O IMPACTO DO EMPREENDIMENTO, E NÃO A TITULARIDADE DOS BENS AFETADOS,
COMO PARÂMETRO PARA DEFINIR A COMPETÊNCIA DE UM LICENCIAMENTO AMBIENTAL
Omar Bradley Oliveira de Souza
Procurador Federal junto à Procuradoria Federal Especializada do INCRA/PB
Sumário : 1. Introdução. 2. As competências em matéria ambiental previstas na CF. O
princípio do interesse como pressuposto para a definição da competência. 3. Por que a
competência é definida pelo impacto do empreendimento, e não pela titularidade dos
bens afetados. 4. Conclusões. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Devido à importância sem precedentes que
a sociedade mundial vem dando ao meio ambiente, e sendo o Brasil um dos principais protagonistas da globalização, é importante fazer o registro de que nosso país tem algumas das mais
modernas legislações sobre meio ambiente no
mundo.
No entanto, é muito comum ouvirmos notícias
acerca de cancelamentos ou suspensões de licenças ambientais em virtude de determinado
órgão, seja ele federal, estadual ou municipal,
não ter sido supostamente o competente para a
concessão da licença. Portanto, o rótulo, justo,
diga-se de passagem, de ser conhecido como
um país de moderna legislação ambiental é, na
prática, prejudicado, porque a competência para
a concessão dos licenciamentos fica a todo o
momento sendo questionada, mesmo depois de
quase trinta anos da edição da Lei nº 6.938/81 e
de mais de dez anos da Resolução Conama nº
237/97, que são as duas mais importantes normas brasileiras sobre licenciamento ambiental.
Diante dessas situações vêm as inevitáveis
perguntas: por que tanta confusão em torno da
competência para a concessão de uma licença
ambiental? De quem é a competência para conceder a licença ambiental de determinada atividade, serviço, obra ou empreendimento? é da
União, do Estado ou do Município? Afinal, quais
os parâmetros que a legislação estabelece para
definir essa competência?
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DOUTRINA, PARECERES E ATUALIDADES 479
Veremos adiante que a legislação infraconstitucional em vigor sofre de algumas deficiências,
tais como a sobreposição de normas e a inexistência delas, mas mesmo assim concluiremos
que as normas em vigor possibilitam ao intérprete definir sem dificuldades de quem é a competência para a concessão da licença ambiental.
2. AS COMPETÊNCIAS EM MATÉRIA
AMBIENTAL PREVISTAS NA CF –
O PRINCÍPIO DO INTERESSE COMO
PRESSUPOSTO PARA A DEFINIÇÃO
DA COMPETÊNCIA
Embora a legislação sobre licença ambiental
seja esparsa, o fato é que a Lei nº 6.938/81 e a
Resolução Conama nº 237/97 esclarecem e elucidam de forma até simples qualquer dúvida que
possa pairar sobre a responsabilidade pela competência da emissão das licenças.
Essa responsabilidade, é importante registrar, deriva das várias repartições de atribuições
estabelecidas pela Constituição Federal aos entes federativos e se funda no critério do interesse. Porém, esse critério, no que tange à licença
ambiental, baseia-se nos impactos ambientais
da atividade ou do empreendimento que se pretende licenciar. É o que veremos agora.
A Constituição Federal de 1988, ao criar a
federação, fez com que o poder não ficasse nas
mãos de uma única pessoa jurídica de direito
público, conferindo uma descentralização política e jurídica a cada um dos entes federativos
brasileiros. Assim, cada ente, em matéria ambiental, deverá instituir órgãos próprios para exercer responsabilidades político-administrativas,
cujas origens são baseadas no critério do interesse.1 Portanto, a União ostenta competência
para assuntos de natureza nacional e regional;
os Estados e o Distrito Federal, para questões
estaduais; e os Municípios, para os locais.
Em outras palavras: a competência políticoadministrativa em matéria ambiental se consubstancia na execução de determinadas tarefas, funções e serviços, e está firmada no art. 23, incs.
VI e VII. Nesse artigo, definem-se várias atribuições comuns entre os entes, daí por que a doutrina deu a tais atributos a denominação de competência comum.
Conseqüentemente, a competência políticoadministrativa em matéria ambiental foi um dos
institutos mais implementados pelo legislador infraconstitucional, porque a União criou uma autarquia especial (Ibama) para se responsabilizar por
essa área, e praticamente todos os Estados do
País têm seus respectivos e próprios órgãos ambientais. O mesmo se diga em relação a todas
as capitais e aos demais grandes Municípios do
Brasil.
Se, por um lado, é digna de aplausos tal implementação, por outro motivou muitas confusões, isto é, em virtude de haver órgãos tanto da
União quanto dos Estados e dos Municípios cuidando da matéria ambiental, algumas vezes não
se sabe de quem é a competência para determinado licenciamento.
Numa hora um só órgão se diz competente,
e, noutra, outro ente se arvora no direito de licenciar, e nem é tão incomum quando, simultaneamente, dois ou mais entes se dizem os responsáveis para licenciar o mesmo empreendimento, gerando, assim, conflitos positivos. O contrário também acontece, ou seja, existem casos
em que um órgão se omite e se diz incompetente, assim como os demais órgãos, gerando conflitos negativos.
Isso ocorre porque a legislação infraconstitucional sofre das deficiências no início apontadas, mas o principal motivo que origina toda
essa celeuma reside no fato de alguns entenderem que a competência se baseia no critério da
propriedade do bem afetado, quando a Constituição, como vimos, é clara ao definir a competência pelo critério do interesse.
3. POR QUE A COMPETÊNCIA É DEFINIDA
PELO IMPACTO DO EMPREENDIMENTO, E
NÃO PELA TITULARIDADE DOS
BENS AFETADOS
A resposta está, em primeiro lugar, na Lei nº
6.938/81, que, no caput do art. 10, diz que a regra
é que os Estados licenciam o empreendimento.
Esse artigo, por sua vez, está regulamentado
pela Resolução Conama nº 237/97, que enumera
os casos de competência atribuídos a cada um
dos três níveis da federação.
Em relação à competência da União, essa
resolução diz o seguinte:
“Art. 4º Compete ao Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis – IBAMA, órgão executor do
SISNAMA, o licenciamento ambiental a que
se refere o art. 10 da Lei nº 6.938, de 31 de
agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental
de âmbito nacional ou regional, a saber:
I – localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar
territorial; na plataforma continental; na zona
econômica exclusiva; em terras indígenas ou
em unidades de conservação do domínio da
União.
II – localizadas ou desenvolvidas em dois
ou mais Estados;
III – cujos impactos ambientais diretos
ultrapassem os limites territoriais do País ou
de um ou mais Estados;
IV – destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e
dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante
parecer da Comissão Nacional de Energia
Nuclear – CNEN;
1. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 11ª ed., São Paulo, Malheiros, 2000, p. 279.
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480 BDM – Boletim de Direito Municipal – Julho/2009
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O impacto do empreendimento, e não a titularidade dos bens