banco Central, ao apurar ilícito cambiário, requer informações à Secretaria da Receita Federal). É claro que a troca de dados pressupõe processo administrativo aberto no órgão requisitante que deverá, ao obter as informações, “passar recibo” (art. 198, § 2.º, do CTN) de que as recebeu, em uma verdadeira “transferência de sigilo”; c) troca de informações entre as entidades impositoras, por força de lei ou de convênio, conforme previsto no caput do art. 199, que será comentado a seguir. Trata-se de dispositivo não autoaplicável, uma vez que depende de regulação por lei ou convênio. Tais instrumentos, na prática, são raros, desestimulando o mecanismo de permuta de dados entre as Fazendas Públicas, que é de todo salutar. Também aqui deve se dar a “transferência de sigilo” entre os órgão receptor e transmissor da informação. Diga-se que, se houver permuta de informações entre União e outros países, o veículo de troca de dados deve ser o acordo ou tratado internacional. É ele também dependente de regulamentação, não sendo autoaplicável. Urge salientar que a LC 104/2001 permitiu importantes ressalvas ao princípio do sigilo fiscal, como se pode notar nos dizeres insertos no § 3.º do art. 198 do CTN: “(...) § 3.º não é vedada a divulgação de informações relativas a: I – representações fiscais para fins penais; II – inscrições na dívida ativa da Fazenda Pública; III – parcelamento ou moratória”. Assim, é possível haver a divulgação de informações sobre representação fiscal para fins penais, dívida ativa, parcelamento ou moratória. Entendemos que tal comando veicula prática fiscal um tanto vexatória e irrazoável para o contribuinte, traduzindo-se, muitas vezes, em cobrança indireta de tributo. Art. 199 do CTN. “A Fazenda Pública da União e as dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios prestar-se-ão mutuamente assistência para a fiscalização dos tributos respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio. Parágrafo único. A Fazenda Pública da União, na forma estabelecida em tratados, acordos ou convênios, poderá permutar informações com Estados estrangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos”. 159 O comando supracitado versa sobre assistência mútua entre as Fazendas Públicas, na forma estabelecida por lei ou convênio. E se não houver lei ou convênio? Haverá empecilhos a que se troquem informações entre os Fiscos? Não, uma vez que a regra limitadora dispõe sobre a quebra de fidelidade entre “agente fiscal” e “particular interessado”, e não entre “agente fiscal” e outro “agente público”, no interesse da fiscalização, sob reserva de sigilo. Os convênios são necessários, em face da existência de problemas comuns que afetam a fiscalização e arrecadação de tributos das diversas unidades federativas. Visam, assim, simplificar a atuação fiscalizatória, por meio de troca de informações entre as Fazendas Públicas dos Estados, no tocante à fiscalização do tributo (exemplo: convênios do ICMS, principalmente no que diz respeito às prestações e operações interestaduais). Art. 200 do CTN. “As autoridades administrativas federais poderão requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção”. Segundo o art. 200 do CTN, as autoridades administrativas federais, ao desempenharem seu mister investigativo, no controle do cumprimento das obrigações tributárias do sujeito passivo, não podem deparar com empecilhos opostos pelo fiscalizado, que se presta a impor óbices à ação fiscal. Dessa forma, qualquer ato que impeça ou embarace a fiscalização, mesmo não constituindo crime ou contravenção, pode ensejar a requisição por parte da autoridade fiscal de auxílio da força pública federal, estadual ou municipal. Em qualquer hipótese, todavia, deve imperar, na utilização da prerrogativa em comento, a máxima parcimônia, uma vez que o emprego da força, divorciado da guarida legal, pode ensejar o crime de excesso de exação (art. 316, §1º, do CP) ou de violência arbitrária (art. 322 do CP). Frise-se que a doutrina diverge quanto à possibilidade de requisição de força policial na hipótese de recusa de apresentação de livros comerciais ou documentos fiscais, no mister fiscalizatório. Não obstante o artigo mencionado se referir apenas às autoridades administrativas federais, somos da opinião de que o entendimento deve ser extensível às autoridades fiscais estaduais e municipais, que requisitarão, respectivamente, força pública estadual e municipal. Note-se que o próprio agente fiscal requisitará o aparato repressor, sem necessidade de se valer de superior hierárquico. 16.1.1 dívida ativa (arts. 201 a 204 do CNT) Art. 201 do CTN: “Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo 160 fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular. Parágrafo único. A fluência de juros de mora não exclui, para os efeitos deste artigo, a liquidez do crédito”. Não obstante o CTN tratar exclusivamente da dívida ativa tributária, não há mais esta divisão entre créditos fiscais e não tributários conforme dispõe a Lei 6.830/80, que trata da cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública. “Art. 1.º. A execução judicial para cobrança da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. Art. 2.º. Constitui dívida ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos municípios e do Distrito Federal. § 1.º Qualquer valor cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o art. 1.º será considerado dívida ativa da Fazenda Pública. § 2.º A dívida ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato. § 3.º A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 (cento e oitenta) dias ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo. § 4.º A dívida ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional”. A dívida ativa não tributária representa os créditos a que faz jus a Fazenda Pública, tais como originários de foros, laudêmios, aluguéis, preços públicos, indenizações, além de outros. Por sua vez, a dívida ativa tributária refere-se a tributos, seus adicionais e multas decorrentes do não pagamento de tributos. Com efeito, o art. 2.º da LEF prescreve que constitui dívida ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei 4.320/64, cujo art. 39, § 2.º, assim reza: “dívida ativa tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e dívida ativa não tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de sub-rogação de hipoteca, fiança, aval, ou outra garantia de contratos em geral ou de outras obrigações legais”. A inscrição do crédito tributário em dívida ativa ocorre pelo inadimplemento da obrigação tributária nascida com o fato gerador. Isso quer dizer, conforme se pôde observar na “Linha do Tempo”, detalhada no curso desta obra, que o crédito tributário não suspenso, não extinto ou não excluído, poderá, como resposta à necessidade de cobrança do sujeito ativo, ser inscrito em dívida ativa. Tal procedimento tem o condão de conferir exequibilidade à relação jurídicotributária. Portanto, a dívida ativa pode ser definida como o crédito tributário inscrito. DA = CT + INSCRIÇÃO 161 Após a inscrição na dívida ativa, cria-se o cenário hábil à propositura da ação judicial de cobrança, de nome ação de execução fiscal, conforme a Lei 6.830/80. Como resposta a tal ação judicial, poderá o contribuinte, após a garantia do juízo, opor embargos à execução fiscal, numa tentativa de extinguir a execução fiscal preexistente. A inscrição será feita por meio do termo de inscrição na dívida ativa, que apenas instrumentaliza a Fazenda Pública com documento hábil à execução. Não se quer dizer, portanto, que o Fisco já esteja em via de cobrar judicialmente o sujeito passivo, uma vez que deve proceder ao ajuizamento da ação de cobrança. Art. 202 do CTN. “O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I – o nome do devedor e, sendo caso, o dos corresponsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência, de um e de outros; II – a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos; III – a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado; IV – a data em que foi inscrita; V – sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito. Parágrafo único. A certidão conterá, além dos requisitos deste artigo, a indicação do livro e da folha da inscrição”. A inscrição na dívida ativa, formalizada pelo termo acima detalhado, perfaz- se no livro da dívida ativa, no ambiente adstrito à Procuradoria Judicial. Frise-se que, hodiernamente, os cadastros da dívida ativa não mais se corporificam em “livros”, mas são armazenados em sistemas eletrônicos de dados. De qualquer sorte, substancialmente, nada muda. Desse termo, inserto no indigitado livro ou assimilado em cadastro eletrônico, extrai-se a CDA – Certidão de Dívida ativa – título executivo extrajudicial, que deverá lastrear a ação judicial de cobrança, isto é, a ação de execução fiscal. Entretanto, mais importante do que sabermos os itens obrigatórios do termo e da certidão de inscrição na dívida ativa é assimilarmos as consequências do erro ou omissão de um deles, como se depreende do art. 203 do CTN: Art. 203 do CTN. “A omissão de quaisquer dos requisitos previstos no artigo anterior, ou o erro a eles relativo, são causas de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente, mas a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado, o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada”. No mesmo sentido, exsurge o art. 2.º, § 8.º, da Lei 6.830/80. Vejamos: 162 Art. 2.º, § 8.º “Até a decisão de primeira instância, a certidão de dívida ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos”. Desse modo, a omissão ou erro em um dos itens obrigatórios do termo de inscrição na dívida ativa, previsto no art. 202 do CTN, causa a nulidade da inscrição e do processo de cobrança. Porém, a certidão poderá ser substituída até a decisão de 1.ª instância, sanando eventuais omissões. Para tanto, será dado novo prazo para defesa ao sujeito passivo. Ultrapassada essa fase, o vício acarretará o reconhecimento da nulidade de todo o processo de cobrança. Prevalece, pois, o brocardo de que “quanto mais tarde, pior”, para a Fazenda credora, no tocante à detecção do vício que macula o processo de cobrança. Art. 204. “A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite”. No mesmo sentido, exsurge o art. 3.º da Lei 6.830/80. Vejamos: Art. 3.º. “A Dívida Ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do executado ou de terceiro, a quem aproveite”. Dessa forma, ao contrário do credor no direito privado, a Fazenda Pública não precisa provar a certeza e liquidez do crédito tributário para executar judicialmente o sujeito passivo. Ademais, a CDA é título líquido, certo e imediatamente exigível, habilitando a Fazenda a pleitear o importe tributário. Prescinde o Fisco, assim, de documento estranho à CDA para provar o débito do sujeito passivo, competindo ao próprio devedor demonstrar o contrário. É o princípio da inversão do ônus da prova. Portanto, tal presunção não é juris et de jure, mas juris tantum, isto é, relativa. 16.2 certidão negativa (arts. 205 a 208 do CTN) Art. 205 do CTN. “A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido. Parágrafo único. A certidão negativa será sempre expedida nos termos em que tenha sido requerida e será fornecida dentro de dez dias da data da entrada do requerimento na repartição”. A Constituição Federal assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de 163 situações de interesse pessoal, conforme art. 5.º, XXXIV, b. Há quem considere tal comando nítido exemplo de imunidade tributária. É demasiado comum ao dia a dia do contribuinte a necessidade de documento que traduza quitação fiscal, permitindo-lhe participar de licitações, obter empréstimos e financiamentos e, fundamentalmente, manter-se quite com a Fazenda. É importante lembrar que o CTN se refere, no parágrafo único do art. 205, ao termo dez dias para a expedição da certidão, e não a “dez dias úteis”, expressão não utilizada pelo Código em nenhum dos seus artigos em vigor. A não observância do interregno legal pode ensejar a propositura de um mandado de segurança, protetor de um direito líquido e certo da impetrante, que tenha sido violado por um ato abusivo de uma autoridade coatora. Art. 206 do CTN. “Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa”. Se o sujeito passivo for alvo de um lançamento tributário, lastreado em notificação ou em auto de infração, e não concordar com a exigência, poderá se valer de quaisquer dos métodos de suspensão do crédito tributário estudados no art. 151 do CTN. Caso ele necessite de uma certidão negativa, enquanto este crédito estiver suspenso, a Administração emitirá um documento, denominado pela doutrina de certidão de regularização ou certidão positiva com efeitos de negativa, no qual aparecerá o crédito com exigibilidade suspensa, sendo hábil, todavia, a produzir exatamente os mesmos efeitos da certidão negativa, uma vez que o requerente não está irregular perante o Fisco. O mesmo fenômeno ocorre com a existência de créditos não vencidos ou em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetuada a penhora. Art. 207 do CTN. “Independentemente de disposição legal permissiva, será dispensada a prova de quitação de tributos, ou o seu suprimento, quando se tratar de prática de ato indispensável para evitar a caducidade de direito, respondendo, porém, todos os participantes no ato pelo tributo porventura devido, juros de mora e penalidades cabíveis, exceto as relativas a infrações cuja responsabilidade seja pessoal ao infrator”. Caso haja necessidade de prática de ato indispensável à caducidade ou perecimento de direito, dispensar-se-á a certidão negativa, independentemente de disposição legal autorizativa. Não é raro deparar o contribuinte com a urgência de atos ou negócios, que devem ser realizados com toda a celeridade possível, sem que se disponha de tempo para a requisição e liberação da certidão de tributos. É certo que, na hipótese de apuração posterior de débito, os participantes (contribuintes ou responsáveis) deverão arcar com os ônus afetos aos tributos, juros de mora e penalidades cabíveis, com exceção das multas pessoais ao infrator (art. 134, parágrafo único, CTN). 164 Art. 208 do CTN. “A certidão negativa expedida com dolo ou fraude, que contenha erro contra a Fazenda Pública, responsabiliza pessoalmente o funcionário que a expedir, pelo crédito tributário e juros de mora acrescidos. Parágrafo único. O disposto neste artigo não exclui a responsabilidade criminal e funcional que no caso couber”. Tal comando disciplina uma responsabilidade pessoal, quanto ao pagamento da dívida tributária, contra o funcionário que emitir uma certidão negativa inquinada de falsidade ideológica. O funcionário fazendário, sabendo que está cometendo uma falsidade, responderá, consequentemente, caso se descubra a fraude, por este ilícito perante as instâncias administrativa, tributária e criminal. Logo, ficará responsável pelo crédito que deixou de constar na certidão, além de ser o destinatário das devidas sanções administrativas e penais. Com efeito, o funcionário desbriado poderá ser alvo de responsabilização penal, atribuindo-selhe, no mínimo, o crime de prevaricação, quando não o de corrupção passiva. Por outro lado, se o funcionário agir sem dolo, exempli gratia, com culpa, não haverá que incidir a responsabilidade pelo crédito tributário, podendo exsurgir, no entanto, a responsabilização disciplinar e a penal, se for o caso. Estamos que tal responsabilização pessoal do servidor público fazendário é contraproducente, devendo-se assimilá-la como responsabilidade solidária. Isso porque o servidor público, como é sabido, recebe, como regra, parcos salários, não se podendo imaginá-lo hábil a satisfazer créditos tributários robustos. Ademais, proteger-se-ia o contribuinte desonesto, com um verdadeiro escudo, na pessoa do servidor. Assim, a responsabilidade mais consentânea com o ideal de justiça deve ser a solidária, a fim de se dar azo à eventual responsabilização do sujeito passivo originário. 16.3 Disposições Finais e transitórias do CTN (arts. 209 e 210 do CTN) Art. 209 do CTN. “A expressão ‘Fazenda Pública’, quando empregada nesta Lei sem qualificação, abrange a Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios”. A definição de Fazenda Pública está na configuração jurídica das pessoas jurídicas de direito público interno, conforme o art. 41, I, II e III, do CC (Lei 10.406/2002). A Fazenda Pública é também conhecida como ente tributante ou Fisco, além de assumir a feição de entidade impositora. Na língua portuguesa, a expressão Fazenda Pública tem a acepção de Hacienda Publica (em espanhol), como termo sinônimo de Tesouro Público, Erário, Fisco. A expressão presume, quando utilizada sem qualificação, a alusão concomitante a todas as órbitas de competência (União, Estados, municípios e Distrito Federal). Em outras palavras, quando se quiser fazer menção a um dos entes federados, a expressão avocará especificação. 165 É prudente salientar que a expressão ora analisada não está circunscrita, exclusivamente, às entidades estatais da Administração Pública, da União, dos Estados, dos municípios e do Distrito Federal, abrangendo, também, as pessoas administrativas submetidas ao regime de direito público – autarquias e fundações públicas (STJ, REsp 58.689/PR, j. 08.03.95, rel. min. Américo Luz, DJ. 08.05.95, p. 12.374). Dessa forma, as entidades paraestatais (sociedades de economia mista e em- presas públicas), porque dotadas de personalidade de direito privado, acham-se excluídas do conceito de fazenda pública (art. 173, § 1.º, II, e § 2.º, da CF). Os Territórios Federais, na sua organização atual, não têm Fazenda Pública própria, sendo seus créditos e débitos integrados na Fazenda Pública da União. É importante lembrar que, se forem divididos em municípios, a competência para tributos municipais permanecerá incólume, existindo, natural e decorrencialmente, as Fazendas Públicas municipais (art. 147 da CF). Art. 210 do CTN. “Os prazos fixados nesta Lei ou legislação tributária serão contínuos, excluindo-se na sua contagem o dia de início e incluindo-se o de vencimento. Parágrafo único. Os prazos só se iniciam ou vencem em dia de expediente normal na repartição em que corra o processo ou deva ser praticado o ato”. Este dispositivo tem uma crucial importância, dada sua abrangência, aplicando-se a todos os prazos previstos no CTN e a toda a legislação tributária (art. 96 do CTN – as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares). Os prazos serão contínuos, sem interrupção aos sábados, domingos ou feriados, e sujeitos à regra processual de que, na sua contagem, exclui-se o dia de início e inclui-se o de vencimento. Assim, o prazo é contado a partir do dia seguinte ao do seu início, isto é, dies a quo da contagem contínua do prazo não será considerado, começando o cômputo no primeiro dia de expediente normal na repartição em que deva ser praticado o ato ou em que corra o processo. Nesse passo, diga-se que o parágrafo único do art. 210 refere-se a dia de expediente normal (expediente completo), e não a “dia útil”. Dessa forma, não são considerados dias de “meio expediente” ou “pontos facultativos”. O dia deve ser “integralmente útil”. A jurisprudência ratifica o entendimento, como se depreende do teor da Súmula 310 do STF: “Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda- feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir”. Ademais, não é diversa a inteligência do comando inserto no art. 184, § 2.º, do CPC, que, por ser mais prolixo, complementa e subsidia a norma do CTN, coexistindo ambos sem dicotomia. Exemplos: 1. Um prazo de três dias para a entrega de documento na repartição fiscal, com intimação na segunda-feira: data limítrofe = final do expediente de quinta-feira; 2. Um prazo de três dias para a entrega de documento na repartição fiscal, com intimação na quarta-feira ou quinta-feira: data limítrofe = final do expediente de segunda-feira (não havendo, é claro, expediente na repartição fiscal no sábado); 166 3. Um prazo de três dias para a entrega de documento na repartição fiscal, com intimação na sexta-feira: data limítrofe = final do expediente de quarta-feira seguinte (não havendo, é claro, expediente na repartição fiscal no sábado); EXERCÍCIOS PROPOSTOS: 1 – (AFRF/2001) De acordo com a lei, entre os elementos a serem obrigatoriamente informados no Termo de Inscrição da Dívida Ativa, não se inclui a) b) c) d) O nome do devedor e dos corresponsáveis A origem, natureza e fundamento legal da dívida O nome e domicílio do fiador O número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida e) O valor originário da dívida 2 – (TRF/2003) Assinale a opção incorreta. Tem o mesmo efeito de certidão negativa, a certidão de que conste a existência de crédito tributário a) b) c) d) e) Em curso de cobrança executiva em que tenham sido oferecidos bens à penhora. Ao qual tenha sido concedida moratória ou objeto de parcelamento. Não vencido ou cujo montante integral tenha sido depositado. Cuja exigibilidade esteja suspensa. Objeto de medida liminar ou de tutela antecipada. 3 – (AFR-MS/2006) A teor do art. 202, II do Código Tributário Nacional, no termo de inscrição de dívida ativa e na certidão de dívida ativa, devem constar obrigatoriamente os itens a seguir, à exceção de um. a) b) c) d) e) A quantia devida. A maneira de calcular a correção monetária. A maneira de calcular os juros de mora acrescidos. A explicação dos cálculos da correção monetária dos juros. O dispositivo legal que permite o cálculo da multa. 4 – (AFR-MT/2008) Nos termos do Código Tributário Nacional é incorreto afirmar. a) O termo de inscrição de dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente o nome do devedor e os responsáveis, seus 167 b) c) d) e) domicílios e residências; a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos; a origem do crédito e as disposições de lei em que se fundam; a data da sua inscrição; número do processo administrativo que originou o crédito. A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feito por certidão negativa, expedida a requerimento do interessado. As omissões constantes na certidão de dívida ativa podem ser sanadas até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula. Inexiste a possibilidade de certidão positiva com efeitos de negativa ante a liquidez e certeza do crédito tributário mesmo tendo a exigibilidade suspensa decorrente de penhora por falta de previsão legal. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de liquidez e certeza, tendo efeito de prova pré-constituída em favor do fisco. 5 – (AFR-RJ/2008) Não são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: a) b) c) d) Os Tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício. Os bancos públicos. As empresas de administração de bens. Entidades ou as pessoas que lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão, quando o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão. e) Os bancos privados. 6 – (AFR-PA/2006) É incorreto afirmar que a dívida ativa a) Goza da presunção de certeza e liquidez. b) Goza de presunção de certeza mas a liquidez do crédito tributário depende de decisão judicial, transitada em julgado. c) Goza de presunção relativa ou juris tantum. d) Tem o efeito de prova pré-constituída. e) Regularmente inscrita pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite. 168 7 – (AFR-PA/2006) A certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa, a) Tem os mesmos efeitos de certidão negativa. b) Não pode ser expedida por servidor, enquanto o processo estiver em andamento, sob pena de responsabilidade funcional. c) Não tem efeito jurídico. d) Importa em reconhecimento do débito pelo devedor, a partir da sua expedição. e) Constitui o crédito tributário, se for expedida pela autoridade competente. 8 – (AFTM-PE/2006) Sob a Dívida Ativa, considere as seguintes afirmações I – a inscrição da Dívida Ativa constitui ato de controle administrativo da legalidade. II – a Dívida Ativa regularmente inscrita goza de presunção de certeza e liquidez. III – a presunção referente à certeza e liquidez da Dívida Ativa é absoluta e não pode ser elidida pelo executado. Está correto o que se afirma apenas em a) b) c) d) e) I. II. III. I e II. II e III. GABARITO: 1. C 2. A 3. D 4. D 5. D 6. B 7. A 8. D 169