UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO-SENSU” EM CLÍNICA MÉDICA E CIRURGICA EM PEQUENOS ANIMAIS DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DO TUMOR VENÉREO TRANSMISSÍVEL NASAL EM CÃO – RELATO DE CASO Elaine Cristina Sobral Ribeirão Preto, nov. 2011 ELAINE CRISTINA SOBRAL Aluna do Curso de Clínica Médica e Cirúrgica em pequenos animais da UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO Matrícula 29658 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DO TUMOR VENÉREO TRANSMISSÍVEL NASAL EM CÃO – RELATO DE CASO Trabalho monográfico de conclusão do curso de Clínica Médica e Cirúrgica em Pequenos Animais (TCC), apresentado à UCB como requisito parcial para a obtenção do título de Clínica Médica e Cirúrgica em Pequenos Animais, sob a orientação do Prof. Dr. Athos Assumpção Pastore. Ribeirão Preto, jan. 2012 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DO TUMOR VENÉREO TRANSMISSÍVEL NASAL EM CÃO – RELATO DE CASO Elaborado por Elaine Cristina Sobral Aluna do Curso de Clínica Médica e Cirúrgica em Pequenos Animais da UCB Foi analisado e aprovado com grau:....................... Ribeirão Preto, de de 2012. ____________________________ Membro da banca ____________________________ Membro da banca ____________________________ Professor Orientador Dr. Athos de A. Pastore Ribeirão Preto, jan. 2011 ii Dedico este trabalho a Maria e José Gonçalves pelo amor durante este percurso e principalmente ao meu namorado Guto, pelo grande apoio recebido e paciência. iii AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Prof. Athos Assumpção Pastore - pela paciência e sabedoria; A família Gonçalves - que me incentivou a fazer este estudo; Ao Dr. João Batista Ferreira Honorato, pela oportunidade, confiança e amizade; Aos meus professores caminhada solidária. iv e colegas, pela RESUMO SOBRAL, Elaine Cristina Diagnóstico e tratamento de Tumor Venéreo Transmissível (TVT) nasal em cão – relato de caso. O TVT – Tumor Venéreo Transmissível é uma neoplasia indiferenciada de células redondas cujo crescimento é rápido. É diagnosticado, na maioria das vezes, em cães jovens, sadios e sexualmente ativos. Acomete, comumente, a genitália externa, porém, também são relatadas regiões extragenitais. O presente trabalho relata um diagnóstico de TVT nasal em um cachorro e seu tratamento. Palavras-chave: Tumor Venéreo transmissível; cachorro; diagnóstico; tratamento. v ABSTRACT SOBRAL, Elaine Cristina Diagnosis and treatment the canine transmissible venereal tumor on the nose - account of case. The transmissible venereal tumor is na indifferentiated round cell neoplasm with fast growth. Is most of the times diagnosed in Young, healthy and sexually active dogs. In general it affects any part of external genitalis, however, given an account of tumor metastasis. The author do a revision of TVT clinic, diagnostic and treatment using biotechniques and anti-tumor medication in the dog. Key words: Transmissible Venereal Tumor, dog; diagnostic; treatment. vi “Olhe no fundo dos olhos de um animal e, por um momento, troque de lugar com ele. A vida dele se tornará tão preciosa quanto a sua e você se tornará tão vulnerável quanto ele. Agora sorria, se você acredita que todos os animais merecem respeito e nossa proteção, pois em determinado ponto eles são nós e nós somos eles”. Philip Ochoa vii LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Preparação histológica do Tumor Venéreo Transmissível canino, onde se podem observar células de formato arredondado, sustentadas por tecido conjuntivo fibrso e vascularizado, permeado por quantidade variada de células inflamatórias e hemácias invadindo o estroma tumoral (obj. 40x).................................................5 Figura 2 – Animal no exame clínico apresentando secreção em olho direito, aumento de volume infraorbitário e em plano nasal direito.................................12 Figura 3 – Raio-x na projeção laterolateral formação nodular de densidade água de partes moles adjacente ao osso nasal......................................................13 Figura 4 – Raio-x na projeção dorsoventral mostrando intensa área de radioluscência peri-apical de canino superior direito; formação nodular com discreto desvio de septo nasal rostral em cavidade nasal direita..........................................................................................................13 Figura 5 – Animal apresentando regressão total dos nódulos na quarta sessão de aplicação do quimioterápico............................................................................15 viii ABREVIATURAS °C – grau Celsius m2 – metro quadrado mg – miligrama ml – mililitro % – porcento TVT – Tumor Venéreo Transmissível ix SUMÁRIO Páginas RESUMO........................................................................................................................... v ABSTRACT....................................................................................................................... vi LISTA DE FIGURAS......................................................................................................... viii ABREVIATURAS............................................................................................................. ix 1. Introdução....................................................................................................................... 1 2. Revisão de literatura....................................................................................................... 3 2.1. Etiologia.................................................................................................... 3 2.2. Morfologia/histologia................................................................................ 3 2.3. Patogenia................................................................................................... 5 2.4. Sinais clínicos.............................................................................................6 2.5. Diagnóstico................................................................................................ 8 2.6. Diagnóstico diferencial.............................................................................. 8 2.7. Tratamento................................................................................................. 8 3. Descrição do caso de interesse....................................................................................... 11 3.1. Caso clínico............................................................................................... 11 3.2. Diagnóstico radiográfico........................................................................... 12 3.3. Diagnóstico citológico............................................................................... 14 3.4. Tratamento................................................................................................. 14 3.5. Resultado................................................................................................... 15 4. Discussão........................................................................................................................ 16 5. Considerações finais....................................................................................................... 18 6. Referências bibliográficas.............................................................................................. 19 1 1. Introdução A primeira descrição do Tumor Venéreo Transmissível (TVT) em animal da espécie canina encontrada na literatura é atribuída a um pesquisador chamado Huzard e data de 1820. A partir de então, seguiram-se outras descrições. Contudo, somente por um importante relato detalhado feito por Sticker, entre 1905-1906, caracterizando esta neoplasia como um linfossarcoma (motivo pelo qual também é denominado de linfossarcoma de Sticker) é que o tumor tornou-se consagrado, sendo então por muitos anos, chamado de tumor de Sticker (LOMBARD e CABANIE, 1968). Sticker constatou que essa neoplasia é transmissível por células transplantáveis, com localização predominante venérea, afetando o pênis e a vagina de caninos, mas também podendo ser encontrado em regiões extragenitais (CHITI e AMBER, 1992). É dentre as principais neoplasias que acometem os cães, podendo ser transplantado como um aloenxerto dentro de uma mesma espécie e, da mesma forma, para outros membros da família Canidae, como coiotes, raposas e lobos (SOUSA et al., 2000; PARK et al., 2006; VON HOLDT e OSTRANDER, 2006). Este tumor possui grande variedade de sinônimos, tais como: condiloma canino, granuloma venéreo, sarcoma infeccioso e linfoma venéreo, sendo essa variedade de sinonímias reflexo da incerteza quanto a sua origem (CANAL et al., 2005). A incidência do TVT está mais restrita à idade de maior atividade sexual e em países onde a população canina não esteja sujeita a rigoroso controle epidemiológico (ROGERS, 1997). 2 Segundo BRITO (2005), as fêmeas são mais acometidas que os machos devido ao seu comportamento durante o período de cio (momento em que aceitam vários machos) e pela ação de hormônios na região genital, garantindo um aporte de sangue maior associado à intumescência vulvar, favorecendo o transplante de células tumorais. Outros pesquisadores não observaram predisposição em relação ao sexo (AMBER e HENDERSON, 1982; MIALOT, 1984). A presença do TVT foi assinalada em todos os continentes, com maior prevalência nas zonas de clima tropical e em grandes cidades (MIALOT,1984). No Brasil, este tipo de tumor canino é de freqüência elevada, assim como em outros países onde existem cães errantes e quando não há restrição à atividade sexual. Atualmente, o TVT está praticamente erradicado nos países desenvolvidos (TINUCCI-COSTA, 1994). O objetivo deste trabalho é descrever algumas características do TVT canino e relatar sua implantação no plano nasal. 3 2 - Revisão de literatura 2.1. Etiologia Os Tumores Venéreos Transmissíveis são tumores transplantáveis que comumente contêm 58 a 59 cromossomos, dos quais 17 a 19 são metacêntricos, em contraste com os complementos celulares de animais da espécie canina normais de 78 cromossomos acrocêntricos. (JOHNSTON, 1998; JONES, HUNT e KING, 2000). Estudos dos antígenos de superfície e da histocompatibilidade sugerem que o tumor resultou de translocações cromossômicas (a união de dois cromossomos, formando apenas um) em um único tumor, com a subseqüente manutenção e disseminação pelas populações da espécie canina em todo o mundo (JOHNSTON, 1998). A expressão do antígeno de histocompatibilidade de classe II pelas células de TVT canino indica uma origem retículoendotelial. Células neoplásicas também expressam imunorreatividade a lisozima e ά1-antitripsina, juntamente com um marcador de macrófago canino, sustentando uma histiogênese de TVT de linhagem monócito/macrófago (MEDLEAU e HNILICA, 2009). 2.2 – Morfologia/ Histologia Histologicamente, o TVT é classificado como uma neoplasia de células redondas, cuja geometria pode sofrer pequenas alterações, mesclando as células redondas com outras ovais ou mesmo poliédricas. Os núcleos são invariavelmente grandes, circulares e intensamente 4 corados pela cromatina (característica hipercromática) e o citoplasma é discretamente basofílico e com múltiplos vacúolos, que geralmente acompanham o bordo celular. Anisocitose e anisocariose são observadas, bem como hipercromasia nuclear e macrocariose. (GROOTERS, 1998; ERÜNAL-MARAL et al., 2000). Em cortes histológicos de material fixado em formol e corados por Hematoxilina/Eosina as células tumorais são arredondadas, demonstrando uniformidade no tamanho e aparencia; núcleo grande e central, cromatina agregada nucléolo excêntrico e proeminente. O citoplasma é abundante, finamente granular e normalmente vacuolizado. As células são arranjadas em grupos ou cordões ao longo de trabéculas de tecido conjuntivo fibroso contendo vasos sanguíneos. Freqüentemente existe uma infiltração de linfócitos, células plasmáticas e macrófagos (TINUCCI-COSTA, 1999) (Figura 1). A presença de figuras mitóticas e células inflamatórias é outra característica desta neoplasia (WELLMAN, 1990; BOSCOS et al.,1999; ERÜNAL-MARAL et al., 2000; VARASCHIN et al., 2001). À microscopia eletrônica as células apresentam-se arredondadas, com alta relação núcleo/citoplasma e grande nucléolo. No citoplasma são vistos vários retículos endoplasmáticos granulares, grandes mitocôndrias, vacúolos, aparelhos de Golgi e ribossomos agrupados ou isolados. São também vistos numerosos microvilos e interdigitações entre as células adjacentes (TINUCCI-COSTA, 1999). 5 Figura 1 – Preparação histológica do Tumor Venéreo Transmissível canino, onde se podem observar células de formato arredondado, sustentadas por tecido conjuntivo fibroso e vascularizado, permeado por quantidade variada de células inflamatórias e hemácias invadindo o estroma tumoral (obj. 40x). 2.3 – Patogenia A transmissão, crescimento e metástases tumorais dependem do estado imunológico do animal para o qual o tumor é transplantado (JOHNSTON, 1998). Anteriormente, alguns pesquisadores acreditavam existir a participação de vírus na transmissão do TVT (LOMBARD e CABANIE, 1968); atualmente, a implantação de células viáveis em tecido escarificado é a forma mais aceita da transmissão natural do TVT (TINUCCI-COSTA, 1999). Células neoplásicas viáveis são mais frequentemente transferidas durante o coito, porém podem ser transferidas a vários locais por meio de lambedura, espirro ou esfregação (MEDLEAU e HNILICA, 2009). 6 A lesão comumente se instala na genitália externa (vulva e pênis), mas, outros sítios primários de TVT são relatados como a cavidade nasal, oral, ânus, tecido cutâneo e subcutâneo. Metástases não são comuns e a maioria é vista nos nódulos linfáticos regionais; outros sítios metastáticos reportados como de ocorrência natural ou experimentalmente transplantado do TVT são a pele, nódulo linfático distante, cérebro, olho, baço, fígado, testículos e musculatura (BRANDÃO et al, 2002). O TVT quando transplantado em cães, passa normalmente por fases consecutivas de progressão, latência e de regressão, em um período de 2 a 6 meses. Entretanto, não existem relatos de regressão espontânea desse tumor de ocorrência natural. Transmissões experimentais podem ser conseguidas por inoculações parenterais de células vivas do tumor ou pela deposição de células do TVT em pele ou mucosa escarificadas, porém não se desenvolvem quando depositadas em conjuntiva ou mucosa intactas (COHEN, 1985; TINUCCI-COSTA, 1999). 2.4 – Sinais Clínicos Os sinais clínicos geralmente estão presentes dois meses antes do atendimento veterinário (ROGERS, 1997). Notam-se tumefações nodulares ou semelhantes a verrugas, únicas ou múltiplas, firmes ou friáveis com coloração vermelha a cor de carne, frequentemente hemorrágicas, com 1 a 20 cm de diâmetro, na derme ou no tecido subcutâneo. A lesão se instala mais comumente na genitália externa, podendo atingir qualquer parte do corpo, especialmente face e membros. Pode haver ulceração e infecção bacteriana secundária (MENDLEAU e HNILICA, 2009). 7 Dentre os sinais iniciais do TVT genital estão a presença de secreção sanguinolenta vaginal ou peniana e hematúria (SOUSA et al, 2000; SANTOS et al, 2005). Além disso, o animal pode apresentar tumefação genital, lambedura excessiva do local, odor fétido e deformidade da genitália externa (ROGERS, 1998; BRANDÃO et al., 2002; SANTOS et al., 2005). A secreção serosanguinolenta ou hemorrágica pode ser confundida inicialmente com estro, uretrite ou prostatite (ROGERS, 1998; VARASCHIN et al., 2001; SANTOS et al., 2005). Com o desenvolvimento do TVT, observa-se tecido nodular, hemorrágico e friável, pouco demarcado, sendo que freqüentemente a lesão pode apresentar ulcerações. Essa neoplasia pode apresentar aspecto de couve-flor ou de placas. Pequenos fragmentos do tumor, com coloração acinzentada podem se destacar facilmente do tecido primário durante a manipulação (JOHNSTON, 1998). No macho esses tumores são encontrados mais freqüentemente na área do bulbo peniano, mas podem aparecer em qualquer lugar na mucosa peniana ou prepucial (NELSON e COUTO, 2006); Na fêmea, localiza-se com maior freqüência na vagina e vulva (LOAR, 1992). O TVT afeta primariamente a mucosa genital, porém, também são relatados sítios extragenitais, tais como, cavidade nasal região cutânea e subcutanea, conjuntiva, pavilhão auditivo, olho e mucosas oral e nasal (GREATTI, 2004; TELLA et al, 2004 e Santos et al, 2005). Em caso de tumores com localização extragenital do TVT pode haver uma variedade de sinais clínicos, dependendo da localização anatômica do tumor, como por exemplo: espirros, epistaxe, epífora, halitose, perda de dentes, exoftalmia, elevações na pele, 8 deformação facial e/ou oral, juntamente com o aumento dos linfonodos regionais (ROGERS, 1997). 2.5 – Diagnóstico O diagnóstico é feito mais comumente pelo exame físico onde se observa o tumor na genitália externa. Nos casos onde o tumor genital não é observado e há suspeita em outras regiões do corpo, a impressão sobre lâmina de microscopia (“imprint”) e a citologia aspirativa por agulha fina (CAAF) são necessários, podendo também ser diagnosticado através de exame histopatológico (SILVA et al., 2007). 2.6 – Diagnóstico diferencial O histórico descrito pelo proprietário, como presença de secreção sanguinolenta vaginal ou peniana, e o aspecto macroscópico da lesão, placas friáveis com aspecto de couve flor, são sugestivos de TVT, devendo-se diferenciar de neoplasias como mastocitoma, histiocitoma, linfoma e lesões granulomatosas não neoplásicas (FLORES et al., 1993). 2.7 – Tratamento Condutas terapêuticas vêm sendo preconizadas para o TVT, entre elas a criocirurgia (DASS e SAHAY, 1989; OLGIVIE, 1996), radioterapia (SANTOS, 1988 e WHITE, 1991), ressecção cirúrgica (PANCHBHAI et al., 1990) e quimioterapia antineoplásica (CAMACHO e 9 LAUS, 1987; BHAT; AHMAD, 1988; HOQUE et al., 1993; ANDRADE et al., 1999 e SILVA et al., 2007). A excisão cirúrgica pode resultar em um controle em longo prazo embora seja um procedimento cruento e que possui índice relativamente alto de recidivas. A eletrodiérese pode ser empregada para a exérese, a qual ocorre em menor tempo cirúrgico e com menor hemorragia. Como desvantagem da eletrossecção, há a possibilidade de atrasos na cicatrização e também a formação de tecido fibroso com deformação dos órgãos genitais (HOQUE et al., 1995). Dentre as várias modalidades de tratamento, como radioterapia, cirurgia ou criocirurgia, a quimioterapia é a aceita como mais efetiva (ERÜNAL-MARAL et al., 2000). Existem inúmeros relatos utilizando vincristina, vimblastina, doxorrubicina e ciclofosfamida como agentes únicos (ROGERS et al., 1998) ou combinados (CALVERT et al., 1982; HOQUE et al., 1995) para o tratamento do TVT. A terapia com sulfato de vincristina como agente único, em aplicações semanais, é o protocolo mais efetivo, sendo necessárias de quatro a oito aplicações intravenosas para a obtenção da cura (ERÜNAL-MARAL et al., 2000). Em tumores resistentes à vincristina, a droga de escolha é a doxorrubicina (ROGERS, 1997). A quimioterapia citotóxica constitui-se no método mais eficiente. Sendo menos cruenta que o tratamento cirúrgico, apresenta menor número de recidivas e, quando estas ocorrem, em geral, são lesões localizadas e sensíveis aos antineoplásicos (CAMACHO e LAUS, 1987). A vincristina faz parte dos alcalóides da vinca, que são extraídos da planta pervinca (Vinca rosea linn). Os alcalóides da vinca são específicos do ciclo celular e, em comum com outras drogas, tais como colchicina e podofilotoxina, bloqueiam a mitose, interrompendo-a na metáfase. Os efeitos bioquímicos dos alcalóides da vinca foram extensamente explorados. A 10 maioria das atividades biológicas dessas drogas pode ser explicada por sua capacidade de ligar-se específicamente à proteína tubulina que é componente importante dos microtúbulos celulares. Devido ao rompimento dos microtúbulos do aparelho mitótico, a divisão celular é bloqueada na metáfase. A incapacidade de segregar corretamente os cromossomos durante a mitose acaba por ocasionar morte celular (CALABRES e PARKS JUNIOR, 1987). A vincristina é uma droga muito utilizada em quimioterapia veterinária, em especial nos protocolos de poliquimioterapia destinados ao tratamento de hemopatias malignas e, mais particularmente, o linfossarcoma de cães e gatos. Em monoquimioterapia, é principalmente prescrita para tratamento do sarcoma de Sticker. É aplicada por via intravenosa estrita na dose de 0,7 mg/m2/semana (LANORE E DELPRAT, 2004) ou 0,025-0,05 mg/kg/semana (VIANA, 2007). O número de sessões varia de duas a seis (LANORE E DELPRAT, 2004). Geralmente, após a quarta aplicação constata-se regressão completa do tecido neoplásico, devendo a terapia ser continuada com mais duas aplicações após o desaparecimento completo das lesões (SOUSA et al, 2000). 11 3 – Descrição do caso de interesse 3.1 – Caso clínico Em julho de 2011 foi trazido à Clínica Veterinária Jodan, no município de Brodowski – SP, um animal da espécie canina, macho inteiro, da raça Pinscher, com aproximadamente 2 anos de idade, peso vivo de 3,5 quilos, com as seguintes queixas: dificuldade respiratória, epistaxe intercorrente e três nódulos na face. Ao exame clínico o animal apresentava dispnéia, obstrução da passagem do ar nos seios paranasais semelhante ao ronco e espirros. A temperatura corporal era de 38,3°C a freqüência cardíaca dentro da normalidade, as mucosas estavam róseas e havia secreção serosanguinolenta somente no olho direito. O animal apresentava aumento de volume infraorbitário e no plano nasal direito (Figura 2). Além disso, havia aumento de volume na gengiva ao redor do canino superior ipsilateral aos nódulos, nominado pelo protocolo como dente 104. O animal também apresentava muita dor à palpação local e linfonodos submandibulares aumentados. O animal é de vida semi domiciliada, ou seja, tem fácil acesso à rua e acompanha a proprietária quando a mesma sai de bicicleta. Não havia recebido quaisquer vacinas, tratamentos contra ectoparasitas ou vermifugações. Sua alimentação é baseada em comida caseira associada à ração comercial. O paciente foi encaminhado a empresa Nucleon – Diagnósticos e Especialidades Veterinárias, localizado na cidade de Ribeirão Preto – SP, para realização de raio-X e citologia intranasal. 12 Figura 2 – Animal no exame clínico apresentando secreção em olho direito, aumento de volume infra-orbitário e em plano nasal direito. 3.2 – Diagnóstico radiográfico Foram realizadas radiografias nas projeções laterolateral decúbito esquerdo e dorsoventral onde foi constatada “formação nodular de densidade água de partes moles adjacente ao osso nasal; intensa área de radioluscência peri-apical de canino superior direito; formação nodular com discreto desvio de septo nasal rostral em cavidade nasal direita” (Figuras 3 e 4). 13 Figura 3 – Raio-x na projeção latero-lateral formação nodular de densidade água de partes moles adjacente ao osso nasal. Figura 4 – Raio-x na projeção dorso-ventral mostrando intensa área de radioluscência peri-apical de canino superior direito; formação nodular com discreto desvio de septo nasal rostral em cavidade nasal direita. No laudo radiográfico enviado os achados radiográficos foram “compatíveis com neoformação, pólipo, formação fúngica e fístula dentária.” 14 3.3 – Diagnóstico citológico Foi coletada secreção nasal com suabe, realizado esfregaço em lâmina e o material foi corado com kit panótico. No laudo citológico foram encontrados: “esfregaços apresentando hipercelularidade monomórfica compostos por células redondas com vacúolos intracitoplasmáticos periféricos, padrão de cromatina paquicromático e alta relação núcleo:citoplasma. Nota-se polimorfonucleares, células epiteliais típicas fagocitando neutrófilos e figuras de mitose. Diagnóstico provável – Tumor venéreo transmissível.” 3.4 – Tratamento O protocolo para as quatro aplicações de vincristina, na via intravenosa, respeitando o intervalo de sete dias, foi: canulação da veia radial com cateter ligado a um frasco de 100 ml de solução de cloreto de sódio a 0,9%, o fármaco sulfato de vincristina, na concentração de 1mg/ml, na dose de 0,05mg/kg/semana (0,17ml) diluído no soro e administrado na velocidade de 4 gotas a cada 5 segundos. Para este manuseio utilizou-se EPI- Equipamentos de proteção individual – que no caso foi composto de luvas de látex, máscara, óculos de proteção e avental. Em seguida ao esgotamento do frasco de soro com o quimioterápico um novo frasco de soro era conectado para a manutenção da veia pega e lavagem do vaso canulado. Concluído o trabalho o paciente ficava sob observação por cerca de quatro horas e não apresentando nenhum sintoma era liberado para casa. 15 3.5 - Resultados Baseando-se no histórico, sinais clínicos, radiográficos e citológicos, temos um diagnóstico definitivo de Tumor venéreo transmissível (TVT). O animal respondeu bem ao tratamento estabelecido, manifestando melhoras e desaparecimento dos sinais clínicos no decorrer do tratamento. Na quarta semana de aplicação do quimioterápico, foi verificada a redução clínica total dos sinais e sintomas do TVT nasal (Figura 5). Figura 5 – Animal apresentando regressão total dos nódulos na quarta sessão de aplicação do quimioterápico. 16 4 – Discussão O animal trazido à clínica tinha aproximadamente dois anos, o que condiz com ROGERS (1997) e AMARAL et al (2004) que relatam que cães sexualmente ativos são mais comumente afetados, embora cães sexualmente imaturos possam ser acometidos pelo contato com a mãe portadora ou com outros cães portadores. O comportamento canino anterior ao coito de cheirar e lamber a genitália pode levar à implantação de células do TVT na mucosa oral e nasal (BARBIERI, 2007). A localização nasal está usualmente associada com espirros e epistaxe (CALVERT, 1984). ROGERS (1997) cita em seu trabalho que animais com tumores de localização extragenital podem apresentar como sinal clínico espirros, epistaxe, epífora, halitose, perda de dentes, exoftalmia, elevações na pele, deformação facial e/ou oral, juntamente com o aumento dos linfonodos regionais, o que reforça a veracidade do caso clínico em questão, pois, o animal apresentava espirros, epistaxe intercorrente, elevações na face levando a deformação facial e os linfonodos submandibulares aumentados. Barbiere et al. (2007) não recomendam o tratamento cirúrgico para o TVT genital e extragenital, tal como o TVT nasal, pois durante o procedimento pode haver a transplantação de células neoplásicas no local da cirurgia ou em outros sítios, por meio de luvas e instrumentais cirúrgicos. O quimioterápico utilizado foi o sulfato de vincristina, que é o mais utilizado, sendo que seus efeitos antibacterianos e antimitóticos (TELLA; AJALA e TAIWO, 2004) levam a uma diminuição da atividade nucleolar e, consequentemente, cessação da proliferação celular (GREATTI, 2004). 17 Uma recuperação de 90% pode ser esperada em cães tratados com sulfato de vincristina na dose de 0,5 – 0,7 mg/m2 ou 0,025 – 0,05 mg/kg, por via intravenosa, uma vez por semana, durante quatro a seis semanas (CANAL et al, 2005). 18 5 - Considerações finais Com este caso clínico abordado é de fundamental importância destacar a realização dos exames citológicos e/ou histopatológicos não somente para identificar o TVT, mas também para diferenciá-lo de mastocitoma, histiocitoma, linfoma e lesões granulomatosas não neoplásicas, conforme comentou FLORES et al. (1993). Com este resultado, conclui-se que o sulfato de vincristina constitui indicação eficaz para o tratamento de TVT, seja de ocorrência genital ou não. 19 6 - Referências Bibliográficas AMARAL, A. S. et al. Diagnóstico citológico do tumor venéreo transmissível na região de Botucatu, Brasil (estudo descritivo: 1994-2003). RPCV, v. 99, n. 551, p. 167-171, 2004. AMBER, I.E.; HENDERSON, R.A. Canine transmissible venereal tumor: evaluation of surgical excision of primary and metastatic lesions in Zaria- Nigeria. Journal of the American Hospital Association, v.18, n.2, p.350-352, 1982. ANDRADE, S.F.; OLIVEIRA, C.M.N.L.; LUIZARI, F.C.; BARBOUR, SANCHES, J.C.; MENDONÇA, M.F. Clínica Veterinária, Ano IV, n.18, p.32-33, 1999. BARBIERI, G. et al. Tumor venéreo transmissível extragenital no tecido cutâneo: relato de quatro casos. A Hora Veterinária, ano 27, n. 158, p. 65 -67, 2007. BHAT, M.N.; AHMAD, S.I. 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